sexta-feira, 6 de novembro de 2015

MITOS

João Eichbaum

O homem inventa mitos e depois se deixa dominar por eles. O primeiro de todos os mitos foi a divindade. Salvo uns poucos indivíduos, a raça humana nunca escapou desse mito. E as gerações se foram sucedendo, sempre criando deuses. Alguns deles desapareceram e voltaram ao lugar donde vieram, a mitologia.

 Mas a ideia da divindade permaneceu, continuou dominante. Foi o maior de todos os mitos, por ser aquele que esconde o segredo da sobrevivência, a aspiração suprema do ser humano.

Os deuses nunca deram as caras, apesar dos clamores incessantes de seus criadores. Então, esses resolveram gerar, paralelamente, mitos de segunda categoria, para tê-los palpáveis. Os escolhidos, depois do bezerro de ouro, foram alguns espécimes da própria raça humana, aquela que nasce chorando, amarrada num matambre gelatinoso, sofre dores, expele excreções indesejáveis, se apaixona, odeia, inveja, mata, destrói, faz coisas que outros animais não fazem, apodrece, e se tem por um “ser digno”.

Antes, esse mito de carne, osso e fezes era criado “boca a boca”. Mais tarde, os meios de comunicação aprimoraram o sistema. O cinema, o jornal, a televisão foram entrando sucessivamente na vida das pessoas e lhes enriquecendo a imaginação para a criação de novos mitos.

Assim, apareceram os artistas de cinema. Depois vieram os jogadores de futebol e de outros esportes, o pessoal de rádio e televisão, as modelos de capa de revista. Hoje temos mitos de todos os jeitos e cores. Do Lula ao Sérgio Moro, tem mito para todos os gostos. E o povão os idolatra, devotando-lhes os mesmos sentimentos que votariam ao deus que não mostra a cara.

Deu para notar isso na Feira do Livro de Porto Alegre. Uns caras que nunca escreveram bosta nenhuma na vida ou só rabiscaram alguma coisa sobre futebol, estavam lá, autografando livros. Eram gente da RBS-TV, levados pela Câmara Riograndense do Livro, para incrementar as vendas. Poucos, entre aqueles que formavam enormes filas, irão ler os livros. Mas todos sentirão orgasmo, ao se sentirem abraçados pelos mitos.





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