sexta-feira, 29 de abril de 2011

LIÇÕES DE DIREITO PARA ESTAGIÁRIOS E ASSESSORES DE JUIZES, DESEMBARGADORES E MINISTROS - João Eichbaum

FORO DE ELEIÇÃO

O seguinte. Uma ação de execução foi proposta no Foro de Porto Alegre, por força de avença definindo foro contratual: as partes, de comum acordo, elegem o Foro da Comarca de PORTO ALEGRE –RS, como competente para dirimir qualquer questão decorrente deste contrato.

A executada era a Sucessão da devedora, que residia em Pelotas e lá faleceu.

Ao despachar a inicial o Juiz da Terceira Vara Cível de Porto Alegre, cujo nome nem me lembro, determinou, de ofício, a remessa dos autos para a comarca de Pelotas, em nome da economia processual e de modo a assegurar à parte demandada ampla possibilidade de defesa...

A ordem processual é estabelecida por normas de direito público. O juiz não pode mudar as regras do processo. Só quem pode fazê-lo é o Poder Legislativo.

Diz um velho ditado latino: jus publicum privatorum pactis mutari non quit, que eu traduzo para vocês, calma lá: o direito público não pode mudar o acordo firmado pelas partes. No caso, as partes firmaram um acordo, estabelecendo como foro competente para eventuais rusgas processuais a comarca de Porto Alegre. A devedora morreu, quem responde pelas dívidas são os sucessores dela e a execução da dívida deve ser realizar de conformidade com o contrato.

Assim, o juiz não podia meter o bedelho dele por dois motivos: primeiro, porque deveria respeitar os termos do contrato, que estabelece como competente o foro de Porto Alegre. Segundo, porque ele é juiz e não advogado, “para assegurar á parte ampla possibilidade de defesa”, rasgando o contrato. Além disso, estando definido por contrato, e por lei, portanto o foro, ele não poderia modificá-lo a seu bel prazer, “por economia processual”. O juiz, ao despachar a inicial, só pode, de ofício, mandar emendá-la, jamais se arvorar em defensor, para facilitar a defesa do réu.

O Código Civil é claro, no art. 78: “ Nos contratos escritos, poderão os contratantes especificar domicilio onde se exercitem e cumpram os direitos e obrigações deles resultantes”.E o § 2º do art. 111 do Código de Processo Civil é escrito com clareza até para juízes analfabetos: “ o foro contratual obriga os herdeiros e sucessores das partes.”

No caso, além de se impor sobre a vontade das partes e sobre a regra do art. 111, § 2º do CPC, o auxiliar do juiz – escolhido não sei por qual critério - delegou, indevidamente, a competência, que é única - e não concorrente - a do juízo de Porto Alegre. E o juiz assinou a bobagem, sem ler.

quinta-feira, 28 de abril de 2011

A BÍBLIA LIDA PELO DIABO - João Eichbaum

16 E fez Deus os dois grandes luminares: o luminar maior para governar o dia, e o luminar menor para governar a noite; e as estrelas.

Então o Inventor criou só isso, é? Se Ele criou apenas “luminares” para governar o dia e a noite, quem é que criou o sistema planetário então, cuja finalidade não é governar o dia, nem a noite? Alguém andou metendo a mão no servicinho do Javé, pra aperfeiçoar a coisa...

17 E Deus os pôs na expansão dos céus para alumiar a terra.

E o cara ainda repete a asneira. Que saco!

18 E para governar o dia e a noite, e para fazer a separação entre a luz e as trevas; e viu Deus que era bom.

Quer dizer, Ele disse pra si mesmo: me dei bem, não tenho idéias imbecis. Mas, Ele só via que era bom, depois de feito. Como é que dizem que Ele é onisciente? Tinha que saber antes, né? Ou então fazia sem programação, arriscando, tipo depois a gente vê se dá certo.
A conclusão a que chego é a seguinte: Deus não era igual ao povo em geral, que acha sexo bom, antes e durante; nunca depois.

19 E foi a tarde e a manhã, o dia quarto.

O Cara trabalhava (trabalhava?) devagar, uma coisa por dia, sem se estressar. Mas, aí eu pergunto: se Ele podia, porque não fez tudo duma vez?
Pensa bem, véio! Ele passou a eternidade toda sem fazer nada e, quando pensou em fazer alguma coisa, foi aos poucos, sem muita vibração, tipo nordestino do Brasil, que não é de se esfalfar, trabalhando.
Mas aí eu te pergunto, se ele fez tudo com ciência e método, aos poucos, bem pensado e organizado, sem crises nem delírios, sem prazo de validade, como é que a coisa se transformou nessa merda toda que a gente é obrigado a aturar hoje em dia?

20 E disse Deus: produzam as águas abundantemente répteis de alma vivente; e voem as aves sobre a face da terra e sob a expansão dos céus.

Gozado, né? Ele mandou as águas produzirem répteis de alma vivente. Mas não é assim que funciona. Sem DNA se cruzando, sem a pegação propriamente dita, ó, não mesmo, as águas não produzem coisa nenhuma vivente. É nas águas que os ditos répteis se reproduzem: de vez em quando rola umazinha e dê-lhe peixinhos e peixinhas.
Agora: alma vivente? Mas que alma? Desde quando peixe tem alma vivente?
Quanto às aves voarem sobre a terra e em baixo do céu, quer dizer, abaixo da estratosfera, nada mais óbvio. Onde é que as aves voariam a não ser nesse espaço, hein, Mané?
Mais uma perguntinha, sem ofender: e as serpentes, que são répteis, e não se reproduzem na água?

quarta-feira, 27 de abril de 2011

O QUEBEC E O FRANCÊS - Janer Cristaldo

De Antonio Bemfica, do Canadá, recebo comentário sobre crônica passada, na qual discuto o projeto de lei de um deputado comunista do Rio Grande do Sul, que pretende policiar a língua:
Assunto interessante esse, Janer. Infelizmente a tua obsessão em analisar as coisas sob uma ótica anticomunista diminui o impacto da crônica (presumo que desejes obter o efeito oposto, ou talvez nem notes isso...). Já ouviste aquela máxima que diz "Nunca atribua à malícia o que pode ser adequadamente explicado pela estupidez"? Também vale nesse caso!Mas voltando ao assunto original, acho que desconheces as leis sobre língua francesa na província de Québec, no Canadá. Em conjunto são conhecidas como "loi 101" (apesar de em verdade serem mais de uma lei) e formalmente como "Charte de la langue française". É a lei que estabelece a primazia do francês como língua de Québec e define em detalhe regras tais como a que exige que em placas e sinais comerciais o texto em francês seja sempre maior de que o texto em qualquer outra língua ou que requer que atendentes no comércio interpelem ou cumprimentem clientes sempre em francês primeiro, mesmo em regiões em Québec nas quais o inglês predomina. Existe também, é claro, o Office québécois de la langue française, que é o órgão que faz cumprir a lei, recebe reclamações públicas, recomenda vocabulário francês equivalente aos termos ingleses comuns no francês (bem como o deputado aí no Sul quer), etc. Outra das funções do órgão é promover "la francisation". Veja lá: "... la Charte oblige les entreprises employant 100 personnes ou plus au Québec à s’engager dans une démarche de francisation et à instituer un comité de francisation".A lei 101 é de 1977 e foi já contestada na Suprema Corte daqui, que decidiu que a lei é inconstitucional. O sistema federalista canadense é meio complicado, e um dos privilégios das províncias é o de poder invocar a cláusula "não-obstante" em casos como esse. "Não obstante" ser a lei 101 inconstitucional, é facultado ao governo de Québec não rescindi-la. Por isso a cada quatro anos a lei deve ser re-aprovada pela assembléia de Québec. Atenção, nos sites do governo de Québec vais encontrar termos como "Assemblée nationale", que não se refere ao parlamento canadense, mas sim à legislatura provincial de Québec, que se considera como nação e usa o termo "national" com certa liberalidade.Bom proveito, Antonio
Meu caro Antônio:Para começar, não vejo nenhum demérito em ser anticomunista. Vinte anos depois da queda do Muro de Berlim, o mundo está repleto de neo-anticomunistas. Eu era anticomunista uns bons trinta anos antes da queda do Muro. Ou seja, há meio século. Nos anos 60, qualquer pessoa honesta que tivesse um mínimo de informação histórica não podia ser comunista. Se era, no fundo se tratava de um oportunista que queria extrair dividendos do prestígio pós-guerra da tirania.Continuando, os três políticos que tentaram policiar a língua no Brasil – Aldo Rebelo, Luiza Erundina e Raul Carrion – são comunistas. Não há de ser por mera coincidência. Comunistas gostam de reger a vida toda do cidadão, inclusive seu modo de falar. Isto foi genialmente abordado por George Orwell, em 1984, ao criar o conceito de novilíngua.
Adelante! Desde há muito há um conflito entre o Quebec e o Canadá. O Quebec é a maior província do país. Cerca de 80% da população do Quebec tem origens francesas, em contraste com as outras províncias do país, cujos habitantes são em sua maioria descendentes de ingleses ou escoceses. Há uma outra distinção de origem religiosa. Enquanto o Quebec é majoritariamente católico, o Canadá é protestante. Ou seja, há um choque de culturas. Não é o caso do Brasil.
Seja como for, a Charte de la Langue Française recomenda o emprego da língua francesa. Não o torna compulsório. Se o artigo 7º da Carta diz que o francês é a língua da legislação e da justiça, diz também que os projetos de lei são impressos, publicados e adotados em francês e inglês e as leis são impressas e publicadas nas duas línguas. O francês e o inglês podem ser utilizados em pé de igualdade nos tribunais do Quebec e os julgamentos devem ser traduzidos em uma e outra língua, conforme o pedido das partes. O que me parece muito normal em uma província bilíngüe. Não é o caso do Brasil. O nhengatu morreu com o marquês de Pombal.
Por outro lado, o francês é obrigatório nos cartazes e na sinalização do tráfego. O projeto gaúcho pretende regulamentar a propaganda, publicidade ou meio de comunicação por meio da palavra escrita sempre que houver em nosso idioma palavra ou expressão equivalente. O que gera uma pergunta interessante: os jornais do centro do país serão proibidos de atravessar o Mampituba? Pago para ver.
Pergunto a meu interlocutor se há legislação semelhante no Canadá: "Existem, claro, leis que definem as línguas oficiais do país e de cada província ou que garantem acesso a educação e serviços para minorias linguísticas, etc., mas legislação como essa de Québec, para proteger e regulamentar o uso da língua, só existe lá, e só quanto à língua francesa".
Nacionalismos tacanhos, eu diria. Em função de nacionalismos tacanhos, a Espanha vive problema semelhante. Que no Parlamento europeu se falem 23 línguas se entende. Se em 1958 lá se falavam as quatro línguas dos seis países fundadores, (alemão, francês, italiano e holandês), a Comunidade Européia inchou. Em 1973, foram acrescentados o inglês, o dinamarquês e o irlandês. Em 1981, foi a vez do grego, espanhol e o português. Em 1986, o finlandês, em 1995, o sueco. Em 2004, o estoniano, o húngaro, o letão, o lituano, o maltês, o polaco, o checo, o eslovaco e o esloveno. Desde janeiro de 2007, com a adesão da Romênia e da Bulgária, a União Européia conta oficialmente com 23 línguas. Até aí, muito compreensível.
Difícil de entender é a decisão do Senado espanhol, que autorizou debates nas cinco línguas distintas do país, com intérpretes convertendo suas palavras em um idioma que todos falam perfeitamente: o espanhol castelhano. A iniciativa de permitir que os senadores falem em catalão, galego, valenciano e basco converteu a Casa em uma torre de Babel. Em nome de nacionalismos tacanhos, os políticos fingem agora que não entendem a língua-mãe e fazem teatro falando línguas regionais.De acordo com a mídia espanhola, os 25 intérpretes necessários para converter as diferentes línguas em castelhano custam ao Senado € 12 mil por dia (R$ 27 mil), ou € 350 mil por ano (R$ 795 mil). O que talvez explique a motivação do comunossauro gaúcho. Depois da criação de cursos de tradutor e intérprete nas universidades, uma larga faixa de acadêmicos caiu na vala do desemprego. Como comunista adora uma boquinha estatal, crie-se uma lei para dar emprego aos desocupados.

