quinta-feira, 30 de julho de 2020


AS FAKE NEWS DO MINISTRO

Alexandre de Moraes parece especializado nessa área: a das fake News, as falsas notícias, mas as falsas notícias do Direito, o Direito falso, o avesso do Direito. É nesse campo que o ministro se aventura, fazendo das suas, vestido de toga e se aproveitando dos poderes que os senadores, depois de uma noitada num barco, lhe garantiram.

Relembrando: o Supremo Tribunal Federal, de uns tempos a essa parte, aprontou muitas, desatando em parcela considerável da população brasileira a desconfiança na Justiça. Daí, a se transformar em revolta essa insatisfação, foi um passo. A Corte em geral e vários ministros em particular passaram a ser alvos de chacota e vitupérios nas redes sociais. Houve um grupo que avançou nesse movimento de repulsa contra aquela instituição, organizou manifestações de rua em frente à sede da Corte, pedindo seu fechamento, com gritos de ordem.

As manifestações encontraram eco no Supremo e a resposta veio através de inquérito instaurado por Dias Toffoli, para apurar “fake news e ameaças a ministros e seus familiares”. A investigação foi confiada a Alexandre de Moraes. E o inquérito se transformou em ato de defesa a favor do Tribunal, assumindo uma natureza policialesca. Começou com buscas e apreensões e terminou com a prisão de algumas pessoas tidas como líderes das manifestações contra o STF. Tudo, sem que o inquérito tivesse em vista a perseguição de uma conduta penal definida, e sem que os advogados tivessem acesso ao seu conteúdo. Às pessoas encarceradas, segundo noticiou a imprensa, não se deu conhecimento do crime ou dos crimes por elas praticados. Um jornalista preso foi impedido de exercer sua atividade. Uma das pessoas presas está agora em liberdade, vigiada por tornozeleira eletrônica.

Por incrível que pareça, toda essa pantomima policialesca foi aprovada pelo Supremo Tribunal Federal, contra o voto do ministro Marco Aurélio de Melo. E ato seguinte dessa ópera do falso Direito foi o impedimento do exercício da liberdade de expressão, determinado por Alexandre de Moraes, atingindo várias pessoas, que tiveram suspenso seu acesso às redes sociais.

Não é destruindo direitos que se constrói ou se mantém a honradez. Não é violando a lei que se preserva a dignidade. Não é desrespeitando o ordenamento jurídico que se conquista o respeito de quem sustenta o Estado. O país está mergulhado nas trevas de uma pandemia. No entanto, os ministros do STF, os encantadores de si mesmos, vivem como se tivessem luz própria, em outro mundo.

Os juízes, como os demais servidores públicos, são investidos nos seus cargos e funções para servirem ao Estado e não para dele se servirem. Mas parece que, dos onze ministros do Supremo Tribunal Federal, dez deles ignoram esses elementares pressupostos de Direito Público.

A liberdade de expressão e de pensamento é um direito fundamental do ser humano, sendo assim consagrado no art. 5º, incisos IV e IX da Constituição. Se o Tribunal, que é o guardião dessa Constituição, proíbe o direito de falar, ele está negando razões para a sua própria existência.




quinta-feira, 23 de julho de 2020


SABE COM QUEM TÁ FALANDO?
João Eichbaum

O nome do desembargador Eduardo Siqueira, do Tribunal de Justiça de São Paulo, encheu as manchetes dos jornais e a boca dos noticiaristas da Globo, na semana passada. O rechonchudo, pançudo e meio despecoçado senhor, saíra pelas ruas de Santos, no litoral paulista, sem o devido resguardo contra o coronavírus: de cara à mostra, sem proteção.

Acontece que lá, como em outras cidades do país, vigora o decreto da máscara. A liberdade de ir e vir está condicionada a uma ordem: só se pode ir e vir mascarado. Então, abordado por um guarda municipal, em razão do descumprimento do decreto, o desembargador sacou o documento do bolso traseiro e o brandiu na frente do nariz do guarda: “sabe com quem tá falando”?

