sexta-feira, 31 de agosto de 2012

DE HOMENS, ABELHAS E FORMIGAS




João Eichbaum

“Num primeiro e preconceituoso olhar, o Mauá pode parecer apenas um imóvel caindo aos pedaços, rodeado por crackeiros viciados, doentes e malcheirosos, além de prostitutas baratas, travestis, assaltos e mendigos com dente tudo zuado pra muita gente, símbolos máximos da degradação humana.”
O texto é de uma matéria do Correio do Brasil sobre um edifício situado no centro de São Paulo, que já abrigou um hotel e hoje, abandonado, está ocupado por “sem tetos”.
“Mas – prossegue o texto - é um edifício muito bem localizado: basta atravessar a rua e você está na estação da Luz, por onde passam duas linhas da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) e duas linhas do Metrô, que se integram facilmente com mais duas. O prédio também está cercado por museus: Pinacoteca do Estado de São Paulo, Estação Pinacoteca, Memorial da Resistência, Museu da Língua Portuguesa e Museu de Arte Sacra. Fica exatamente ali a principal sala de concertos do país, a Sala São Paulo, casa da respeitada Orquestra Sinfônica do Estado (Osesp). Falando em música, a vizinhança abriga ainda a sede da Escola de Música do Estado de São Paulo (Emesp), conhecida como Centro Tom Jobim. O Parque da Luz, a praça e a estação Júlio Prestes da CPTM, uma unidade da Faculdade de Tecnologia de São Paulo (Fatec) e outra da Escola Técnica do Estado de São Paulo”.
A matéria noticia que foi deferida uma liminar de reintegração de posse para os proprietários daquele prédio quase em ruínas e alerta para a situação dos atuais ocupantes.
“Não pode ser que rato e barata more melhor que ser humano”, dizem os moradores.
Vocês já ouviram coisa semelhante de um grande filósofo, de um grande antropólogo, de um grande sociólogo, desses que cobram uma fortuna para enganar a elite cultural, que também paga outra fortuna, para os ouvir nas conferências das “Fronteiras do Pensamento”?
E diz mais a matéria do CB: “Tanto espaço ocioso e o trabalhador se esmagando no trem e no busão pra ir de casa pro serviço: duas, três horas por dia, porque mora longe, na periferia, que é onde o salário alcança pagar aluguel. “É desumano, enquanto tem vários imóveis parados aqui”, lamenta Ivaneti Araújo, uma senhora de 39 anos que lidera a ocupação.
É assim o ser humano: só ele teve capacidade de inventar uma convivência cheia de contrastes, mas nunca foi capaz de aprender, com as formigas e as abelhas, esses bichinhos que não tiveram o privilégio de ser criados “à imagem e semelhança de Deus”, a melhor maneira de viver em sociedade.


quinta-feira, 30 de agosto de 2012

SERÁ O FIM DE UMA ERA?


João Eichbaum

Cezar Peluso está se despedindo do Supremo Tribunal Federal.  A sessão de ontem foi interrompida, depois do voto dele, para que os advogados pudessem apertar sua mão.
Acho que só apertaram, não beijaram a mão desse ex-seminarista, que tinha como confessor o arcebispo de São Paulo. Certamente, nenhum dos advogados ficou feliz com o voto de Peluso, que não poupou ninguém, não absolveu ninguém, botou todo mundo no mesmo saco.
Sem favor nenhum, foi o melhor voto de todas as sessões do mensalão, um voto estritamente técnico, interessante pelo modo como foi proferido, sem aquela leitura enfadonha a que se entregam os ministros. Foi o voto de um juiz, de um verdadeiro juiz de carreira, do juiz que conhece o Direito Penal e que examinou os autos com lentes de julgador.
Não conhecia o Peluso, salvo por suas manifestações extra autos que andaram causando algum desconforto entre alguns magistrados e por algumas extravagâncias que custaram algum dinheiro para o erário, quando foi presidente do STF. Mas, sua postura ontem me impressionou, porque julgou com autoridade, além de ter dado uma verdadeira aula de Direito.
Até o Joaquim Barbosa, que não admite opiniões contrárias, ficou na dele, reconheceu a maestria de Peluso. O Mendes, com todo aquele vozeirão, não tirou os olhos do voto escrito que, certamente, foi lavrado por assessores. O Cezar de Mello demonstrou erudição, uma erudição que não leva a nada, completamente despida de objetividade e haurida também de um longo voto escrito.
Comparando a postura do Peluso com a dos demais ministros, pode-se chegar à conclusão de que o Supremo Tribunal Federal vai ficar empobrecido de cultura, de trabalho, de dedicação ao processo, da qualidade técnica na arte de julgar, com a saída daquele magistrado paulista.
É verdade que Peluso não foi perfeito. Deixou em branco uma parte importante, no que diz respeito aos crimes de peculato de todos os réus. Afora o erro cometido por todos os ministros, que não sabem distinguir entidade paraestatal de sociedade de economia mista, seu voto ficou a dever a conduta delituosa dos agentes, a ação específica que se enquadraria no tipo penal. Mas, para quem não é exigente, se saiu muito bem, deixando a impressão de que foi o último jurista que ocupou uma cadeira no STF. Certamente, a partir de segunda feira, ao lembrarem de Peluso, muitos advogados dirão sobre o Supremo: ruim com ele, pior sem ele.


quarta-feira, 29 de agosto de 2012

NOTÓRIO SABER JURÍDICO? ONDE?


João Eichbaum

Alguns dos defensores dos réus do chamado mensalão já puseram as barbas de molho.
Os primeiros votos, a começar pelo voto do relator, deixam muito a desejar, do ponto de vista da dialética. Nenhum dos ministros, dos que até agora votaram, soube montar aquele silogismo primário que empresta fundamentos aos juízos de valor.
Nenhum deles se deteve na premissa maior, que é a lei. Todos começaram pela premissa menor, que são os fatos. De tipicidade penal ninguém tratou. Falaram muito em contratos, em sacos de dinheiro, em conversas de gabinete, em notas fiscais, em adiantamentos de pagamentos, etc. E dessas coisas tiraram ilações. Em outras palavras: da premissa menor saltaram logo para a conclusão.
Com os votos prontinhos, elaborados pelos assessores, demonstrando claramente que não conhecem o processo, que não se debruçaram com consciência e responsabilidade sobre os autos,  o Luiz Fux, e as duas mulheres, a Rosa Weber e a Carmen Lúcia se limitaram a acompanhar o relator.
O Fux fez discurso contra a corrupção, como se estivesse num palanque eleitoral. A Carmen Lúcia leu com voz monótona um trecho de Nelson Hungria, também contra a corrupção, como faria qualquer professor sem didática. A Rosa Weber, nem isso fez. E ainda ficou na dúvida sobre o crime de lavagem de dinheiro, porque certamente o seu assessor pouco sabe sobre isso. Ela, em todo caso, de Direito Penal e Processo Penal não entende coisa nenhuma, porque passou a vida inteira lendo e decidindo sobre Direito do Trabalho.
É possível até que os três nem tivessem tanta convicção assim, para acompanhar o relator – tal a fraqueza de suas manifestações. Mas, depois que viram a população brasileira exigir a cabeça do Lewandowski, esqueceram os favores que deviam ao Lula ou à Dilma.
Já o Toffoli saiu dessa rotina, acendendo uma vela pra Deus, outra para o Diabo: para enganar a torcida, acompanhou o revisor na parte da arraia miúda, o Pizzolato e companhia, mas manteve sua fidelidade ao padrinho, que exigira sua presença no julgamento, no tocante ao político João Paulo Cunha.
Não podia ser outro o quadro geral dessa pantomima de vários atos, cuja figura de proa, Joaquim Barbosa, uma criatura dominada por indomável necessidade de superação, não admite opiniões contrárias. Parece que tem o certificado de propriedade da verdade, quer sempre ter a última palavra.
Tudo isso justifica plenamente o temor dos advogados: num espaço ocupado pela vaidade e pelas nulidades, não há lugar para a sabedoria.


