sexta-feira, 23 de dezembro de 2016

INFELIZ NATAL

João Eichbaum

De repente, a vida perdeu seu horizonte. Tudo ficou sombrio e confuso, sem perspectivas. Não há um ponto fixo que se ofereça para o repouso de um olhar. Ele se sente um traste, um nada. Sente-se como alguém que não tem importância para si mesmo. E logo agora, no Natal. Quando espocarem espumantes e foguetes, quando o alarido de crianças felizes ressoar em algum lugar, a única resposta será a dor no peito, a vontade de chorar, a aflição.

Ah, e faltarão palavras que sejam desacompanhadas de lágrimas! Porque nada mais tem sentido neste Natal para quem perdeu o emprego, para o pai de família que fica devendo alegria para seus filhos. Ele não sabe explicar, diante da muda indagação deles, por que os estragos da vida não são iguais para todos. E a única resposta que lhes pode dar, quando perguntam pelas coisas que já começam a faltar na mesa é uma só: estou desempregado.

Atribulado pelas ameaças da miséria, ele talvez nem se dê conta de que a fonte de suas desgraças é uma coisa chamada propina. Que essa coisa acabou fechando empresas, abortando empreendimentos que geravam empregos: a economia começou a sucumbir sob o peso da iniquidade. O resultado das pedras de dominó, que desabaram em cadeia, foi a escuridão de uma vida sem perspectivas.

Das propinas para licitações às propinas para aprovar Medidas Provisórias, o caminho da corrupção foi deixando marcas. Marcas e apelidos. Em sua trajetória foi arrastando matreiras raposas, assim como lobos rapaces, abrigados sob a lã de cordeiros. A lista imensa, encabeçada pelo Caju, pelo Justiça e pelo Índio, está na imprensa e nas redes sociais, revelando o mais abjeto episódio da história política do Brasil: o exercício da função legislativa para embolsar dinheiro sujo.

Para os desempregados não haverá Natal. Mas, para os culpados, fechados em seus gabinetes em Brasília, tramando contra juízes, procuradores e policiais, nenhuma diferença haverá. Será o mesmo Natal de sempre, o Natal da fartura, do luxo, do desperdício e dos banquetes nababescos, inspirados pela irônica certeza de que pior do que a morte, só vida de pobre.


Eles conhecem a força do poder que os embriaga. Diante do tamanho sobrenatural de seu ego, a lei se torna massa de moldar. Por isso, podem festejar à vontade. Nada que uma prescrição, uma anistia, uma descriminalização da corrupção ou uma mudança na Constituição não resolva. 

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