terça-feira, 26 de abril de 2011

DA ARTE DE ENGANAR - João Eichbaum

Um levantamento da média de inteligência atual mostraria que o homem brasileiro continua próximo de seus ascendentes primatas.
Subjugada pela mídia, a massa popular não pensa, apenas se deixa levar. A mídia cria para ela os ídolos no esporte, no cinema, na política, nas novelas, em quaisquer programa de TV, como Faustão, BBB e outras porcarias. A religião cria o deus em quem ela vai acreditar.
A inteligência, como qualquer operação manual ou intelectual, atrofia se não for usada. Como a massa não pensa, mas deixa que pensem por ela, acaba perdendo o hábito do raciocínio, da elaboração do próprio discurso, da criação das próprias idéias.
Sabendo disso, há políticos que se refestelam no poder, usando um instrumento que lhes serve apropriadamente: o populismo, como é conhecida a arte de enganar.
Getúlio Vargas e Lula usaram e abusaram desse instrumento.
E no Rio Grande do Sul, o senhor Tarso Genro está seguindo a mesma cartilha. Com sucesso, diga-se de passagem.
Olhem só. Seu primeiro ato, como governador, foi criar mais de quinhentos cargos em comissão, para acoitar os companheiros de partido, com salários que são de matar de inveja qualquer trabalhador.
A alegação foi a de “qualificar” o serviço público.
Os servidores públicos, que ingressaram na função por meio de concurso, nada disseram. Não tiveram sequer a capacidade de se sentir ofendidos, por não serem suficientemente “qualificados”.
Bom, mas aí, a seguir, o senhor Tarso Genro fez convênio com a Fundação Getúlio Vargas, a fim de receber subsídios técnicos para a administração da coisa pública. Quer dizer, de nada adiantou botar na folha de pagamento pessoas “qualificadas”.
Pessoas com inteligência um pouco acima da média sabem que o empreguismo é um grande multiplicador de votos. O Getúlio fez isso, o Lula, igualmente. Tarso não faria diferente.
Estavam as coisas nesse pé, ou seja, nada de novo acontecendo no Estado, nem um metro de estrada a mais, a saúde, a segurança e a educação na mesma porcaria de sempre, quando ocorreu em Santa Catarina um acidente que roubou a vida de vinte e oito pessoas, residentes em Santo Cristo no Rio Grande do Sul. Aí o senhor Tarso voou para Santo Cristo, para abraçar familiares das vítimas.
Nesse ínterim, a mídia provocou uma “avaliação” do “governo” Tarso. Resultado: 80% de aprovação.
Feliz da vida com esse resultado, ele foi para a Coréia aprender como se faz “educação”, já que entre seus companheiros “qualificados” ninguém entendia da coisa, certamente.
Na volta, deu uma “aula magna” sobre maconha, na Universidade Federal.
Aí aconteceram mais tragédias: crianças, famílias inteiras morreram soterradas. E o Tarso foi lá, mais uma vez, abraçar os familiares dos mortos. Não sei se antes, ou depois, passou em Veranópolis para comer maçã no meio do povo. E após as tragédias correu para Esteio, a fim de marcar presença numa festa gauchesca, onde o povo estava presente, como em qualquer espetáculo.
É assim que age o populista, desde os tempos do império romano, porque sabe que a massa popular só quer saber de pão e circo. Nem que o circo só encene tragédias.

segunda-feira, 25 de abril de 2011

QUEREM PROIBIR O MAL - Paulo Wainberg

Li no jornal: O Deputado Federal Aldo Rabello, líder do novíssimo Partido Comunista, está fazendo um projeto de lei para proibir o uso, por escrito, de palavras estrangeiras no Brasil.
Idéia magistral, como é que não pensei nisso antes? Como é que outros deputados e senadores não pensaram nisso antes, neste País? Há quinhentos e onze anos o Brasil vem incorporando essas horrorosas palavras em inglês, francês, alemão, japonês, italiano, causando gravíssimos danos à função social da língua portuguesa e ninguém fez nada!

Como se sabe, a língua pátria é condição necessária para a formação de uma nação. Entretanto, ao longo dos séculos, invasores de língua querem retirar nossa identidade, introduzindo solertemente suas estrangeiras palavras em nossos textos, abalando de forma radical o nosso nacionalismo que, finalmente, graças aos ideais comunistas do ínclito deputado, será doravante salvo.

Imaginem a alegria que sentiremos nós, brasileiros, quando formos proibidos de escrever Internet, substituindo o terrível termo pelo brasileiríssimo Entre a Rede.

O Twitter será eliminado, pois não há palavra para ele, em português.

E-mail? Minha querida, recebeste a correspondência eletrônica que te enviei ontem?

Você nunca mais manejará um mouse e terá, para todo o sempre, um camundongo em sua mão.
O locutor não gritará o horrendo gol, que será substituído por... por ‘a esfera ingressou na área posterior às traves e o travessão’.

Sua casa não terá mais ladrilhos e sim pequenos pedacinhos de pedra colorida.
E isto que estou simplificando, há situações muito mais complexas que o nacionalismo deve proteger à todo o custo, quando se trata de defender a língua mãe.

Ai de quem se atrever a digitar marqueting no trabalho de conclusão de concurso. Um bom e verdadeiro brasileiro substituirá a palavra alienígena por algo bem mais simples, como ‘a estrutura de divulgação, interação, empatia e divulgação das atividades mercadológicas visando dar conhecimento de produtos e atividades específicas ou gerais’.

Se um escritor como eu descrever a despedida de seu personagem francês com um ‘au revoir’, será imediatamente preso!

E não tomarei mais seu tempo com exemplos. Passo a identificar a motivação que levou o parlamentar à conceber um absurdo tamanho.

A primeira coisa que me ocorre é que ele não tem mais nada para pensar. Absolutamente nada. E solidário com seus pares parlamentares, que também não pensam em nada além de negócios rendosos, resolveu ocupar-lhes a mente.

Imagino nossas Casas Legislativas lotadas, em sessões solenes e intermináveis, onde nossas excelências debaterão a matéria à exaustão, estudando, vernáculo a vernáculo, o que pode e o que não pode ser escrito neste país.

Pense nos puristas parlamentares, exultantes com o debate, revelando seu extraordinário pensamento, as linhas de raciocínio, os apartes pro bono (acabo de me arriscar, escrevendo em latim), os a favor, os contra, um espetáculo brasileiro de democracia, não importa que a corrupção corra solta e que mais de sete mil pessoas trabalhem para oitenta senadores, ganhando o salário pagos por nós, que odiamos palavras estrangeiras escritas por incultos professores, artistas, jornalistas, poetas, escritores, filósofos e outros entreguistas que assolam a Nação.

Perceba a grandeza do projeto!

Outro motivo que pode ter levado o velho Aldo à conceber a coisa pode ser a arteriosclerose, palavra que nem sei se brasileira é.

Imaginando-se, por confusão mental, estar sob a influência (ou domínio) do Império Romano e percebendo que o Latim virou latim vulgar, aquele falado nos países conquistados, misturados com as línguas pátrias, entrou em crise de nervos.

Esquecendo-se de que o Português deriva do latim vulgar, quer o nobre que preservemos, como se fôssemos uma raça, a pureza absoluta, abolindo da nossa escrita tudo aquilo que não for contemplado na língua de Virgilio.

“Mensalão”, por exemplo, é permitido?

Você, garota, jamais seja fashion. Arrisca-se aos piores rigores da lei.
Enfim!

