A VIDA E O FUTEBOL
Só pode jogar futebol quem está vivo. Decorrência
disso, mercê da lógica: vida e futebol estão interligados, porque esse depende
daquela. E se existe essa dependência, um não pode ser diferente do outro.
E assim é. O mesmo que acontece na vida, acontece no
futebol. Na vida, se ganha, se perde, ou se empata, como no futebol. E a base
de tudo é a sorte. Sim, senhores, a sorte é que comanda ambos os espetáculos, o
da vida e o do futebol. O talento exigido pelo futebol é obra do acaso, que se
infiltra naquela corrida de óvulos e espermatozoides, da qual tudo se pode
esperar. Não é todo o mundo que nasce com o bumbum voltado para a lua.
Mas o talento, como tudo na vida, é relativo. Ele não
se basta a si próprio. Necessita de desenvolvimento, que só é possível através
de treino e disciplina. O sujeito pode nascer com o talento para o futebol, mas
se não tiver oportunidade de exercitá-lo
com a bola, nada feito. Mas, não é só isso. Ou seja, o talento não é absoluto.
Como uma das propriedades da vida, ele depende dos acasos, exatamente por isso:
porque a vida é comandada pelos acasos.
Todo Pelé tem
seu dia de “perna de pau”, assim como todo o “perna de pau” tem o seu dia de
Pelé. Os acasos que trazem momentos felizes são aleatórios: não acontecem
sempre, e para a mesma pessoa. Para usar a linguagem do futebol: quando liga,
tudo dá certo e, quando não liga, se vai o boi com a corda. Não adianta ter
talento, se o jogador não está no seu dia de sorte. A sorte e o azar são os
ingredientes da vida que constituem a essência dos acasos, e esses não querem
saber se o sujeito tem talento ou não.
Na vida, existem os que conseguem seus objetivos de
forma diferente daqueles que trabalham uma vida inteira e morrem desassistidos
dos bons fados. Afinal, a esperteza, como tantas outras coisas, exige talento.
É claro que, no futebol, não poderia ser diferente: há aqueles que têm faro
para se aproveitar da sorte. E botam
esse faro a trabalhar por eles. De câmera na mão, visitam os clubes, conquistam
seus dirigentes, filmam treinos e jogos. E aí, depois de pescarem “pernas de
pau” no seu dia de Pelé, partem
para contratar, pessoalmente ou
por interpostas pessoas, com times pequenos.
Sob variados pretextos, influências e arreglos,
muitos elencos hoje são montados por “empresários”. Não há mais craques de
várzea. Não se vê guris correndo atrás da bola na rua, em terrenos baldios.
Sobram aqueles que, sem padrinhos para mostrar o talento na base de grandes
clubes, pipocam de lá para cá, na mão dos empresários.
Como a vida, o futebol evolui. Hoje, guri que pode,
fica em casa, jogando “video game”. Mas, um dia todos poderão ter essa sorte.
Aí, sem a periferia, que produz figurantes para o espetáculo, o que será do
futebol?
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