sexta-feira, 11 de janeiro de 2019


A ITAIPU É PARA OS AMIGOS
João Eichbaum      
Em suas entranhas, o poder acomoda os amigos, seja qual for o regime de governo. A diferença entre os regimes ditatoriais e democráticos reside em que, nesses últimos, o povo tem a liberdade de escolher a sua desgraça: quem vai explorá-lo, quem vai sufocá-lo de impostos, enriquecendo à sua custa e fazendo o bem para os amigos.

Há outra diferença ainda: quem não escolheu o vencedor, parido pelo voto obrigatório, tem o direito de berrar, xingar, amaldiçoar, torcer para que tudo dê errado. Mas, as diferenças ficam por aí. O que sobra, em qualquer regime, é a exploração do povo, a quem são distribuídas migalhas de ilusão, como se fosse possível reencontrar o paraíso perdido.

Mas bocas ricas, como a Itaipu Binacional, por exemplo, são criadas para acomodar os amigos. Seus conselheiros, de livre nomeação do presidente da república, são aquinhoados com 27 mil reais por mês, para participarem de reuniões que ocorrem a cada dois meses. Ou seja, para participar de uma reunião, eles abocanham nada menos do que 54 mil reais. É um prêmio, e não uma contraprestação de serviços.

Michel Temer nomeou três conselheiros: a loira Samantha Meyer, ex-mulher de seu amigo Gilmar Mendes, Orlando Pessuti, filho do seu amigo Pessuti, ex-governador do Paraná, e agora, no apagar das luzes de seu governo, o amigão do peito Carlos Marun.

Ao saber da nomeação de Marun, no último dia do governo Temer, Jair Bolsonaro abespinhou-se e anunciou que iria anular a nomeação. A ele se juntou a voz de gaúcho do Mourão, cuja mulher é advogada.

Mas agora, informa-se que ficou o dito pelo não dito. Um assessor jurídico do presidente Bolsonaro o teria dissuadido de tornar sem efeito a nomeação de Marun, sob a alegação de que se trata de um “ato jurídico perfeito”.

O povo escolheu Bolsonaro, porque queria moralizar o país, acabando com as falcatruas, com a corrupção, com o desvio do dinheiro para finalidades que não atendam às necessidades do bem comum. Mas agora, na ressaca da eleição, parece que o presidente não está colhendo bons frutos através de assessores jurídicos. Afinal, no país da “universidade para todos”, onde milhares de bacharéis e centenas de mestres e doutores estão na fila da amargura, à espera de algum subemprego, tudo pode acontecer...

O assessor que acha irreversível a nomeação de Marun, porém, além de desconhecer o estatuto da Itaipu, não tem uma ínfima ideia de exegese constitucional. Para que se torne perfeito um ato jurídico emanado de qualquer dos órgãos da administração pública direta ou indireta, ele tem que passar pelo filtro dos princípios do art. 37.

A assessoria jurídica da presidência da república não pode ser um quadro meramente decorativo, um pálio dourado para abrigar amigos. O povo quer mudança radical no trato com a coisa pública. A menos que a beleza quimérica da democracia se resuma nisso: espremido entre a corrupção e a incompetência, nada mais resta ao povo, senão a desolação interminável de escolher uma delas.



Nenhum comentário: