sexta-feira, 5 de março de 2021

 

O VÍRUS

Há filósofos que, certamente, nunca pisaram num estádio de futebol, onde as tendências sexuais da mãe do juiz são propaladas a cada instante. Segundo tais filósofos, sendo a peça mais importante do trabalho de Javé, o homem é forrado de dignidade e com uma inteligência que lhe permite andar sobre as águas e subir ao céu de corpo e alma. De navio e avião, claro.

Julgando-se criaturas superiores aos outros animais, se arrogando o privilégio de criação diferenciada, muitos se recusam a aceitar a tese de Charles Darwin, de que não passamos de um ramo da espécie símia.

Grande parte da humanidade ignora essa certeza: a de que o ser humano carrega um DNA que difere apenas 2% do DNA dos bonobos e chimpanzés. Seu retrato se completa com ataques de ódio e libido, e impulsos que o levam da ganância sem escrúpulos à ingenuidade emoldurada por crenças e superstições.

Ele não passa de joguete da natureza, como todos os outros animais. É gerado da mesma forma que os demais de sua espécie: aquela corrida que, em game de óvulos e espermatozoides, acaba produzindo seres com prazo de validade. A diferença fica por conta do ritual barulhento na cama. No mais, todos são tratados do mesmo modo pela natureza, submetidos às suas leis e caprichos.

 Agora ela acabou de espalhar pelo mundo uma coisa invisível, que pode matar mais do que qualquer engenho bélico inventado pela inteligência humana, desde que os possuidores de tal faculdade perderam o pelo e o rabo. E ela não vai escolher um casal de cada espécie, para preservar a continuação do gênero animal, metendo os queridinhos numa arca flutuante. De acordo com suas leis, só subsistirão os melhores.

Fruto da inteligência humana, ou seja, produto da natureza do homem, quer por descuido, quer intencionalmente, apareceu o vírus chinês. E ele mostrou seu poder, sua força de multiplicação. Transou com o vírus africano, transou com o vírus inglês, e está aí, driblando a ciência, desafiando a criatividade humana, a tão gabada inteligência desse animal que se acha superior aos outros.

Não poderia haver prova maior de que o ser humano, por mais que se ache, está limitado ao poder e aos caprichos da natureza. Não poderia haver prova maior de que somos um nada, como muitos outros que a combinação de elementos químicos da natureza produz, e depois elimina para sempre, indiferente aos nossos choros e velas. Não poderia haver prova maior de que só a natureza tem capacidade para esconder ou reforçar, com seus perpétuos fenômenos, qualquer imperfeição na textura do cosmos.

A natureza é inesgotável em leis e caprichos próprios. Por maiores que sejam a aplicação e a destreza que o homem empregue no estudo de seus fenômenos, nunca encontrará os limites da imprevisibilidade deles. Ora, vejam: enquanto o mundo inteiro estava com os olhos no Brasil e xingando o Bolsonaro por causa das queimadas na Amazônia, surgia o vírus chinês, mostrando que os furos da natureza estão sempre mais em baixo.

 

 

 

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