A
HEROÍNA
João
Eichbaum
Para
recuperar o sentido verdadeiro do martírio e do heroísmo, é bom falar nela.
Chamava-se Helley de Abreu Silva Batista e, por duas vezes, foi vítima das
tocaias do destino. A primeira, quando perdeu o filhinho de 4 anos, afogado
numa piscina. Buscando reaver o valor da vida, que lhe havia sido subtraído
pela desgraça, ela procurou a superação da dor na doação de si mesma, para
salvar outras crianças.
Pedagoga,
fez pós-graduação em Educação Especial Inclusiva e ingressou, por concurso,
como professora, no Centro de Educação Municipal Gente Grande, uma creche em
Janaúba, uma pequena cidade com 71 mil habitantes, em Minas Gerais.
Movida
pelo idealismo, sua preocupação era motivar os alunos na busca do melhor
rendimento, principalmente se tratando de crianças com alguma deficiência: a
essas dedicava maior atenção, para lhes proporcionar um aproveitamento de
criaturas ativas no contexto social.
Na
preparação das comemorações do Dia da Criança, se ocupava em despertar os
alunos para os espetáculos mágicos do cinema, com pipocas e doces, quando
irrompeu um incêndio na escola. Sem pestanejar, se entregou à tarefa de pôr a
salvo as crianças, enfrentando o fogo, expondo a própria vida.
O
incêndio fora provocado pelo vigia da
escola. Depois de atear fogo em si mesmo, o homem começou a fazê-lo também nas
crianças. Além de salvar alguns alunos, alcançando-os pela janela para outras
pessoas, Helley travou luta corporal com o incendiário, para conter sua
loucura. Nesse ato heróico, muito acima de suas forças, a vida se lhe esvaiu.
Seu corpo foi encontrado ao lado do corpo do algoz.
A
história desse país, que agora parou na página da corrupção, nunca fora
enaltecida com tal grau de heroísmo de uma mulher. Mas, apesar de sua grandeza,
ela foi lembrada apenas como pauta de notícia passageira. Não houve mobilização
de multidões, não houve cobranças movidas a ódio. Ao que se saiba, ninguém
deixou seu trabalho, seu lazer, seus afazeres cotidianos, sua preguiça
assistida por verbas governamentais, para ir à rua gritar palavras de ordem,
exigir justiça ou, pelo menos, para engrandecer a memória da professora Helley:
sua morte não serviu de repasto para energúmenos, nem de instrumento para a
política suja dos demagogos.
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