CRIME
SEM LEI
João
Eichbaum
Salvo
o abalo das funções cerebrais por doença ou por corrosiva senilidade, nenhum
estudante de Direito esquecerá uma lição ouvida nas primeiras aulas de Direito
Penal: “não há crime, sem lei anterior que o defina”. Sendo essa uma regra
basilar de Direito Penal, a Constituição Federal brasileira a consagrou no
inciso XXXIX do artigo 5°.
Todo
o mundo sabe que só o Poder Legislativo tem competência para legislar e que,
portanto, só ele pode definir as condutas penais, ou seja estabelecer o que é
crime.
Um
partido político, não resistindo à coceira da demagogia, ingressou no STF com ação
de inconstitucionalidade por omissão atribuída ao Senado, pedindo que aquele
tribunal considere a homofobia como compreendida na “ampla definição” do crime
de racismo. Em outras palavras, pediu que o STF substitua o Legislativo,
criando um crime não tipificado por lei.
Com
um discurso prolixo, enfadonho, gongórico, intoxicado por adjetivos e advérbios
que repugnam ao comedimento da linguagem jurídica, o septuagenário ministro
Celso de Mello introduziu no Direito Penal brasileiro a analogia como
instrumento de hermenêutica: atendeu ao pedido, considerando a homofobia como
uma extensão do crime de racismo. Trocando em miúdos: criou um crime não
definido por lei.
Tese
nenhuma justifica o rompimento de princípios básicos de Direito Penal. Menos ainda,
malabarismos dialéticos, que outro efeito não têm senão o de barbitúricos
verbais. E primários conhecimentos de criminologia ensinam: não é criando
crimes que se combate o crime. A criação de um novo delito, sobretudo, é
desnecessária quando existem outros meios para se punir, tais como agravantes e
qualificativos, que aumentam a pena em condutas penais já existentes.
Uma
visão crítica da realidade brasileira mostra que não adianta desenhar novos
comportamentos penais, para gáudio de uns poucos enroscados nas próprias
causas, quando a maioria esmagadora do povo respira o medo e a insegurança, e
chora suas perdas, porque o Estado não tem domínio sobre a violência
indiscriminada. E nem punir ele consegue, com seu sistema carcerário
desmantelado e dominado por organizações criminosas.
O
Supremo Tribunal Federal, depois dessa, tem a obrigação de comprovar a
necessidade de sua existência. Senão, será tido como um tribunal feito só para
sonhar, atrapalhando a vida de quem paga imposto para bancar os privilégios e
pompas da realeza judiciária.
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