quinta-feira, 26 de agosto de 2010

ESSE CIRCO CHAMADO JUSTIÇA

UM BOM LUGAR PARA SE COCHILAR
João Eichbaum

“O primeiro bocejo foi do ministro José Antônio Dias Toffoli. Com as mãos em concha, sobre a boca. Depois foi Gilmar Mendes, com a proteção de uma das mãos, e por três vezes em menos de dez minutos. Marco Aurélio Mello o seguiu, com dois bocejos. Eles escutavam Ellen Gracie ler um relatório. A voz da ministra tem um tom agradável, mas sem modulação. Em plenário, à exceção de poucas frases curtas sobre questões pontuais, a ministra nunca fala, só lê. E sempre de maneira monocórdica”.
O texto não é meu, não. É de Luiz Makloue Carvalho, de grande cepa - como não poderia deixar de ser, com esse sobrenome - publicado na edição de agosto da revista Piauí, sob o título Data Venia, o Supremo.
Com rara felicidade, Luiz Makloue Carvalho descreve as cenas tristemente pitorescas de um julgamento no Supremo Tribunal Federal, começando, como vocês viram, pelos bocejos, gerados pelo aborrecível relatório da senhora Ellen Gracie, e terminando com uma conclusão infantil e descomprometida.
Tratava-se do julgamento de dois políticos, cujos crimes prescreveriam no dia seguinte ao daquela soporífera sessão. Com um empate em 5 a 5, decidiram suspender o julgamento, à espera do voto inútil do ministro Eros Grau, que estava viajando. Viajando às custas de quem, não se sabe. Viajando para qual finalidade, também não se sabe. E, voltando da viagem, votou, confirmando a inutilidade de sua presença. Seu voto valeu nada, como todo mundo sabia, e soou como um deboche para com os contribuintes que lhes pagam os altos salários. Os crimes já estavam prescritos, porque esperavam julgamento desde 2007.
É assim que funciona a justiça, com primatas vestidos de toga: à custa de bocejos e vozes sonolentas, lendo em tom modorrento votos e relatórios escritos por estagiários. Nem a glória de ser ministro, nem os altos salários, nem as mordomias livram os primatas bípedes das necessidades primárias: o sono, o bocejo e outras manifestações fisiológicas menos edificantes, que deixo de mencionar, para não estragar a digestão de vocês.
Eles não são melhores que ninguém, por mais que imaginem sê-lo, por mais que os empanturre a glória de ser ministro do Supremo. A única vantagem é que podem cochilar ou dormir e soltar puns debaixo da toga, durante o marasmo das sessões de julgamento, às nossas custas, enquanto batalhamos pelo pão nosso de cada dia, e enquanto perdem o sono aqueles que esperam pela sonolenta justiça deles.

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