terça-feira, 28 de agosto de 2012

TRÁGICA FALÊNCIA


Hugo Cassel

No caminho acelerado rumo ao abismo econômico que destruiu a economia na Europa e o fracasso da moeda unificada, o Brasil vive enganado pelas mentiras do governo. Enquanto isso a “Gerenta Mamulenga” obedece cegamente ao chefe da quadrilha, que protege seus 40.000 ladrões. No País, falido, paralisado de Norte Sul, pipocam as greves, não existe segurança, a saúde do povo atinge um nível baixíssimo, a educação só existe em comerciais da TV, e o numero de analfabetos prossegue aumentando, todos eles com a maior esperança de repetir quem sabe o milagre do corrupto “Pai da Mentira”. Ao mesmo tempo em que se trombeteia vantagens, se divulga a previsão de um ridículo PIB de 1,3% em 2012.

O vexame na Olimpíada ao custo de 125 milhões, porém não envergonha o Governo, nem preconiza planejamento decente para 2016. Não se dão conta que acabou o tempo em que no futebol, os jogadores sentiam imensa honra em vestir a camisa da seleção. Convocados na sexta, eram apresentados no vestiário, entravam em campo e venciam. Jogar bola deixou de ser esporte para se tornar um dos melhores negócios do mundo. Qualquer perna de pau faz um bom contrato, vira craque, usa brinquinhos, corrente de ouro e, se for afrodescendente arruma certamente uma loira “de cinema” apaixonada por ele desde criancinha.Tudo requer  planejamento que a maioria fez, menos o Brasil. Porém nada disso importa, pois a patota, gosta mesmo é de aproveitar a mordomia. Na Olimpíada a “Presidenta” carregou mais de 200 sortudos, para Londres, por conta do contribuinte. No jogo contra a Suécia, lá estavam dezenas deles outra vez. A maioria protegida pelo Passaporte Diplomático, para não ser preso.

Coisa boa para nós porém, é que a PresidANTA, se preocupa em corrigir o vernáculo, com a lei que determina a Flexão do Gênero nas Profissões. Agora eu estou finalmente sabendo que não sou “Jornalista” e sim “Jornalisto”. Se for mulher é “Gerenta” e assim se for homem acho que é “gerento” Dilma e Lula não mudam, pois “Nojenta” e “Nojento” continua igual. Por falar em ANTA, o macho será que vira ANTO?

MACEIÓ: Sérias deficiências em Turismo Receptivo. Mobilidade urbana precária. Praias sujas, como Pajuçara, sem fiscal de saúde e sem controle de ambulantes, escura e sem policia. A crítica é geral e a opinião sobre a corrupção é total. Lamentável. Povo carinhoso e prestativo, porém isso é pouco. Ibope de Collor: zero!

Mensalão: Oi zum,zum,zum,zum zum! Tá faltando um! Oi zum zum zum zum zum! tá faltando um! Botem no de qualquer um, mas por favor menos no meu! Foi a ordem que ele deu, e o STJ obedeceu. CADÊ MEU GENERAL??!!

segunda-feira, 27 de agosto de 2012

VIRAM SÓ, NO QUE DEU?




João Eichbaum

Deu no jornal: “após três anos de convivência sob o mesmo teto, duas mulheres e um homem decidiram regularizar a situação matrimonial e estabelecer, em cartório, as mesmas regras atribuídas ao casamento”. Foi lavrada e publicada no Diário Oficial do Estado de São Paulo a “Escritura Pública de União Poliafetiva”.
O quê? Vocês estão escandalizados?
Sei, sei, apreensivos pelo que pode acontecer: a porteira está aberta. Depois daquela aberração histórica do Supremo Tribunal Federal, permitindo que a bicharada toda saísse dos armários, tudo é possível. Está tudo permitido pelo voto do Luiz Fux, aquele ministro que não sabe escrever e faz rodeios e viravoltas, não sabe como chegar ao assunto, mas vai fundo, mesmo atropelando o vernáculo. Olhem só as asneiras antológicas que o Fux prega:
Tem-se, pois, que a proteção constitucional da família não se deu com o fito de se preservar, por si só, o tradicional modelo biparental, com pai, mãe e filhos.
Bem ao contrário, a Constituição de 1988 consagrou a família como instrumento de proteção da dignidade dos seus integrantes e do livre exercício de seus direitos fundamentais, de modo que, independentemente de sua formação – quantitativa ou qualitativa –, serve o instituto como meio de desenvolvimento e garantia da existência livre e autônoma dos seus membros.
Dessa forma, o conceito constitucional pós-1988 de família despiu-se de materialidade e restringiu-se a aspectos meramente instrumentais, merecendo importância tão-somente naquilo que se propõe à proteção e promoção dos direitos fundamentais dos indivíduos.
Viram só?
Não sou eu que digo. Está escrito, mal escrito, mas escrito no voto do Luiz Fux, que foi acolhido até pelo ex-seminarista Peluzo, sobrinho do bispo. Todo mundo fora do armário.
Não tem mais essa de “modelo biparental”. Não existe mais modelo de família, quer do ponto de vista qualitativo, quer do ponto de vista quantitativo.
E quem conhece o voto do Fux sabe que, para o boneco, (vocês não acham que ele tem cara de boneco de ventríloquo com aquela peruca pastosa e ondulada?) entre os direitos fundamentais do indivíduo assume papel relevante a liberdade sexual, no pior sentido: de dar o quê e para quem quiser...
Estamos cada vez mais perto do fundo do poço, meus amigos! Estão querendo acabar com a terceirização dos serviços de cama! Estão querendo eliminar aquela figura tradicional que alavanca o PIB de qualquer país, movimentando o comércio de jóias e presentes, e rendendo bons honorários para advogados e detetives: a amante.

