RAQUEL E OS INDICIADOS
João Eichbaum
No Brasil só há três poderes:
Legislativo, Executivo e Judiciário. O Ministério Público não representa os
órgãos de soberania do país, pois não é um poder. Vontade não lhe falta. Age
como se fosse a cereja do bolo, mas não é um poder.
Isso significa que a PGR, sem o
status de órgão de soberania, não está no mesmo nível dos Poderes da República.
O estrato institucional que ocupa não exige aquela solenidade toda, aquela
pomposa cerimônia que armou, para a posse de Raquel Dodge como Procuradora
Geral da República.
Tal solenidade só serviu para
botar o Brasil no mapa do ridículo, mais uma vez. Nenhum país, que cultive
expectativas ordenadas, colocaria na mesma mesa, com toda a pompa e
circunstância e o tratamento recíproco de Vossa Excelência, indiciados e
acusadores.
Estampa de primeira página de
alguns jornais mostra a nova chefe da Procuradoria Geral exibindo um sorriso
fotográfico, tendo de um lado o presidente da República, Michel Temer, com o
rosto tomado por um ricto que viaja entre a raiva e a vergonha. No outro lado,
o presidente da Câmara de Deputados leva a mão à testa, traindo uma expressão
de espanto, tipo assim “o que que to fazendo aqui”?
A cara do Temer e do Rodrigo
Maia, assim como o sorriso arranjado de Raquel Dodge, refletem o malestar
dominante na cerimônia. A operação Lava Jato, o maior instrumento contra a
corrupção política, na história do país, foi sufocada por indigesto silêncio.
De certo, a Procuradora Geral da República preferiu não falar em corda na presença
dos enforcados...
Tudo isso mostra que a
solenidade teve mais de constrangimento do que de festa. Em seu fraco discurso,
no qual até quimeras do papa encontraram lugar, Raquel trata a corrupção como
um substantivo que nunca se desprendeu de sua natureza abstrata. Os ideais que
ressalta não são dela, mas constam do artigo 1º da Lei Orgânica Nacional do Ministério
Público.
Ao mencionar o “respeito e a
harmonia entre as instituições”, porém, esqueceu da roupa suja: no seio do
próprio Ministério Público, hoje, “respeito e harmonia” são virtudes
desfiguradas.
Uma transmissão de cargo dentro
de metros quadrados mais domésticos do que suntuosos, sem pompas, sem sorrisos
amarelos e adulações da alta roda, esconderia as fraquezas do Ministério
Público. Assim se evitariam duas coisas: o desconforto, nos personagens da
peça, e a água, que botaram no chope do povo, impedindo um brinde à operação
Lava Jato.
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