NOVA CARTA AO OSMAR
PAULO WAINBERG
www.http://paulowainberg.wordpress.com
@paulowainberg (Twitter)
O Osmar, você já sabe, é o meu correspondente que não responde e não corresponde. Em torno dos sessenta anos, abandonou a cerveja porque, segundo diz, ela incha, e passou para o uísque. Na terceira dose fica sono e vai dormir. Vai ver é por isso que jamais me escreve. Solteirão convicto (não é gay), sua última namorada a valer usava saia tubinho e peruca.
Enfim, sem perder a esperança de uma resposta, aí vai a carta:
Querido Osmar.
Como eu já te contei, tenho um problema crônico com as mulheres: Gosto mais delas do que elas de mim.
Não sei a que atribuir o fenômeno, porque não tenho nenhuma restrição a elas. Podem ser bonitas, feias, gordas, magras, de qualquer cor e etnia, gosto de todas, jamais digo o que elas devem fazer e como devem pensar, sou sincero nos meus elogios que, diga-se de passagem, não tem outra motivação do que simplesmente elogiar, sem intenções escusas, sem cabotinice ou desejo de conquistas.
Quando elogio as mulheres é simplesmente porque gosto delas.
Eventualmente posso sugerir um estilo, uma cor de roupa, um penteado, visando minha apreciação estética, ainda que a distância, nada demais, pura sinceridade e, por que não?, afeto.
Elas, entretanto, por não gostarem de mim, simplesmente não me aceitam como eu sou: um homem puro que gosta das coisas boas da vida, não guardo ressentimentos e não tenho ódio por ninguém.
Quase sempre entendem errado, ou não entendem, sei lá, as mulheres têm, quando querem, dificuldade de compreensão. Quando acerto, não fiz mais do que minha obrigação. Quando erro, entro na categoria de fracasso total, irremediavelmente incompetente, me transformam em alguém que nunca faz nada certo, que nunca vai aqui ou ali, mesmo que eu tenha ido aqui ou ali na semana passada.
Você, meu caro Osmar, homem vivido, certamente sabe do que estou falando e, talvez por isto, tenha passado sua vida inteira sem levar as mulheres a sério, fazendo com elas apenas o suficiente para suas necessidades e caindo fora sem olhar para trás.
Infelizmente não sou assim. Mesmo quando caio fora, eu olho para trás.
Bem, esta carta, sempre na esperança de que você me responda, é mais um desabafo, uma coisa assim, meio Buñel, meio Almodóvar, compreende?
Mas não se engane, porque não vou deixar de gostar delas. Talvez eu mude um pouco o modo de mostrar isso, talvez passe a me expor um pouco menos, ficar reservado, entrar numa de misógino ou, o que parece ser uma idéia tentadora, aderir a você, assumir o uísque e nunca mais pensar nisto.
Com o afeto e a esperança de sempre, aceite meu sincero abraço.
Do seu amigo de sempre,
Haroldo.
terça-feira, 31 de maio de 2011
segunda-feira, 30 de maio de 2011
ESPETO CORRIDO
Hugo Cassel-Abrajet SC
VISITA- Esteve em visita e participando de reunião em Balneário Camboriú, com os jornalistas Alberto Souza e Hugo Cassel, presidente e vice da Abrajet SC, (Associação Brasileira de Jornalistas de Turismo) a Doutora Isolete Pereira. Advogada, jornalista (Abrajet) e apresentadora de programa de Radio e TV em Buenos Aires, Isolete, que é catarinense, desempenha também as funções de tradutora juramentada do Governo Argentino nos assuntos de MERCOSUL. Autora de projetos visando solução para vários problemas comuns aos países, a jornalista fez uma explanação de um deles , que visa a educação das crianças no aspecto segurança no transito. Esse projeto já em fase de implantação na Argentina, patrocinado pelo Governo, é composto de livros, revistas, folders e filmes apresentados de forma simples e com musica e letra de fácil entendimento pelos jovens. É claro que os adultos também são chamados a respeitar as leis de transito, pois o exemplo deve ser dado por eles. Projetando a implantação do projeto nos demais países do MERCOSUL , a jornalista ganhou suporte do Governo da cidade de Córdoba, para um encontro de autoridades e imprensa, que em principio deverá ser efetivado no próximo mês de Julho. De plano recebeu da Diretoria da ABRAJET SC o mais amplo apoio.
