sexta-feira, 23 de maio de 2008

COISAS DA VIDA

Cartinha de Basileno Polidoro, da cidade de São Leopoldo, para seu primo Telegôncio Miranda, residente no Rio de Janeiro.

Pois inventei de remeter minha pessoinha, recém formada em bacharelismo de direito, para a vila Santo André, a fim de desfrutar dos benefícios de noivado com uma certa Eufroidiana Campos, de estado civil totalmente solteira e prendas ligeiramente domésticas.
Nem te conto, primo. A donzela não perde em castidade nem para a Virgem Maria. Basta relatar que, para lhe pegar na mão, de aliança e tudo o mais, careci de pedir licenciamento ao senhor Ergomenendes de Campos, seu distinto progenitor, guarnecido de costeletas até o encurvar do queixo e sem mostrar brilhatura nenhuma de marfim por de dentro dos beiços.
Na primeira vez que lhe encostei no cotovelo levei um choque pra mais de mil watts e só então vim a saber que a moça estava aparelhada à prova de mão boba e outros atrevimentos correlatos. E se não podia pegar na mão, nem pensar na tentativa de varejar outros compartimentos de semvergonhismo. E nada de chegamentos no ouvido ou outras secções de alta voltagem.
No dia em que quis beijar a mão da donzela à moda de cavalheiro, a mãe dela, uma matrona roliça, com umas pernas que mais parecia mapa dos rios do Brasil de tanta variz, irrompeu na sala, discursando:
- Não pense que vai melar cueca nesse sofá. Tira esse pacote de semvergonhice de cima da minha filha. Aqui é casa de família e tem intronização de Jesus Crucificado.
Logo eu, um sujeito de foro e cartório, sem contar as varas de família e as de órfãos e ausentes, tive que pedir concordata, primo, em matéria de agarramentos. E reboquei minha pessoa, recém formada em leis, para requerer atendimento no Arroio da Manteiga, onde o semvergonhismo é pago.

Nenhum comentário: