DOS ANTIGOS CARNAVAIS
AO BURACO DO BOI
João Eichbaum
Agora não tem mais farra, confete,
serpentina, glitter, bumbos e bundas, tamborins e reco-recos. Nem ceva
geladinha, champanhe e paqueras no camarote da Brahma. Com a vida estragada
pela propina, Eike Batista deve ter saudade de muitos carnavais. Sua ex-mulher,
Luma de Oliveira, foi a mais inesquecível das rainhas de bateria. Com aquele
corpo torneado, farto em ancas, coxas, arredondados traseiros e um frontispício
de fazer frade babar na barba, ela irradiava uma beleza delirante.
Muita beleza tinha ela, e
ele, muito dinheiro. Esses dois ímãs, cuja atração é inevitável, por mais distantes
que estejam um do outro, servem sempre para unir o fútil ao agradável. Todo
homem gosta de mulheres lindas e toda mulher linda, que sabe preservar sua
beleza, não a entrega para qualquer pobretão. Há, exceções, é claro,
confirmando essa regra milenar, que inclui Cinderelas e Brancas de Neve por
esse mundo afora.
Imagine-se o que passa pela
cabeça desse homem, de cuja biografia fez parte a exuberante Luma de Oliveira,
agora confinado entre quatro paredes, com machos que sofrem os efeitos da
abstinência sexual e que ali estão com ele porque não são santos. Provavelmente
ele já tinha ouvido falar da lenda segundo a qual todo o novato na cadeia é
sorteado entre os mais antigos para servir de mulher.
Sabe lá o que é deitar de
costas para a parede, e assim ficar a noite inteira, teso, sem poder se virar?
Aí vem o sono insone do medo, deixando o vivente de olho aceso e o ouvido
atento a qualquer ruído, a qualquer movimento dentro e fora da cela. Tenso,
alerta, de olhos abertos e de ouvidos em pé, e o filme da vida em outros
carnavais rodando em sua cabeça.
Mas isso não é tudo. Tem
aquele momento crítico, quando os intestinos dão o sinal de que precisam
trabalhar. Lá está o boi, aquele buraco revestido de louça, que serve de
latrina, sobre o qual o sujeito tem de se acocorar para dar vazão às
necessidades que pedem saída pelo reto. Ali ele fica exposto para o que der e
vier, sem a mínima condição de defesa.
Que rainha da bateria, que
nada! É ali que o homem, nu, se depara com o terror de existir, porque encontra
aquela verdade que muitos filósofos recusam e para a qual fecham os olhos os
que veem o ser humano como concepção divina, revestida de dignidade. A verdade
do boi salienta o que o homem verdadeiramente é: um animal despojado de toda a
grandeza, de todo o poder, feito escravo das necessidades animalescas comuns,
que nada têm de poesia, e botam o papa e o morador de rua no mesmo nível.
Acocorado daquele jeito, nem
todo o dinheiro do mundo lhe servirá para comprar uma postura que o coloque
acima dos demais seres humanos. A menos que os idólatras dos “direitos humanos”
encontrem, em suas cavilações, algum outro modo de se livrar dos excrementos,
com dignidade.
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