OPINIÕES- A banda saudável do nosso Brasil, assiste estarrecida , e anestesiada, por oito anos de um governo onde aconteceu de tudo que não havia acontecido “antes nesse pais” à desconstrução do respeito, da vergonha, da dignidade, da moral e educação e dos direitos constitucionais do cidadão. Uma minoria insignificante da população exigindo e conseguindo de autoridades constituídas condicionadas, comprometidas , incompetentes e covardes, decisões que a torna possuidora de “mais direitos’ que os cidadão componentes da maioria. O que essa minoria na verdade quer não é o reconhecimento de sua opção sexual, eis que isso sempre existiu, em paz mas permissão oficial para exibicionismo festivo de atentados â moral e bons costumes em público como vem acontecendo. Se não fosse trágico esse momento até seriam hilárias as opiniões dos “defensores” dos “direitos Humanos” constantes no famigerado “Plano Nacional de Promoção da Cidadania e Direitos Humanos da LGBT” –
Indianara Siqueira- Secretária da REDTRANS na Câmara dos Deputados em 23/11/2010: “Minhas melhores professoras foram justamente as prostitutas”-( Deve ter sido boa aluna. Deu no que deu).
André Lázaro- Secretário de Educação Continuada , Alfabetização, e Diversidades do MEC ( o que é isso?) em 23/9/2010 na Câmara dos Deputados, sobre um filme “para crianças”-: “Um dos filmes tinha um beijo lésbico na boca e a gente ficou uns três meses discutindo até onde entrava a língua”- ( Essa é fácil, André: Entrava bem mais abaixo do umbigo).
Beto de Jesus-(de Jesus???) -Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bisexuais, Travestis e Transexuais:- “ Esse modelinho de família que Bolsonaro quer, é o modelo que quase não existe mais, papai , mamãe, Filhinho, Filhinha.” ( É possível não existir na casa em que você foi criado, Beto, mas existe e, é maioria, mas não pro seu bico)-
Luiz Mott:- Fundador do Grupo Gay da Bahia:- “ Já transei com mais de 500 homens diferentes. Quero Pedofilia já, enquanto estou com tudo em cima”- (Cansou de estar por baixo Luiz?) Você devia estar era no Sanatório ou na Cadeia)-
OPINIÃO DO ESPETO: Com tudo isso poucas são as vozes que se atrevem a contestar essa corja. Duas apenas Jair Bolsonaro e o Pastor Silas Malafaia. É muito pouco.
VISITA- Esteve em visita e participando de reunião em Balneário Camboriú, com os jornalistas Alberto Souza e Hugo Cassel, presidente e vice da Abrajet SC, (Associação Brasileira de Jornalistas de Turismo) a Doutora Isolete Pereira. Advogada, jornalista (Abrajet) e apresentadora de programa de Radio e TV em Buenos Aires, Isolete, que é catarinense, desempenha também as funções de tradutora juramentada do Governo Argentino nos assuntos de MERCOSUL. Autora de projetos visando solução para vários problemas comuns aos países, a jornalista fez uma explanação de um deles , que visa a educação das crianças no aspecto segurança no transito. Esse projeto já em fase de implantação na Argentina, patrocinado pelo Governo, é composto de livros, revistas, folders e filmes apresentados de forma simples e com musica e letra de fácil entendimento pelos jovens. É claro que os adultos também são chamados a respeitar as leis de transito, pois o exemplo deve ser dado por eles. Projetando a implantação do projeto nos demais países do MERCOSUL , a jornalista ganhou suporte do Governo da cidade de Córdoba, para um encontro de autoridades e imprensa, que em principio deverá ser efetivado no próximo mês de Julho. De plano recebeu da Diretoria da ABRAJET SC o mais amplo apoio.
