UM PODER ACIMA DE TRÊS
A organização previa
pontualidade nos pormenores. O avião, trazendo 30 milhões de reais, depois de
aterrissar, iria para o hangar, onde um carro-forte receberia a milionária
carga. Então, por volta das 19:30 eles se dirigiram ao hangar. Abrigados nos
veículos com dísticos da Polícia Federal e fardados como integrantes daquela
força, tiveram livre acesso ao aeroporto, sem qualquer exigência que os
inibisse. A essa altura dos acontecimentos, a Polícia Federal é a longa mão de
ferro do Supremo Tribunal Federal, sempre pronta para cumprir ordens de lá emanadas.
Então, não há quem se atreva a pedir identificação ou barrar-lhe a entrada, sob
pena de responder por “crime antidemocrático”.
Por isso, não foram
necessárias muitas palavras, nem grandes explicações aos vigilantes do carro-forte.
Ao verem aqueles fuzis, já com dedos nos gatilhos apontados para eles, não
tiveram tempo sequer de se preparar para uma desgraça. Ensaiaram uma troca de
tiros mas, em número menor do que aqueles senhores fardados com uniformes da
Polícia Federal, nem mesmo abrigados dentro do carro-forte blindado, puderam
lhes fazer frente. Enquanto alguns dos recém chegados se apossavam dos malotes
com o dinheiro e os jogavam para dentro dos veículos que os haviam trazido,
outros tinham como alvo os vigilantes.
Pilotos e funcionários
do aeroporto, tiritando até a medula dos ossos, foram então tomados como
reféns, com a chegada da Brigada Militar, que exigiu fogo cerrado de ambas as partes.
Usando armamento mais pesado e tendo reféns como escudo, os assaltantes
disfarçados em policiais fizeram tombar a primeira vítima, um sargento da Brigada.
Não podendo deixar sem socorro o colega, os brigadianos foram obrigados a uma
trégua momentânea. Disso se aproveitaram os assaltantes para encetar fuga. Mas
um de seus veículos foi atingido, sendo morto seu ocupante. Dos 30 milhões, 15
se encontravam nesse veículo.
Isso só acontece num
país onde “bandalheira” é sinônimo de “governabilidade”. Onde projetos do
Executivo são aprovados na proporção dos cargos oferecidos aos partidos políticos
e da verba destinada aos parlamentares, por meio de conversas em linguagem de
cifrão, com aberto desrespeito ao dinheiro dos contribuintes. E a Justiça, de
sua parte, descomprometida com a realidade, usa os sentimentos como premissa de
seus
juízos de valor. Em primeiro lugar, os “direitos humanos” dos bandidos. Depois,
podem ser analisados eventuais direitos das vítimas do crime ou da dor que ele
provoca. Mas, bandido tem direito a prisão confortável, a visitas íntimas, a
audiência de custódia, a saidinhas de Páscoa, de Natal, no dia da mamãe ou do
papai...
Quando os Poderes da
República, não conseguindo dominar o crime, permitem o comércio de pequenas
porções de alucinógenos que, multiplicadas por milhões, fomentam o tráfico
proibido, além de infligirem lancinantes torturas, causadas tanto pelo consumo
como pela abstinência da droga, às famílias dos dependentes, formando embriões
de violência e criminalidade.
Então a morte
anunciada pela incompetência estatal se cumpre: enquanto policiais são
equipados com vulneráveis coletes antibalísticos, o crime se arma com fuzis capazes
de dividir um elefante pelo meio.