SONIDOS E ARRULHOS DESAFINADOS DA CONSTITUIÇÃO
Para ser CEO de uma multinacional, considerando-se
a finalidade da empresa, que outra não é, senão a de forrar as burras, se supõe
que o sujeito deva ser esperto, mostrando perícia nas artes da sedução. Mas,
essa qualidade não pode deixar de ser atrelada à sovinice, quando se trata de
remunerar aqueles que movimentam as operações, garantindo o dinamismo do
empreendimento: os trabalhadores.
A iFood que, como todas empresas,
necessita de mão de obra, se utiliza da prestação serviços de terceiros para
suas operações, sem compromisso com a legislação trabalhista. Mas, nem todos os
prestadores de serviço aguentam o repuxo, sem a garantia que o vínculo
empregatício lhes daria: vão para a Justiça.
Até agora, em alguns dos casos levados
ao STF, esse vínculo não tem sido reconhecido. Mas, são casos cercados por
circunstâncias específicas e, por isso mesmo, o Supremo ainda não firmou
jurisprudência abrangente.
Mas como um CEO bem qualificado, o
senhor Diego Barreto, que preside a iFood no Brasil, saltou na frente da
Jurisprudência, movido pelo espírito cristão de Francisco de Assis: é dando,
que se recebe. Sabendo que o CNJ anda à cata de doações para um programa
humanitário na formação de juízes, organizou um jantar em sua casa, bem ao
gosto do presidente daquele órgão judiciário, o senhor Barroso, que aprecia um
microfone para expelir bemóis e sustenidos, seguidos de aplausos. Para
abrilhantar a performance do togado, o anfitrião convidou também a cantora
Paula Lima, além de uma plateia convenientemente selecionada para a ocasião.
No dia seguinte, vários órgãos de
comunicação publicaram a foto da dupla Barroso e Barreto, esforçados em afinar
um sambinha com a cantora.
Como não poderia ser, o festivo
jantar deu pano pra manga: o Presidente do STF se juntando ao CEO de uma
empresa que tem processos a serem julgados.
Barroso não gostou da crítica e se
saiu com essa: “a incultura é um problema difícil de sanar no Brasil. Os que
criticaram foi para “vender jornal, falando bobagem”. E esclareceu: “nós
realizamos um jantar para obtenção de recursos para o nosso programa de Bolsas”.
A irritação com a crítica é própria
de quem não tem argumentos.
No dia 30 de abril o CNJ havia publicado
um edital, buscando empresas e instituições privadas interessadas em contribuir
para bolsas no valor de R$ 3.000,00 mensais, por dois anos, em favor de negros,
deficientes físicos e indígenas, para equalizar as condições de ingresso na
magistratura. Uma questão social, demográfica, alheia às atribuições do CNJ.
Será que o edital previa o jantar na
casa de pessoa interessada em julgamentos pelo STF, abrilhantado com a voz
romântica do seu presidente?
As bobagens correm por conta de quem
as pratica, e não de quem as publica. Não há lei que privilegie o CNJ, órgão do
Judiciário, como exceção, no cumprimento do art. 95, parágrafo único, inc. IV
da CF, que veda aos juízes “receber, a qualquer título ou pretexto, auxílios ou
contribuições de pessoas físicas, entidades públicas ou privadas...”.
Nenhum comentário:
Postar um comentário