OPINIÕES- A banda saudável do nosso Brasil, assiste estarrecida , e anestesiada, por oito anos de um governo onde aconteceu de tudo que não havia acontecido “antes nesse pais” à desconstrução do respeito, da vergonha, da dignidade, da moral e educação e dos direitos constitucionais do cidadão. Uma minoria insignificante da população exigindo e conseguindo de autoridades constituídas condicionadas, comprometidas , incompetentes e covardes, decisões que a torna possuidora de “mais direitos’ que os cidadão componentes da maioria. O que essa minoria na verdade quer não é o reconhecimento de sua opção sexual, eis que isso sempre existiu, em paz mas permissão oficial para exibicionismo festivo de atentados â moral e bons costumes em público como vem acontecendo. Se não fosse trágico esse momento até seriam hilárias as opiniões dos “defensores” dos “direitos Humanos” constantes no famigerado “Plano Nacional de Promoção da Cidadania e Direitos Humanos da LGBT” –
Indianara Siqueira- Secretária da REDTRANS na Câmara dos Deputados em 23/11/2010: “Minhas melhores professoras foram justamente as prostitutas”-( Deve ter sido boa aluna. Deu no que deu).
André Lázaro- Secretário de Educação Continuada , Alfabetização, e Diversidades do MEC ( o que é isso?) em 23/9/2010 na Câmara dos Deputados, sobre um filme “para crianças”-: “Um dos filmes tinha um beijo lésbico na boca e a gente ficou uns três meses discutindo até onde entrava a língua”- ( Essa é fácil, André: Entrava bem mais abaixo do umbigo).
Beto de Jesus-(de Jesus???) -Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bisexuais, Travestis e Transexuais:- “ Esse modelinho de família que Bolsonaro quer, é o modelo que quase não existe mais, papai , mamãe, Filhinho, Filhinha.” ( É possível não existir na casa em que você foi criado, Beto, mas existe e, é maioria, mas não pro seu bico)-
Luiz Mott:- Fundador do Grupo Gay da Bahia:- “ Já transei com mais de 500 homens diferentes. Quero Pedofilia já, enquanto estou com tudo em cima”- (Cansou de estar por baixo Luiz?) Você devia estar era no Sanatório ou na Cadeia)-
OPINIÃO DO ESPETO: Com tudo isso poucas são as vozes que se atrevem a contestar essa corja. Duas apenas Jair Bolsonaro e o Pastor Silas Malafaia. É muito pouco.
sexta-feira, 27 de maio de 2011
LIÇÕES DE DIREITO PARA SECRETÁRIOS, ASSESSORES, AUXILIARES E ESTAGIÁRIOS DE JUÍZES, DESEMBARGADORES E MINISTROS
O VOTO DO FUX (III)
João Eichbaum
Na lição de DANIEL SARMENTO (A Dimensão Objetiva dos Direitos Fundamentais: Fragmentos de uma Teoria. In Revista de Direito da Associação dos Procuradores do Novo Estado do Rio de Janeiro, vol. XII – Direitos Fundamentais: 297/332. Rio de Janeiro:Lumen Juris, 2003, p. 298 e seguintes) e INGO WOLFGANG SARLET (A Eficácia dos Direitos Fundamentais. 10. edição. Porto Alegre: Livraria do Advogado,2009, p. 141 e seguintes), os direitos fundamentais também positivam valores eleitos por uma comunidade como nucleares, de maneira a balizar a atuação do poder político e até mesmo dos particulares, irradiando-s por todo o ordenamento jurídico.
Viram? Não é da autoria do Fux esse pensamento. Ele o atribui a duas outras pessoas. Como a frase não está entre aspas, é lícito supor que não se trata de expressão literal dos autores mencionados, mas de idéia trabalhada com a linguagem arrevesada do Fux. Mas, se os autores escreveram assim mesmo, tal como o diz o Fux, então eles estão no mesmo barco: têm que fazer um cursinho de redação.
Positivar significa “tornar positivo”. Vamos então dissecar essa significação.