Um País como o nosso, sem problemas, onde as instituições funcionam como um relógio suíço, a honestidade é absoluta, escândalos não existem, crimes não são cometidos, a segurança é perfeita, as estradas são ótimas, a educação é a melhor do mundo, a Saúde Pública é maravilhosa, o sistema político é exemplar, o problema social não existe e a riqueza é distribuída com absoluta justiça, tem mesmo é que se preocupar com palavras estrangeiras.Eu, olhando aqui debaixo, já estou me preparando para nunca mais escrever non sense. Corro o risco de ser condenado a não sei quantos anos de prisão

quarta-feira, 20 de abril de 2011

SE MEU APARTAMENTO FALASSE - Janer Cristaldo

Em meus dias de universidade, li um estudo interessante de epistemologia sobre a interferência humana no conceito de acaso, de autoria de dois pensadores franceses, cujos nomes não mais lembro. Acaso é o imprevisível. Suponhamos que um belo dia se arma uma tempestade em Paris, fenômeno perfeitamente previsível pelos serviços de meteorologia. A tempestade produz um vendaval, coisa também previsível. O vendaval derruba uma telha de um telhado, algo também bastante previsível. A telha cai sobre uma pedra na calçada. Não falamos de acaso.

Mas digamos que M. Dupont estava com dor de dente e marcou no dia da tempestade uma consulta com um dentista. Providência mais do que previsível, necessária. M. Dupont vai a pé, já que seu dentista não fica longe de sua casa. Ao passar pelo prédio que foi destelhado, a telha cai sobre sua cabeça. Aí falamos em acaso. É a interferência imprevisível de duas séries de fenômenos, estes perfeitamente previsíveis. Mas depende da presença do ser humano. Sem ser humano no meio, não há acaso.

Costumo falar do único deus em que creio, o deus Acaso. Leitora me pergunta que deus é esse. É o deus do qual falei acima, o que derruba telhas na cabeça dos transeuntes. É o deus que tem regido minha vida. É deus geralmente generoso, que trata bem os que nele crêem. Se um dia saí das grotas do Upamaruty e Ponche Verde a correr mundo e hoje vivo em São Paulo, tudo é obra de sua vontade imperiosa.

Sua primeira ação em minha vida ocorreu há mais de meio século. Já contei, conto de novo. Eu tinha dez anos e estudava numa escola rural de Três Vendas, distrito de Dom Pedrito, situada justo na Linha Divisória. De um lado da estrada, Brasil. Do outro, o Uruguai. No quinto ano primário, com escassas noções de história ou geografia, fomos informados que professoras "da cidade" viriam fiscalizar as provas. Pânico total de nossas professoras.

Fora escrever e as quatro operações, mais alguns poemas cívicos, ninguém conhecia muita coisa além disso. Mas para tudo há solução. As provas chegaram numa sexta-feira. Numa época em que sequer havia rádio na região, fomos todos convocados – sei lá como, suponho que à pata de cavalo – num raio de léguas, para uma aula no domingo. Violadas as provas, recebemos as respostas para decorar.

Dia seguinte, as fiscais de Dom Pedrito constatavam, boquiabertas, a excelência pedagógica de nossas mestras. Os alunos escreviam tranqüilos, sem hesitar um segundo, foi nota dez pra todo mundo. Minha mãe era professora e claro que cúmplice. Mas não muito. Sempre exibiu uma vara de marmelo quando eu me recusava a estudar. Não só exibia como tampouco foi avara ao aplicá-la. Naquela segunda-feira, minha sorte estava selada. Findo o curso primário, bom em matemática, o máximo que podia aspirar era ser caixeiro nalgum bolicho das Três Vendas ou Ponche Verde, uma das poucas chances de escapar ao rabo do arado. Findas as provas, atrelei o tordilho à aranha. Uma fase havia terminado em minha vida. Voltava ao campo, talvez para lá morrer.

Dei de rédeas ao tordilho, a aranha já descia o lançante da coxilha. Foi quando Dona Ivone Garrido, a fiscal implacável, já de certa idade e não muito ágil, atravessou um alambrado de sete fios que cercava o colégio e gritou: "pára, Clotilde, teu filho é um gênio, ele não pode voltar para o campo". Minha mãe, que só queria ouvir isto, me tomou as rédeas das mãos e esbarrou o tordilho. Daqueles segundos geridos pelo deus Acaso – e aqui começa o mistério – decorrem minhas andanças e estas linhas.

Depois daquela distante manhã, a roda do acaso não parou mais de rodar. Certa vez, ao entrar em um escritório da Varig, em Amsterdã, uma mulher linda envolta em peles e com uma chapka lhe abrigando os cabelos me abraçou com carinho. Nossa, pensei, a Varig está fazendo de tudo para captar clientes. Nada disso. Era uma atleta carioca que passara duas ou três noites em meu apartamento em Porto Alegre, durante uns jogos universitários. Marcamos encontro em Genebra. Não deu certo. O deus Acaso não gosta de coisas combinadas.

Em Estocolmo, em 71, quando saía de meu curso de sueco, no Kungsträdgården, praça que em língua de gente quer dizer Jardim do Rei, encontrei em meio às neves uma gaúcha com a qual eu começara um namorico em Tramandaí, uns quatro ou cinco anos antes. Em Madri, ao sair de um meus botecos prediletos, o Gijón, tropecei com um bom amigo, um professor de história uruguaio da UFSC, Aníbal Aicardi Abadie. Continuamos normalmente uma charla interrompida alguns anos antes em Florianópolis. Repeti o que dissera fray Luís de León, em meados do século XVI, ao retomar sua cátedra na universidade de Salamanca, após cinco anos de prisão pela Inquisição: como decíamos ayer... Marcamos encontro em Barcelona. Também não deu certo.

Meu doutorado dependeu de obra de acaso. Eu ganhara uma bolsa de mestrado em Paris. Estava em uma fila na Sorbonne para inscrever-me no curso, quando encontro na fila M. Raymond Cantel, doyen da Sorbonne, que eu conhecera alguns anos antes. Perguntou-me que fazia ali. Estou me inscrevendo para um mestrado, professor. M. Cantel foi o responsável pelos estudos de literatura de cordel na universidade francesa. Veio ao Brasil em busca de traços de uma seita sebastianista. Não a encontrou. Mas voltou com dois mil livrinhos de cordel na bagagem. “Que é isso, meu filho? Tens currículo mais que suficiente para um doutorado. Te inscreve em doutorado”. Em questão de minutos, e por obra do deus Acaso, meu mestrado se transformou em doutorado. De minha banca, participou M. Paul Verdevoye. Tradutor de Martín Fierro ao francês, poema que embalou minha infância nos dias de Upamaruty.

Minha filha, de certa forma, é também obra do deusinho. Nasceu em Porto Alegre. Mas diria que foi gestada em Cannes. Eu fazia a cobertura de um festival de cinema e passava minha coluna por telefone. Quem a recebia era uma jornalista da Caldas. Daí surgiu a Primeira Namorada.
Naqueles dias de Paris, assinei crônica diária na Folha da Manhã, de Porto Alegre. Ao final da coluna deixava meu telefone e endereço. Correspondi-me com muitos leitores, mais precisamente leitoras. Entre elas uma advogada muito querida de Santa Maria. Trocamos fotos. Em abril de 1979, tive de voltar rapidamente ao Brasil. Encontrei-a ao tomar um ônibus para Santa Maria. Ela reconheceu-me pela foto. E ali mesmo, no ônibus, começou uma relação que dura até hoje.

Ano passado, fui visitá-la em Porto Alegre. Ela morava na Fernandes Vieira. Certo dia, ao sairmos de sua casa, me deparei com um restaurante na mesma quadra, o Zero de Conduta. Este cara já morou em Paris, disse a ela. Aí a seqüência causal é mais complexa.

Em meus dias de Filosofia, tive aulas por quatro anos com Gerd Bornheim, intelectual bastante conhecido em Porto Alegre nos anos 60. Foi cassado pelos militares em 69. Em 71, em minha primeira visita a Paris, hospedei-me no Grand Hotel Saint Michel, na rue Cujas, ao lado da Sorbonne. De Grand o Saint Michel nada tinha, era apenas um une étoile muito freqüentado por brasileiros, e gerido pela folclórica Madame Salvage. Consta que, em seus 70 anos, ela punha um cartaz na porta de seus aposentos:GENEZ PAS! JE SUIS EN TRAIN DE FAIRE L’AMOUR
Certo dia, ao voltar de madrugada, quando fui pegar a chave, ergue-se de um catre uma calva ilustre e familiar. Era o Gerd, que trabalhava como porteiro da noite. Este foi o primeiro elo da corrente. Convidou-me para uma janta no dia seguinte. Fomos no Zero de Conduite, ali perto na Monsieur le Prince. O restaurante fazia homenagem ao filme homônimo de Jean Vigo e hoje não mais existe. Foi meu primeiro restaurante em Paris, onde tomei contato com esse delicioso queijo grego, o fetá. Ora, um Zero de Conduta em Porto Alegre só podia ser obra de quem vivera em Paris nos anos 70.

Antes de ir adiante, mais uma manobra do deus Acaso no Zero. O restaurante tinha uma grande mesa de madeira, para umas vinte pessoas, na qual os clientes iam sentando ao lado uns dos outros. Minha tese era sobre Ernesto Sábato. Certo dia, estou em meio a um pichet de rouge, relendo Sobre Heroes y Tumbas. A minha frente, senta-se uma menina com El Tunel em punho. Ali mesmo começou nossa relação. Era uma adorável poeta peoniana, tão altiva quanto seu conterrâneo, Alexandre, o Grande. Acabei por dedicar-lhe minha tese. Naquele almoço, o deusinho malandro estava agendando minhas futuras viagens a Dubrovnik, Skopje e Mljet.
Volto a Porto Alegre. Dois ou três dias depois, entrei no Zero de Conduta para uma cerveja. A bem da verdade, nem havia notado que era o Zero de Conduta. Havia uma pequena biblioteca no restaurante, onde encontrei vários livros em sueco, principalmente de culinária. Fui até o caixa. Quem fala sueco aqui?

