VERBO PREFERIDO DO PODER: PROIBIR
Ao negar
legitimidade à Associação Nacional de Juristas Evangélicos para ajuizar
“arguição de descumprimento de preceito fundamental”, o STF está na contramão
do maior princípio de Direito Constitucional que sustenta os regimes
democráticos: o de que “todo o poder emana do povo”. A Constituição federal é
clara, ao conferir tal legitimidade a “confederação sindical ou entidade de
classe de âmbito nacional”, dispositivo esse acolhido na Lei 9.882/99 que
regula aquele processo.
A insegurança
jurídica, plantada por decisões como essa, é fruto do mau uso dos instrumentos
da exegese. O primeiro pressuposto que deveria socorrer a inteligência de
qualquer ministro do Supremo, é de que ele é membro de um tribunal constitucional.
A missão precípua do Supremo é resguardar a Constituição Federal, preservá-la
de violações, mantê-la como sustentáculo da segurança jurídica. Não lhe cabe,
por isso, interpretar restritivamente dispositivos processuais, quando se cuida
de tema que só pode ser resolvido através de sua competência exclusiva. Em se
tratando de direito fundamental, o Supremo é a única e última instância. Ao
excluir da proteção jurisdicional, por defeito formal, o direito de uma parcela
de cidadãos, ele está se desviando, não apenas de sua competência, como do
próprio dever constitucional.
Salvo erro
grosseiro da parte, ao utilizar, por exemplo, uma forma processual que afronte
diretrizes constitucionais, não cabe ao Supremo a análise de questão
procedimental, para se negar ao exame do mérito. Isso, pela simples e
claríssima razão, de que, em se tratando de direito fundamental, o mérito é
superior à nua e inexpressiva formalidade.
Ora, se cabe nas
atribuições do juiz a faculdade de interpretar extensivamente, por qual razão
irá ele interpretar restritivamente, não só negando à parte a proteção do seu
direito, como violando a Constituição Federal, que consagra como direito
fundamental o acesso ao Judiciário? Logo o Supremo Tribunal Federal comete tal
disparate?
A Associação
Nacional dos Juristas Evangélicos é uma entidade que se ajusta à lei pelo
próprio nome. O que mais será necessário para aceita-la como “entidade de
classe, de âmbito nacional”?
Os ministros do STF
precisam saber que intérprete não é sinônimo de escamoteador. Não é lícito
distorcer a letra da lei, para extrair do texto legal o que ele não diz. Se a expressão literal da lei é clara, que
razão haverá para tratá-la com a redação nebulosa, coleante e obtusa, besuntada
de adjetivos e advérbios, que só é considerada como poço de erudição ou
manifestação de cultura por quem não domina o vernáculo? A letra da lei é o
primeiro instrumento útil para a sua intepretação. Quem despreza esse
instrumento não merece ser qualificado como intérprete, porque não passa de um
inventor: inventa regras que passam longe dos fundamentos da hermenêutica.
Nessa linha, o voto
prolixo, soporífero, político de Gilmar Mendes, vencedor na restrição a cultos
em razão da pandemia, é um modelo de pobreza, não só de hermenêutica, como de
dialética. A lengalenga desemboca na conclusão de que os direitos fundamentais
são relativos, voláteis: sua validade depende dos fatos.
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