O verbo “tornar” envolve idéia de transformação, de mutação, de mudança de estado. Algo deixa de ser o que era, para se transformar em outra coisa. Seguido de adjetivo pode ter também o sentido de “fazer”,
“Tornar positivos valores eleitos”, ou como diz o voto do Fux, positivar valores eleitos é uma expressão ambígua, da qual se pode inferir que “os direitos fundamentais transformam em positivos os valores que, antes, eram negativos”.
Aí não dá, né? Como é que a gente vai colocar essa significação naquela baita frase do Fux?
Mas, vamos adiante. “Positivar valores...de maneira a balizar a atuação do poder político”...
Pô! Nada a ver!
Se “positivar” significa “tornar positivo”, o adjetivo “positivo” não vem carregado da força necessária para desencadear, por si mesmo, outra ação. O que é positivo é positivo: certo, real, verdadeiro, afirmativo, e também...decisivo.
Aqui nesse adjetivo, que deveria ter sido empregado pelo Fux, reside toda a clareza da idéia, desde que acompanhado da locução adverbial necessária: decisivo.
Bom, para não cansar a beleza de vocês, o que o Fux queria dizer era o seguinte: “entre os direitos fundamentais, também se compreendem os valores que são tidos como essenciais, por uma comunidade, os quais se tornam decisivos, e com tal força, que limitam a atuação do poder político e até mesmo dos particulares, irradiando-se por todo o ordenamento jurídico.
João Eichbaum
Na lição de DANIEL SARMENTO (A Dimensão Objetiva dos Direitos Fundamentais: Fragmentos de uma Teoria. In Revista de Direito da Associação dos Procuradores do Novo Estado do Rio de Janeiro, vol. XII – Direitos Fundamentais: 297/332. Rio de Janeiro:Lumen Juris, 2003, p. 298 e seguintes) e INGO WOLFGANG SARLET (A Eficácia dos Direitos Fundamentais. 10. edição. Porto Alegre: Livraria do Advogado,2009, p. 141 e seguintes), os direitos fundamentais também positivam valores eleitos por uma comunidade como nucleares, de maneira a balizar a atuação do poder político e até mesmo dos particulares, irradiando-s por todo o ordenamento jurídico.
Viram? Não é da autoria do Fux esse pensamento. Ele o atribui a duas outras pessoas. Como a frase não está entre aspas, é lícito supor que não se trata de expressão literal dos autores mencionados, mas de idéia trabalhada com a linguagem arrevesada do Fux. Mas, se os autores escreveram assim mesmo, tal como o diz o Fux, então eles estão no mesmo barco: têm que fazer um cursinho de redação.
Positivar significa “tornar positivo”. Vamos então dissecar essa significação.
O verbo “tornar” envolve idéia de transformação, de mutação, de mudança de estado. Algo deixa de ser o que era, para se transformar em outra coisa. Seguido de adjetivo pode ter também o sentido de “fazer”,
“Tornar positivos valores eleitos”, ou como diz o voto do Fux, positivar valores eleitos é uma expressão ambígua, da qual se pode inferir que “os direitos fundamentais transformam em positivos os valores que, antes, eram negativos”.
Aí não dá, né? Como é que a gente vai colocar essa significação naquela baita frase do Fux?
Mas, vamos adiante. “Positivar valores...de maneira a balizar a atuação do poder político”...
Pô! Nada a ver!
Se “positivar” significa “tornar positivo”, o adjetivo “positivo” não vem carregado da força necessária para desencadear, por si mesmo, outra ação. O que é positivo é positivo: certo, real, verdadeiro, afirmativo, e também...decisivo.
Aqui nesse adjetivo, que deveria ter sido empregado pelo Fux, reside toda a clareza da idéia, desde que acompanhado da locução adverbial necessária: decisivo.