- Jag – me respondeu o caixa.Havia morado cinco anos em Estocolmo. Naqueles dias, eu estava publicando neste blog, em capítulos, minha tradução de Kalocaína. Falei de meu blog e passei-lhe meu cartão.

- Ah, és o Janer. Estive em teu apartamento em Paris.Ele também estivera por lá, o nome de seu restaurante o atestava. Era o Marcos Estivalet, que me visitara com um jornalista gaúcho, o Alfredo Fedrizzi, naqueles distantes anos 70, em meu studio na Brillat Savarin.

Mas comecei prometendo falar de meu apartamento. Deste onde moro desde 2001. Aqui a série causal é também complexa. Começa, eu diria, nas ilhas gregas. Lá por 77 ou 78, eu navegava de Mykonos para Santorini. Eram dias em que eu não queria ver brasileiro por perto. Não havia ido para Paris para conviver com os patrícios. Foi então com certo horror que vi, em pleno Egeu, a Baixinha conversando com um casal de brasileiros.

Vai daí que acabamos nos relacionando. Graças a eles, entrei em contato, em Paris, com os brasileiros da Maison du Brésil. Graças a eles, encontrei também amigos com os quais mantive bom convívio. Entre estes, Silvia Ricardino, harpista. Que acabou voltando a São Paulo, cidade em que, na época, eu jamais imaginava morar.

Hoje, cá estou. Quando me mudei para cá, falava para minha amiga harpista de meu novo endereço. Moro na São Vicente de Paula, naquele prédio de tijolinhos. No prédio de tijolinhos? Muito freqüentei aquele edifício. Em que andar?

- Oitavo.

- Oitavo? Não pode ser. Eu freqüentava um apartamento no oitavo. Em qual bloco?

- No bloco frente à portaria, nos fundos.

Era o mesmo apartamento que ela freqüentava, quando sequer imaginava que um dia viveria em Paris. Um dos proprietários deste apartamento foi um dentista, não diria melômano, mas que cultivava a música erudita e reunia em torno a si os cultores da boa música. Convidei então a Sílvia a voltar a seus dias de juventude.

Ora, direis, a vida é isso mesmo, uma seqüência de acasos. Pode ser. Mas penso que acaso exige distância. Cruzar todos os dias com os vizinhos de seu bairro não vale. Não está na faixa do acaso, mas da necessidade. O mesmo se você vive em uma pequena cidade e nunca saiu dela. Vai cruzar todos os dias pelas mesmas pessoas. Destas andanças, extraí uma lei, que chamo de a Lei de Cristaldo: todos os encontros são possíveis. Desde que você não permaneça parado no mesmo lugar.

Meus atuais vizinhos de parede-meia são um maestro e uma mezzo soprano. Muitas vezes acordo com os trinados da moça. Tens sorte que não é uma soprano, me adverte a Sílvia. Pode ser. Mas penso que nada teria contra uma soprano.

Se meu apartamento falasse, muita música teria a contar.

terça-feira, 19 de abril de 2011

DA INFLUÊNCIA DO PRIAPISMO NAS DECISÕES JUDICIAIS - João Eichbaum

Pera lá! Não abandonem a leitura, de cara. Para quem não sabe, priapismo não é nenhuma corrente filosófica. Por favor, não pensem que vou tratar de filosofia.

Então, vamos aos fatos.
O senhor Peluso, aquele que foi seminarista e agora cultiva um bigodinho pintado, o presidente do Supremo Tribunal Federal, resolveu acabar com a morosidade da Justiça. E vocês sabem como? Suprimindo efeitos dos recursos e concentrando todo o poder de decisão nas mãos dos mocinhos e das mocinhas de primeiro grau, aqueles que sentem orgasmo só em pensar que têm o poder nas mãos, e dos desembargadores, os juízes de segundo grau, aqueles que arrotam grandeza, têm o rei na barriga e comem pasteizinhos com guaraná, durante os julgamentos, à custa de todos nós.

Não sei se vocês entenderam. Mas é o seguinte: um cara acusa você de ser traficante de tóxico. Você não tem como provar que não é. A gente só prova o que é. Cá pra nós, como é que você vai provar que quem lhe passa essa grana toda é a coroa daquele político, que ganha milhões com as “obras do governo”, a coroa aquela que dá tudo o que você quer, para não se privar do seu quilométrico e bem aparelhado pênis?

O que não é, ninguém consegue provar. Mas como você é malhadão e sarado, tem dinheiro no banco, veste roupa de grife e anda sempre com carro zero quilômetro, que custa os olhos da cara, para o Ministério Público aí está a prova. Ainda mais que nas “escutas telefônicas”, de que o Ministério Público tanto gosta, você sempre fala para seus amigos que continua com o “bagulho” aquele, porque descola uma grana legal. Então, você é condenado, através de uma sentença que foi feita pelo secretário do juiz, por levar uma vida de luxo e ostentação e se envolver com “bagulhos”, o que leva à presunção de que você é traficante. Quando você, por razões priápicas e financeiras, não passa de um simples comedor, que vive à sombra de árvores alheias.
Você recorre. Quem examina seu processo no “segundo grau”, se não é um estagiário, é o secretário ou o assessor do desembargador. Examinar o processo? Falei mal. Ele pega a sentença que foi feita pelo secretário do juiz, passa no “scanner”. E, para formar o acórdão, ele escreve: “para evitar despicienda tautologia” invocamos a douta sentença. E taca a cópia que tirou no “scanner”.

Deu pra você, você vai mofar na cadeia, o “bagulho” aquele caiu fora, arrumou outro garotão. Mesmo assim, você recorre, para o Supremo ou para o Superior Tribunal de Justiça. Muitos anos depois de você ter cumprido a pena, sai da cadeia já desdentado e sem viço, aí o STJ ou o STF vai decidir que você é inocente, porque presunção nunca foi, nem será prova (coisa que o secretário do juiz não sabia).

Manjou? É assim que o senhor Peluso quer que funcione. É assim que ele quer terminar com a morosidade da justiça. Porque, tirando fora os tribunais superiores, não existirá morosidade. E o que importa para o senhor Peluso é a morosidade, e não a justiça propriamente dita. Nos tempos de seminário, ele não aprendeu que a pressa é a inimiga da perfeição.

Agora, por favor, não me perguntem como é que aquele ex-seminarista, o senhor Peluso, que se ajoelha aos pés do arcebispo de São Paulo para confessar seus pecadinhos veniais, chegou ao Supremo Tribunal Federal.

Não sei, mesmo.
Mas voltaremos ao assunto, qualquer hora dessas.

segunda-feira, 18 de abril de 2011

PAPO LEVE - Paulo Wainberg

Estão vulgarizando a vulgaridade. O que isto quer dizer? Não sei. É outra dessas frases que atravessam meu cérebro como se fossem metais que se lançam ao éter. Porém, refletindo um pouco, não deixo de ter razão, a vulgaridade está cada vez mais vulgar e, um pouco mais, o vulgar se tornará banal, isto é, perderá todas as suas qualidades. Ligo no programa do Faustão, aquele esqueleto que um dia foi gente, e me dedico a observar o bailado das bailarinas. Então me pergunto, enquanto alguém está despencando de uma escada e o Faustão acha graça: Onde será que arrumam mulheres tão lindas? Abro as páginas do jornal e leio que o Senado (irrrrghhh) comprou oitenta carros novos para os senadores (arrrrghhh) e mais oitenta iphones (sei lá o que isto faz), para substituir os carros velhos do ano passado e o celulares velhos da semana passada. Leio um livro de auto-ajuda e percebo quanta coisa eu deixo de fazer para me auto-ajudar, como não ficar estressado, não me incomodar com bobagens, como não rezar dez vezes ao dia, como não misturar bananas com melancia e como não tomar doze tranquilizantes. Vai ver é por isto que passo minha vida sem conseguir me auto ajudar e, portanto, submetido ao que der e vier. Vou ao jornal de novo e vejo que esses livros são os mais vendidos do mundo. Aí, numa tentativa de desvulgarizar um pouco a vulgaridade, abro um livro de poemas, me dou conta de que as frases do poeta propõem, com beleza, lirismo e emoção, a plena ajuda para quem souber ler, mas logo canso, religo a televisão para assistir o programa do Gugu, que Deus me perdoe. Dezenas de bundas femininas, moldadas com se fossem pão recém saído do forno, sacodem ante meus olhos e nem acho graça. Centenas de seios flatulentos balançam à minha vista e é como se abacates em crise, protestando contra o PT, desabassem ao mesmo tempo do abacateiro. Então me pergunto: Onde está a autêntica vulgaridade, aquela que o Chacrinha despejava sobre nós todos os domingos, sem malícia e sem vergonha? Não existe mais, infelizmente. A vulgaridade hoje está tão vulgar, que ninguém mais repara nos bigodes lustrosos, nas gravatas extravagantes e no sotaque nordestino dos deputados federais. Tão vulgar que ninguém nota. Sou do tempo em que a vulgaridade possuía um quê de, sei lá, sutileza, mistério, uma gênese de reflexão que surgia à simples visão de uma Rita Cadilac. Na contrapartida, a voz de Nara Leão, a poesia de Chico Buarque, o show do Chico Anysio elevavam o espírito desarmado, tanta intensidade posta ao nosso dispor que era possível, com um pouco de boa vontade, apreciar e rir da vulgaridade. Chacrinha, Golias e Luz Del Fuego ocupavam nossos espaços vazios com vulgaridade um tanto criativa, capaz de gerar desejos de maior refinamento, em busca de uma estética, digamos por dizer, mais cultural, frase esta que talvez signifique que, após assisti-los, saíamos correndo em busca de Mozart, Beethoven e de Lawrence Durrel e seu Quarteto de Alexandria. Hoje não. Hoje, após assistir o pagode, o funk, o punk, o remelexo da mulata silicone e os comentários dos ídolos da televisão, sobra um espanto, uma perplexidade, uma inacreditável incapacidade de compreender como Mais Você, Menos Você, Papo Calcinha, Papo Cueca, Zorra Total e a Praça é Nossa permanecem no ar, semana após semana, ano após ano, repetindo, repetindo e repetindo. A vulgaridade, vulgar do jeito que está, conseguiu atingir sua finalidade ontológica, sua razão de ser, seu devir, seu fundamento filosófico: vulgarizar definitivamente o vulgo.

