OS INTERNAUTAS E AS DESGRAÇAS
ALHEIAS
João Eichbaum
Um aparente descaso dos
noticiários e a falta de solidariedade dos internautas encobrem o
desaparecimento do submarino argentino ARA San Juan. Além do cotidiano
exercício do rancor, somente
manifestações sobre coisas de menor importância continuam ocupando o
espaço das redes sociais.
Mas, ligeiras noções de
antropologia podem explicar o fenômeno. O animal humano, antes de tudo, ama-se
a si mesmo sobre todas as coisas: é egoísta. Seguem-se, na ordem de suas
propriedades, o epicurismo e o pragmatismo, em versão mais branda do que as
teorias filosóficas nesse campo.
Para quem não sabe: epicurismo
é o culto do prazer, e pragmatismo, a tendência para ver e fazer as coisas a
partir do lado prático, economizando
esforço. Evidentemente, ninguém quer ser infeliz. Todo o homem anda à procura
da felicidade e, quanto menores forem as dificuldades para alcançá-la, tanto
melhor será.
Pela ordem, a quarta
propriedade que marca o ser humano é sua natureza gregária: o homem, como os
outros animais, não pode viver só. Sua convivência em grupo é exigida pela lei
básica da preservação da espécie.
Exatamente por força desse
convívio, nascem os sentimentos de comiseração, de solidariedade, de compaixão,
de apego. Promovem-nos primeiramente os laços de sangue, a família, o
parentesco. Depois, a intimidade, gerada pela convivência mais estreita no
grupo social.
O que sobra dessa corrente de
afeto vai para o resto da humanidade, se é que não se esgota no gato, no
cachorrinho ou nos peixinhos do aquário.
Hoje, quando já não há
distância, nem falta de informação para se saber o que acontece no mundo, as
desgraças alheias agasalham um potencial maior de comoção. Algumas, mais do que
outras. Por exemplo, a foto daquele menino morto, de bruços sobre a areia, onde
fora despejado pelo mar, arrancou lágrimas, protestos e revolta em todo o
mundo. Era uma criança indefesa, jogada ao léu pelo destino, refugada pela
vida, abandonada pelos deuses.
A tragédia dos jogadores da
Chapecoense também verteu nas redes sociais uma tristeza sem força para reter
as lágrimas de muita gente. Já o caso do
submarino argentino, mais próximo do mistério do que da realidade sangrenta,
por enquanto não passa da presunção de uma desgraça. Na verdade, só os fatos,
dando vida à notícia, agasalham um potencial maior de comoção pela dor alheia.
A mesma força virtual não a tem a presunção, o imaginável.
Por enquanto, fiéis às regras
da natureza, os internautas das redes sociais mantêm o usual entretenimento com
as coisas que dizem respeito a seu ego: o prazer de mostrar ao mundo que
existem, e as tentativas de remover, no grito, os empecilhos à sua felicidade.
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