quinta-feira, 13 de abril de 2017

VIRGENS NA ZONA?
João Eichbaum

Ao completar 90 anos, o ancião resolveu dar-se de presente uma virgem. Então telefonou para Rosa Cabarcas, dona de um bordel que atendia a clientes especiais, para lhe fazer a encomenda. Esse é o enredo do último romance de Gabriel Garcia Márquez, MEMÓRIAS DE MINHAS PUTAS TRISTES.

O livro, longe daquilo que o título possa sugerir, não conta histórias de meretrício nem aventuras de alcova, mas expõe realidades da vida. Algumas chocam e enternecem, ao mesmo tempo. Outras são de uma evidência irrecusável, como a de que puteiro não é lugar para virgem.

Mas o romance de Gabriel Garcia Marques passou longe da realidade brasileira. Aqui, nesta terra onde tudo é perfeito para a felicidade dos políticos, há uma zona de meretrício pervertida pelo resplendor do poder, chamada Brasília. Desde anteontem, quando apareceu o listão da Odebrecht, ou do Janot, como queiram, soube-se que lá havia virgens.

A ninguém assombra que, na esperada lista, figurem nomes de gente que enriqueceu dando e recebendo, ao longo de uma legislatura atrás da outra. O que causa espécie é o nome de figurinhas que sempre mostraram um comportamento de freira, sem vocação nem virtudes de putas, ou a postura de Catilinas metidos a macho, donos da moral e dos bons costumes políticos.

Os eleitores pensavam que tinham as chaves das aldravas da honra das virgens que elegeram para o Senado e para a Câmara e, de repente, lá está, para escarmento geral, o nomezinho delas, no meio das rameiras que ganharam a vida só fazendo aquilo: entregando-se para a Odebrecht.

Esse é o resultado de um sistema no qual se elege o “diálogo” como instrumento de hegemonia de ideias. Há ideias que emperram no meio do caminho, porque o povo as recusa. Mas o contubérnio político chamado “diálogo” tudo resolve. Desde priscas eras é considerado bom político aquele que tem trânsito na oposição, aquele que sabe dialogar.

É claro que esse “diálogo” tem seu preço: ninguém dá nada de graça. Aí começa o rompimento do hímen da honestidade. Qualquer vantagem que contribua para a manutenção no poder deixa a honra em segundo plano. Então, desaparecido o alarme do pudor social, nada impede a prostituição.

O povo já sabia que não há virgens disponíveis na zona. Mas, parece que não estava muito convicto disso. Agora, o listão da Odebrecht apaga todas as dúvidas: todo mundo é desonesto, até prova em contrário.


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