sexta-feira, 15 de abril de 2011

LIÇÕES DE DIREITO PARA ESTAGIÁRIOS DE JUÍZES, DESEMBARGADORES E MINISTROS - João Eichbaum

Hoje em dia, todas as lições de direito devem ter como público alvo os estagiários, porque são eles que lavram as sentenças e os acórdãos e os passam para os assessores ou secretários dos magistrados. Destes últimos o que sobra nas sentenças e acórdãos é apenas a assinatura. Digital, é claro, providenciada pelos secretários e assessores. Comecemos, então, por uma coisa facílima: o deferimento antecipado do pedido, que a deficiente linguagem do Código de Processo Civil chama, simplesmente, de tutela, dentro de um texto que causa arrepios a quem preserva a pureza do estilo: o juiz poderá antecipar... os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial... “Tutela pretendida no pedido”... Isso quer dizer, literalmente, que, ao ajuizar uma ação, o autor pede a pretensão de uma tutela. Pode? Claro que não. Não é assim que funciona. E se não é assim que funciona a redação da lei é equivocada. O autor, na inicial, faz o pedido (reconhecimento de paternidade, pagamento de uma dívida, manutenção de posse, revisão de contrato,etc.) e não circunavega, requerendo “pretensão de tutela”. O que significa “tutela”? Tutela, em sentido próprio, significa apenas o encargo de administrar a pessoa e os bens de menor incapaz, não submetido ao poder familiar. Em sentido figurado, “tutela” significa “proteção, amparo”. Nada mais. A “tutela”, de que se ocupa o art. 273 do CPC, seguido de outros dispositivos, como se verá, não tem o verdadeiro significado que lhe empresta o vernáculo. É uma invenção nada científica, porque não tem fundamentos etimológicos. Nem merece a qualificação de neologismo, porque o vocábulo já existe na língua portuguesa. Ajuntado ao adjetivo “pretendida”, (usado pelo referido dispositivo) o substantivo “tutela”, pode ser “traduzido”, fora de qualquer lógica, e com impiedosa agressão ao vernáculo, como “pedido”. Nenhuma outra significação se lhe pode emprestar. Então, autorizado pelo art. 273 do CPC, o pedido, ou seja, res petita, o objeto da ação, pode ser deferido antes da sentença. A isso se chama de “tutela jurisdicional antecipada”. Não existe ação sem pedido. E o pedido tem que ser certo e determinado (art. 286 do CPC). Assim, numa ação de revisão de cláusulas contratuais, imprópria e vulgarmente, chamada de “ação revisional”, a “tutela pretendida” ou “especifica”, quer dizer, o pedido, é unicamente o de revisão de cláusulas”. Não se pode misturar pedido de “revisão de cláusulas” com pedido de exclusão dos cadastros de informações negativas, num mesmo procedimento. Se houver essa mistura, não fica definida a “tutela específica”, pois não se sabe qual dos dois pedidos representa a “tutela específica”. E isso, pela primária razão de que são pedidos distintos. Mas a lei oferece solução para casos tais. Se o autor pretende as duas coisas, isto é, a revisão de cláusulas contratuais e a exclusão de seu nome das informações negativas de crédito, ele terá que seguir dois caminhos diferentes, um para cada pedido, a fim de obedecer à lei, fazendo, de cada um deles, um pedido certo e determinado. Na ação principal, pedirá a revisão de cláusulas. E através de procedimento de medida cautelar formulará o pedido de “exclusão de seu nome das informações negativas de crédito”. Aí, cada procedimento terá o seu pedido certo e determinado ou, como erradamente diz o CPC, a sua “tutela especifica”. O art. 461, § 5º, do CPC é impróprio para deferir, antecipadamente, a exclusão do nome da parte do registro de informações negativas de crédito, em ação que pede dois objetos distintos (revisão de cláusulas e exclusão do nome do autor dos registros de informações negativas de crédito), porque aquele dispositivo só autoriza tal medida, para a “efetivação da tutela específica”. E havendo dois pedidos distintos, qual será o específico? Um erro não justifica outro. Se o autor ingressou em juízo com o procedimento impróprio para pedir a exclusão de seu nome do cadastro de informações negativas de crédito, não pode o Judiciário fazer vistas grossas, errando também ao invocar equivocadamente o art. 461, § 5º do CPC, em não distinguindo os pedidos, que deveriam constar de procedimentos diferentes. Repita-se: numa ação, chamada “revisional”, a “tutela específica pretendida” (leia-se pedido) não pode ser a da exclusão do nome do autor do cadastro negativo de crédito.

quinta-feira, 14 de abril de 2011

A BÍBLIA LIDA PEDO DIABO - João Eichbaum

12 E a terra produziu erva, erva dando semente conforme a sua espécie e a árvore frutífera, cuja semente está nela, conforme a sua espécie; e viu Deus que era bom.

Moleza, hein, chefe? Só refresco! A terra saiu produzindo erva, semente, árvore frutífera, sem ninguém pegar no batente, sem ninguém botar a mão na massa. E o Grande Produtor viu que era bom. Bom. Mas, bom pra Ele? Por acaso Ele era chegado numa fruta?

13 E foi a tarde e a manhã, o dia terceiro

Pô, três dias pra fazer essas coisinhas, só usando o gogó: faça-se, isso, faça-se aquilo? Será que as ordens não eram logo atendidas, e levavam um dia inteiro para aparecer?

14 E disse Deus: haja luminares na expansão dos céus, para haver separação entre o dia e a noite; e sejam eles para sinais e para tempos determinados e para dias e anos.

A coisa soa meio vaga, né? Luminares... para haver separação entre o dia e a noite. Bem, eu conheço um luminar só, que nos diz quando é noite e quando é dia: o sol. Mesmo assim, nem sempre a coisa funciona desse jeito. Muitas vezes é pleno dia e não tem sol.
Agora, sejam eles para sinais e para tempos determinados e para dias e anos parece frase de analfabeto com canudo de doutor, ou coisa de bêbado mijando no poste. Não dá pra entender bosta nenhuma.

15 E sejam luminares na expansão dos céus, para iluminarem a terra

E quando é noite e não tem sol, nem aquela lua redonda e linda, nem estrelas, e chove pra caralho, o que é que vai iluminar a terra, mano?
Bem, pensando bem, no escurinho é melhor.

quarta-feira, 13 de abril de 2011

O LADO MAU DAS RELIGIÕES - João Eichbaum

Comentando ainda o massacre das crianças no Realengo, Marta Medeiros, em sua coluna de hoje na Zero Hora, cita José Saramago: “o mundo seria mais pacífico, se todos fôssemos ateus”.
O pensamento de Saramago, é claro, choca os crentes, cria revolta naqueles que acreditam em Deus, na vida eterna, na Igreja, nessas coisas todas.
Mas, quem examina a história com olhos de analista não pode deixar de dar razão a José Saramago, mesmo que não o faça em termos absolutos. José Saramago, certamente, nunca teve a pretensão dos papas, de ser “infalível”.
Mas, pensem bem. A bíblia está cheia de histórias de guerras, de assassinatos, começando com o de Abel, de manifestações iradas de Javé, que chegou a exigir de Isaac o assassinato de seu único filho legítimo.
Não são histórias que induzam à piedade, à devoção, ao recolhimento e, principalmente, ao amor ao próximo.
A história da Igreja Católica, Apostólica, Romana, está indelevelmente marcada com sangue, o sangue derramado pela inquisição, que obrigava todo mundo a acreditar em Deus e na dita Igreja.
Os próprios fundamentos dessa Igreja se assentam na idéia sanguinolenta do Deus, chamado Pai, que exigiu o “sacrifício” do Deus chamado Filho, denominado Jesus Cristo. O mesmo Deus que pediu o sacrifício do filho de Isaac levou também seu filho à morte na cruz. E a cruz, símbolo de tortura e morte, é o símbolo dos cristãos, ostentado nas igrejas, nos tribunais brasileiros, no pescoço enrugado dos velhos e entre os seios sensuais das moças.
As barbáries cometidas, em nome de Alá e de Maomé, pelos muçulmanos, dispensam qualquer comentário.
A morte, a própria morte é usada pelas religiões como um produto: através dela é que se chegará à vida eterna. E se não é encarada como caminho para a vida eterna, o é como castigo, mas sempre por imposição de Deus.
Enfim, sem a morte, entendida nesses termos, religião nenhuma sobreviveria.
Ora, essas idéias, sendo mal assimiladas por seres humanos afetados por deficiências de intelecto, só podem desaguar em desatinos, dos quais está cheia a história desse animal chamado homem.

