ANO NOVO, VELHOS VÍCIOS
Justiça é um substantivo abstrato, que deveria ser
transformado numa sensação real, movida por um amontoado de juízes, chamado
Judiciário. Ela devia ser ubíqua e onipresente, porque é o verdadeiro pão da
alma de quem dela necessita. Mas é operada com lentidão de lesma, ornada de
adjetivos e advérbios, e destratada com agressões ao vernáculo. Entre dezembro e
janeiro, é travada com nome de “recesso”: um eufemismo, usado para disfarçar a
verdade. A maioria dos juízes, com esse “recesso”, goza noventa dias de férias
anuais.
Pouco importa o número de processos que deveriam ter
sido julgados há muito tempo, mas servem para afofar traseiros escondidos sob a
toga; pouco importa o número de processos que adormecem em arquivos de computadores,
e que são responsáveis por essa pastosa lentidão. Quem precisa de Justiça, que espere.
É preciso comemorar o aniversário de Jesus Cristo e o Ano Novo.
Mas, nesse ano, durante o período festivo do
aniversário de Cristo que, para a Justiça, começa antes do Natal, passa pelo
ano novo, e segue janeiro a dentro, alguns ministros do Supremo Tribunal
Federal resolveram “trabalhar”. Mas, não
porque o descanso seja uma vergonha, já que o povo paga por uma justiça que não
recebe. Nem pela “suprema virtude” de amarem eles de paixão o batente.
Isso deu o que falar e o que pensar. E já circulam
fuxicos pela imprensa, anunciando que eles querem deixar Fux, o presidente do
STF, nu e de mão no bolso, para não despachar liminares. Por isso teriam
renunciado ao recesso. Ah, sim, esse “trabalhar” outra coisa não significa
senão despachar liminares...
Acontece que, no “recesso judiciário”, as medidas de
urgência são despachadas pelo presidente do Tribunal, na ausência dos ministros
para os quais elas tenham sido distribuídas. Então alguns ministros vão ficar
de plantão, aguardando processos.
Más línguas, porém, é o que não falta. Dessas
desistências do recesso, o Estadão concluiu que tudo não passa de ajuste de
contas. Para ele, há ministros que estão pê da cara com o Fux, porque o voto
dele impediu a reeleição de Maia e Alcolumbre. E todo mundo sabe que há pedidos
de impeachment de ministros, engavetados no gabinete do Alcolumbre...
.
Um dos que ficam de plantão é o Marco Aurélio. Esse
não esconde suas mágoas, por ter Fux cassado a ordem de libertar o traficante
milionário André do Rap.
A teoria das conspirações, intrigas, picuinhas e
pontos obscuros, é ainda apimentada, segundo o Estadão, com um habeas corpus gestado
por advogados, com a finalidade de liberar a função do “juiz das garantias”,
sustada por Luiz Fux.
Nada que o diabo não goste. Nada que não aconteça numa
Instituição onde as façanhas dos indivíduos que a compõem suplanta o espírito
do colegiado.
Sendo assim, ó: infeliz ano novo. Pelo visto não houve
propósitos de melhorar a honra da Corte Suprema, empanada, no ano passado, pelo
declínio na postura e nos conhecimentos jurídicos, e pela egolatria, em nível
pouco comum em quem não tem ascendência divina.
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