CRÔNICA FORA DA COLUNA
João Eichbaum
Era um espetáculo fascinante. O
trem noturno passava, despejando luzes pelas janelas e baloiçando ao som metálico
das rodas sobre os trilhos. Os silvos da locomotiva e a fumaça que ela deitava
sobre os vagões eram como um sinal de adeus dos que partiam, rumo a uma terra
longínqua e desconhecida chamada São Paulo.
Mas a esse espetáculo que, nas
noites de Cruz Alta, atiçava nele a ambição de ser ferroviário, o menino teve
que renunciar. Órfão de pai, aos 12 anos teve que atender ao chamado da vida
para o campo de luta: precisava ajudar no sustento da mãe e dos irmãos.
Então teve sua primeira profissão:
garçom. Às dez e meia da noite, enquanto o trem passava, ele limpava as mesas
do bar. Nessa hora, só elas, que lhe aparavam as lágrimas, ficavam sabendo da
dor que lhe causavam os sonhos interrompidos pela desgraça de ser órfão.
Elas, as mesas de bar, suas
primeiras confidentes, nunca mais deixaram de sê-lo. Sobre elas, as lágrimas
dele desapareciam. E ele nunca deixou de procurá-las: quer por causa dos trens
que, na desordem da vida, partiram sem volta, quer pelo trem que o levou para
sempre, no último vagão, abanando um lenço para quem não veio lhe dizer adeus.
Por isso, até hoje, sempre que
pode, ele homenageia as mesas de bar. Como na “CRÔNICA DE UM AMANTE
DESVAIRADO”...
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