quinta-feira, 9 de julho de 2009

A VOLTA DE PAULO WAINBERG - PARA NOSSO GÁUDIO

CRÔNICAS CELESTIAIS

PARAISO POSSÍVEL
Paulo Wainberg


O paraíso do intelectual deve ser a oficina mecânica. Esse homem sisudo que, ao longo da vida, dedicou-se a profundos pensamentos, leituras constantes, preocupações existenciais, divagações filosóficas e abstração constante, merece passar o resto da eternidade enfiando as mãos na graxa, aparafusando e desparafusando, consertando telhados e construindo esquadrias, casas de cachorro, trocando lâmpadas e levando choques leves ao acoplar relés em baterias usadas. Nenhuma outra preocupação invadirá a mente do intelectual que ultrapasse os limites da espessura de uma madeira compensada, a utilização de uma bobina ou a capacidade de flutuação da bóia, na caixa d’água da privada.

O paraíso da dona de casa deve ser um imenso bordel, onde ela terá mil homens e receberá uma grana. Um lugar perfeito para que ela diga, durante a transa, todos os palavrões e as frases sujas que jamais teve coragem, quando fazia amor com o marido. O espaço fantástico onde todas as fantasias reprimidas são possíveis, todas as posições são aceitáveis, todas as experiências são válidas e jamais, jamais mesmo durante toda a eternidade, um filho baterá na porta do quarto dizendo que está com sede. Ou com medo. Essa virtuosa mulher que, ao longo da vida, dedicou-se à família e ao marido, temente a Deus e cumpridora das regras religiosas, merece infinitos prêmios a compensar sua carga de frustração e desejos reprimidos, cabendo-lhe, sim senhor, uma eternidade em constante orgia, prazer e sacanagem.

O paraíso do idoso deve ser uma grande piscina de água tépida, sob um permanente sol de um céu sem nuvens, repleto de garotas de vinte anos a brincar, gargalhar e coquetear ao seu redor, todas de biquini, enquanto ele saboreia seu drinque preferido.

O paraíso do operário deve ser uma imensa fábrica onde ele seja o dono e onde trabalhem mil operários para ele.

O paraíso do político deve ser um inferno com ar condicionado e um jantar anual com o Demônio em pessoa.

O paraíso da avó deve ser um extraordinário laboratório que devolva a maciez de sua pele, o fulgor da juventude, o brilho da adolescência, a limpidez do olhar, a cor original dos cabelos e a tesão de antigamente.

O paraíso do orador deve ser uma grande platéia sem sono.

O paraíso da mulher amada deve ser um local verdejante, intrincado, emaranhado, com caminhos que não se cruzam, labirintos que não se esgotam, onde o aroma de mel se mistura com fuligem, onde gosto de leite condensado se mistura com pimenta, onde a paixão regurgita como um recém-nascido, onde o seio é uma dádiva e o mistério não se esgota.

O paraíso do estivador deve ter mil máquinas de erguer peso e mil cadeiras de balanço onde ele, a balançar-se, toma limonada, como carne de sol e pita seu cachimbo.

O paraíso dos anjos deve ser repleto de sexo e o paraíso do sultão não tem mulheres.

No paraíso da minha secretária eu não existo

O paraíso dos maridos deve ter mil aparelhos de TV, infinitas cervejas no congelador, pipoca a dar de relho e futebol o tempo todo. E – isto é fundamental – nenhuma esposa a reclamar.

O paraíso da esposa tem maridos que fazem de tudo, pagam as contas e nunca se queixam.

O paraíso das crianças não tem passado, não tem futuro, só tem presente.

O paraíso do psicopata é repleto de otários.

O meu paraíso? Quem me dera acreditar em paraísos.

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