POR QUE
NÓS, PROFESSORES/AS, TEMOS O DEVER MORAL, ÉTICO E PROFISSIONAL DE NEGAR BOLSONARO?
Mariléia
Sell
Se há
uma unanimidade no discurso de qualquer político e até na compreensão do senso
comum é de que a educação é fundamental para o progresso de qualquer país.
Entretanto, o tripé educação, saúde e segurança, de tão falados, já descambaram
para um vazio semântico. Ou seja, não dizem muito, estão esvaziados de sentido.
O mesmo vazio em que caíram expressões como “educar para a autonomia” e “formar
cidadãos críticos”, constantes em todos os planos políticos pedagógicos de
qualquer escola do país. “Educar contra qualquer tipo de discriminação” também
está entre essas expressões queridinhas de qualquer projeto de qualquer escola
que se preze.
Na
constituição federal de 1988, no título I, dos direitos fundamentais, no artigo
3º diz que são objetivos fundamentais da república federativa do Brasil: a)
construir uma sociedade livre, justa e solidária; b) promover o bem de todos,
sem preconceito de origem, raça, sexo, cor, idade ou quaisquer outras formas de
discriminação. Na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, de 1996, tem
um capítulo inteiro dedicado à educação para a diversidade como tema
transversal, ou seja, um tema que deve ser tratado em todas as disciplinas.
Isso quer dizer que a escola pública brasileira (e quando falo em pública falo
também da rede privada porque todas as escolas lidam com o público e todas
estão sujeitas às mesmas leis), pautada na legislação, tem como dever ético
reforçar os laços de solidariedade, sem jamais estimular a violência, a
humilhação e a segregação. Isso é lei. Está escrito no acordo máximo que o
estado brasileiro tem com o povo. Precisa ser cumprido.
Em
tempos de eleição e em tempos em que um candidato nega essa diversidade, ao
afirmar que as mulheres devem receber salários menores porque engravidam, que
ter filhas mulheres é sinônimo de uma “fraquejada”, este candidato
explicitamente nega o princípio constitucional da igualdade de direitos. Ao
chamar mulheres de “vagabunda” e “burra” e dizer que não estupraria uma
deputada porque ela é “feia”, não é necessário estender-se nas explicações para
saber do pensamento dele em relação às mulheres. Ao dizer que é favorável à
ditadura e que a ditadura brasileira falhou porque deveria ter matado mais,
nega o estado democrático de direito, que é o horizonte de qualquer sociedade civilizada.
Ao querer armar a população, prega a justiça com as próprias mãos, prática
adotada por sociedades bárbaras. Ao dizer que se tivesse um filho gay
preferiria que ele estivesse morto, nega a diversidade de gênero. Ao dizer que
seu filho foi bem-educado o suficiente para não se envolver com uma mulher
negra, reafirma, descaradamente, o seu racismo, além de negar toda a história
da escravidão no Brasil, ao dizer que os negros se voluntariaram ao trabalho
forçado. Ou seja, esse candidato revela um atraso intelectual preocupante. Para
os indígenas, que ele considera indolentes, ele já declarou que não demarcará
“um centímetro” de terras.
Jair
Messias Bolsonaro não tem uma única proposta razoável para a educação, a não
ser a sua preocupação manifesta contra a doutrinação comunista e contra o que
os desinformados chamam de “ideologia de gênero”. Aliás, ele demonstra uma
preocupação exagerada, que renderia interessantes análises psicanalíticas, a
respeito do chamado kit gay. Para evitar que os professores contaminem as
crianças e os jovens brasileiros, ele propõe a educação a distância, ainda na
educação básica. Ele também advoga a favor de as famílias não serem mais
obrigadas a mandarem os filhos e as filhas para a escola, podendo educá-los/as
em casa. Jair Bolsonaro não entende a “tara” dos brasileiros por um diploma
superior, deve ser porque ele mesmo não conseguiu letrar-se em conhecimentos
mínimos durante a sua formação.
Professores
formados em universidades sérias, além de sólidos conhecimentos na sua área,
também sabem de suas obrigações morais e éticas em uma sala de aula; é da nossa
profissionalidade. Ou seja, os professores e as professoras têm o compromisso
de zelar por tudo o que a teoria da área, cientificamente informada, acumulou
em séculos de estudos, pois negar a ciência seria advogar pelo obscurantismo e
pela ignorância, como é o caso de negar que houve ditadura no Brasil. Além
disso, também têm o compromisso de observar os preceitos universais de uma
educação libertadora e emancipatória, a saber, educar para a solidariedade, a
diversidade, o respeito, a justiça, a liberdade. Isso tudo vem no pacote da
formação de um professor e de uma professora, além de, como exposto acima,
estar previsto na lei vigente do país. Por isso tudo, é dever moral, ético e
profissional dos professores e das professoras posicionar-se contra tudo o que
afronta os direitos da pessoa humana, assim como é dever lutar pela educação do
país e não entregá-la aos desmandos de alguém declaradamente incapaz,
preconceituoso, autoritário e intelectualmente prejudicado. Temos essa
obrigação porque fizemos um juramento no dia em que nos graduamos. Quanto aos
professores e professoras que apoiam Bolsonaro, fico me perguntando como
acomodam tantos disparates ao paradigma ético pessoal e como equacionam tantas
falácias ao quadro teórico de sua respectiva área. Pela racionalidade,
princípio tão caro à nossa formação, é que não é.
Mariléia
Sell é Professora Doutora dos Cursos de Letras e Comunicação da Unisinos
Um comentário:
Vai dar aulas em cuba, sua fdp
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