MALDITO FRUTO DO TEU VENTRE
Mariléia
Sell
Nesta
semana, a pesquisadora e professora de direito da Universidade de Brasília,
Bebora Diniz, recebeu ameaças de morte por seus posicionamentos sobre os
direitos das mulheres. A professora é referência internacional em bioética e
tem na sua pauta as agendas feministas, os direitos humanos e os direitos
reprodutivos. Ela é reconhecida como uma das cem mais importantes pensadoras do
mundo por seu trabalho sobre as grávidas que contraíram o zika vírus. Em suas
palestras e entrevistas, ela tem defendido a descriminalização do aborto. Ou
seja, ela é do demônio. Não fosse a vigilância de pessoas preocupadas com a
vida, com os costumes e com a moral, provavelmente descambaríamos para a
barbárie.
O debate
sobre a descriminalização do aborto, no Brasil, é feito prioritariamente por
homens, homens que fazem as leis, homens tementes a Deus, homens que misturam
igreja e política, em franca inobservância da nossa legislação. Homens que
controlam os discursos sobre os corpos e sobre as escolhas das mulheres desde o
período neolítico. Homens que, baseados em sua experiência milenar, sabem que a
realização da mulher se dá na maternidade e na domesticidade. Homens que
comprovaram, na ciência do século XIX, que as mulheres são seres não pensantes,
justamente por terem um útero. Por isso mesmo, os homens é que pensam por elas.
A eles cabe a elevada tarefa dos contratos sociais!
No
Brasil, as mulheres podem interromper a gravidez somente em três
situações: em casos de estupro, risco de morte para a mãe, ou diagnóstico
de anencefalia. Abortos que extrapolem esse espectro são considerados crime e
dão cadeia de um a três anos para a mulher. No Brasil, acontecem cerca de um
milhão de abortos clandestinos por ano. Desses, 250 mil resultam em internações
por complicações e a cada dois dias uma mulher morre no país. De acordo com
dados do Datasus, em 2016 foram gastos R$ 46.779.250,35 com as internações. Não
precisa ser versado em política e economia para concluir que esse dinheiro
poderia ser investido em políticas públicas de saúde, em planejamento familiar,
em informação. Em países que adotam essa prática, como a França, o Uruguai, a
Espanha e Cuba, os índices de aborto baixaram drasticamente, o que invalida o
argumento de que a legalização transformaria o aborto em um método
contraceptivo.
Os
métodos para abortar são os mais variados e vão desde o consumo de remédios ao
uso de objetos como agulhas. O recorte de classe aqui é inevitável: as mais
pobres morrem mais. Quem tem dinheiro recorre a clínicas e com aproximadamente
R$ 5 mil resolve a situação. Uma coisa é certa: pobre ou rica, na legalidade ou
na ilegalidade, nada impede uma mulher de fazer aborto. Outra coisa é certa
também: isso nunca acontece sem sofrimento e sem devastação psicológica.
Em
culturas marcadamente machistas como a brasileira, os filhos acabam sendo
responsabilidade maior das mulheres. É a mulher que fica, muitas vezes,
impedida de trabalhar e de estudar porque não tem onde deixar seus filhos.
5,5 milhões de crianças brasileiras sequer são registradas pelos seus pais
e cerca de 100 mil processos correm contra pais que não pagam a pensão
alimentícia. Além disso, as tarefas domésticas, que envolvem o cuidado com a
vida da família, esse trabalho invisível e extenuante, ainda são
responsabilidade da mulher. Em comparação ao homem, a mulher gasta três vezes
mais tempo com a casa. Não seria razoável, então, ouvir as mulheres sobre essa
questão da legalização do aborto?
A
legalização do aborto é um debate urgente e deve ser feito sem hipocrisias e
falsos moralismos. Sem as hipocrisias de quem ‘defende a vida’, mas que convive
muito bem com o abandono e a miséria das crianças brasileiras. Sem o
descaramento daqueles que são contrários à legalização do aborto, mas que
defendem que bandido bom é bandido morto, ou que querem jogar as crianças que
deram errado na cadeia. A miséria, a cadeia, o abandono de todas as ordens
(incluindo o intelectual), a violência e a morte, aliás, são muito bem
assimiladas pelos moralistas, o que não se tolera nesse país é a ideia de a
mulher decidir sobre o seu corpo. A ideia de uma mulher pensadora tomar o
microfone e defender direitos. Afinal de contas, há limites para o que pode ser
tolerado, não é mesmo?
Mariléia
Sell é Professora Doutora dos Cursos de Letras e Comunicação da Unisinos
Um comentário:
Uma prova de que mulher tem uma certa dificuldade de pensar, de que seria meio que desajeitada para encarar os universais pela abstração que é a atividade própria do filosofar é este texto. Puta que pariu, se há bandidos fruto de gravidezes que foram adiante, mas pelo menos eles tiveram a chance de viver e se são bandidos, que sejam processados, julgados e condenados se tudo se confirmar contra a conduta dos mesmos e mesmo em um caso de pena de morte contra os tais haverá um processo. Mas, por que citar a marginalidade em caso de pobreza? Ser pobre é ser bandido? Eu mal tenho dinheiro para comprar os meus cigarros e se os compro, os compro dos mais baratos, mas nem sequer penso em roubar um só palito de fósforo alheio, porra! Não sei, mas talvez um útero atrapalhe o raciocínio, tanto que a palavra histeria vem do termo grego para útero, algo feminino, ou seja, a fulana toma o que meramente sente como se fato fosse, a tal doida, meu Deus!
Uma pessoa que vive, mesmo que sofra como um cão falta de dinheiro ou de saúde, sempre quererá estar viva ou de ao menos ter tido a chance de ter nascido do que ter sido abortada, evidentemente. Mas será que mulher não pensa? É isso? Por isso quase não há filósofas na história da Filosofia?
Postar um comentário