sexta-feira, 1 de abril de 2022

 

DE JUDAS, VENDILHÕES, E POLÍTICOS

Sob o título “Trinta Moedas pela educação”, na coluna “Opinião”  de terça-feira passada, diz O Estadão que o “gabinete paralelo no MEC, com pastores influenciando na liberação de verbas da pasta, é grave ofensa à ordem jurídica. Educação é inegociável. Desde que o Estadão revelou, na semana passada, a existência de mais um gabinete paralelo no governo Bolsonaro, desta vez no Ministério da Educação (MEC), têm vindo à tona novos dados sobre o aparelhamento da estrutura estatal para atender a interesses de lideranças religiosas. Trata-se de uma situação rigorosamente inconstitucional, que desrespeita princípios básicos da administração pública, fere o caráter laico do Estado e, não menos importante, prejudica diretamente a qualidade da educação pública”.

Mas no texto não há uma única palavra sobre o desvalor que sustenta as falcatruas: a imoralidade. A ação dos pastores,  trocando a “palavra de Deus” por verbas orçamentárias, não constitui nada de novo na mitologia judaico-cristã. Histórias como a dos vendilhões do templo e das trinta moedas de Judas já atraíam seguidores, tanto antes como depois de Cristo. Ou seja, desde que o homem perdeu o pelo e o rabo, e começou a usar a língua para enrolar os outros...

Convenhamos:  “graves ofensas à ordem jurídica” o Brasil vem sofrendo há muito tempo. O Direito, no Brasil, só segue uma cartilha: a que ensina o manejo, as artimanhas, os acordos e os negócios que interessam à classe política dominante.

A “ordem jurídica” de um regime democrático é a que respeita a vontade do povo. E aqui no Brasil a única coisa que não se faz é isso. O povo vive num país pobre, com deficiências nos serviços de saúde, segurança e educação. Mas esses problemas os políticos não têm: o povo lhes paga planos de saúde, segurança e subsídios de países ricos, que lhes permitem a educação dos filhos longe das misérias que desqualificam o ensino para os pobres.

Perdão. Dizer que “o povo lhes paga” é uma expressão incorreta. Eles, os políticos, é que estabelecem os próprios subsídios e todos os outros penduricalhos que lhes dão o direito a uma vida principesca. E botam tudo na conta do povo que trabalha, ou que arrisca seu capital, produzindo e criando empregos. A cobrança dessa conta fica a cargo da Receita Federal, no mês de abril, todos os anos. E ai do povo, se não pagar...

Mas, não é só isso. “Grave ofensa à ordem jurídica” de um país, que se diz democrático, é a extorsão do povo através de leis como a dos “fundos partidários”, que retiram do orçamento as verbas que só aos políticos servem.

Aproveitando-se a irônica linguagem bíblica do Estadão, não custa lembrar de passagem que, além das “trinta moedas”, no Brasil ainda há os vendilhões do templo. São aqueles que, “sob a proteção de Deus” invocada na Constituição Federal, fazem negociatas para manter essa democracia. Para isso, usam a linguagem de Francisco de Assis, que pode ser usada também no meretrício: é dando que se recebe...

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