quarta-feira, 8 de janeiro de 2025

 

        A CONSTITUIÇÃO E O IDIOMA VIOLADOS

O problema do senhor Dias Toffoli é o seguinte: na expressão racional, ele se engasga com vocábulos e com a gramática do único idioma que lhe permite falar.

A crônica intitulada “O Repetente Piorou”, da lavra de Augusto Nunes na Revista Oeste, é uma verdadeira obra de arte literária, exprobrando o desastre linguístico e discursivo daquele senhor que, graças ao notório saber jurídico do Luiz Inácio da Silva, se tornou ministro do STF.

Para não dizerem que o brilhante jornalista exagerou na tinta, ele transcreve literalmente o palavrório que a língua do Toffoli expeliu, ao votar na questão da constitucionalidade do art. 19 da Lei do Marco Civil: “Esse caso, como todos sabem, mas para aqueles que desconhecem, que estão nos ouvindo, envolveu um editor que foi condenado por crime de racismo por divulgar livros de teor antissemita contra os judeus”.

Para quem conhece a gramática da língua portuguesa, a leitura desse ajuntamento de palavras, a partir da conjunção “mas”, dói nos ouvidos como um si bemol desafinado. A pobre conjunção está perdida na selva da inconsequente loquacidade do ministro: foi despida das funções que a gramática lhe atribui.

A partir dessa agressão à gramática, evidentemente, o palavreado do Toffoli não poderia ter desembocado em conclusão lógica, decorrente de científico silogismo jurídico. Principalmente depois de dar um puxão mais para baixo no seu nível de cultura, ao definir o transporte ferroviário como “meio de comunicação”...

O “caso do editor”, por ele citado, é exatamente a premissa que tira todo o vigor de sua conclusão, à luz da Constituição de 1988, que, no art. 5º, inc. IX, veda a censura. Se o editor foi punido pelo crime de racismo, cumpriu-se, rigorosamente, a ordem jurídica com a aplicação da lei penal. Como se tratava de recurso penal, o STF não poderia ter invocado “limites da liberdade de expressão” para condenar o recorrente. Se o fez, uma hermenêutica tão indigente não pode servir como didática. Além disso, a Lei do Marco Civil da Internet, que reforçou a vedação da censura prevista na Constituição, ainda não existia.

Assim reza o art. 19 da Lei acima referida: “Com o intuito de assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura, o provedor de aplicações de internet somente poderá ser responsabilizado civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros se, após ordem judicial específica, não tomar as providências para, no âmbito e nos limites técnicos do seu serviço e dentro do prazo assinalado, tornar indisponível o conteúdo apontado como infringente, ressalvadas as disposições legais em contrário”.

Onde está a “inconstitucionalidade” desse artigo, que tem como finalidade precípua garantir a liberdade de expressão e impedir a censura? Nele estão claros não só o enunciado verbal, como o espírito da Constituição, que estabelece como “fundamental” o direito de expressão.

Numa hora dessas é que se constata quão indispensáveis são o domínio da linguagem e alguns conhecimentos perfuntórios de dialética, para que a indigência de regras discursivas não se homizie no poder.

 

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