sexta-feira, 24 de agosto de 2012

LEIS MAL FEITAS E JULGAMENTOS BURROS




João Eichbaum

Entre outras asneiras que ouvi da boca do Lewandowski, uma que me chamou muita atenção foi a seguinte: “nos termos do artigo 327 do Código Penal, o réu Henrique Pizzolato é funcionário público, porque o Banco do Brasil é uma sociedade de economia mista”.
Repito a transcrição que fiz do § 1º art. 327 do Código Penal:
Equipara-se a funcionário público quem exerce cargo, emprego ou função em entidade paraestatal e quem trabalha para empresa prestadora de serviço contratada ou conveniada para execução de atividade típica da Administração Pública.
O primeiro jurista brasileiro a definir o que seja “entidade paraestatal” foi Celso Antônio Bandeira de Mello, nos seguintes termos:
A expressão abrange pessoas privadas que colaboram com o Estado desempenhando atividade não lucrativa e à qual o Poder Público dispensa especial proteção , colocando a serviço delas manifestações de seu poder de império, como o tributário, por exemplo. Não abrange as sociedades de economia mista e as empresas públicas; trata-se de pessoas privadas que exercem função típica (embora não exclusiva do Estado)
.Na linha de definição de Celso Bandeira de Mello, segue o conceito de MARÇAL JUSTEN FILHO:
Entidade paraestatal ou serviço social autônomo é uma pessoa jurídica de direito privado criada por lei, atuando sem submissão à Administração Pública, para promover o atendimento de necessidades assistenciais e educacionais de certas atividades ou categorias profissionais que arcam com sua manutenção mediante contribuições compulsórias.
 
HELY LOPES MEIRELLES ensina:
São pessoas jurídicas de direito público, cuja criação é autorizada por lei específica (CF, art. 37, XIX e XX), com patrimônio público ou misto, para realização de atividades, obras ou serviços de interesse coletivo, sob normas e controle do estado. Não se confundem com as autarquias nem com as fundações públicas, e também não se identificam com as entidades estatais. Respondem por seus débitos, exercem direitos e contraem obrigações, são autônomas.
           Às lições dos mestres acrescento: a preposição grega para (“pará”, em caracteres latinos, mas deficiência do “Word” me impediu de colocar o acento no último alfa) regida pelo dativo significa “ao lado de”, ou seja, “no mesmo nível”. Ora, as empresas de economia mista não estão no mesmo nível do Estado.
Com o avanço progressivo da corrupção, a Lei 8.666, que trata das licitações, resolveu ampliar, no § 1º do art.84, o conceito penal de “entidade paraestatal”, nos seguintes termos:
 Equipara-se a servidor público, para os fins desta Lei, quem exerce cargo, emprego ou função em entidade paraestatal, assim consideradas, além das fundações, empresas públicas e sociedades de economia mista, as demais entidades sob controle, direto ou indireto, do Poder Público.
Em negrito e grifado, para que todos entendam, a começar por aqueles ministros do STF que não são plenamente alfabetizados: para os fins desta Lei.

Em Direito Penal não há interpretação extensiva, nem analogia. O que vale é a letra da lei, e o artigo 327 do Código Penal não estende o sentido de “entidade paraestatal” às empresas de economia mista, como o faz o § 1º da Lei 8.666/93.

E tem mais: o § 1º do art. 327 do Código Penal, foi introduzido pela Lei 9.983, que é de 14 de julho de 2.000, posterior à Lei 8.666, portanto. Que o ignaro Legislativo deixasse passar em branco a oportunidade de copiar o § 1º da Lei 8.666, até se releva. Mas não se pode perdoar a ignorância dos ministros do Supremo, nem dos Procuradores da República.
Pena que a gente aqui esteja lecionando de graça.


quinta-feira, 23 de agosto de 2012

O LEWANDOWSKI É PIOR


João Eichbaum

Me enganei. Pensei que nenhum outro ministro do Supremo Tribunal Federal conheceria menos exegese penal do que o Joaquim Barbosa.
O Lewandowski é pior. Sabe menos ainda. Para condenar o Henrique Pizzolato por um tipo de peculato, invocou, entre outras coisas, a “antecipação de pagamentos” de contratos publicitários às empresas de Marcos Valério.
Ora, antecipar pagamentos de valores previstos em contratos, pode ser um procedimento irregular, mas não é uma conduta tipificada como crime no Código Penal Brasileiro. E mais: “antecipar pagamentos” não é sinônimo de “desviar valores”.
Para imputar um segundo crime de peculato a Henrique Pizzolato, o Lewandowski atribuiu às empresas de Marcos Valério a falsificação de notas fiscais.
Transcrevo duas condutas penais distintas: a de falsidade ideológica e a de peculato, deixando a análise de ambas a critério de vocês.

Falsidade ideológica: omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, com o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante.

Peculato: Apropriar-se o funcionário público de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de que tem a posse em razão do cargo, ou desviá-lo, em proveito próprio ou alheio.

 Henrique Pizzolato e o Marcos Valério, que não são funcionários públicos, foram condenados por peculato, por incrível que pareça. Isso mesmo: peculato, em razão de falsificação de notas fiscais.
A partir do voto do Lewandowski se pode ter certeza de que ele é mais um ministro do Supremo  pertencente àquela considerável fatia dos 62% dos brasileiros diplomados em curso superior, que não são plenamente alfabetizados.
E na companhia dele está aquele “professor de Direito Penal” da PUC do Rio de Janeiro, que indagado pela apresentadora da Globo News sobre o significado da expressão “cominação de pena”, lascou, sem um mínimo rubor: “cominação de pena é a aplicação da pena pelo juiz”. Eu estava de corpo presente, na frente da TV.
Depois dessas, só me resta arriar as cortinas do palco e cair fora. Pelos fundos.



