sexta-feira, 6 de outubro de 2017

PENA DE MORTE, SEM CONDENAÇÃO
João Eichbaum
A delação premiada, que sustenta as investigações da chamada Operação Lava Jato bem como as acusações e condenações dela decorrentes, já mostrou seu lado fraco e deixou muitas indagações no ar, com o caso do Joesley Batista.
Não é preciso ser psicólogo, para extrair daquele sujeitinho uma personalidade de não levar fé, com fortes tendências para o exibicionismo, temperada malandragem de quem conhece mais a vida do que a burocracia, e um olhar de terneiro desmamado, para seduzir incautos. O diálogo dele com Ricardo Saud, pontilhado de fofocas e mimimis, revela quem são os dois.
Tal foi o fiasco, que já estão sob suspeita as provas (provas?) atreladas àquela delação. E os delatores acabaram na cadeia, contaminando com alto grau de desconfiança todo o trabalho realizado pela polícia, bem como os benefícios concedidos pelo Ministério Público Federal aos parlapatões.
A avó remotíssima da Lei 12.850 é a “santa” Inquisição. Dos cruéis procedimentos daquela criminosa forma de arrancar confissões, os legisladores da Itália, da Alemanha e dos Estados Unidos só aproveitaram a tortura da prisão, porque o conceito moderno de Direito não permite espremer bagos em máquina de moer carne.
O Brasil não ficou para trás. A macaquice jurídica trouxe para cá essa ideia, que é um escárnio à visão científica do Direito. Apesar de todas as juras de amor aos direitos humanos e de todos os atrasos sociais que impedem os brasileiros de terem a mesma educação haurida nos países desenvolvidos, foi aprovada a Lei 12.850/13.
Aqui, como fomento à tortura da prisão, temos o espetáculo da mídia, o orgasmo da imprensa, que não tem o mínimo escrúpulo em dizimar reputações, aumentando o tamanho da humilhação, na proporção que diminui o caráter dos acusados por presunção: a prisão remove a mais cândida inocência.
 Já para o mau caráter basta a ameaça de prisão. Aí, ele já vomita o que lhe dá no bestunto, em troca das bem-aventuranças oferecidas no sermão do Ministério Público.
Agora temos a primeira vítima fatal dessa lei iníqua. Preso em decorrência da Operação Ouvidos Moucos, realizada pela Polícia Federal, o reitor da Universidade Federal de Santa Catarina, Luis Carlos Cancellier de Olivo, pôs termo à própria vida. “Minha morte foi decretada no dia da minha prisão”, escreveu ele num bilhete, antes de se suicidar.

Um país que consagra o princípio constitucional da inocência presumida, mas permite, na legislação ordinária, a prisão por conjecturas, constrói uma hipocrisia jurídica. Complacente, o STF não cumpre sua função institucional. O resultado são desgraças como essa: a pena de morte, para quem não teve oportunidade de provar sua inocência.

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