JUSTIÇA OU BLEFE?
João Eichbaum
Quem veste a toga de juiz
por vocação não se deixa levar pela turba, aquela que pode preferir Barrabás a
Jesus Cristo. Nem decide compulsivamente, embalado pelas manchetes da imprensa.
A sentença é um juízo de valor, que se constrói entre quatro paredes, sem
exposição pública.
O juiz não pode
condescender, nem pactuar com opiniões que venham de fora dos autos. Da mesma
forma, nada pode excluir, exorcizando de sua consciência ou da lógica o que o
conteúdo dos autos lhe sopra.
O juiz não pode ser
intransigente, duro, inflexível, resistente às inovações a que se deve amoldar
o Direito, quando o impelirem transformações sociais. Nem medir com a mesma
vara, no Direito Penal, a todos os que lhe são submetidos a julgamento.
Mas, se não deve ser
inflexível, o juiz não pode também ser mole ou fácil, frouxo como massa de
moldar. Sua postura há de ser imune a influências emocionais que possam
alterar, mitigar ou endurecer o espírito das normas legais ou a matéria “sub
judice”.
Da prova clara, concreta,
indubitável, que não seja contaminada pelo testemunho vesgo ou apaixonado,
qualquer pessoa, mesmo que não seja juiz, poderá extrair uma conclusão razoável
sobre a culpabilidade do réu. Não assim, diante do sinuoso conjunto indiciário,
que não produz certeza absoluta.
Os indícios não desnudam,
por si, a verdade. Eles são apenas fios, cujo desembaraço é necessário, para
gerar convicção. São as pedras de montagem de um quebra-cabeça, de valoração
genuinamente subjetiva, que varia de pessoa para pessoa.
O conjunto indiciário,
que “doutores” mal informados chamam de “prova indiciária” (prova não é indício
e indício não é prova), planta mais perguntas do que conclusões. Nele se
instala a dúvida, diante da qual varia o comportamento dos juízes. E o
resultado pode ser a justiça verdadeira, ou um blefe.
O juiz que se fez juiz
para fazer justiça - diferente do juiz que se fez juiz porque queria emprego e
passou num concurso, ou do juiz que foi apadrinhado, para vestir toga de
desembargador ou ministro - submete o conjunto indiciário a um processo de
decantação. Não se entrega à sanha da publicidade, porque tudo pode voltar à estaca
zero.
Eis aí a diferença. O
juiz, que o é por veia e jaez, se revela “homo ex hominibus sublatus, ad
homines ipsos judicandum”: um homem tirado do meio dos homens, para julgar os
próprios homens. Por isso tem consciência de suas fraquezas. Ele não encarna
divindades, nem vive a glória: vive apenas o drama de ser juiz.
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