A DEUSA
VENDIDA
Ela se
venda, mas não se vende. Quem a vende são os corruptos, que negociam em nome
dela. Eles se aproveitam de seu templo, de seu poder, de seu esplendor, da
venda, que a torna cega, para se tornarem rufiões: fazem dela uma prostituta de
luxo e disso tiram proveito.
Na última
semana a imprensa noticiou investigações sobre venda de sentenças no Tocantins,
na Bahia, no Mato Grosso e – nossa!– no Superior Tribunal de Justiça. A
interjeição entre hifens se deve ao inusitado: o Superior Tribunal de Justiça,
que é o órgão investigador da venda de sentenças nos Estados, tornou-se
investigado pelo Supremo Tribunal Federal.
É claro
que o nome dos ministros que compõem a Turma, onde foi descoberto o comércio de
decisões judiciais, já desapareceu das manchetes. No lugar deles apareceu o
nome do comprador das sentenças, chamado de “lobista”, Andreson Oliveira
Gonçalves.
Segundo a
imprensa, Andreson não só comprava decisões, como conhecia de antemão o teor
delas. Mas, quem as vendia? Quem lhe fornecia as informações?
Por
enquanto, bico calado. Onde há gente de alto coturno envolvida, qualquer oração
tem o sujeito oculto. Por ora, ao que se sabe, as investigações têm em mira as
assessorias dos ministros.
Mas, o que
se sabe provém de notícia fornecida pela revista Oeste: “dos 31 ministros do
STJ metade tem parentes que atuam em Tribunal”. São sobrinhos, enteados,
mulheres... Ou seja, o número e a condição de pessoas que possuem credenciais
para ter acesso às decisões judiciais, naquele tribunal, formam uma teia quase
inextrincável.
Outra
coisa muito sabida, porque não é segredo para ninguém, neste país onde
corruptos confessos são perdoados, é que a chave de muitos tesouros se obtém
através da senha “você sabe com quem está falando”?
A deusa
Themis, criada pela mitologia grega para encarnar a justiça como representação
axiológica e moral da verdade, da equidade e de um protótipo ideal de criatura
superior às paixões humanas, no Brasil não passa de uma escultura de pedra.
Aqui, os
tribunais superiores se consideram, em primeiro lugar, compostos por seres
humanos, sujeitos a fraquezas, como o estresse, o esgotamento físico e mental.
Mas, para que as partes não se sintam no direito de recorrer, assim aliviando o
trabalho de suas excelências, a terapia de que eles fazem uso, não vem de
laboratórios. Eles têm fórmulas próprias que provocam a soltura dos deveres
constitucionais. Ruminam “súmulas” desdenhando da axiologia jurídica que
sustenta o “direito fundamental” aos recursos, consagrado no artigo 5º inc. LV
da Constituição Federal.
Além
disso, o parlamento lhes fornece a lei, da qual eles se socorrem para compor
uma selecionada equipe de assessores, com cargos em comissão ou função
gratificada.
Assim, a
função jurisdicional não sofre solução de continuidade, quando ditas
excelências se afastam do país para flanar em quermesses jurídicas patrocinadas
por empresários, advogados, e partes envolvidas com a Justiça.
Afinal, a
Deusa Themis é uma simples figura, esculpida para enfeitar o STF. Verdade, moral
e equidade não passam de paramentos da liturgia mitológica...