terça-feira, 24 de novembro de 2009

CRÔNICAS ALUCINADAS

UNIMUNDOS
Paulo Wainberg



Não tenho dúvidas: vivemos num universo paralelo a outro universo onde alguém, eu, está, neste exato momento, concluindo que vive num universo paralelo ao dele.
A vantagem de viver num universo paralelo é que, tudo o que está errado aqui, está certo lá, coisa que eu estarei, neste exato momento, pensando.
Se, no meu universo, todo mundo é vesgo, no outro universo, ninguém é. Como eu acho que é errado ser vesgo, aprovo o universo paralelo onde eu lamento que lá, ninguém é vesgo.
Porque, como é sobejamente sabido, um universo paralelo é exatamente o oposto do outro.
O que me leva à questão dos espelhos e seus reflexos. Se ergo o braço direito, meu reflexo erguerá o esquerdo. O sinal na minha bochecha direita está na bochecha esquerda do meu reflexo.
O relógio de parede lá no fundo, à minha esquerda, está à direita do meu reflexo e se os ponteiros do meu marcam três e vinte, no reflexo marcam vinte para as nove.
Você acha, por acaso, que o universo paralelo ao meu é o que se reflete no espelho? Eu, sinceramente, acho que não. Caso eu passasse a minha vida inteira diante de um espelho, até poderia cogitar dessa possibilidade. Mas minhas incursões ao espelho são para lavar a cara, escovar os dentes e pentear os cabelos, pela manhã. E, ao longo do dia, sempre que passar por uma vitrine espelhada, ver o tamanho da minha barriga, de perfil.
No meu universo paralelo, que não é o espelho, os carros andam para trás, os aviões descem e os morros tem o pico enterrado no chão e a base enorme, lá em cima. Lá se escalam montanhas de cima para baixo, as vacas vivem no mar e os peixes dão em amendoeiras. Lá, choram de alegria e riem de tristeza.
Certa noite, após uma rara conjunção radiossinótica associada, ultrapassei as barreiras e me vi, subitamente, no meu universo paralelo, olhando para mim mesmo com o cabelo repartido da direita para a esquerda. Achei bizarro, porque reparto sempre da esquerda para a direita.
Lá, eu era anti-matéria e meu eu paralelo me alertou para o pouco tempo que eu tinha, antes de tudo explodir.
– Quero que tudo se exploda mesmo! – reagi.
– Então tá – falei, em paralelo.
A rara conjunção radiossinótica associada repetiu-se, numa probabilidade de uma em oitenta e sete bilhões, e dei por mim de volta ao meu próprio mundo paralelo, onde eu era, novamente, matéria.
Cogitei ter sonhado, tudo não passava de uma grande bobagem.
– Por mil salva-vidas estóicos!, – praguejei.
Olhei ao meu redor. Era tudo familiar, não havia dúvida, eu estava em casa. Fui ao banheiro e olhei atentamente meu rosto. Era ele mesmo, ao contrário, como sempre. Inclusive o cabelo, repartido da direita para a esquerda.
Eu estivera mesmo no universo paralelo ou tudo não passara de uma alucinação? Olhei bem fundo nos meus olhos ao contrário, e concluí: – E que diferença faz?
Neste momento, ouvi o ruído do motor do carro, entrando na garagem.
Em seguida ouvi a porta do carro batendo, o ruído da chave na fechadura e a porta de casa se abrindo.
Dei uma espiada rápida e corri para baixo da cama, me escondendo: eu acabara de chegar em casa.

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