sexta-feira, 24 de setembro de 2021

 

DISCURSO DE PALANQUE

“Conclamo os líderes do nosso país a que se dediquem aos problemas reais que assolam o nosso povo: a pandemia, que ainda não acabou e já levou para o túmulo mais de 580 mil vidas brasileiras, e levou a dor a estes familiares que perderam entes queridos; devemos nos preocupar com o desemprego, que conduz o cidadão ao limite da sobrevivência biológica; nos preocupar com a inflação, que corrói a renda dos mais pobres; e a crise hídrica, que se avizinha e que ameaça a nossa retomada econômica”.

Você sabe quem é que fez esse discurso com sotaque de palanque eleitoral? Esse empolgado discurso de oposição, cobrando providências dos “líderes do país”? Tem alguma ideia?

Quem quer que ouvisse essa arenga sem saber de que gogó ela partia, poderia se perguntar: que vereador será esse?

Pois essa foi a parte do Luiz Fux no bate-boca mantido, à distância, com o Bolsonaro que, com sua língua detrativa e mal educada, andou ferindo os brios dos togados. Só tem uma coisa: Fux esqueceu de tirar a toga para discursar, esqueceu que a toga diferencia o magistrado do vizinho encrenqueiro, do político da oposição, do vereador parlapatão. Esqueceu que a toga, representando a Justiça, exige de quem a veste um comportamento ajustado à liturgia do cargo, cujos atributos deveriam ser serenidade, moderação e circunspecção. Esqueceu de que ombro de magistrado não deve servir apenas como cabide de toga, mas como repositório de responsabilidades. Uma delas é a de demonstrar que as funções por ele exercidas devem infundir confiança na justiça.

Sim, senhores. Nem na forma, o discurso de Luiz Fux obedeceu aos requintes da boa dialética, que todo o metido a intelectual deveria conhecer. Se ele tivesse lido as catilinárias de Cícero, faria discursos como os daquele tribuno romano, que servem como aulas de latim. Longe disso, o aranzel do Fux atropela o vernáculo. Ele embola o sujeito, começando na primeira pessoa do singular: “conclamo os líderes...” E, no mesmo período, bota o predicado no plural: “devemos nos preocupar com o desemprego... Sem falar na última oração, cujo sujeito fica boiando, sem ação...

E dá nisso: quem não aprendeu com Cícero, está sujeito a ser confundido com candidato a vereador em palanque eleitoral.

 

sábado, 18 de setembro de 2021

 

A LENDA DE TROIA EM BRASÍLIA

Tudo começou  com um general no Supremo. Alguém soprou para o Toffoli, então presidente do STF, o nome do general Fernando Azevedo e Silva, para seu assessor militar.

Estranho, né? Um general no Supremo, muito estranho. Mas, aconteceu e  ficou tudo às mil maravilhas, tanto para o Toffoli, como para seu assessor, o general.

Aí o Bolsonaro assumiu o Executivo e uma de suas primeiras providências foi nomear esse mesmo general, como seu ministro da Defesa. Outra vez, estranho né?

Mas coisas ruins começaram a acontecer, a partir da demissão do Sérgio Moro do Ministério da Justiça. E deu zebra para Bolsonaro, com o primeiro gol contra: o ministro do STF Alexandre de Moraes impediu a posse do escolhido para suceder Moro. Desde então, Bolsonaro perdeu todas no Supremo, levou pau por todos os lados.

E a coisa foi piorando. No primeiro de seus pronunciamentos contra o STF, Bolsonaro chegou a dizer: “agora chega”. E todo mundo pensou que seria o fim do STF. Mas, não foi. Bolsonaro demitiu o general amigo do Toffoli, mudou os comandantes das três armas. Mas tudo continuou como dantes, ou pior, quando Alexandre começou a prender gente aliada a Bolsonaro. E Bolsonaro dando indiretas, recados ameaçadores. Mas, Alexandre de Moraes e o STF, nem aí para o Bolsonaro. Todos se sentiam seguros, donos da bola, para fazer gol de impedimento e com a mão.

Até que houve o 7 de setembro, que alguns temiam e outros esperavam como dia da virada. Nunca, ao que se saiba, um presidente da República conseguiu mobilizar tanto povo a seu favor, nas ruas. Sentindo-se prestigiado, endeusado, Bolsonaro partiu para o ataque contra o STF, soltou a língua, virou fera, rugiu como leão.

Mas, no dia seguinte pediu água, pediu intermediação do Temer para se chegar a Alexandre de Moraes, baixou a bola, falou em paz, se desarmou. Deixou abestalhado, de boca aberta, frustrado, pê da cara,  o povo que estava ao lado dele para o que desse e viesse.

Acontece que esse  povo desconhecia o mito do cavalo de Troia, usado pelo STF. E Toffoli deve estar se arrebentando de rir.

 

 

sexta-feira, 10 de setembro de 2021

 

           O SUJEITO DO SOFÁ

"O sujeito do sofá é um idiota incapaz de entender uma polegada além do que lhe dizem os grandes grupos de comunicação". Essa definição é da lavra do respeitável cronista, um dos melhores do país, Percival Puggina, no texto intitulado “A Arrogância do Intelecto vai nos ferrar”?