quarta-feira, 22 de agosto de 2012

OUTRA MANCADA DO RELATOR DO MENSALÃO




João Eichbaum

O advogado Luiz Francisco Corrêa Barbosa, o Barbosinha, - não o ministro que dormia durante as sustentações orais - estava coberto de razão, quando proclamou alto e bom som: “se os mensaleiros forem absolvidos, o serão por culpa do Procurador Geral da República”.
Como conhecedor do Direito, ele sabia o que estava dizendo.
Olhem só o que diz, com relação a Henrique Pizzolato, a ambígua, sinuosa e pobremente gongórica “denúncia”, acolhida pelo Joaquim Barbosa: 
Henrique Pizzolato desviou os valores em prol do grupo liderado por Marcos Valério, pois tinha pleno conhecimento que citada quadrilha aplicava os valores correspondentes à comissão BV em benefício do núcleo central da organização delitiva, caracterizando um dos mecanismos para alimentar o esquema criminoso ora denunciado.
Por esse motivo, de forma deliberada e consciente, deixou de desempenhar as suas atribuições funcionais, consistente em impedir o desvio desses vultosos valores.
Agora confiram o tipo penal, descrito no caput do art. 312 do Código Penal, delito pelo qual foi também condenado Henrique Pizzolato:
Apropriar-se o funcionário público de dinheiro, valor, ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de que tem a posse em razão do cargo, ou desviá-lo, em proveito próprio ou alheio.
Henrique Pizzolato desviou os valores... Como o fez? A denúncia esclarece, na segunda oração: pois tinha pleno conhecimento que citada quadrilha aplicava os valores correspondentes à comissão BV em benefício do núcleo central da organização delitiva.
 A conjunção subordinativa “pois” aqui está empregada no sentido causal, explicando o modo como eram “desviados os valores”. Pode?
Ah, e a quadrilha aplicava os valores... em benefício do núcleo central da organização delitiva.
Então temos dois beneficiários: uma quadrilha e um “núcleo central”. Ninguém tem nome. Dá para entender?
E para deixar embasbacada qualquer pessoa que conheça um mínimo de vernáculo e de Direito  Penal e Processual, assim conclui a peça acusatória, atribuindo a Henrique Pizzolato o crime de peculato:
Por esse motivo, de forma deliberada e consciente, deixou de desempenhar as suas atribuições funcionais, consistente em impedir o desvio desses vultosos valores.
Viram? Primeiro o Pizzolato tinha desviado os valores, depois não tinha impedido que os desviassem. Qual das duas condutas vale na denúncia?
E só para não deixar passar em branco a agressão ao vernáculo: alguém aí pode me dizer que substantivo está sendo modificado pelo adjetivo consistente?
Lembrem-se de que o crime de peculato, definido no artigo 312 do Código Penal, só pode ser praticado por funcionário público que se apropria de valores de que tem a posse, ou os desvia.
Segundo o Procurador Geral e o Joaquim Barbosa, o Diretor de Marketing do Banco do Brasil (cargo de Henrique Pizzolato na época) é um “funcionário público” que tem a chave e o segredo do cofre. Ah, e é guarda também: com base no artigo 312 do Código Penal, foi condenado por não “impedir o desvio de valores, aplicados (?) por uma quadrilha, em benefício do núcleo central duma organização criminosa”.
É mole ou querem mais?

terça-feira, 21 de agosto de 2012

O VOTO CAPENGA DO BARBOSA




João Eichbaum

Para interpretar a lei penal, não é necessário ser “mestre”, nem “doutor”, nem “professor”. Basta conhecer o vernáculo e alguns rudimentos da Ciência do Direito.
No seu voto, o Joaquim Barbosa, cujo currículo é abastecido com todos os títulos acima citados e mais outros penduricalhos acadêmicos, propôs a condenação de Henrique Pizzolato por crime de corrupção passiva. Segundo a denúncia, acolhida por Barbosa, Pizzolato teria facilitado contratos de propaganda, para Marcos Valério e suas empresas, em troca de propina.
O delito de corrupção passiva está assim descrito no art. 317 do Código Penal, que trata dos crimes praticados por funcionário público contra a administração em geral:
Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função, ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem.
O crime de corrupção passiva, portanto, só se tipifica se o beneficiário ou o intermediário da vantagem  indevida for funcionário público.
O § 1º do artigo 327 do Código Penal estabelece:
Equipara-se a funcionário público quem exerce cargo, emprego ou função em entidade paraestatal e quem trabalha para empresa prestadora de serviço contratada ou conveniada para execução de atividade típica da Administração Pública.
Henrique Pizzolato era, ao tempo dos fatos denunciados, “Diretor de Marketing” do Banco do Brasil.
O Banco do Brasil é uma sociedade de economia mista e não uma “entidade paraestatal”. A “entidade paraestatal” presta serviços próprios da Administração Pública e, por isso mesmo, sem fins lucrativos. A empresa de economia mista trabalha com fins lucrativos, exatamente porque não presta serviços típicos da Administração Pública.
Funcionário do Banco do Brasil não é funcionário público, nem se compara a funcionário público para os fins do artigo 317 do Código Penal.
Os títulos acumulados por Joaquim Barbosa não lhe proporcionaram o aprendizado do vernáculo, não lhe ensinaram que na hermenêutica penal descabem a interpretação extensiva e a analogia, e lhe ficaram a dever rudimentos de Direito Administrativo.
A conduta delituosa só se configura se estiver moldada estritamente ao tipo penal definido, segundo os ensinamentos que nos legaram os romanos: nullum crimen sine lege.
Joaquim Barbosa é egresso do quadro dos Procuradores da República, aqueles mesmos que, botando os pés pelas mãos, se preocupam mais com “uma situação específica paradigmática”, do que com a “exposição do fato criminoso”.
O voto dele, portanto, não poderia ser diferente da denúncia. Mas, bem que o Barbosa poderia acrescentar no seu currículo um cursinho de exegese.


segunda-feira, 20 de agosto de 2012

Sobre os prazeres da teologia: QUANDO UM I DIVIDE A IGREJA


Sobre os prazeres da teologia:
QUANDO UM I DIVIDE A IGREJA
 

JANER CRISTALDO


Volto a meus prazeres diletos, as discussões teológicas. Em Marcos, por exemplo, Cristo morre às 9h da manhã, no dia do Pessach, a manhã seguinte à refeição do Pessach. Em João, Cristo morre um dia antes, no dia da preparação do Pessach, em algum momento depois do meio-dia. Isto é o de menos. Bart D. Ehrman, em quem colho estas incongruências, apresenta uma bateria de outras que mostram a discrepância dos quatro evangelhos. Em Jesus, interrupted, traduzido no Brasil com o rebarbativo título de Quem foi Jesus? Quem Jesus não foi?, o autor pergunta:

- Quem realmente foi ao túmulo? Apenas Maria (João 20:1)? Maria e outra Maria (Mateus 28:1)? Maria Madalena, Maria mãe de Tiago e Salomé (Marcos 16:1)? Ou mulheres que tinham acompanhado Jesus da Galiléia a Jerusalém – possivelmente Maria Madalena, Joana, Maria mãe de Tiago e “outras mulheres” (Luca 24:1 ver 23:55)? A pedra realmente havia sido roladas da entrada da tumbas (como em Marcos 16:4), ou foi rolada por um anjo quando as mulheres estavam lá (Mateus 28:2)? Quem ou o quê elas viram lá? Um anjo (Mateus 28:5)? Um homem jovem (Marcos 16:5)? Dois homens (Lucas 24:4)? Ou nada e ninguém (João)? E o que foi dito a elas? Para mandar os discípulos irem “para a Galiléia”, onde Jesus os encontraria (Marcos 16:7)? Ou para recordar que Jesus tinha dito a elas “enquanto estavam na Galiléia” que teria de morrer e nascer novamente (Lucas 24:7) Depois as mulheres contam aos discípulos o que viram e ouviram (Mateus 28:8) ou não contam nada a ninguém (Marcos 16:8)? Se elas contam a alguém, a quem é? Aos 11 discípulos (Mateus 28:8)? Aos 11 discípulos e a outras pessoas (Lucas 24:8)? A Simão Pedro e a outro discípulo não identificado (João 20:29)? Qual é a reação dos discípulos? Não reagem, porque o próprio Jesus aparece imediatamente a eles (Mateus 20:9)? Não acreditam nas mulheres, porque parece um “desvario” (Lucas 24:11)? Ou vão até a tumba ver com os próprios olhos (João 20:3)?

