INDIGESTA APOLOGIA
Sob o título “A Luz de
Lisboa”, em artigo publicado no Estadão, o advogado paulista Nicolau da Rocha
Cavalcanti se entregou à inglória tarefa de elogiar a realização do tal de “Fórum
Jurídico de Lisboa”, aqui apelidado de “Gilmarpalooza”.
Tamanha temeridade só
podia colher, como colheu, uma enxurrada de exacerbadas e desairosas críticas
ao referido bacharel, que poderia ter dormido sem elas.
O texto do advogado,
realmente, soa incomodamente como deboche ao pensamento de todos quantos sabem
como, por quem, e em que circunstâncias é realizado aquele evento. Quer como
peça literária, quer como juízo de valor, a publicação não resiste à mais perfuntória
análise.
O próprio título
revela que o autor do artigo não é dotado de respeitável criatividade. “A Luz
de Lisboa” é um tema de que se têm ocupado, há muitos anos, poetas, escritores
e vários artistas de outros ramos. Movida por tal inspiração, a direção do
Museu de Lisboa usou-a para assim denominar grandiosa exposição que reúne obras
de pintura, desenho, fotografia, cinema, vídeo, documentário e literatura. Sem
dizer que o título não era de sua lavra, fruto de seu talento literário, o
advogado Cavalcanti se valeu da poética expressão para ilustrar seu artigo.
É evidente que a
deficiência de criatividade dificulta a elaboração de argumentos, de razões
deveras convincentes. Então lá veio ele dizer que “sendo um espaço de reflexão
e debate, a distância permite ver, com outras luzes, o objeto discutido, o
Brasil”.
Ora, o Brasil é um
país, simplesmente. Que tipo de discussão exigiria um país? O que pode ser
objeto de discussão, sim, é a realidade vivida no país, a realidade política,
social, financeira, étnica. Mas a realidade não pode ser vista, ou pintada, “com
outras luzes”, como a “luz de Lisboa”, por exemplo, à distância, sob pena de ser
tida como uma realidade disfarçada.
Toda a dialética se
torna indigente, quando se socorre de presunções como premissas para juízos de
valor. Ao afirmar que “nos tempos atuais de embrutecimento, realizar esse fórum
no Brasil de forma serena e pacífica tornou-se simplesmente impossível”, o advogado articulista navega
numa afirmação vazia. Embrutecimento? Como assim? Quem está praticando
“embrutecimento”?
O advogado faz
circunvoluções para não chegar ao ponto crucial do “Gilmarpalooza”: os gastos
públicos, as viagens e diárias com guarda-costas pagas com o dinheiro do
contribuinte. A imensa comitiva que voou para Lisboa foi composta, por “160 autoridades
dos três Poderes e outros 20 assessores”, segundo a UOL Notícias.
Quem pagou isso tudo?
O advogado não diz. Quando se trata mandar às favas o artigo 37 da Constituição
Federal, é melhor calar, porque não há explicações que possam ser consagradas
como argumentos.
Mas há em Portugal
jornalistas atentos para os desvios das funções públicas. O colunista João Carlos Batalha, da revista
lisboeta Sábado, em publicação sobre o “Gilmarpalooza”, intitulada “O Festival
do arranjinho”, alude à “orgia da promiscuidade” no evento.
Por sorte ele não é
brasileiro, nem mora aqui. Senão, já estaria enquadrado no “inquérito do fim do
mundo” por crimes antidemocráticos...
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