O guarda não tugiu, nem mugiu, mas teve o atrevimento de chamar o desembargador de “cidadão”. Pra quê, minha gente, o togado subiu nos tamancos: “cidadão, não, você está falando com um desembargador”. Enquanto isso, sem mostrar a mínima impressão com o currículo do cidadão, que não se considera cidadão porque é desembargador, o guarda manteve a calma e começou a preencher a notificação de multa.

A pachorra do guarda atiçou ainda mais a ira do desembargador, que estava a ponto de largar fumaça azulada pelas ventas, diante de tanta falta de consideração. Aí, deu de mão no celular e chamou, ou fez que chamou, o secretário municipal de segurança. No diálogo, ou suposto diálogo, sobrou para o guarda, pela boca do desembargador que não se considera cidadão, um substantivo que, fazendo as vezes de adjetivo, serve para verrumar a auto-estima do atingido: “analfabeto”.

Nada disso mexeu com a bonomia do servidor municipal. Concluído o preenchimento da notificação, destacou a primeira via e a entregou ao togado. Esse, incontinenti, encarou o guarda com desprezo, fez pedacinhos do documento, e saiu com aquele andar de quem anda e defeca ao mesmo tempo.

O fato escandalizou o país. A falta de educação, o desprezo para com os mais humildes, a arrogância por se sentir mais do que os outros, arrancaram a revolta da população. Como pode um desembargador mostrar tal descaramento? Onde está a dignidade do cargo de juiz, que desanda em truculência, em desaforo barato?

Mas o povo desconhece a doença transmitida pelo vírus do poder, que é a “juizite”. Vestido de toga, o homem se sente entupido de poder, se torna juiz e senhor de vidas e destinos. Tanto na primeira instância como nos tribunais, ressalvadas honrosas exceções, grassa a epidemia. Os altos salários e a garantia de poder fazer bobagem toda a vida, chamada vitaliciedade, são os agentes desses surtos.

O abandono aos delírios do poder é quase uma rotina no Judiciário. É coçado pelo poder que o Supremo Tribunal Federal, com sua linguagem florida e seus arroubos de superioridade, rasga a Constituição e muda a jurisprudência, a cada nova verdade criada por ele.

E, no rabo desses balés de vaidades e infantis exibições de poder, vem pendurada a conta para o contribuinte.