E durma-se com um barulho destes. 

Ehrman tem uma trajetória curiosa. PH.D. em teologia pela Universidade de Princeton e professor de estudos religiosos na Universidade da Carolina do Norte, saiu de biblioteca em biblioteca mundo afora, para conferir não os originais dos textos sagrados, que não existem mais – nem mesmo suas cópias, que tampouco existem – mas as cópias de cópias de cópias que ainda restam. Disto resultou um primeiro livro, Misquoting Jesus: the Story behind Who changed the Bible and Why, traduzido como O que Jesus disse? O que Jesus não disse?. 

Se antes acreditava que a Bíblia era a palavra de Deus, Ehrman descobriu que sua elaboração era humana e muito humana – com todas as deficiências de uma obra humana. E perdeu a fé. Seu itinerário foi mais ou menos o meu. Perdi a fé lendo a Bíblia. Mas não perdi meu tempo em bibliotecas comparando cópias antigas. Bastou-me o texto, mesmo traduzido. 

Ehrman propõe uma leitura não vertical da Bíblia, começando no início de cada livro e indo até o fim. Mas uma leitura horizontal, isto é, você lê uma história em um dos evangelhos, depois a mesma história em outro Evangelho, como se tivessem sido escritas lado a lado, em colunas. E você compara as histórias cuidadosamente, em seus detalhes. Não há fé que resista a tal leitura. A Bíblia torna-se um livro muito humano, organizado por editores sem preocupação alguma com a coerência.

Ainda há pouco, falei sobre os corpos de santos que foram ressuscitados, segundo Mateus, por ocasião da crucificação do Cristo. Os demais evangelistas não voltam a falar deles e o episódio até hoje constitui um problema para os teólogos católicos. A que título foram ressuscitados? Que foi feito deles após a ressurreição? 

Mas este não é o problema maior, e sim um outro, que passa despercebido ao leitor apressado. Se foram ressuscitados durante a crucificação, isto também significa que ressuscitaram três dias antes do Cristo. Como fica então Paulo com seu brado triunfante na primeira epístola aos Coríntios? “Onde está, ó morte, a tua vitória? Onde está, ó morte, o teu aguilhão?” O fanático judeu sabe que sua pregação tem suas bases no absurdo: “Mas se não há ressurreição de mortos, também Cristo não foi ressuscitado. E, se Cristo não foi ressuscitado, é vã a vossa fé”.

Acontece que as epístolas de Paulo foram escritas antes dos Evangelhos. I Coríntios foi escrita em Éfeso, cerca de 55 d.C. E Paulo sequer suspeitava que Marcos, mais tarde, iria escrever tal disparate. (Seu evangelho foi escrito em Roma, talvez entre 75-80 d. C. Para a Igreja Católica, entre 60-70 d.C. Mesmo assim, após as epístolas paulinas). Pois se muitos ressuscitaram antes de Cristo, a ressurreição do crucificado estava longe de ser a primeira vitória contra a morte.

Em Marcos também está a ressurreição de uma criança por Cristo: cumi, Talita, cumi. Em João, autor do último dos Evangelhos canônicos (finais da 1ª década do século II), Cristo ressuscita Lázaro. Quer dizer, ressurreição era algo mais ou menos banal na época. Só que Paulo, ao que tudo indica, não fora informado.

O problema dos 27 textos do Novo Testamento é que foram compilados mais tarde, em 367 d.C., por Atanásio, o bispo de Alexandria, no Egito. Ao escrever as epístolas ou os evangelhos, tanto Paulo como os evangelistas ignoravam que seriam mais tarde reunidos em um só volume. Cada um foi contando sua versão do Cristo, sem importar-se com as demais versões, o que aliás nem poderiam fazê-lo. Daí que o Novo Testamento – como também o Antigo – às vezes está mais para samba do crioulo doido do que para documento histórico.

Teologia é coisa séria. Segundo o Evangelho de João, o Espírito Santo procede do Pai. Assim o entendeu o Credo niceno-constantinopolitano, que no ano de 381 já repetia esta profissão de fé. Sabe-se lá porque cargas d'água, os romanos acrescentaram ao Credo a partícula que, que corresponde ao nossoe. Daí filioque, ou seja, o Espírito procede do Pai e do Filho. Os cristãos orientais acusaram então os latinos de haver alterado os símbolos da fé. Em 444, Cirilo da Alexandria afirmava que o "Espírito é o Espírito de Deus Pai e, ao mesmo tempo, Espírito do Filho, saindo substancialmente de ambos simultaneamente, isto é, derramado pelo Pai a partir do Filho". Inúmeros teólogos eram do mesmo aviso. Mas os cristãos gregos não conseguiam aceitar a polêmica conjunção, o e (que, em latim).

O caldo engrossou quando o Concílio de Toledo, em 589, oficializou o símbolo da fé com o filioque, e considerou anátema a recusa da crença de que o Espírito Santo procede do Pai e do Filho. Não bastasse o absurdo conceito do três-em-um - inteligível se levamos em conta a preocupação de fugir ao politeísmo - discutia-se agora a relação de um com os outros dois. E a Igreja partiu-se irremediavelmente em dois, em função de três letrinhas. E dividida permaneceu até hoje, entre Romana e Ortodoxa. 

Já foi pior. Houve época em que a Igreja esteve a ponto de cindir-se por uma única letra. No início do século IV– conta-nos Ehrman – na época de Ário, professor cristão da Alexandria, praticamente a Igreja inteira concordava que Jesus era ele mesmo divino, mas que havia apenas um Deus. Mas como exatamente isso funcionava? Como ambos podiam ser Deus? 

Ário considerava ter havido um tempo no passado distante antes do qual Cristo não existia. Ele passou a existir em determinado momento. Embora fosse divino, não era igual a Deus Pai; como era o Filho, era subordinado a Deus Pai. Eles não eram “da mesma substância”; eram “similares” em substância.

O oponente mais conhecido a esta tese era Atanásio, justo aquele que seria mais tarde responsável pelo cânone do Novo Testamento. Para Atanásio, o Cristo era feito exatamente da mesma substância – homoousias, em grego - que o Pai. Nada a ver com substância similar – homoiousias. E a Igreja arriscou cindir-se por um i. 

Foi quando o imperador Constantino, que havia se convertido ao cristianismo para unificar seu império fragmentado, deu-se conta que uma religião dividida não podia produzir unidade. Convocou então o Concílio de Nicéia, em 325 d. C., que optou pela posição de Atanásio. Há três pessoas em Deus. Elas são distintas umas das outras. Mas cada uma é igualmente Deus. Todas as três são seres eternos. E todas as três são feitas da mesma substância. 

