O
LIMBO DAS FUTILIDADES
João
Eichbaum
Entre
os inúmeros fenômenos que intrigam a quem gostaria de levar a espécie humana a
sério, um se salienta: pessoas comuns se negam a si mesmas, deixam de viver sua
vida, de passear, de fazer um amor gostoso, para desperdiçar seu tempo com
coisas alheias.
Dias
atrás, não houve veículo de comunicação no mundo inteiro que não se ocupasse do
nascimento de mais um primata humano na família monárquica da Inglaterra.
Matéria de primeira página nos jornais, o assunto foi tratado como se toda a
humanidade dependesse dele.
O
que provocava desdenhoso sacudir de ombros em quem tem a cabeça no lugar e só
empresta valor às coisas de que se possa tirar algum proveito, para outros foi
motivo de orgasmo fora dos lençóis: impávidos aduladores se aglomeravam na
frente do palácio, com o celular na mão, para fotografar um monte de panos que
embrulhavam um ser humano, que em nada é ou será diferente das demais criaturas
deste planeta.
Haverá
algum psiquiatra ou psicólogo que tenha capacidade de dissecar essa tendência,
que a maioria dos homens têm, de se diminuir, de se desvalorizar, de abrir mão
de seu próprio ego, para canalizar suas emoções na direção de outro ente, feito
de carne e osso e sujeito a todas as misérias da natureza, como qualquer
animal?
O
que leva uma população inteira, como a da Inglaterra, a admitir e a assimilar
essa farsa milenar que privilegia alguns seres humanos, dispensando-os até dos fracassos,
quando a realidade da vida mostra a outra face, a da miséria, a da fome, a da
escravidão, a da tortura, a do aniquilamento moral e físico de outros?
A
tão combatida desigualdade social tem aí sua nascente. É o próprio povo que se
submete, que escolhe a parte de baixo do estrato social, onde se entoca, para
de lá se deslumbrar com o esplendor de seus ídolos de barro: reis, rainhas,
príncipes, princesas, papas, e outras majestades menores.
Não
fosse a admiração ou a idolatria que lhes é votada, não haveria ídolos. Ídolos
ignorados não se criam, não se desenvolvem, continuam na sombra do
desconhecimento público. A fama é que os endeusa, que os leva aos estratos
superiores e deixa, para os que ficam nos andares de baixo, o consolo de
viverem felicidades menores, no hiato de seus grandes problemas.
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