QUANDO EU MENOS ESPERAR
(Outra carta ao Osmar)
Paulo Wainberg
O Osmar, você sabe, é meu correspondente que não corresponde. Ainda não sei por que insisto em mandar estas cartas, talvez lá no fundo ainda me restem esperanças, provavelmente é isto. Ele é barrigudo, solteirão convicto – não gay – e bebe cerveja. Muita cerveja. Uns dizem que boa parte da barriga é fruto da cerveja. Outros atribuem à sua vida sedentária. Outros mais à excessos alimentares. E ainda outros à tudo junto.
Mas vamos lá, à carta, vai ver, quando eu menos esperar...
Querido Osmar.
Hoje quero corrigir uma distorção histórica graças a qual a Humanidade se escravizou e ingressou no viés definitivo do cansaço e da preocupação.
Sabe ao que estou me referindo? Ao conceito de ‘dia útil’. Alguém, com certeza um recalcado qualquer, logo depois que fomos expulsos do Jardim do Éden, decidiu que dia útil é para trabalhar, ir à escola, pagar as contas, discutir com o guarda de trânsito e brigar com as crianças.
E transformou os feriados e os fins-de-semana em dias inúteis.
Você se dá conta, Osmar, do quanto nós fomos prejudicados por tão absurda idéia?
Só pensar nisso e pronto!, meu sábado está estragado porque sou um inútil e meu domingo, então, nem se fala, é véspera de dia útil! E quando tem feriadão? Dias inúteis sucessivos a nos martirizar.
E não adiantam expedientes como levar trabalho para casa ou fazer plantão na farmácia. Aí a coisa piora porque você acaba não trabalhando em casa, olha para a tarefa, deixa para depois, o tempo passa, você também e explode a crise de identidade: você é um útil inútil ou um inútil útil?
Por essas e outras, querido Osmar, é que eu continuo nesta saga de corrigir erros históricos como, por exemplo, o envelhecimento.
Falando nisso, ando com saudades da minha juventude, quando eu tinha sessenta anos. Não sei se contei a você mas andei fazendo aniversário por esses dias e ingressei na perigosa faixa dos sessenta e cinco, na qual a gente ainda pensa que pode tudo e, vai ver, não pode.
Quando eu era jovem, no auge dos meus sessenta, tais aflições não me acometiam. Eu podia tudo, mesmo! Bem, quase tudo, mas o que eu não podia não fazia falta, entende? Podia viver sem costela gorda três vezes por semana e não me importava de só ter dois remédios por dia, para tomar.
Bons tempos aqueles, quando eu não pegava no sono na frente da televisão e conseguia ir, acordado, para a cama. Quando eu caminhava uma hora e meia e continuava vivo. Quando eu não ia mais do que uma vez por noite ao banheiro, fazer xixi.
Estou errado ao considerar o envelhecimento um erro histórico? Não seria muito mais apropriado que, fisicamente, estacionássemos nos trinta? Todo mundo com cara de jovem, fazendo coisas de jovem e a cabeça melhorando, melhorando, melhorando até melhorar tanto que eu chego a chorar quando penso em tudo o que podia fazer e não fiz...
Bem, você não vai me responder mesmo, mas, repito, quem sabe? Quando eu menos esperar...
Aliás, tem coisas que a gente espera a vida inteira e não chegam. Tem outras que a gente não espera, e chegam. E tem aquelas, quando prometem a você: Quando você menos esperar...
Aí é que a porca torce o rabo, o parafuso emperra e um prego entra no teu pé. Pois esse aviso, quando você menos esperar..., é uma traição e uma covardia. Alguém te diz isso e imediatamente você começa a esperar aquilo que você menos esperava um segundo antes.
E se tem coisa que me incomoda, Osmar, é esperar. Odeio esperar. Na verdade, prefiro não esperar.
Portanto, Osmar, se você ou qualquer um tiver alguma coisa para mim, não me faça esperar, nem mais nem menos.
Um abraço afetuoso.
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