terça-feira, 12 de abril de 2011

ISLÃ ATACA NO RIO - Janer Cristaldo

Islã ataca no Rio? – me perguntava eu neste blog, no dia mesmo do massacre em Realengo, quinta-feira passada. Os termos do testamento deixado por Mohammed Atta, o líder dos terroristas que jogaram dois aviões no World Trade Center, batiam demais com a carta do psicopata carioca. Havia uma óbvia digital muçulmana na matança. Publiquei as duas cartas para confronto: http://tinyurl.com/699qnsdNão que o Corão mande matar criancinhas. Isto é coisa do bom deus dos judeus e cristãos, que manda massacrar, arrasar, degolar, destruir cidades e – atenção - matar tudo que respire. Criança respira? Então mate. Só o santo homem Moisés mandou degolar três mil judeus.Se o Corão não manda matar criancinhas, terrorista muçulmano não se pergunta, quando se explode, se há crianças por perto. Dezenas de crianças foram explodidas em Israel pelos homens-bomba palestinos. Islã ataca no Rio? Houve quem aventasse, com um leve sorriso irônico, que tratava de mais uma boutade minha parte, a ser debitada em minha ojeriza ao Islã. Afinal o assassino falava em Jesus, logo não podia ser muçulmano. Fiz a pergunta e fiquei à espera de que a polícia e a grande imprensa chegassem lá. Parece que estão chegando. O ponto de interrogação de minha crônica, pelo jeito, já pode ser dispensado.Mal abro hoje minha correspondência, um leitor pergunta: “Você foi o primeiro a documentar essa hipótese (conexão islâmica). Agora veremos como a imprensa irá noticiar os fatos. Será que pedirão uma lei antiterrorismo?”O leitor me remete a notícia de O Globo, publicada no final da noite de ontem: “Nos textos, revelados neste domingo pelo Fantástico, da Rede Globo, ele escreve que fazia parte de um grupo, cita o atentado de 11 de setembro e destaca que há sites na internet que ensinam como fazer bombas e como conseguir recursos para comprar munição e explosivos. (...) Entre os escritos, numa carta aparentemente dirigida a uma mulher, há muitas referências religiosas e sinais de tendência suicida. Em alguns trechos do manuscrito, ele afirma passar quatro horas por dia lendo o Alcorão: "Não o livro, porque ficou com o grupo, mas partes que eu copiei para mim", escreveu Wellington. No mesmo texto ele menciona o atentado terrorista de 11 de setembro 2001, em Nova York e Washington: "Tenho meditado muito sobre o 11/09".Esta hipótese já havia sido aventada timidamente no sábado, pelo jornal Zero Hora, de Porto Alegre:— Ele falava em jogar um avião no Cristo Redentor. Era fascinado pelo 11 de Setembro (atentado com aviões em Nova Iorque, em 11 de setembro de 2001, que deixou cerca de 3 mil mortos). O primo que testemunhou aos policiais viveu com Wellington numa casa da Rua do Cacau, a cerca de três quarteirões da escola onde ele realizou a chacina. Ele ainda disse que o matador se dizia fundamentalista muçulmano e treinava pilotar aviões, num jogo de computador. Por ter deixado uma longa barba crescer, alguns vizinhos em Sepetiba (onde estava morando há cerca de dois anos) o chamavam de Bin Laden.Há mais um detalhe além da barba, que talvez não seja irrevelante. O criminoso usava uma camisa verde, a cor do Islã. Seria oportuno investigar se Wellington já usava essa camisa anteriormente ou se a comprou para a ocasião.De Islã e de cristianismo, Wellington deve entender a mesma coisa. Isto é, nada. É mais um desses malucos que andam com livros sagrados debaixo do sovaco e destes textos depreendem só o que sua loucura pede. Mas ele gostou do massacre das torres gêmeas. Sem dúvida alguma, adoraria jogar um avião no Cristo Redentor (e aqui não mais se entende sua menção a Jesus) Na falta de um sponsor generoso como Bin Laden, que lhe financiasse um curso de pilotagem, pegou o que tinha mais à mão, dois revólveres. E partiu à luta. Ou seja, em busca de fama.Não é preciso ler sobre o 11 de Setembro para descobrir que um bom massacre transporta um Zé-ninguém obscuro e ressentido às primeiras páginas dos jornais. O anônimo Wellington Menezes Oliveira finalmente saiu do anonimato. Hoje faz manchetes no Brasil e no mundo todo. O caminho rumo à fama não é assim tão inacessível como julgam muitos mortais. A imprensa, que talvez tenha sido uma das motivações do assassino, sabe disso. Acontece que os jornais não podem deixar de noticiar tais fatos.Não que o Islã em si tenha sido o responsável último pelo massacre no Rio. Mas o gesto de Mohammed Atta, decorrente do ódio muçulmano ao Ocidente, certamente sim. As motivações do ataque estão sendo atribuídas – por sociólogos, psicólogos e outros ólogos – a um conceito ianque, importado dos States, o tal de bullying, que a imprensa nacional sequer teve o pudor de traduzir. Qualquer gesto de violência que foge à lógica é hoje atribuído ao bullying. Convenhamos: se toda criança que sofreu humilhações na infância fosse um potencial assassino, o mundo todo seria um imenso festival de massacres.A razão da matança deve ser buscada um pouco mais atrás, em um distante 11 de setembro. Que tem, sem dúvida alguma, uma digital do Islã.

segunda-feira, 11 de abril de 2011

CRÔNICAS TRISTES - CHORO SEM LÁGRIMA - Paulo Wainberg

Choro pelos pais. Choro pelas crianças que mal começavam e foram interrompidas. Choro pelos parentes, irmãos, amigos. Choro pela desgraça e pela tragédia da escola, no Rio de Janeiro. Choro sem lágrimas, um choro interno, um choro da alma que, já empedernida, recusa-se a suar, não são as lágrimas o suor da alma? Choro forte desta vez, pois o choro diário, quando morrem em acidentes de trânsito, em atentados terroristas, em tsunamis e terremotos, assaltos ou devido às drogas, é um choro amortecido pela constância e pelo medo de que a tragédia aconteça comigo ou próximo a mim. Entender o ser humano sempre foi um esforço, uma busca que não terá fim. Porém ouso considerar que as doenças mentais podem ser divididas em patologias apenas psíquicas e patologias psíquicas racionais. O assassino do Rio de Janeiro não tinha alternativa e faria o que fez de qualquer modo. Sua loucura é incontrolável, ele não possuía nenhum domínio sobre ela e assim submetido, seguiu em frente, dando vazão ao impulso doentio. Esquizofrenia talvez seja a denominação adequada à sua doença. Outras do mesmo gênero são a cleptomania, a pedofilia, a paranóia, a bipolaridade, doenças que dominam e controlam o sujeito que sobre elas não possuem qualquer controle, qualquer domínio. Para os atos que esses doentes praticam, não há perdão, mas também não há condenação. Devem estar sob constante vigilância e tratamento que reduzam os impulsos e impeçam as tragédias. Nem sempre é possível. As doenças psíquicas racionais são aquelas em que o indivíduo opta pela ação que vai praticar, embora possua arcabouço mental para escolher o oposto, isto é, não fazer o que o impulso determina. O fanatismo é uma doença mental racional, o sujeito escolhe submeter-se à sua obsessão e agir de acordo com ela. Terroristas, racistas, homofóbicos, intolerantes de todo o gênero são doentes mentais racionais porque, ao invés de utilizar a razão para o benefício da humanidade, raciocinam em favor do próprio fanatismo. O homem-bomba que explode um supermercado, um aeroporto ou um avião, age em nome de uma causa que ele, fanaticamente, segue. Não admite, racionalmente, rever suas idéias, encarar distorções evidentes, modificar seus conceitos. Assim, age em plena posse de suas faculdades mentais. E todos aqueles que apóiam o procedimento são, igualmente, doentes mentais racionais, que minimizam a morte, a destruição e o desespero alheio, em nome do valor mais elevado: a causa que defendem. Todo ditador, não importa a ideologia, é um doente mental racional. Quando um esquizofrênico atira e mata indiscriminadamente, está respondendo aos impulsos da própria mente adoecida, ao comando de vozes inexistentes, mas que para ele, existem. É tão intensa a doença que, quase sempre, são suicidas, como se um pequeno espaço saudável de sua mente exigisse a auto punição imediata. Quando um terrorista ou um ditador mata indiscriminadamente, está obedecendo a um raciocínio lógico que sua mente adoecida constrói, mas sobre o qual possui amplo domínio e plena capacidade para elaborar o raciocínio inverso. Trata-se, neste caso, de uma escolha consciente pela destruição. Os doentes mentais racionais não merecem perdão, merecem o pior castigo possível, merecem a extirpação e a execração. Os outros, os verdadeiros doentes mentais, merecem a nossa piedade e compreensão. O assassino do Rio de Janeiro fez justiça com as próprias mãos ao disparar a arma contra a própria cabeça. Encerro chorando sem lágrimas, mas com a alma dorida e triste por saber que somos todos seres humanos, quando podíamos ser apenas humanos. E sigo a vida como ela pode ser seguida, sem esperanças e com medo.

sexta-feira, 8 de abril de 2011

NÃO SEI DE QUEM É A CULPA - João Eichbaum

De quem é a culpa pelo massacre de inocentes e indefesas crianças numa escola do Rio de Janeiro? Respondam-me, por favor, porque eu não sei. Do governo não é, porque o governo proíbe o uso de armas, a venda de armas, o porte de armas. Essa proibição foi tudo quanto o governo pode fazer para evitar assassinatos, massacres e outras atrocidades de menor porte. Portanto, a culpa não é do governo, porque ele fez tudo quanto poderia fazer, fez o máximo que a inteligência dos deputados poderia permitir... Proibindo armas, eles achavam que poderiam riscar o homicídio do Código Penal. Só eles, claro... Será da direção da escola a culpa, porque não tomou as medidas necessárias para proteger a vida dos alunos? Também não. A escola não é responsável pela segurança dos alunos. Então, afinal, de quem é a culpa? Não sou daqueles que procuram culpados para tudo. E isso pela simples razão de que conheço esse animal chamado homem, por cujos direitos a Maria do Rosário e uma multidão de seguidores seus se bate. Há fatos que, realmente, não são gerados por culpa, porque são produzidos pelo animal homem, sujeito a altos e baixos, muitas vezes submetido totalmente aos impulsos da animalidade, que se situa abaixo da linha da inteligência. Falo dos doentes mentais, falo dessas criaturas que de homem só têm o aspecto, porque foram castigadas por deficiências de funções cerebrais, deficiências essas que as colocam no mesmo nível dos animais ditos inferiores. O que aconteceu no Rio de Janeiro foi obra de um louco, de um animal humano subjugado pelas deficiências das funções cerebrais. Enfim, os incréus não encontram outras explicações para a barbárie cometida no Rio de Janeiro, a não ser a animalidade humana. Mas o homem não é o culpado por essa animalidade. Não foi ele que escolheu ser homem. Já os crentes, esses que apregoam por toda a parte que “Deus é fiel”, esses nos devem explicações que podem nos levar ao culpado. São eles que atribuem a esse deus a criação do homem e a administração do mundo e de suas criaturas, vivem dizendo “se Deus quiser”, ou “graças a Deus”. Só eles, portanto, saberão dizer o que falta nessa “administração divina”, quem é o reponsável por defeitos congênitos nas criaturas humanas, nessas criaturas que nos levam a nós, descrentes, à constatação única de que o homem não passa de um animal. Ah, antes que me esqueça, o autor do massacre das inocentes crianças era crente. Como os muçulmanos que matam e morrem, para se encontrar com Alá.

