quarta-feira, 16 de novembro de 2022

 

A NOTA DOS MILITARES, A ORDEM DO MORAES E O POVO


Para não parecerem omissas, mostrando-se indiferentes ao clamor de certos setores da sociedade, que se plantaram defronte aos quartéis pedindo “intervenção militar”, ou para que o seu silêncio não fosse interpretado como assentimento, as Forças Armadas se manifestaram.

A manifestação ocorreu, por ocasião da entrega do relatório da auditoria paralela, feita depois de alguma resistência do Tribunal Superior Eleitoral, primeiro sob as ordens de Edson Facchin e depois sob as ordens de Alexandre de Moraes. A entrega do referido relatório foi também exigência daquela Corte.

Em nota, os comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica “reafirmam seu compromisso irrestrito e inabalável com o povo brasileiro, com a democracia e com a harmonia política e social do Brasil, ratificado pelos valores e pelas tradições das Forças Armadas, sempre presentes e moderadoras, nos mais importantes momentos da nossa história”. Mas traz também um sentido de advertência, nos seguintes termos: “ A Constituição Federal estabelece os deveres e os direitos a serem observados por todos os brasileiros e que devem ser assegurados pelas Instituições, especialmente no que tange à livre manifestação do pensamento; à liberdade de reunião pacificamente; e à liberdade de locomoção no território nacional”.

A nota dos militares invoca a Lei 14.197, de 1º de setembro de 2021, cujo artigo 359-T exclui de conduta penal “a manifestação crítica aos poderes constitucionais...ou a reivindicação de direitos e garantias constitucionais por meio de passeatas, de reuniões, de greves, de aglomerações, ou de qualquer outra forma de manifestação política com propósitos sociais”.

No mesmo dia, o ministro Alexandre de Moraes, agindo como se alguma lei lhe concedesse poder onipresente, exarou despacho que soou como um dar de ombros ao pensamento das Forças Armadas. Alexandre determinou a desobstrução de calçadas, acostamentos e logradouros públicos, no entorno de prédios públicos, além de estradas, em todo o território nacional. Para tanto, diz ele que “ a persistência de atos criminosos e antidemocráticos em todo o país, contrários à Democracia, ao estado de Direito, às Instituições, e à proclamação do resultado das Eleições Gerais de 2022... recomenda a EXTENSÃO DA DECISÃO CAUTELAR A QUAISQUER FATOS DESSA NATUREZA EM CURSO EM TODO O TERRITÓRIO NACIONAL...”

Atos criminosos e antidemocráticos” são termos genéricos, incabíveis em decisões judiciais. Não há na legislação penal crime algum, definido como “ato antidemocrático”. O fato criminoso tem que ser real, revelado por nomenclatura própria. “Não há crime, sem lei que o defina”, é um princípio básico de Direito Penal, acolhido pela Constituição brasileira. E o juiz deve analisar à luz da Lei Penal o fato que lhe é submetido, e não sob as falsas luzes da presunção. No caso, as manifestações populares se ajustam literalmente ao preceito invocado pelas Forças Armadas, preceito que não considera crime “ a manifestação crítica aos poderes Constitucionais... por meio de passeatas, reuniões, aglomerações”, etc.

Alardeia-se que vivemos numa democracia. Mas não há democracia sem povo. Só nas teocracias os “poderes constitucionais” estão nas mãos dos deuses.

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