quarta-feira, 26 de julho de 2023

                                                                    CENAS DE UM DEFLORAMENTO

O Direito, como ciência, está sumindo do Brasil. A Constituição do Ulysses está sendo violada. O devido processo legal já não existe. A tipificação de crimes já não depende de lei: está sendo criada por jurisprudência. O Supremo Tribunal Federal se dá o direito de reformar a Constituição. E não fica só nisso: arvora-se também no direito de determinar ao Poder Executivo o que ele deve ou o que ele não deve fazer, se atribui competência para estabelecer normas que a Constituição reserva exclusivamente para o Poder Legislativo.

E tudo começou, sabem com quem? Com dois senhores que, por terem feito algum cursinho em Harvard e aprendido alguma coisa com a operação “mãos limpas” na Itália, acharam que tinham poder e capacidade para erradicar a corrupção que mina a política brasileira. Em outras palavras: acharam que os fins justificam os meios.

Várias pessoas foram levadas para a cadeia por força desse lema, e lá deixadas, como se não houvesse lei que condiciona e limita a supressão da liberdade. E lá ficaram, enquanto não abriram o bico, delatando e vomitando culpa, em troca de uma pena branda ou da liberdade imediata. Por um milagre, ainda não devidamente explicado, até dinheiro havido em corrupção foi devolvido.

Só que esse dinheiro, saído do bolso ou das contas do corrupto para o corrompido, teve um curso de muitas voltas e mãos várias, que lhe subtraíram a face linear de fato concreto, com circunstâncias próprias, definidas, destrincadas, libertas de qualquer sombra de dúvida. Então, a denúncia do Ministério Público, sob a batuta de um procurador da República chamado Deltan Dallagnol, não conseguiu a clareza, a objetividade e a simplicidade do art. 41 do Código de Processo Penal: necessitou de um complicado “power point”. Assim, embora desprendida das rédeas do referido art. 41, foi recebida, levando à condenação dos réus, entre os quais Lula, por sentença de Sérgio Moro.

Dos condenados, só o Lula não se conformou. E, com seu poder de sedução, arrastou muitos poderosos para o seu lado. E aí começaram as variações sobre o mesmo tema: os fins justificam os meios. Um inquérito instaurado no STF, cuja injuridicidade lhe valeu, por parte de um ministro daquela Corte, o apelido de “inquérito do fim do mundo”, tomou o mesmo rumo da Lava Jato. E serviu como um modelo ajeitado para cassar o mandato de Deltan Dallagnol. Agora, as mesmas bases desse Direito por linhas tortas parece apontar o guante da cassação de mandato parlamentar para Sérgio Moro, o juiz que condenou Lula.

Sim, senhores: ontem a Lava Jato substituiu os rigores do Direito pela força dos fins; hoje impera o apocalíptico “inquérito do fim do mundo”. E quem conhece a lei e a Bíblia vê o inverso do Juízo Final, descrito no livro do Apocalipse: na fila da direita os maus, que são contra o Estado Democrático de Direito sem direitos, e na fila da esquerda os bons, os que imolam, no altar da deusa Democracia, o hímen da Constituição.

  

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