quinta-feira, 7 de abril de 2011

A BÍBLIA LIDA PELO DIABO - João Eichbaum

8 E chamou Deus à expansão Céus, e foi a tarde e a manhã do dia segundo. Bom, para fazer uma confusão dessas era preciso mesmo um dia inteiro. Mas, me digam uma coisa: alguém já viu água em cima do céu? Ou o cara que escreveu isso quis explicar a chuva? De qualquer jeito, se deu mal. Se as águas que estavam “acima da expansão” seriam as águas que fazem chover, então não ia parar de chover nunca. 9 E disse Deus: ajuntem-se as águas debaixo dos céus num lugar; e apareceu a porção seca; e assim foi. Então, quer dizer que foram reunidas todas as águas no mesmo lugar e a coisa ficou dividida assim: parte seca e parte molhada. Só que alguém, depois disso, andou sabotando a criação, porque hoje existe um mar aqui, um oceano ali, rios, lagos e lagoas, tudo separado, nos mais variados sítios, como diria o português. Donde se conclui que Javé não entendia nada de geologia. Salvo na parte do pré-sal que Ele botou no Brasil, só pra ajudar o Lula. 10 E chamou Deus à porção seca Terra, e ao ajuntamento das águas chamou Mares e viu Deus que era bom. Já comentei isso, que as águas não estão todas juntas, e não existe só mar. Existem oceanos, lagos e lagoas, rios, etc. O que é que Ele “viu que era bom”?. A parte seca ou os “Mares”? Ah, que mar é bom, no verão, é. Principalmente quando a gente ta curtindo as gatas na praia e depois resolve dar um mergulho. Quer dizer, a gente enche os olhos com a beleza das gatas na porção seca, isto é, na praia, desvia o olhar daquelas velhas gordas, despencando banha pra todos os lados, e se joga no mar. Aí, as duas coisas ficam boas. Agora, em alto mar, dentro dum navio, rebolando e chacoalhando no meio duma tempestade, cara, nem é bom pensar: isso não é bom. 11 Disse Deus: produza a terra erva verde, erva que dê semente, árvore frutífera que dê fruto segundo a sua espécie, cuja semente está nela sobre a terra. E assim foi. A primeira coisa que Ele mandou crescer, portanto, foi a erva verde, a erva daninha, essa que faz a gente pegar na enxada e suar, de sol a sol, e quanto mais a gente capina mais ela cresce. Brincadeira, né? Pra começar, então, a botar no nosso, erva daninha, essa mesma que dá semente, não precisa nem plantar, aparecem da noite pro dia, essas pragas... Depois, sim, veio a “arvore frutífera que dá frutos segundo sua espécie”. É, seria muito engraçado se a bananeira dessa laranja, se a videira dessa maçã, se a laranjeira desse banana, e assim por diante, se cada árvore não desse fruto próprio da sua espécie. Se não fosse assim, véio, queria te ver passar debaixo duma videira carregada de melancias, das grandes. Ba, bróder, mas as florestas, como é que surgiram, se Ele mandou crescer a erva verde (será a do chimarrão?) e depois a árvore frutífera? As florestas, pô, cheias de carvalho, de cedro, de pau brasil, que os portugueses, os franceses e outros fiadasputas levaram, a floresta amazônica que ta assim, ó, de depredadores? Como é que surgiu tudo isso, se Ele só criou erva verde e árvore frutífera?

quarta-feira, 6 de abril de 2011

DE FREQUENTADOR DA ZONA A CRÍTICO DOS JUROS ALTOS, JOSÉ DE ALENCAR ESTÁ A CAMINHO DA CANONIZAÇÃO - Hucho Haddad

No Brasil, a exemplo do que ocorre em boa parte do planeta, exigir coerência no mundo político é a mais hercúlea das tarefas. Quiçá não seja uma empreitada completamente impossível. Quando um político passa para o outro lado da vida, se é que isso de fato existe, suas mazelas chegam à sepultura muito antes do cadáver. O mau vira bom, o desonesto vira honesto, o implacável vira um coitado. Sem querer duvidar da sua honestidade, esse cenário já recobre a morte de José Alencar Gomes da Silva, vice-presidente da República nos dois mandatos de Lula da Silva (2003-2010), que morreu em São Paulo após mais de uma década de luta contra um câncer abdominal. Tão logo subiu a rampa do Palácio do Planalto pela primeira vez, José Alencar não demorou a tecer suas críticas contra as altas taxas de juros. Mal sabia Alencar que os banqueiros derramaram verdadeiras fortunas na campanha de Lula e ao incauto povo brasileiro cabia pagar a conta. Como cabe até hoje. E o esperneio discursivo do empresário José Alencar pouco adiantou. Fosse um homem coerente, Alencar teria alcançado o boné e renunciado. Só não o fez por conta de interesses maiores. Ano e meio depois de tomar posse ao lado de Lula, o simpático José Alencar adotou obsequioso silêncio diante do escândalo que ficou nacionalmente conhecido como mensalão do PT, esquema criminoso de cooptação de parlamentares que trocaram a consciência por um punhado de dinheiro imundo. É verdade que todos são inocentes até prova em contrário, mas no PT de outrora rezava a regra de que para condenar alguém bastavam apenas evidências. A profecia é de autoria de José Dirceu de Oliveira e Silva, o Pedro Caroço, figura com a qual José Alencar conviveu sem qualquer reserva. O agora santificado José Alencar apostou nas palavras do companheiro Lula, que certa vez disse com todas as letras que a China é uma economia de mercado. Certo de que o parceiro palaciano sabia das coisas, Alencar deflagrou um processo para abrir uma unidade de seu conglomerado têxtil no país da lendária muralha. Mesmo com o Brasil sofrendo há anos aconcorrência desleal dos fabricantes chineses de tecidos e afins, Alencar exigiu que o projeto fosse cumprido à risca. E o mercado brasileiro de tecidos, que deveria ser defendido pelas autoridades verde-louras e também pelo então vice-presidente, foi mandado às favas inclusive por José Alencar. Por ocasião da CPI dos Correios, que acabou investigando a fonte de financiamento do mensalão petista, o nome da Coteminas veio à baila, pois a empresa de José Alencar recebeu em uma de suas contas bancárias um depósito de R$ 1 milhão feito pelo PT. Alencar, que logo tratou de isentar de qualquer culpa o seu conglomerado empresarial, alegou que as explicações deveriam ser cobradas do próprio PT. A operação, segundo José Alencar, decorreu do fornecimento de 2,75 milhões de camisetas aos candidatos petistas nas eleições municipais de 2004. O então presidente nacional do PT, Ricardo Berzoini, informou a José Alencar, horas depois da eclosão do escândalo, que o repasse à Coteminas não foi contabilizado pelo partido. A dívida, de R$ 12 milhões, correspondia à época a 50 carretas abarrotadas de camisetas. Para contemplar as necessidades de Lula e Alencar, o caso foi devidamente abafado. Guindado ao Ministério da Defesa por decisão de Lula, o empresário José Alencar viu a sua Coteminas vender cada vez mais uniformes para o Exército brasileiro. Coincidência? Talvez, mas na política essa palavra não existe no dicionário. Em 2006, ao aceitar o convite para novamente fazer dupla com Lula da Silva, José Alencar acabou por endossar o mensalão e outros tantos escândalos de corrupção patrocinados pelo Partido dos Trabalhadores e por muitos palacianos. No quase infindável imbróglio da Varig, coube a José Alencar aproximar o empresário Constantino Oliveira, o nada diplomático Nenê, do presidente Lula, que implorou para que o dono da Gol comprasse a outrora mais importante companhia de aviação do País. Muito estranhamente, Nenê Constantino, tão mineiro quanto José Alencar, atendeu aos apelos de Lula e arrematou a Varig por US$ 300 milhões, uma empresa que estava resumida à própria marca. Até hoje ninguém conseguiu entender a transação que nem mesmo o mais incauto investidor seria capaz de apostar suas economias, mas o universo do poder tem essas situações inexplicáveis. Em agosto de 2010, ao ser entrevistado pelo apresentador Jô Soares, o nada elegante José Alencar aceitou falar sobre o processo de investigação de paternidade que lhe movia Rosemary de Morais, sua suposta filha, e a recusa em se submeter a um teste de DNA. Ao apresentador global o agora bonzinho José Alencar repetiu o que disse à Justiça. Que a mãe de sua suposta filha era prostituta e que ele, José Alencar, foi um frequentador contumaz das zonas de meretrício das cidades onde morou desde jovem. Ao expor a mãe da sua suposta filha de forma tão covarde e aviltante, José Alencar não apenas escancarou o seu caráter, mas mostrou ao mundo ser ele alguém bem diferente daquele que hoje, após a morte, a consternada população brasileira tenta canonizar. Ter pena de José Alencar por conta da sua luta contra o câncer não causa espanto. Mas há milhares de brasileiros na mesma situação de Alencar e que lamentavelmente dependem do sistema público da saúde para lutar contra a morte. Esses sim são bravos lutadores, dignos de pena e do respeito incondicional de todos. Em momento algum quero festejar a morte de alguém, até porque esse é o tipo de atitude que não se toma nem mesmo com os mais figadais inimigos, mas não se pode alçar aos céus com tanta rapidez quem ainda tem contas a acertar com o Criador. De igual maneira, a minha manifestação não se trata de moralismo oportunista, mas serve como apelo aos brasileiros para que releiam a recente história política nacional e que mantenham a coerência no momento em que mais um político se despede da vida terrena. Errar é humano, é verdade, mas o erro pontual pode ser transformado em plataforma de acertos futuros se o errante tiver um mínimo de massa cinzenta. Como sempre escrevo, digo e não canso de repetir, sou o melhor produto dos meus próprios erros. Ainda bem! E é por isso que espero que no momento da minha morte os meus inimigos preservem a coerência e mantenham as críticas que me fizeram ao longo da vida. Só assim descansarem em paz, ciente de que mesmo longe dessa barafunda continuarei coerente e incomodando. O meu finado pai, que tantos bons exemplos me deixou, por certo não encontrou minha mãe na zona mais próxima, mas os que me odeiam podem continuar me chamando de “filho da p***”. O genial Jânio Quadros dizia que o melhor é se referir ao desafeto como “filho de p*** com a anuência da minha respeitadíssima genitora. Fora isso, é preciso considerar que, assim como acontece com os árbitros de futebol, jornalistas políticos polêmicos sempre têm uma mãe sobressalente para os costumeiros e inevitáveis xingamentos. E que o Criador escute as minhas preces e dispense ao ser humano José Alencar o tratamento devido, pois a sua luta pela vida foi inglória. Amém!

