MISTURA DO MAL COM O ATRASO
João Eichbaum
“Você é uma pessoa horrível. Uma mistura do mal com
o atraso e pitadas de psicopatia”.
Não. Esse furor poético, que tem tudo para figurar
na antologia do desprezo, não parte de um amante despeitado, não representa o
grito de um coração torturado pelas mágoas, sempre iguais, de um amor que se
foi, ou de uma paixão que pegou fogo e, por isso mesmo, virou cinza.
Se fosse o caso de um amor desfeito, ele não
perderia o fio da poesia, a linha romântica, o tom de ternura ferida, as marcas
do afeto que teimam em ficar, mesmo subjugadas pela desilusão.
Aqui, a poesia não suprimiu o rancor. Os traços
poéticos foram deixando pelo caminho, isso sim, a tristeza agressiva do amor
que desistiu e se entregou à malquerença.
Então, do poema raivoso transborda o fel do rancor:
“Vossa
Excelência nos envergonha. Vossa Excelência é uma desonra para o tribunal. Uma
desonra para todos nós. Um temperamento agressivo, grosseiro, rude. É péssimo
isso. Vossa Excelência, sozinho, desmoraliza o tribunal. É muito ruim, muito
penoso para todos nós ter que conviver com Vossa Excelência aqui. Não tem
ideia, não tem patriotismo, está sempre atrás de algum interesse que não é o da
Justiça”.
Aí está: longe de ser um
caso de amor acabado, o texto nada mais é do que uma diatribe do ministro
Roberto Barroso, disparada contra seu colega Gilmar Mendes, em plena sessão do
Supremo Tribunal Federal.
Ouvindo o desarranjo
verbal no rasto do poema da ira, emudeceram aqueles senhores que, debaixo da
toga, se deixam seduzir pelas atrações do poder e pelos encantos do mundo. Foi
como se um terremoto estivesse mexendo em sua torre de marfim, onde se sentem imunes
aos estragos que desqualificam o resto da humanidade. Frágil, como o espelho na frente do qual se
idolatra, a imagem do STF se esfacelou.
A instituição então se
desnudou, perante o povo, como um grupo humano qualquer, infestado de
fraquezas. A poesia rancorosa de Roberto Barroso acabava de desenhar a cara do
sistema judiciário. Soltando corruptos, dando-lhes a oportunidade de farrear
zombeteiramente com o dinheiro que roubaram da nação, e libertando assassinos,
assaltantes, estupradores, que voltam ao mundo do crime para sacrificar
inocentes, a Justiça pratica o mal. Entregando-se à lassidão que caduca
direitos, e tratando julgamentos com uma presteza de lesma, ela é o próprio
atraso da vida. E, para que essa mistura de mal com atraso cresça e não
desande, além de impostos, temos que pagar custas.
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