Sim, existe tal tipo. É aquele sujeito que, por falta de cultura ou de leituras, despojado da capacidade de pensar, desconfiar, duvidar e criticar, aluga seus olhos e seus ouvidos para os grandes canais de comunicação como um penico que aceita tudo: líquido, sólido e gasoso.

Quando o resultado das urnas desmentiu fragorosamente as previsões e os palpites de comentaristas e institutos de pesquisas ligados a determinados grupos de comunicação, a casa ruiu para esses grupos. A mamata deles, sustentada pelas fontes de arrecadação fiscal, secou. E aí, desmamados, iniciaram essa guerra, que já dura quase três anos.

Empurrados contra o muro da falência, se entregaram ao desespero, perderam a criatividade, se desfizeram das propriedades que qualificam a boa imprensa, a imprensa séria, digna de crédito. Agora não têm freios nos dentes para falar mal do presidente, de seus filhos, de seus amigos.

É evidente que pessoas dotadas de inteligência, com níveis de cultura não envenados por paixões políticas, por ideologias dogmáticas infensas a contrarrazões, reunem condições de ponderar, avaliar, medir os fatos, e não se dobram à lavagem cerebral a que aqueles grupos querem submeter a população.

Essas pessoas, porém, são em menor número. Cultura, capacidade de entender e de pensar não dá em touceira.

Mas, o sujeito do sofá existe e, desde que apareceu a primeira emissora de televisão no país, se deixou dominar por ela. Esse sujeito perdeu – se é que a teve alguma vez – a capacidade de pensar por ele mesmo.  Para ele, as melhores horas do dia são aquelas em que ele se aboleta na frente do aparelho de televisão. Dali não sai. A televisão exerce um fascínio inelutável sobre ele. Encantam-no mulheres ou homens que aparecem em filmes, noticiários, programas de  calouro, novelas, e claro, programas pornográficos, como o tal BBB, de que se serve para satisfazer seu onanismo. O que os narradores de futebol e o Tite dizem, pra ele é lei. Mesmo que a imagem esteja mostrando o contrário.

Sim, esse é o sujeito do sofá, que certamente nunca leu um livro na vida, ou se leu algum, já nem se lembra do título e, muito menos, do autor. É o homem medíocre por excelência.

O sujeito do sofá é o objeto do desejo dos noticiaristas e comentaristas da televisão. É com ele que contam os grandes grupos de comunicação, para saírem do atoladouro que ameaça engoli-los. E agora, com a colaboração de Renan Calheiros, Omar Azis e a jurisprudência casuística do STF, bombas e mais bombas rondam o palácio do Planalto. Tudo, porque os aproveitadores do erário têm certeza de que o sujeito do sofá lhes garantirá a saída do Bolsonaro e eles voltarão a mamar nas tetas da república.

 

sábado, 4 de setembro de 2021

 

DEMOCRACIA: EXPLORAÇÃO DO POVO PELOS POLÍTICOS

Ao sair de casa, olhe para cima. Veja acima de sua cabeça aquele emaranhado de fios, fiapos, pedaços de fios, fios caídos, aquele desarranjo público que significa não menos do que desleixo, desconsideração, burrice e incompetência. São fios da RGE, da Vivo, da Net, da Claro, da Oi, da Sky, fios de luz, de telefone, de fibra ótica.

Coisa de terra de ninguém. Terra de quem chega primeiro e faz o que quer. Terra de quem chega depois e desarranja o que o primeiro fez. Não existe estética. Há, sim, por toda a parte, de poste a poste, sinais de ambição, desorganização, o pior retrato de uma cidade.

Vez por outra, os terceirizados de uma empresa, ao resolverem os problemas que lhes cabem, acabam causando problemas não só para as outras empresas que são sócias daquele caos, como e principalmente para os usuários, que sustentam a farra dos serviços públicos diretos ou concedidos.

Na contramão desse desleixo do qual são cúmplices as administrações municipais e estaduais, começou a crescer o interesse pela energia solar. Aos poucos, como quem não quer nada, essa indústria foi se agigantando. E aí as concessionárias da energia estatal sentiram medo. Correram ao congresso, para abiscoitar lucros sem contribuir com nada, para tirar proveito da iniciativa privada e dos custos arcados exclusivamente pelos usuários.

E a Câmara Federal já forneceu atestado do grau de honestidade de muitos deputados: aprovou o pagamento de uma taxa, por conta dos usuários, às ditas concessionárias. Ou seja: taxaram a luz do sol.

Viram como as concessionárias estrangeiras, que usam laranjas brasileiras, têm poder? Viram o tamanho de seus tentáculos e a força dos seus cifrões? Viram o quanto vale em dólares uma lei brasileira?

Sim, senhores, é a isso que chamam, no Brasil, democracia. Essa é democracia garantida por aqueles se acham e batem no peito, dizendo que são guardiães da Constituição, mas nem merecem ser mencionados nessa crônica. Essa é a democracia deles: a exploração do povo pelo Congresso Nacional.