quarta-feira, 8 de setembro de 2010

COM A PALAVRA, JANER CRISTALDO

VATICANO NEGARÁ BÍBLIAPARA DEFENDER IRANIANA?

Comentando, no início do mês passado, a hipócrita intervenção de Lula no caso da iraniana condenada à lapidação em Tabriz, eu escrevia que as raízes da prática estão, em verdade, na Bíblia. Nos Evangelhos, temos o episódio da adúltera que estava prestes a ser lapidada, segundo a lei judaica, e Jesus tomou sua defesa. É o momento do famoso “aquele dentre vós que está sem pecado seja o primeiro que lhe atire uma pedra”. No que de mim dependesse, eu atiraria todas. Ateu sendo, pecado é coisa que desconheço.
Lapidação não é prática original dos muçulmanos, mas do Antigo Testamento. No Levítico, a execução dos adúlteros é lei: “O homem que adulterar com a mulher de outro, sim, aquele que adulterar com a mulher do seu próximo, certamente será morto, tanto o adúltero, como a adúltera”.
Diga-se de passagem, a prática nem consta do Corão. Foi introduzida na Sharia, a lei islâmica, através de um "hadith", leis baseadas em episódios da vida do Profeta ou nos seus conselhos. Esteja ou não no Corão, é penalidade imposta a adúlteros em vários países islâmicos.Com detalhes perversos: as pedras não podem ser tão grandes que provoquem a morte imediata, nem tão pequenas que não provoquem a morte. O ritual dura em torno de duas horas. Decididamente, os filhos de Alá devem ter muito estômago. Pois haja estômago para matar a pedradas uma mulher enterrada na areia.
Se os judeus se civilizaram e hoje não mais lapidam mulheres, o mesmo não ocorreu com os muçulmanos. Ocorre que o islamismo é uma das três religiões ditas abraâmicas. Tem suas origens na Bíblia – da mesma forma que o cristianismo se apossou do Antigo Testamento – e Abraão é um de seus profetas.
O Vaticano disse ontem que poderá intervir, por meio de canais diplomáticos, em apoio à iraniana Sakineh Ashtiani, sentenciada à morte por apedrejamento após ser condenada por adultério e pelo assassinato do seu ex-marido. É o que leio nos jornais de hoje. A declaração do porta-voz da Santa Sé, Federico Lombardi, ocorre após o filho dela, Sajjad Ghaderzadeh, ter apelado ao papa Bento XVI e ao governo da Itália, em entrevista, para que salvem a vida da mãe.
"A Santa Sé acompanha o caso com atenção e participação", diz Lombardi, em comunicado. Perguntinha a quem interessar possa: qual é mesmo livro que prega a lapidação? Ora, direis, hoje a Igreja Católica não lapida mais mulheres, apesar de tê-las torturado e queimado através dos séculos. Mas a lapidação é prescrita no Pentateuco e, segundo o testemunho de João, persistia até os dias do Cristo.
Nisto reside a grande contradição da Igreja de Roma. Como base de sua fé, adota um livro bárbaro, que prega não só a lapidação de mulheres, como a lei de talião, a escravidão, a destruição dos altares de outras tribos e o genocídio. Claro está que a Santa Sé não mais defende tais prescrições. Mas tampouco renega o Livro. Muito menos o deus cruel e inumano que o permeia. O Vaticano seria mais coerente se apoiasse o apedrejamento de Sakineh.

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