quinta-feira, 16 de julho de 2020


GILMAR MENDES DO BANCO DOS RÉUS?
João Eichbaum

Essa invectiva não saiu da boca de algum papagaio falador, que só repete o que ouve, mas nem sabe o que está dizendo. Nem partiu de algum demagogo barato, escolado em estelionato político. E muito muito menos de algum palpiteiro, que desconhece as leis penais. É um pronunciamento do senhor Gilmar Mendes, ministro do STF, que deve ter muita admiração por si mesmo, em razão da inteligência que ele pensa que tem. E por ter essa admiração, acha que tudo o que lhe sai da boca é admirável, saturado de excelentes razões, isento de culpa e de responsabilização criminal.
Certamente estarrecido, o ministro da Defesa, em primeiro momento, não encontrou palavras que soassem no mesmo tom, como resposta. E se limitou a informar a atuação das Forças Armadas no combate ao coronavirus.
Mas suportar a acusação de genocídio, nem barata, que tem sangue de barata, consegue. E aí veio a reação das Forças Armadas: “comentários dessa natureza, completamente afastados dos fatos, causam indignação. Trata-se de uma acusação grave, além de infundada, irresponsável e sobretudo leviana. O ataque gratuito a instituições do Estado não fortalece a democracia. Genocídio é definido por lei como ‘intenção de destruir, no todo ou em parte, grupo nacional, étnico, racial ou religioso’ (Lei 2.889/1956). Trata-se de um crime gravíssimo, tanto no âmbito nacional, como na justiça internacional, o que, naturalmente, é de pleno conhecimento de um jurista”.
Seguiu-se a informação de que o Ministério da Defesa encaminhou representação ao Procurador Geral da República.
Mas, a partir daí surgiram complicações de natureza processual. O Gilmar disse: “o Exército está se associando a esse genocídio”. Mas, o núcleo do crime de calúnia consiste em “caluniar alguém”. “Alguém” é pronome indefinido, que subentende uma “pessoa”. É diferente de “algo”, que subentende uma “coisa”. Exército é um substantivo coletivo, que designa vários soldados. Dizer-se que “o exército está se associando ao genocídio”, significa dizer que todos os militares daquela corporação estão se associando àquele crime: do comandante geral ao mais ignoto soldado raso.
O exército não tem legitimidade para propor o desencadeamento da ação penal. E muito menos as Forças Armadas, porque Gilmar Mendes se referiu exclusivamente ao Exército.
Esse impasse à denúncia levou a PGR a buscar outra alternativa. E existem duas: o art. 219 do Código Penal Militar, que pune ofensa à dignidade das FFAA, e o art. 23, inc. II, da Lei de Segurança Nacional que pune a incitação de animosidade entre as FFAA e classes civis. Da denúncia de calúnia Gilmar se safa, mediante retratação, mas não desses dispositivos.
Só tem um inconveniente: ele será julgado pelo STF. Amizades e inimizades provocarão impedimentos e convocações de outros ministros. Um clima nunca vivido naquele tribunal trará constrangimentos.  Mas para o povo será um espetáculo de lavar a alma e deixar o fígado em paz.



quinta-feira, 9 de julho de 2020


O BANDEIRINHA
João Eichbaum

Quem nasceu ontem talvez não saiba o que é um bandeirinha. Bandeirinha era chamado o sujeito que corria pelas laterais do campo de futebol, de bandeira na mão, vestido de preto, calça curta, salientando as montanhas glúteas, mesmo que não fosse maricas. Quando ele levantava a bandeira, era sinal de offside. Hoje os bandeirinhas não são mais bandeirinhas, mas auxiliares do árbitro. E quando eles levantam a bandeira, não é mais offside, mas impedimento.

Esses caras – ai deles e de quem os pariu!- recebem nos ouvidos as ferroadas dos xingamentos de mais baixo quilate, que atingem os úteros de suas genitoras, quando um impedimento, que era offside, não é impedimento e, muito menos, offside. Ou quando um impedimento legítimo não é considerado impedimento, nem offside.

Agora o coronavirus trouxe mais um tipo de bandeirinha para o Rio Grande do Sul. É o senhor governador do Estado, um pelotense escolhido por seus admiradores de Pelotas e mais boa parte dos eleitores desses imensos rincões gaúchos, onde antigamente se falava grosso, com tom e jeito de macho.

É de retrato ostentoso o atual governador dos pampas: bem apessoado, tipo cavaleiro de bons modos, fala fofa, cabelo, barba e bigodinho nos trinques por arte de estilistas capilares, unhas feitas como em mão de noiva. Nada nele lembra seus antecessores, vinhos de outras pipas, como Júlio de Castilhos, Cordeiro de Farias, Silveira Martins, Borges de Medeiros, que já foram levados deste mundo.

Apanhado de surpresa por uma palavra de etimologia grega, a tal de pandemia, da qual de certo nunca ouviu falar,  o governador trocou o timão do navio gaúcho por paus de segurar bandeira.

Assim: essa pandemia, espalhada pelos chineses em todo mundo, começou aos poucos, como quem não quer nada. Parecia até ter medo de gaúcho macho. Mas, devagar foi tomando conta, porque aqui, como no resto do mundo, ninguém estava preparado para tanta urucubaca de uma vez só. E começou a finar gente de Covid 19, e gente lotando hospitais.

