terça-feira, 14 de janeiro de 2025

 

RANCOR E ZELO PELA DEMOCRACIA

Energúmenos os há em toda a parte, movidos por ideias de variados gêneros: sociais, políticos, religiosos, etc. Nisso se incluem sentimentos de natureza lúdica, como futebol, basquete, corridas automobilísticas, arte cinematográfica, novelas, e por aí vai. 

Nos últimos dias esse fanatismo apareceu em noticiários, crônicas, editoriais, a partir da premiação artística obtida por uma senhora chamada Fernanda Torres. Pelas manifestações se depreende que essa senhora é uma atriz cinematográfica. Certamente é muito conhecida por quem, não tendo domínio de leitura corrente para acompanhar legendas, prefere assistir a filmes brasileiros e novelas da Globo.

E, por falar nisso, a própria Globo acha que a premiação da atriz empolgou o país, como se fosse uma taça de campeão de futebol do mundo. Mas, se tudo se limitasse a essa idolatria, que nada representa e em nada corresponde às verdadeiras necessidades do povo brasileiro, tudo se desculparia por conta do elevado número de analfabetos funcionais neste país.

A imprensa carunchada, amamentada nas tetas do governo da hora, depois de consultar seu repertório de mágoas, laureou dona Fernanda como heroína da democracia. Acontece que, segundo dizem, o tal filme, fonte do prêmio, não passa de romanceada narrativa de fatos ocorridos na época do regime militar, em tempos idos.

Para Rosane de Oliveira, colunista de Zero Hora, “o retrato de uma família destroçada pelo arbítrio mostra o quanto é degradante para uma sociedade a supressão da democracia”. Mas essa afirmação serve como premissa para uma conclusão capenga. “Defender o arbítrio – diz a colunista - não é uma inocente manifestação de liberdade de expressão. É na verdade um crime passível de responsabilização penal, principalmente quando o equivocado posicionamento deriva para ações violentas como a invasão às sedes dos três poderes da República ocorrida em janeiro de 2023.”

Eliane Cantanhede, do Estadão, afina pelo mesmo diapasão: “Prêmio de Fernanda Torres a 3 dias do 2º ano do 8 de janeiro é um troféu à democracia”. E exalta a premiada atriz por “trazer o troféu justamente três dias antes de o (sic) aterrorizante 8 de janeiro de 2023 completar dois anos”.

Diz Cantanhede que “a PGR se prepara para denunciar quem e o que for denunciável, e o Supremo para julgar e punir”... E isso posto, conclui que “as instituições estão a postos para defender a democracia dentro da ordem e da legalidade”.

Dona Fernanda poderia ser elogiada sem alusões absurdas. Atores do “aterrorizante 8 de janeiro” acusados de “ações violentas” (faxineira com o rosário na mão, morador de rua, vendedor de algodão doce, manicure armada com pincel de batom) foram convocados pelo destino, sem direito a prêmios, para desempenharem papéis num processo penal instaurado com denúncia coletiva, direcionado para lotes humanos, sem o direito fundamental da individualização da pena. Longe de interpretar a “ordem e a legalidade”, determinadas na Constituição e no Código de Processo Penal, é um feito judicial contaminado por obscenidades processuais, jamais tratadas na história do direito brasileiro. Uma obra feita a capricho para figurar na Antologia da Infâmia.

 

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