Bom, para não cansar a beleza de vocês, o que o Fux queria dizer era o seguinte: “entre os direitos fundamentais, também se compreendem os valores que são tidos como essenciais, por uma comunidade, os quais se tornam decisivos, e com tal força, que limitam a atuação do poder político e até mesmo dos particulares, irradiando-se por todo o ordenamento jurídico.
quinta-feira, 26 de maio de 2011
A BÍBLIA LIDA PELO DIABO
João Eichbaum
A FORMAÇÃO DO JARDIM DO ÉDEN
4 Estas são as origens dos céus e da terra, quando foram criados: no dia em que o Senhor fez a terra e o céu. 5 E toda a planta do campo que ainda não estava na terra, e toda a erva do campo que ainda não brotava, porque ainda o Senhor Deus não tinha feito chover sobre a terra e não havia homem para lavrar a terra.6 Um vapor, porém, subia da terra e regava toda a face da terra.
Complicado, né? O cara que escreveu isso parece meio perdido, não sabe o que dizer pra encher lingüiça. Deus criou a planta de campo, mas a planta ainda não estava na terra! Hum!
Será que Ele tinha se esquecido de criar a chuva?
Bom, de qualquer maneira, um vaporzinho que subia da terra quebrava o galho. Mais não era preciso, porque não havia homem para lavrar a terra e comer, então pra quê plantas e ervas brotando?
Manjou, cara? O Velho Javé, além de tudo, era um mão de vaca: economizava água e frutas.
7 E formou o Senhor Deus o homem do pó da terra e soprou em seus narizes o fôlego da vida; e o homem foi feito alma vivente.
Xi, pelo jeito o homem aquele, feito de pó, tinha mais de um nariz.
Gozado, se era feito de pó, como é que não se esfacelou quando recebeu aquele sopro? Teria sido melhor assim, porque Javé, na certa, ia tentar nova experiência, testando um material melhor.
8 E plantou o Senhor Deus um jardim no Éden, da banda do oriente: e pôs ali o homem que tinha formado. 9 E o Senhor Deus fez brotar da terra toda a árvore agradável à vista, e boa para comida: e a árvore da vida, no meio do jardim, e a árvore da ciência do bem e do mal.
Legal, hein, beleza! Casa e comida, cuca fresca, sem espinhas na cara, pouca quilometragem, o sujeito tinha tudo pra se dar bem! Sem nada pra fazer, se deitava, olhava as árvores, as estrelas e o firmamento, que eram novidades para ele e, por distração, coçava o saco.
Foi assim que tudo começou.
10 E saia um rio do Éden para regar o jardim e dali se dividia e tornava em quatro cabeças. 11 O nome do primeiro é Pison, esse é o que rodeia a terra de Havila, onde existe ouro.12 E o ouro dessa terra é bom: ali há bdellio, e a pedra sardônica. 13 E o nome do segundo rio é o Gihon:este é o que rodeia toda a terra de Cusch. 14 E o nome do terceiro rio é Hiddekel: este é o que vai para a banda do oriente da Assíria; e o quarto rio é o Eufrates.
Era um baita conteúdo de água para regar o jardim, vocês não acham? Rios mansos, água tranqüila, tudo bem administrado. Mas vocês já imaginaram se fosse hoje, com tanto rio em volta? Agora que o Velho Javé perdeu o controle e quem manda é a natureza? Nossa! Quanto alagamento, quantas casas boiando, galinhas cacarejando no teto, Fuscas velhos de pernas pro ar no meio da água...!
Se um rio só já faz estrago ...Mas, pera lá: o ouro, donde é que saiu? Quando é que Javé criou o ouro? Não criou mineral nenhum, naqueles seis dias, os únicos em que trabalhou na vida.
Então, como é que apareceu o ouro, e o que é que o homem, sozinho, ia fazer com o ouro, sem fins lucrativos?
A FORMAÇÃO DO JARDIM DO ÉDEN
4 Estas são as origens dos céus e da terra, quando foram criados: no dia em que o Senhor fez a terra e o céu. 5 E toda a planta do campo que ainda não estava na terra, e toda a erva do campo que ainda não brotava, porque ainda o Senhor Deus não tinha feito chover sobre a terra e não havia homem para lavrar a terra.6 Um vapor, porém, subia da terra e regava toda a face da terra.
Complicado, né? O cara que escreveu isso parece meio perdido, não sabe o que dizer pra encher lingüiça. Deus criou a planta de campo, mas a planta ainda não estava na terra! Hum!
