terça-feira, 13 de setembro de 2016

MAU USO DA FERRAMENTA

João Eichbaum

"Senhor presidente, com meu agradecimento ao azo do registro da ocasião, estou seguro de que a história desta Casa inscreverá devidamente a Presidência de Vossa Excelência em seus anais".

Qualquer pessoa medianamente versada no vernáculo não se deixaria abater por escrúpulos, ao deparar com o texto acima. Instada que fosse a analisá-lo, sentir-se-ia agredida em sua cultura e desabafaria: “foi escrito por um analfabeto funcional”.

“Meu agradecimento ao azo do registro da ocasião...” O que teria feito o “azo”, para merecer a gratidão do autor do texto? Azo, meus amigos, é um substantivo masculino: sinônimo, exatamente, de “ocasião”. Então, traduzida, a frase quer dizer isso: “meu agradecimento à ocasião do registro da ocasião”. Três substantivos que, juntos, não dizem coisa com coisa.

De fato, se o texto for submetido à análise sintática, os três substantivos acima referidos, “azo, registro e ocasião”, não terão função alguma na oração. São, não só do ponto de vista sintático, como do ponto vista do conteúdo do texto, palavras mortas, sem sentido.

Feitos os agradecimentos ao “azo”, o autor do texto se diz “seguro de que a história desta Casa inscreverá devidamente a Presidência de Vossa Excelência em seus anais". Como poderá a história inscrever a Presidência...em seus anais”? O substantivo “anais” é sinônimo de “história”. Mas também significa “obra que relata os acontecimentos de cada ano”. Nesse último sentido, os anais é que registram a história.

A etimologia do vocábulo “anais” se deve a dois substantivos latinos: annus e anus. Do modo como foi (mal) redigido o texto, os “anais” podem se referir ao traseiro da pessoa referida como “Vossa Excelência”.

Esse texto obtuso, avesso a regras primárias de redação, é - segundo a Folha - da lavra do ministro Luiz Edson Fachin. Ele o teria dirigido a Ricardo Lewandowski, repassando-o, ao mesmo tempo, aos demais ministros do STF. Luiz Fachin é “doutor” e professor da Universidade Federal do Paraná. Um lembrete: a única ferramenta de que ele dispôs para chegar até lá foi a linguagem.









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