OS CASTIGOS DIVINOS
João Eichbaum
Primeiro foi o caso da maçã que, ao que parece,
não estava nos planos de Deus, quando fez um boneco de barro, deu nele um
assoprão, criando o homem. Esse, chamado
Adão, sozinho, não criou problema para Deus. Ficou lá pelo paraíso, sem fazer
nada o dia inteiro, a não ser coçar o saco, que Deus tinha botado nele, sem
finalidade nenhuma, até então, que não a de ser coçado.
Vendo aquele cara sem fazer nada, a não ser as já
mencionadas coçadas de saco, o próprio Deus se sentiu entediado, mesmo porque
ele próprio havia criado o céu, a lua, as estrelas, os rios, as florestas e
tudo o mais, exatamente porque estava desde o começo da eternidade, que não tem
começo, completamente desocupado. E aí criou tudo, e mais o mundo, para ter
alguma coisa como passar a eternidade. É bom lembrar que, para Deus, não existe
tempo: só eternidade.
Bem daí deu aquilo que se sabe, né: ele teve que
criar a mulher, para não deixar o homem sozinho, sem fazer nada, coçando o
saco. Tirou uma costela do cara e fez a mulher. A partir dali, o saco do homem
já tinha motivo para funcionar e ele tinha como esvaziar o saco.
Mas então veio o caso da amizade da mulher com a
serpente, a qual, numa tarde de fofocas, fez a cabeça da mulher. Disse para ela
que, se comesse a maçã, ia ficar empoderada, isso é, teria poder igual a Deus.
Não podia dar outra: a mulher comeu a maçã, seduziu o homem e deu no que deu:
foram expulsos do paraíso.
Foi a primeira incomodação que Deus teve, mas foi
fácil de resolver. Eram só os dois, ele os mandou embora, gritando “fuck you”,
imprecação que, mais tarde, foi traduzida como “crescei e multiplicai-vos”.
Mas, Deus não contava que, com a multiplicação a
coisa ia ficar muito pior. E aí ele teve teve que apelar para o dilúvio. Afogou
a terra, e só não exterminou a humanidade, porque poupou Noé, sua família e
mais um casal de cada animal, dos dinossauros aos bichinhos da goiaba.
Depois do dilúvio e com as transas dos filhos e
noras de Noé, as coisas tomaram outro rumo. Mas não como Deus queria. Tanto que
surgiram as cidades pecadoras Sodoma e Gomorra. E Deus teve que se desembaraçar
delas. Torrou as duas no fogo e no enxofre.
Não adiantou. Então Deus criou Hitler, Stalin,
Fidel Castro e outros para darem um jeito na humanidade, cada um a seu modo. Atiçou
guerras, inventou a peste espanhola, a gripe, o cólera, mandou terremotos,
tsunamis e furacões de menor calibre. Quase conseguiu. Mas ficou no “quase”. A
humanidade continuou se esbaldando.
Agora, aparece o coronavirus. Borrado de medo do
castigo divino, o povo correu para o papel higiênico, se arrependendo das
puladas de cerca e de outras variações sobre o mesmo tema. Mas respirou
aliviado com os noticiários da grande imprensa: “a culpa é só do Bolsonaro”.
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