Entendeu, ó herege?

quinta-feira, 16 de agosto de 2012

AS PRELIMINARES DO JOAQUIM BARBOSA


João Eichbaum

Relator do processo do mensalão, Joaquim Barbosa se comportou ontem de uma maneira insólita, como nunca se viu, na história do Supremo.
Ao ter arguida sua suspeição, por haver se manifestado, na imprensa, sobre o dito processo, se sentiu ofendido, se sentiu agredido, confundiu a função de juiz com a sua personalidade. E propôs, então, ao plenário do Supremo, que se oficiasse à Ordem dos Advogados do Brasil, noticiando a “agressão” contra ele perpetrada, por três advogados.
E mais: transformou seu sentimento pessoal em “preliminar” do mérito do processo do mensalão, acreditem! Quer dizer, ele botou sua digníssima pessoa na frente do processo e achou que ela merecia aquela preliminar. Como diria minha avó, confundiu o cu com as têmporas.
A remessa de um ofìcio à OAB não é um ato processual. É uma providência de caráter administrativo, que só poderia ser tomada, ou não, depois do julgamento da causa, e não antes, como preliminar. Os sentimentos pessoais do juiz não se podem confundir com o mérito da demanda.
Foi derrotado, claro.
Mas aí, veio o pior. Vencido no seu voto, se sentiu no direito de vociferar contra a decisão da maioria. Mais uma vez, botou sua pessoa na frente do processo. Não se conformou com a decisão do Supremo, porque sua pessoa estava sendo desprestigiada.
Por fim, aprontou outra: acoimou de má-fé a arguição de nulidade, suscitada por um defensor público, em razão de não ter sido intimado o advogado constituído. E interrompeu o voto do revisor, que o contrariava, para dar explicações, como se estivesse participando de um debate e não proferindo uma sentença.
Mas, se tudo isso não bastasse, derrotado, voltou atrás no seu voto e acompanhou os demais, sem se desdizer da qualificação de “má-fé” que atribuira ao réu. Em outras palavras: acolheu a preliminar de nulidade suscitada de “má-fé”.
Esse é o Joaquim Barbosa, que já foi protagonista de incidentes nada recomendáveis dentro das quadro paredes do Supremo, o mesmo Joaquim Barbosa que pediu licença para tratamento de saúde (problema de coluna) e foi flagrado jogando “snooker” com os amigos, no Rio de Janeiro. De coluna dobrada, taco na mão e olhando o buraco.



quarta-feira, 15 de agosto de 2012

SAFO E DOUTOR “HONORIS CAUSA” (II)




João Eichbaum

Ne sutor ultra crepidam, já admoestavam os romanos: o sapateiro não deve ir além da chinela.
E quando o sapateiro vai além da chinela, ele bota os pés pelas mãos.
Entre os jornalistas que atuam por esse Brasil inteiro, muitos há que exercem a profissão, não porque sejam verdadeiramente jornalistas, mas porque, com o diploma na mão, conseguiram um emprego.
Mas, não é só isso. Se ficassem na deles, redigindo notícias ou crônicas sobre abobrinhas, fazendo a coluna do horóscopo, a coluna social, a coluna da meteorologia, tudo bem. O pior é quando, indo além da chinela, se metem a dar pitacos em assunto que não dominam.
Anteontem, depois da sustentação oral do Barbosinha, uma gordinha que tem voz e cara de sono, e que fala de Brasília para a Globo News, saiu criticando o pronunciamento do advogado do Roberto Jefferson, dizendo que os “ataques” ao Lula não teriam efeito prático nenhum, porque o STF já tinha decidido não incluir o ex-mecânico - que enriqueceu na política -  no processo do mensalão.
Outra jornalista da RBS, a Carolina Bahia, na sua coluna de ontem, se tivesse ficado quieta, não teria passado atestado de ignorância. Depois de dizer que “o tempo dedicado pelo advogado Luiz Francisco Corrêa Barbosa aos argumentos técnicos foi mínimo”, ela conclui que “o efeito prático de chamar Lula de mandante do mensalão é nulo”.
Em primeiro lugar, eu gostaria de saber o que é que essa diplomada em jornalismo entende por “argumentos técnicos” em matéria de Direito. Tenho certeza de que sua ignorância não lhe assopraria a resposta certa.
Mas, para todos os que acham que o Barbosinha “jogou para a plateia” ao reclamar contra a ausência do Lula na denúncia e contra a omissão do Procurador Geral da República, vou traduzir a sustentação oral, mostrando que ela foi “técnica” do começo ao fim.
Para que se configure o crime de “corrupção”, tanto ativa, como passiva, são necessárias, no mínimo, duas pessoas – eu disse pessoas – o corruptor e o corrompido. A denúncia diz que o pagamento de “propina” era para votar projetos do “interesse do Governo”.
A tese do Luiz Francisco Corrêa Barbosa é de que o “governo” é uma entidade abstrata, não é uma pessoa. Quem tinha interesse na aprovação de seus projetos, era a pessoa do Lula. Por essa razão, simples, o nome do Lula não poderia ter ficado de fora da denúncia. Então, das duas uma: ou se inclui o nome do Lula na denúncia, ou Roberto Jefferson deve ser absolvido, exatamente pela falta de uma das pessoas cuja presença é necessária para a configuração do delito.
Isso é matéria técnica: a descaracterização do tipo penal denunciado. E o “efeito prático” perseguido pela defesa, enxovalhando o Lula, era a absolvição de Roberto Jefferson.


terça-feira, 14 de agosto de 2012

SAFO E DOUTOR "HONORIS CAUSA"




João Eichbaum

Márcio Thomás Bastos é (ou foi) incensado pela imprensa como o melhor advogado do Brasil. Em cima disso ele constrói sua tabela de honorários. A fama dele cresceu a tal ponto que se dá o direito de cobrar milhões por seus trabalhos.
A quem o viu no caso Cachoeira e conhece os meandros da profissão de advogado não escapa a conclusão de que ele não é nada disso que dizem. Tanto que seu cliente, preso há meses, continuou preso, apesar dos vários “habeas corpus” impetrados.
E o que fez o “melhor advogado do Brasil”? Deixou seu cliente na mão.
Tido como uma das melhores expectativas no caso do “mensalão”, seu trabalho só não pode ser considerado vulgar, porque há muitos advogados que de retórica nada entendem, não dominam o vernáculo, não possuem qualidades para colocar  força de convicção no discurso, têm um vocabulário reduzido e com seus argumentos desossados levam os assistentes aos bocejos e os ministros à sesta. Em comparação com esses colegas seus, é claro que o Thomás Bastos se sobressai.
Mas ontem, o Brasil inteiro teve oportunidade de conhecer um advogado brilhante, que nunca foi incensado nem paparicado pela imprensa: Luiz Francisco Corrêa Barbosa, o “Barbosinha”.
Adestrado na arte de falar, altissonante e fluído, Barbosinha sabe se portar na tribuna. Faz da ironia o seu melhor argumento, esbanja  presença de espírito, raciocina com lógica e graça. Tudo com o repousado domínio de quem sabe o que está dizendo. Durante sua sustentação oral, nenhum ministro cochilou.
Ele foi o único brasileiro que, num ato solene, de viva voz, teve coragem para levar ao ridículo o falastrão Lula, atribuindo-lhe, com aguda ironia, os apostos de safo e doutor “honoris causa”.
Mal terminada sua sustentação oral, com a qual também massacrou sem dó nem piedade o Procurador Geral da República, que outra reação não teve senão encarar o advogado com um olhar de vaca raivosa e sonolenta, o nome do Barbosinha já percorria os noticiários. Em sua tese também não poupou o STF, mostrando a falta de intimidade dos ministros com o Código de Processo Penal.
Perseguido, tripudiado e injustiçado pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, expulso da Ajuris, Barbosinha deu a volta por cima, subindo ao topo da lista dos melhores advogados deste país.
Alguém por aí se lembra do nome dos desembargadores que o condenaram ou dos juízes que o expulsaram de sua Associação?