Aí o governador resolveu ser bandeirinha, para dominar a situação. Assim como no futebol, levantando a bandeira para dar impedimento, o perigo de gol se resolve, o único jeito de conter os avanços do coronavirus, para ele, é sacudindo bandeiras. Então foram criadas três bandeiras com os respectivos paus, para serem levantadas, segundo o andar do coronavirus. A bandeira amarela, uma coisa maravilhosa que lembra buquê de crisântemo, anuncia quase normalidade. A bandeira vermelha, de assustar, trava grande parte da economia produtiva, permitindo algumas atividades, proibindo outras. E a bandeira preta, a do luto, a que indica morte próxima, pavores eternos, fecha quase tudo, derreando a economia.

E assim, nesse balanço, vai sendo “administrado” o Rio Grande. Das bandeiradas do governador depende hoje aquela economia que outrora não parava nem para a cavalhada refrescar os cascos, e exportava até façanhas, na falta de outra coisa.


quinta-feira, 2 de julho de 2020


O INFERNO DE UM PRESIDENTE
João Eichbaum

O Judiciário marcou território. Quem tem poder e rins funcionando faz isso. Do entrevero léxico, que é o palavrório do Fux, escorreu a obtusa ideia de que não vai haver intervenção, coisa nenhuma, porque o Presidente é, mas não é, o comandante supremo das Forças Armadas. E mais: que a missão do generais, brigadeiros e almirantes é ficar nos quartéis, hangares e capitanias só contando tempo, à espera da gorda previdência diferenciada, quando trocarão as fardas carregadas de medalhas pelo pijama, para olhar televisão.

Calados, os comandantes ouviram a proclamação de que a toga é superior à farda. Dobraram-se ao mutismo da concordância, subjugados pela prudência de quem não se mete em guerra.

 O Weintraub teve que sair escondido, por ter externado o sacrílego pensamento de botar na cadeia os ministros do STF. E se escafedeu pelos fundos, perseguido pela certeza de que, no Brasil, a única voz que manda calar a boca e baixar as armas é a do pessoal da toga.

Prenderam o Queiroz na casa do Wassef, andam à cata da coroa do Queiroz também. O Wassef está mais enroscado do que carrapicho em pelego. E a família Bolsonaro parece pendurada na corda do pânico, amedrontada pelo que pode brotar da boca deles.
Qualquer juiz dá ordens ao Presidente da República, exige que ele ande mascarado porque, se não andar, pagará multa, como reles infrator.

Agora o Celso de Mello quer botar Bolsonaro à mercê dos terríveis interrogadores da Polícia Federal, cujo chefe não lhe deram o direito de escolher. E isso tudo acontece depois que Bolsonaro, mirando o infinito com seus olhos de artilheiro e, cheio de certezas, encheu a boca para dizer “agora chega”.

Milhões de brasileiros querem um Brasil melhor. Um Brasil com políticos que respeitem o povo, que não sejam dados a falcatruas, a vendas de votos, a trocas de partido por dinheiro, por poder, por qualquer coisa que melhore a vida sobrecarregada de privilégios que só eles têm.

Milhões de brasileiros querem a transformação total deste país, com uma varredura na corrupção, na roubalheira, na ganância fiscal que os obriga a trabalhar quatro meses só para o governo.

Milhões de brasileiros querem se livrar dessa imagem de galinheiro, na qual o país se transformou, entregue à desordem dos galos. Querem um país onde os bandidos não tenham mais direitos que o povo, o povo que trabalha, sua, sofre no transporte público, sobrevive com salário mínimo e acaba morrendo na fila do Sus. Querem que o Brasil deixe de ser o eterno 7x1 em qualquer coisa.

Mas, a chamada “grande imprensa” não deixa. Abandonando o escrúpulo, o jornalismo da ética e da responsabilidade social, ela se transformou em panfletário do ódio. Sua meta é deixar milhões de brasileiros com o choro engasgado, e apagar com um cuspe o calor vulcânico de seu amor pela pátria, ao lhes dizer que o sonho acabou e que do sonho só sobreviveu Bolsonaro, por ser um político igual aos outros...