terça-feira, 5 de abril de 2011

DO PRAZER DE SER ROUBADO - Janer Cristaldo

Tenho recebido não poucos mails com listas pedindo assinaturas contra a decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) pela validade da Lei da Ficha Limpa somente a partir das eleições de 2012. Indignados, querem a punição em função de lei promulgada hoje por atos praticados ontem. É indignação de quem não tem a mínima idéia do que seja Direito.Claro que todos querem ver políticos corruptos afastados do Congresso. Mas dos males o menor. Lei não pode retroagir. Seria o caos jurídico, a insegurança total para todo cidadão. O que você fez ontem e era perfeitamente legal pode se tornar crime amanhã. O problema está à frente. Ao que tudo indica, essa lei não entrará em vigência nos próximos dez anos, dado os níveis de recurso que o Direito brasileiro admite. Este é o verdadeiro pepino. Há quatro instâncias recursais neste insólito Brasil. Com sorte e bons advogados, o canalha morre antes da quarta.Leio no Globo: “Levantamento feito pela ONG Congresso em Foco revela que um em cada quatro parlamentares reeleitos responde a processo no Supremo Tribunal Federal (STF). Dos 320 congressistas que se reelegeram ou garantiram nas urnas o direito de trocar de casa legislativa, 76 são alvo de investigação no STF. Juntos, eles acumulam 167 pendências judiciais.“Ainda de acordo com a ONG, há 120 inquéritos e 47 ações penais contra 71 deputados federais e cinco senadores eleitos no dia 3 de outubro. Somente o Distrito Federal e o Espírito Santo não reelegeram parlamentares com processo. Minas Gerais, com 11 nomes, e São Paulo, com dez, são as bancadas com maior número de reeleitos com problemas no Supremo. O número de reeleitos com pendências na Justiça, porém, pode ser ainda maior”.Dos onze ministros do STF, cinco defenderam que a lei deve ser aplicada na eleição do ano passado: Joaquim Barbosa, Carlos Ayres Britto, Ricardo Lewandowski, Carmen Lúcia e Ellen Gracie. As listas que infestam a rede consideram que estes cinco constituem o último bastião da moralidade no país. É preocupante saber que o STF abriga ministros que defendem a retroatividade da lei. Nem a ditadura fez isso. Quem tem de vetar políticos corruptos não é exatamente o Supremo. Mas o eleitor.Claro que todos queremos ver políticos corruptos afastados do Congresso, afirmei lá atrás. Mas... queremos mesmo? O plural me parece inadequado. Eu, sem dúvida alguma, quero. É por isso que não voto em nome nenhum há uns bons vinte anos.Políticos corruptos flagrados pela Justiça, pela polícia e pela imprensa – que tiveram inclusive de renunciar a seus mandatos para não serem cassados – são reeleitos nas eleições seguintes, como se uma amnésia coletiva tivesse acometido todo mundo. Por acaso algum eleitor não sabe quem é José Sarney, Roseana Sarney, Paulo Maluf, Jader Barbalho? No entanto, aí estão, eternamente deitados no poder, sempre com folgada maioria de votos.Diga-se o mesmo dos Caetanos, Bethânias, Gal Costas, Ivetes Sangalo et caterva. Tungam a carteira de seus fãs e depois cobram por seus shows. Espectador é o que não falta. Da mesma falta que eleitor é o que não falta para eleger e reeleger corruptos notórios.Brasileiro, ao que tudo indica, sente sumo prazer ao ser roubado.

segunda-feira, 4 de abril de 2011

UM DEFUNTO CHAMADO JOSÉ DE ALENCAR -João Eichbaum

Podem me chamar do que quiserem: não sou hipócrita. Nos últimos dias vi manchetes, ouvi manchetes, vi fotos, e até presenciei um minuto de silêncio no jogo do Inter pela Libertadores. Tudo pelo finado José de Alencar. O Lula, evidentemente, não perdeu a ocasião para chorar. Ele sabia que a imprensa estava ali, com suas potentes câmeras. A Dilma, ao lado do Lula, também fez beicinho. Você, meu amigo, o que é que sabe sobre o defunto José de Alencar? Que ele era vice-presidente da República. Tudo bem. Mas, vice-presidente da República, até o Sarney, aquele que enriqueceu graças aos cofres públicos, também foi. O Itamar, aquele que se engraçou numa modelo sem calcinha também foi. Pois o José de Alencar foi vice-presidente da República para eleger o Lula. Do seu currículo político é a única coisa que sei. Se ele fez alguma coisa pelo povo brasileiro não sei. Ninguém sabe. O mais que sei é que ele era um cara rico, ficou doente, mas nunca entrou numa fila do Sus. Nunca precisou ficar desde madrugada à espera de uma consulta. Morreu, depois de driblar a morte um sem número de vezes, porque tinha dinheiro, sem conhecer a desgraça do SUS. Foi, inúmeras vezes, para o hospital, sem que fosse necessário ficar na fila de espera. Foi, enfim, um privilegiado. Enquanto ele ia e vinha, de casa para o hospital, do hospital para casa, a qualquer hora, muita gente morreu na fila do SUS, esperando consulta, esperando vaga em hospital, esperando transplante. Por que essa “consternação”? Só porque foi imposta pela imprensa. Para o povo brasileiro, o José de Alencar não passou de um zero à esquerda, fora o exemplo de que o rico pode enganar a morte, enquanto o pobre se rala na fila do SUS.

sexta-feira, 1 de abril de 2011

ENCASTELADO NO VATICANO, PAPA DEFENDE ESPAÇO PARA OS MUÇULMANOS NA EUROPA - Janer Cristaldo

Bento XVI conclamou, na semana passada, os crentes e não crentes reunidos no que chamou de Átrio dos Gentios, diante da Notre Dame de Paris, a “deixar cair as barreiras do medo do outro, do estrangeiro”. O Átrio dos Gentios é uma criação do Vaticano, para favorecer o diálogo entre crentes e não-crentes. “Muitos reconhecem que eles não pertencem a uma religião, mas desejam um mundo novo e mais livre, mais justo e mais solidário. Cabe a vocês de fazer que em vossos países na Europa, crentes e não-crentes encontrem o caminho do diálogo”, disse o Bento. Mas não era bem do outro, nem dos estrangeiros – e muito menos dos não-crentes - de quem falava Sua Santidade. Seu discurso, segundo o Nouvel Obs, fazia eco às inquietações dos religiosos da França, face ao que chamam de estigmatização dos muçulmanos. Gentios, para a Igreja, não são exatamente os ateus. Mas todos aqueles que não participam de sua fé nem de seus dogmas.“Se se trata de construir um mundo de liberdade, de igualdade e de fraternidade – disse o papa, fazendo uma homenagem dissimulada aos revolucionários de 1789 que, entre outras providências, confiscaram os bens da Igreja - crentes e não-crentes devem se sentir mais livres de serem iguais em seus direitos de viver sua vida pessoal e comunitária em fidelidade a suas convicções”.Como se pudessem ser cultivadas estas flores – liberdade, igualdade e fraternidade – entre duas culturas, quando uma delas considera a mulher um ser inferior, que deve ser castrada e obediente a seu amo e senhor. Como se algum muçulmano desejasse algum mundo novo, mais livre, mais justo e mais solidário. A única coisa que os muçulmanos almejam na Europa é a preservação de seu mundo arcaico e de seus bárbaros costumes. “Uma das razões de ser deste Átrio dos Gentios – insistiu o vice-Deus – é de trabalhar por esta fraternidade além das convicções, mas sem negar suas diferenças”. Ora, as diferenças entre Ocidente e Islã são incontornáveis. Mas os sacerdotes são todos cúmplices, sejam de quais religiões forem. Padre não briga com padre. Nenhum aiatolá de Roma vai atacar os aiatolás de Teerã ou os mulás do Cairo ou de Bagdá. Todo código de deontologia é um acordo entre canalhas. Vigarista algum acusa o colega de vigarice. “Sejam atentos a estabelecer laços com todos os jovens sem distinção – disse Bento – não esquecendo aqueles que vivem na pobreza e na solidão, os que sofrem do desemprego, da doença ou se sentem à margem da sociedade”. Ironicamente, Sua Santidade se dirigia ao país que sustenta, com sua Previdência Social, os coitadinhos dos jovens árabes e africanos que se julgam no sagrado direito de ter quatro mulheres, cortar-lhes o clitóris e espancá-las quando bem entenderem. Sem falar no direito adquirido de queimar carros dos franceses impunemente, a cada final de ano.Encastelado no Vaticano - presente de Mussolini à Igreja, sempre é bom lembrar - cidadela que jamais teve o ônus de abrigar levas de imigrantes, Bento conclama a Europa a dormir com o inimigo. Melhor Sua Santidade ficasse calada. Passaria talvez por inteligente.