segunda-feira, 13 de agosto de 2012

ESSE CIRCO CHAMADO JUSTIÇA


João Eichbaum

O meu amigo, o corajoso e polêmico Luiz Francisco Corrêa Barbosa, mais conhecido como “Barbosinha”, foi barrado no Supremo Tribunal Federal.
Nomeado e constituído defensor do ex-deputado Jeferson, um dos denunciados no processo do mensalão, o “Barbosinha” teve seu ingresso obstado naquele “Olimpo da Justiça Brasileira”, porque estava de calça “jeans”.
Quer dizer, não passou na “triagem”, que está a cargo dos seguranças.
Sim, minha gente, o seguimento do processo, no Supremo Tribunal Federal, depende dos seguranças. Qualquer julgamento só terá a participação de advogados, se o permitirem aqueles funcionários. Ou seja, o exercício profissional da advocacia depende deles.
O “Barbosinha”  não estava trajado de acordo com o Código de  Processo Penal dos seguranças, que deve ser um figurino. Quem decide, em primeira instância, sobre o “direito de defesa”, no Supremo Tribunal Federal, são os seguranças.
Sem os seguranças, ó, nada feito: o réu não tem direito à defesa, através de defensor constituído.
Em outras palavras, sem passar pelo crivo da segurança, o réu, no Supremo Tribunal Federal, não terá direito à defesa.
E tudo isso porque as “normas” do Supremo Tribunal Federal,  estão acima da lei. Mais do que isso: estão acima da Constituição Federal.
A Constituição Federal assegura o pleno direito de defesa, mas o SupremoTribunal Federal, limita esse direito: depende do modelo de calça usado pelo defensor do réu. Se não for de acordo com o “modelito” desenhado pelo Tribunal, nada feito.
O Poder Judiciário é um circo. Ele arma o palco. Seu objetivo principal  não é a justiça, mas o espetáculo, a pompa, a aparência. Os atores devem estar vestidos de acordo com a moda, segundo o figurino do Supremo Tribunal Federal, que encarrega os seguranças de fiscalizar o elenco. Não é a lei que conta, mas sim a avaliação dos seguranças.
Como “criadores de moda”, não tenho dúvida de que os ministros do Supremo são grandes juristas.



sexta-feira, 10 de agosto de 2012

EM RITMO DE GANSO


Janer Cristaldo
Há muito a universidade vem absorvendo as deficiências do ensino secundário. O marco mais significativo ocorreu quando se começou a ensinar português nos primeiros anos de curso. Quando fiz vestibular – e já lá vai quase meio século – só entrava na universidade quem tivesse bom domínio do vernáculo. Hoje, a universidade está despejando fornadas de analfabetos. 

E não só a universidade. Ainda há pouco, eu comentava o caso de um professor de Direito Penal da PUC-SP, mestre e doutorando pela PUC-SP, pós-graduado em Direito Penal Econômico e Europeu pela Universidade de Coimbra, que grafou “mal vizinho” e “mal pagador”. O analfabetismo já chegou à pós-grad. Em país em que um presidente se gaba discretamente de sua incultura, nada de espantar.

Nada de espantar também que o Senado tenha aprovado, na noite de ontem, projeto que reserva metade das vagas nas universidades federais e nas escolas técnicas do país para alunos que cursaram todo o ensino médio em colégios públicos. Não bastasse o ensino superior ter passado a discriminar conforme a cor do aluno, agora os senadores estão empurrando para o ensino superior as deficiências do ensino público. Estudar em boa escola virou desvantagem. O preço é ser preterido no vestíbulo da academia. 

O projeto também segue agora para sanção presidencial. Na prática, ele mais do que dobra o total de vagas destinadas a cotas nas federais.O texto ainda prevê que as cotas devem ser prioritariamente ocupadas por negros, pardos ou índios. A divisão deve considerar o tamanho de cada uma dessas populações no Estado, segundo o censo mais recente do IBGE. Se houver sobra de vagas, elas irão para os demais alunos das escolas públicas.

Quanto ao mérito, esforço pessoal, cultura, estes critérios estão mortos e bem sepultados. Se você quer vencer na vida, seja incompetente. Do jeito como vão as coisas, quem souber flexionar corretamente um verbo ou distinguir adjetivo de advérbio, ainda será considerado uma sumidade das letras.

Se alguém acha que estou deplorando estes novos tempos, em muito se engana. Houve época em que eu não só torcia por um país melhor, como até lutava por isso. Há muito desisti. Sou hoje um mero observador. Se o povo elege medíocres que elaboram tais leis, é porque este povinho merece. Me reservo apenas o direito de ser culto e a esperança de que isto, em futuro próximo, não seja tipificado como crime. Só peço um tempinho para morrer antes. Os senhores legisladores não perderão muito por esperar. Não é para amanhã, mas também não farei os responsáveis pelos rumos do país esperar muito.

Ontem foi dia aziago para quem esperava melhores manhãs. Pois o mesmo Senado também aprovou, por 60 votos a favor e 4 contrários, o segundo turno da proposta de emenda constitucional que torna obrigatória a obtenção do diploma de curso superior de jornalismo para o exercício da profissão. O texto terá ainda de ser votado na Câmara dos Deputados, onde tramita uma proposta semelhante. E é claro que será mais uma vez aprovado.

Se alguém ainda não lembra, até 1969 era jornalista não quem tinha diploma, mas aptidão para o ofício. Como ocorre em todos os países do Ocidente. A conspiração contra o jornalismo vem de longe. Começou com a junta militar da ditadura – cujos nomes hoje ninguém lembra, mas passou à História como Junta dos Três Patetas – que instituiu a exigência de diploma. É curioso ver como as esquerdas, tão hostis ao regime militar, assumiram de corpo e alma esta medida ditatorial.

