quarta-feira, 10 de novembro de 2010

COM A PALAVRA, JANER CRISTALDO

Confesso que tenho inveja do Janer. Gostaria de ter escrito e assinado a crônica que segue, publicada por ele no domingo.
João Eichbaum

APOLOGISTA DA DROGA VENDE BEM NO BRASIL

Decididamente, eu vivo fora deste insensato mundo. Leio no Estadão que nestas duas primeiras semanas de novembro - com eventos tão díspares como Fórmula 1, Salão do Automóvel, Mostra de Cinema e shows do Black Eyed Peas, Jonas Brothers e Eminem -, São Paulo vai receber 400 mil turistas, o equivalente a toda São José do Rio Preto, que devem movimentar nada menos do que R$ 385 milhões na economia da cidade. É, de longe, o melhor momento para o mercado do turismo paulistano, que já cresceu 30% neste ano.
Que vem fazer em São Paulo esta gente toda? Fórmula 1 e Salão do Automóvel até sei o que é, mas jamais me ocorreria a ir a algum desses eventos. Até hoje não entendi que tipo de ser humano vai a uma corrida de Fórmula 1. Os carros passam voando onde está o espectador, ele vê só um risco à sua frente. Se ficasse em casa, olhando a televisão, poderia ter uma visão geral da corrida.
Quanto a cinema, confesso que ainda curto. Mas uma preguiça abissal me impede de sair de casa. Deve ser coisa da idade. Há muito desisti de ler ficções e cinema também é ficção. Prefiro catar algum filme interessante na televisão nas madrugadas. Com os televisores de última geração, se pode ter bom cinema em casa sem ter de ouvir gente comendo pipoca.
Quanto a Black Eyed Peas, Jonas Brothers e Eminem, não tenho a mínima idéia do que se trata. Me espanta que tenham público em São Paulo. Vivo fora desse mundo. Lembro que há uns vinte anos, uma sobrinha veio do Rio Grande do Sul para ver um show de um tal de U-2. Que é isso? – perguntei. Ela se escandalizou. Eu, jornalista, não sabia o que era o U-2? Não sabia, não. E não sentia falta alguma por não saber.Sei que são coisas que atraem multidões. É o máximo que sei. Ora, abomino multidões. A multidão máxima que admito é o público de uma ópera. Em verdade, não é bem o que se chama de multidão. E muito menos é uivante. Quando vejo na televisão uma massa de jovens balançando as mãos erguidas, não noto diferença alguma das multidões que saudavam Hitler, Stalin ou Kim Il Sung. Ou o papa. Dá no mesmo. Psicologia de rebanho.
Assim sendo, confesso não entendo essa histeria toda em torno a um cantor septuagenário que está no Brasil, o tal de Paul McCartney. Que se apresenta hoje, em Porto Alegre. Este sei quem é, mas nada me diz. Seguido tenho ácidas discussões com um amigo, para quem os Beatles foram revolucionários. Revolução onde? Meu amigo empunha uma canção de John Lennon:
Imagine que não há paraíso
Isso é fácil se você tentar
Sem inferno abaixo de nós
Acima de nós só o céu
Imagine todas as pessoas
Vivendo pelo hoje
Imagine que não há países
Isso não é difícil de fazer
Nada para matar ou morrer por
E sem religião também
Imagine todas as pessoas
Vivendo pelo hoje
Ora, não venha alguém me dizer que uma letrinha vagabunda dessas provocou alguma revolução. Slogans não provocam revolução alguma, apenas servem para conduzir fanáticos. Não foi a Marselhesa que provocou a Revolução Francesa. O hino serve apenas para excitar ânimos. Revoluções surgem de idéias, de pensamento, não de cançonetas. Não é cantando que não existem infernos (mas paraísos existem) que vamos lutar contra o obscurantismo. Lutar contra religiões exige pensamento, não letrinhas de grupos de rock. Mas é claro que ler um ensaio filosófico cansa mais que cinco minutos de musiquinha.
Imaginar um mundo sem religião é besteirol de adolescente, que ainda não descobriu que a humana estupidez é eterna. Dizem que os Beatles influenciaram minha geração. Se assim foi, eu a ela não pertencia. Sou mais Pedro Raimundo, Inesita Barroso, Miguel Aceves Mejía, Jorge Negrete. Não que tais cantantes tenham me influenciado. Eles me ofereciam música, não ideologia.
Nunca entendi multidões de jovens curtindo canções em língua que não entendem. Qual o percentual desse público que vai ver McCartney entende inglês? Duvido que cinco por cento. Ok, eu gosto de Kalinka, sem entender russo. Gosto do ritmo. Adoro músicas folclóricas, mesmo em línguas que não conheço. Mas folclore nasce de povo. Nada a ver com música mercenária, feita para vender. Jamais veremos multidões fanáticas, com gestos uniformizados, curtindo Kalinka.
Os Beatles fizeram fortuna com seus apelos comerciais. Claro que não escapei de ouvir suas canções, mas elas nada me disseram. O grande legado de Paul McCartney e John Lennon, a meu ver, é a apologia das drogas. Era uma bandeira respeitável nos anos 70. Os Beatles foram os grandes agentes do LSD, cocaína, maconha e congêneres. Hoje, algumas mentes brilhantes estão concluindo que quem consome drogas financia o tráfico e o crime. No entanto, continuam lotando estádios em homenagem aos apologistas da droga.Tenho boas amigas, de minha geração, que vão ver o beatle macróbio. A elas, minhas desculpas. Mas não posso deixar de dizer o que penso. Terá McCartney estádios lotados, hoje, na Inglaterra? Duvido. Veio ao país dos botocudos faturar os restos de prestígio que lhe resta. Mais ou menos como aqueles chefs franceses, cujos restaurantes em Paris vivem às moscas. Mas encontram uma clientela ingênua para vender seus peixes caríssimos no Brasil.

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