Será que Ele tinha se esquecido de criar a chuva?
Bom, de qualquer maneira, um vaporzinho que subia da terra quebrava o galho. Mais não era preciso, porque não havia homem para lavrar a terra e comer, então pra quê plantas e ervas brotando?
Manjou, cara? O Velho Javé, além de tudo, era um mão de vaca: economizava água e frutas.
7 E formou o Senhor Deus o homem do pó da terra e soprou em seus narizes o fôlego da vida; e o homem foi feito alma vivente.
Xi, pelo jeito o homem aquele, feito de pó, tinha mais de um nariz.
Gozado, se era feito de pó, como é que não se esfacelou quando recebeu aquele sopro? Teria sido melhor assim, porque Javé, na certa, ia tentar nova experiência, testando um material melhor.
8 E plantou o Senhor Deus um jardim no Éden, da banda do oriente: e pôs ali o homem que tinha formado. 9 E o Senhor Deus fez brotar da terra toda a árvore agradável à vista, e boa para comida: e a árvore da vida, no meio do jardim, e a árvore da ciência do bem e do mal.
Legal, hein, beleza! Casa e comida, cuca fresca, sem espinhas na cara, pouca quilometragem, o sujeito tinha tudo pra se dar bem! Sem nada pra fazer, se deitava, olhava as árvores, as estrelas e o firmamento, que eram novidades para ele e, por distração, coçava o saco.
Foi assim que tudo começou.
10 E saia um rio do Éden para regar o jardim e dali se dividia e tornava em quatro cabeças. 11 O nome do primeiro é Pison, esse é o que rodeia a terra de Havila, onde existe ouro.12 E o ouro dessa terra é bom: ali há bdellio, e a pedra sardônica. 13 E o nome do segundo rio é o Gihon:este é o que rodeia toda a terra de Cusch. 14 E o nome do terceiro rio é Hiddekel: este é o que vai para a banda do oriente da Assíria; e o quarto rio é o Eufrates.
Era um baita conteúdo de água para regar o jardim, vocês não acham? Rios mansos, água tranqüila, tudo bem administrado. Mas vocês já imaginaram se fosse hoje, com tanto rio em volta? Agora que o Velho Javé perdeu o controle e quem manda é a natureza? Nossa! Quanto alagamento, quantas casas boiando, galinhas cacarejando no teto, Fuscas velhos de pernas pro ar no meio da água...!
Se um rio só já faz estrago ...Mas, pera lá: o ouro, donde é que saiu? Quando é que Javé criou o ouro? Não criou mineral nenhum, naqueles seis dias, os únicos em que trabalhou na vida.
Então, como é que apareceu o ouro, e o que é que o homem, sozinho, ia fazer com o ouro, sem fins lucrativos?
quarta-feira, 25 de maio de 2011
DEVE-SE ACABAR COM A PSICANÁLISE?
JANER CRISTALDO
Foi lançado no Brasil, só agora em 2011, O Livro Negro da Psicanálise, publicado em Paris em 2005. A antologia de ensaios denuncia a psicanálise como um embuste e Freud como um charlatão. O livro certamente fará muito ruído chez nous, afinal sempre estamos na rabeira dos grandes debates. Se a pergunta entre americanos é se deve-se ou não acabar com os doutorados, em Paris a pergunta é outra, assim enunciada pelo Nouvel Observateur: "Deve-se acabar com a psicanálise?"
Qualquer uma das duas questões ainda causa perplexidade nesta terra de papagaios. No Estadão de hoje, lemos entrevista com a editora franco-argelina Catherine Meyer, responsável pela antologia. Interrogada sobre se Freud era um mentiroso, a moça não tem papas na língua:
- Sim, porque ele fraudou seus resultados. Não foi o único; há outros a trapacear no meio científico. Mas você sabe como as coisas funcionam na ciência: define-se uma hipótese, mesmo que inacreditável - como Édipo e o amor de um filho pela mãe e a pedra angular de nossa vida psíquica. Eis uma hipótese! Um filho tem desejo e quer ter relações sexuais com sua mãe. É o complexo de Édipo. Quando se faz uma hipótese científica, a seguir passa-se à fase de verificação. Procede-se um percurso de pesquisa para constatar a hipótese pela sua eficiência. Quando se imagina um medicamento para a tuberculose, ele é testado em várias pessoas. A seguir, usamos a lixeira para jogar fora todas as hipóteses refutadas. O que os teóricos explicam muito bem no Livro Negro da Psicanálise é que Freud lançou hipóteses e elas nunca deixaram de ser apenas isso: hipóteses. Ele traficou a realidade para confirmar suas hipóteses.
