VIVER
TANTO, PARA QUÊ?
João
Eichbaum
Em
sua coluna de terça-feira última, na Folha de São Paulo, a jornalista Mirian
Goldenberg refere o cientista inglês Aubrey de Grey que, segundo ela, “pretende
criar, nos próximos 20 anos, medicamentos
e tratamentos para reduzir ou reparar os danos provocados pelo envelhecimento”.
A ideia de Aubrey é de uma longevidade de até mil anos.
Mirian então partiu para uma enquete pessoal,
indagando às pessoas se elas gostariam de viver até mil anos. Resultado: metade
não quer. E a jornalista cita um colega seu, de 63 anos, cujo nome não divulga,
que dá suas razões para não se entusiasmar com Aubrey de Grey.
“Deus me
livre – diz o entrevistado por Mirian. Já vivi bastante, já está bom. Tenho
tantos problemas com filhos, trabalho, família que não quero viver muito mais.
Tudo tem limite, um ponto de saturação. As pessoas estão muito chatas, eu
também estou muito chato. Se eu chegar aos 80, com boa saúde e dinheiro
suficiente, já está bom demais. Mesmo assim vai ser difícil aguentar tanta
burrice, violência e roubalheira."
Resumo perfeito da vida, no que concerne ao
animal humano. Se os demais seres orgânicos têm sua limitação imposta pela
natureza, que razões teria o animal humano para escapar de tal regra?
Animal essencialmente social que é, o homem, em
razão disso, não tem absoluta liberdade para decidir sobre si mesmo. Há
inúmeros vínculos que o prendem ao grupo, principalmente necessidades cujo
suprimento depende desse grupo.
A fim de não onerar o grupo, se quiser viver
até mil anos o homem terá que manter sua capacidade produtiva. Sem isso, não
haverá previdência suficiente para mantê-lo no ócio. Mais sensível é o ponto de
saturação no grupo do que no indivíduo. E quando chega a esse ponto, entra em
vigor a lei do predador, imposta pela natureza. No caso do homem, seu predador
é o próprio homem e o instrumento predatório será a desintegração social.
A longevidade nos tempos de hoje, que não é lá
essas coisas, já dá mostras desse fenômeno. A celeridade da evolução, produzida
pela tecnologia e somada à mudança de costumes, vai deixando os velhos de
escanteio, desconectados da nova realidade, ou gerando neles a insatisfação, a
revolta contra “tudo isso que aí está”. São os sintomas da desintegração
social, que não permitirão uma vida digna até mil anos.
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