INFELIZ NATAL
João Eichbaum
De repente, a vida perdeu
seu horizonte. Tudo ficou sombrio e confuso, sem perspectivas. Não há um ponto
fixo que se ofereça para o repouso de um olhar. Ele se sente um traste, um
nada. Sente-se como alguém que não tem importância para si mesmo. E logo agora,
no Natal. Quando espocarem espumantes e foguetes, quando o alarido de crianças
felizes ressoar em algum lugar, a única resposta será a dor no peito, a vontade
de chorar, a aflição.
Ah, e faltarão palavras que
sejam desacompanhadas de lágrimas! Porque nada mais tem sentido neste Natal
para quem perdeu o emprego, para o pai de família que fica devendo alegria para
seus filhos. Ele não sabe explicar, diante da muda indagação deles, por que os
estragos da vida não são iguais para todos. E a única resposta que lhes pode
dar, quando perguntam pelas coisas que já começam a faltar na mesa é uma só:
estou desempregado.
Atribulado pelas ameaças da
miséria, ele talvez nem se dê conta de que a fonte de suas desgraças é uma
coisa chamada propina. Que essa coisa acabou fechando empresas, abortando
empreendimentos que geravam empregos: a economia começou a sucumbir sob o peso
da iniquidade. O resultado das pedras de dominó, que desabaram em cadeia, foi a
escuridão de uma vida sem perspectivas.
Das propinas para licitações
às propinas para aprovar Medidas Provisórias, o caminho da corrupção foi
deixando marcas. Marcas e apelidos. Em sua trajetória foi arrastando matreiras
raposas, assim como lobos rapaces, abrigados sob a lã de cordeiros. A lista
imensa, encabeçada pelo Caju, pelo Justiça e pelo Índio, está na imprensa e nas
redes sociais, revelando o mais abjeto episódio da história política do Brasil:
o exercício da função legislativa para embolsar dinheiro sujo.
Para os desempregados não
haverá Natal. Mas, para os culpados, fechados em seus gabinetes em Brasília,
tramando contra juízes, procuradores e policiais, nenhuma diferença haverá. Será
o mesmo Natal de sempre, o Natal da fartura, do luxo, do desperdício e dos
banquetes nababescos, inspirados pela irônica certeza de que pior do que a
morte, só vida de pobre.
Eles conhecem a força do
poder que os embriaga. Diante do tamanho sobrenatural de seu ego, a lei se
torna massa de moldar. Por isso, podem festejar à vontade. Nada que uma prescrição,
uma anistia, uma descriminalização da corrupção ou uma mudança na Constituição
não resolva.
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