DEMOCRACIA SEM POVO
João Eichbaum
Quando os vândalos do MST
invadem uma propriedade, nunca encontram lá a polícia armada e preparada para
os repelir. Ninguém os recebe com gases, jatos d’água, balas de borracha. Os
proprietários que se virem, que entrem na Justiça e esperem sentados, para não
cansar.
Mas não é bem assim,
quando o povo quer ver e ouvir, ao vivo e de corpo presente, os deputados que
elegeu; quando quer fiscalizar aqueles que enchem a boca para dizer que
representam o povo.
Quando a verdadeira
democracia se põe em pé, o discurso é outro. Aquele substantivo de origem
grega, tão elogiado, tão exaltado, tão forte e poderoso para repelir a mais
remota ideia de um Estado totalitário, deixa de existir, de repente, se o povo,
sem o qual não há democracia, resolve entrar numa Assembléia Legislativa.
Ah, não, assim não. Se
não quiser ser tratado como um leão em fúria, o povo que fique do lado de fora,
não tente botar os pés naquela augusta casa. Pau no povo, polícia nele, jatos
d’água, bala de borracha, qualquer coisa que sirva à segurança dos deputados,
que lá não estariam, se não fosse o povo.
O povo, na hora de
cobrar, é um perigo para a democracia. A outra conclusão não se pode chegar,
depois daquela truculência da polícia contra o povo, que queria entrar na Assembléia
Legislativa do Rio de Janeiro, para conferir quantos e quais são os deputados
que gostam de corrupção.
E, como se não bastasse a
violência, os deputados partiram para o embuste: convocaram os funcionários da
casa à ocupação de todos os lugares destinados à assistência. Assim, o povo não
seria repelido por ser o povo, mas por não haver lugares disponíveis, para o
distinto povo, senhoras e senhores.
De modo que, sem o povo,
os deputados puderam agir como agem os salteadores, aproveitando a ausência dos
donos da casa: vilipendiaram o mandato. Tomaram para si o que era do povo, o
direito de fiscalizar seus mandatários.
Por 39 votos contra 19, os
deploráveis personagens de mais uma história de malfeitos dessa República
transformaram a Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro em valhacouto:
livraram da prisão seu presidente Jorge Picciani e os deputados Paulo Melo e
Edson Albertassi, acusados de corrupção.
Quer dizer: o povo, além
de apanhar, não ganhou a senha para abrir a caverna construída pela
Constituição Estadual do Rio, que acoita os Ali Babás cariocas e seus
sequazes. Que, no caso, eram trinta e
nove.
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