Em 81, ao voltar de Paris, fui entrevistado por um jornalista da rádio Universidade, de Porto Alegre. Perguntou-me como era a condição legal do jornalista na França. Por acaso, eu tinha no bolso uma agenda francesa destinada a jornalistas, que trazia o texto legal. Segundo o artigo L 761-2 do código do trabalho, “le journaliste professionnel est celui qui a pour occupation principale, régulière et rétribuée l'exercice de sa profession dans une ou plusieurs publications quotidiennes ou périodiques ou dans une ou plusieurs agences de presse et qui en tire le principal de ses ressources."

Traduzindo: jornalista profissional é aquele que tem por ocupação principal, regular e retribuída o exercício de sua profissão em uma ou várias publicações cotidianas ou periódicas ou em uma ou várias agências de imprensa e que disto tira o principal de seus recursos. E estamos conversados. (O grifo é meu).

Melhor tivesse ficado calado. O foquinha à minha frente encerrou incontinenti a entrevista. Eu havia dito o que ninguém queria ouvir. A exigência de diploma favorece uma guilda poderosa de analfabetos muito bem pagos, integrada por incompetentes que jamais pisaram em uma redação de jornal mas se julgam capazes de ensinar o que se faz em uma redação de jornal.

Me considero jornalista competente, não por acaso fui chamado a trabalhar nos dois mais importantes jornais do país. Nunca tive curso de jornalismo. O básico do ofício aprendi em seis meses de redação. Nenhum curso universitário supre o que se aprende em seis meses de redação. Sem falar que redigir é o mínimo que se pede de um jornalista. O que se pede, fundamentalmente, é domínio de sua área e isto nenhum curso oferece. Que pode escrever sobre economia ou ciências um novato que jamais estudou economia ou ciências?

Só vai escrever bobagem, é claro. Exemplo emblemático disto, que gosto de repetir, aconteceu em 1983, quando a Veja endossou como verdade científica uma brincadeira lançada pela revista inglesa New Science. Tratava-se de uma nova conquista científica, um fruto de carne, derivado da fusão da carne do boi e do tomate, que recebeu o nome de boimate. Se a editoria de ciências visse esta notícia num jornal brasileiro, evidentemente ficaria com um pé atrás. Para a revista, a experiência dos pesquisadores alemães permitia “sonhar com um tomate do qual já se colha algo parecido com um filé ao molho de tomate. E abre uma nova fronteira científica".

Isso que a New Science dava uma série de pistas para evidenciar a piada: os biólogos Barry McDonald e William Wimpey tinham esses nomes para lembrar as cadeias internacionais de alimentação McDonald´s e Wimpy´s. A Universidade de Hamburgo, palco do "grande fato", foi citada para que pudesse ser cotejada com hambúrguer. Os alertas de nada adiantaram. Como se tratava de uma prestigiosa publicação européia, a Veja embarcou com entusiasmo na piada. O jornalista responsável pela barriga foi promovido a editor da revista.

Em 2009, o Supremo Tribunal Federal decidira que a exigência do diploma, imposta no regime militar, atentava contra a liberdade de expressão. Em vão. A guilda insistiu na proteção dos seus e agora temos algo insólito no Direito Constitucional, uma profissão regulamentada pela Constituição. 

O senador Aloysio Nunes lembrou que se a emenda for aprovada pelos deputados, a profissão de jornalista será a única a constar da Constituição. "Existem médicos, advogados e outros profissionais que são bons jornalistas, sem a necessidade de ter um diploma específico. Será uma aberração colocar a profissão de jornalista na Constituição por razões meramente corporativas, para atender ao sindicalismo dos jornalistas, que é o mesmo que trabalha pelo controle social da mídia".

Para o senador, a proposta interessa sobretudo aos donos de faculdades privadas ruins, "arapucas que não ensinam nada e que vende a ilusão de um futuro profissional. Não há interesse público envolvido nisso, pelo contrário, a profissão de jornalismo diz respeito diretamente à liberdade de expressão do pensamento, de modo que não pode estar sujeita a nenhum tipo de exigência legal e nem mesmo constitucional".

É voz que clama no deserto. O projeto obviamente será aprovado pelos deputados. Político não gosta de seres pensantes e, pior que tudo, independentes. O Brasil será, definitivamente, um dos raros países do mundo (os outros são ditaduras árabes ou ex-socialistas) a ter o diploma como conditio sine qua non do exercício da profissão. 

E assim vai meu amado país, em ritmo de ganso: um passo e uma cagada.

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quinta-feira, 9 de agosto de 2012

A LINGUAGEM


João Eichbaum

Não. Não é o que vocês estão pensando. A linguagem, de que falo, não é aquela mistura de línguas que faz um efeito bárbaro no corpo todo, eriça os cabelos, a gente não tem mãos que chegue, vai agarrando aqui, agarrando ali, quanto mais pega, mais quer pegar, até que...Bem, aí, cada um na sua.
Falo da linguagem como meio de comunicação.
Para servir de comunicação entre os seres humanos a linguagem está atrelada a várias regras: cada letra tem um som, a junção de determinados sons formam uma palavra e a junção de várias palavras pode exprimir uma frase ou um pensamento.
Único instrumento do Direito, a linguagem está para as ciências jurídicas, assim como o bisturi está para a medicina. O mau uso de um ou de outro é um virtual condutor de danos, muitos dos quais, imponderáveis.
Apesar dessa evidência, não só os cursos de Direito como as próprias áreas de execução desse Direito, que são os juízos e tribunais, não emprestam à linguagem o valor que ela merece, para que a justiça não seja devorada pela ignorância. Faculdades de Direito particulares despejam, na praça, anualmente, milhares de bacharéis que não sabem exprimir um pensamento com clareza e correção. As Universidades Públicas se preocupam mais com a formação de doutores em Direito do que com bacharéis que saibam se expressar corretamente.
Resultado: hoje em dia poucos, muito poucos, sejam doutores ou bacharéis, sabem expressar um pensamento com a simplicidade e a clareza que só com a obediência às regras do vernáculo se consegue: sujeito, verbo e objeto.
Com o uso da informática, tudo piorou: as mais absurdas construções foram padronizadas, porque a cópia se tornou fácil. Se é mais fácil copiar, para que gastar o cérebro?
Peças importantes, como a denúncia, na ação penal, se tornaram verdadeiras charadas, com adjetivos e advérbios saindo pelo ladrão.
A ninguém ocorre que uma denúncia mal feita, sem a objetividade imposta pelo art. 41 do Código de Processo Penal, pode tirar a liberdade de inocentes ou abrir as portas para os culpados. A ninguém ocorre que um contrato redigido sem clareza rouba noites de sono, causa transtornos, pode aterrorizar. Examinem-se os contratos bancários, por exemplo.
Não se trata, portanto, de preciosismo. Sem o uso adequado da linguagem, não é o Direito que se realiza, mas a vontade do operador que não domina o vernáculo.
Está na hora de demolir essa Torre de Babel em que se transformaram juízos e tribunais, recondicionando a axiologia jurídica, para que a linguagem volte a ocupar o seu lugar na escala de valores.