sexta-feira, 17 de fevereiro de 2017

É MOLE?
João Eichbaum

Há juízes que se têm por zelosos guardiães da honra alheia. Comparada com a honra, a Constituição Federal não tem valor para eles. A caneta dos meritíssimos está sempre engatilhada para desagravar xingamentos e safadezas de maior calibre, que mancham o pundonor de ilustres figuras desta República.
Mas, às vezes, como dizia o velho latim, o “summum jus” se transforma em “summa injuria”. Olhem o que fez jorrar por aí o despacho do vara federal de Brasília. O magistrado impediu a Folha de São Paulo de divulgar os achados num áudio, em que um hacker prometia botar o nome de Michel Temer na lama.
A censura judicial adicionou pimenta na criatividade popular, quando se soube que o hacker tinha falado assim para a Marcela, a esposa recata e do lar: “pois bem que achei que esse áudio joga o nome de vosso marido na lama, quando você disse que ele tem um marqueteiro que faz a parte baixo nível... Tenho uma lista de repórteres que oferecem 100 mil cada pelo material".
Pronto. Isso bastou para a proibição do juiz virar lenda urbana, com relatados e sucedidos de pura invenção. Falou “lama” e teve gente que ouviu “cama”. Daí, a se lembrar do pré-octogenário, tentando auferir benefícios de cama, numa luta sem trégua, de fazer vazar mesóclises pelo colarinho, e a natureza mandando vento contra, foi bem menos do que um passo.
Tem gente cuja imaginação até gemidos, suspiros e todos os efeitos sonoros de recreações de cama criou no áudio. Outros deram maior vazão à criatividade, detectando murmúrios de alcova, daqueles que tratam de variações sobre o mesmo tema: agora vamos fazer o “canguru perneta”, não, não, esse eu não posso, me dói a coluna. Nem a do “franguinho assado”...? Alguns, mais liberais, se lembraram do Caetano Veloso, cantando o “cucurucucu Paloma”. Mas ninguém se lembrou do verso do Vinicius: “enquanto eu tiver língua e dedo, mulher não me mete medo”.
Houve ainda quem pensasse no companheiro Che Guevara: tem que endurecer sem perder a ternura, lembrando desses momentos péssimos, em que o sujeito da honra preservada preferia ter ficado na casa da sogra, cuidando do pequinês dela, enquanto ela partia pra balada funkeira. Seria melhor do que ter ficado a ver navios na cama, muito pra cá de Bagdad.

Viram no que dá, se meter a anjo da guarda da honra alheia? A censura pode dar com os burros n’água e o protegido tem que ficar de quatro, tentando juntar os cacos duma honra sexual que foi ferida por engano, depois de botar cinco delegados de polícia, 25 investigadores e três peritos à caça de um mísero hacker!

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