Claro que o livro vai gerar acerbos protestos, afinal demole com o ganha-pão de não poucos vigaristas em Pindorama. Mas o debate é antigo e já tem pelo menos 40 anos. Em 1965, os cientistas americanos Edward e Cathey Pinckney publicaram The Fallacy of Freud and Psychoanalysis, traduzida em 1970 no Brasil como Psicanálise, a Mistificação do Século, pela Edigraf, que reduzia Freud à condição de vigarista. No Brasil, Silva Mello publicou, em 1967, um gordo ensaio de 536 páginas, intitulado Ilusões da Psicanálise, publicado pela Civilização Brasileira.
Escrevem os Pinckney:- Não existe uma única prova científica em apoio de que a psicanálise – definida como Freud como uma forma de tratamento da doença mental – tenha curado alguém ou possa curar uma doença! Ao contrário, existem numerosas observações documentadas demonstrativas não apenas dos insucessos da psicanálise, mas ainda, o que é pior, das suas conseqüências prejudiciais.
- O que mais contribui para comprovar a mistificação psicanalítica é o fato de os psicanalistas se esforçarem desesperadamente para rotular de ciência o seu método de exploração, sem contudo preencher nenhum dos postulados estabelecidos e aceitos pelos cientistas de todo o mundo, os únicos capazes de permitir-lhe o reconhecimento como verdadeiramente científica.
Isto foi escrito em 1965, há 46 anos. Os autores continuam desancando Freud por mais 218 páginas.
Estes livros repercutiam denúncias anteriores da grande vigarice do século XX. A psicanálise, mal surgiu, foi violentamente contestada. Em Gog, publicado em 1932, Giovanni Papini via Freud como um médico fracassado com pendores literários. Incapaz para a medicina, Freud dedicou-se à ficção. Assim nasceu a psicanálise. Mr. Goggius, o personagem do escritor florentino, é um milionário americano que a certa altura de sua vida quis conhecer o mundo e sai a viajar para ouvir as maiores personalidades da política, da ciência e das letras de sua época. Na entrevista com Freud, diz o criador da psicanálise:
- Que minha cultura é essencialmente literária demonstram-no, abundantemente, as minhas contínuas citações de Goethe, Grilpazer, Heine e outros poetas. A forma de meu espírito está inclinada para o ensaio, para o paradoxo, para o dramatismo, e nada tem da rigidez pedante e técnica do verdadeiro homem de ciência. Há uma prova irrefutável: em todos os países em que a psicanálise penetrou, foi ela mais bem entendida e aplicada pelos escritores e pelos artistas do que pelos médicos. Por outro lado, meus livros se assemelham muito mais a obras de imaginação do que a tratados de patologia. Os meus estudos sobre a vida cotidiana e sobre os movimentos do espírito são verdadeira e genuína literatura, e em Totem e Tabu também me exercitei na novela histórica. O meu desejo mais antigo e tenaz seria escrever verdadeiras novelas: possuo um tesouro de material em primeira mão que faria a fortuna de cem novelistas. Mas receio que agora seja muito tarde.
- Seja como for, soube, transpondo as dificuldades, vencer o meu destino e logrei o meu sonho: continuar a ser um literato, embora com as aparências de médico. Em todos os grandes homens de ciência há o sopro da fantasia, mãe das intuições geniais; mas nenhum se propôs, com eu, a traduzir em teorias científicas as inspirações da literatura moderna.
Isto escrevia Papini em 1932. Há quase oitenta anos. Antes da morte de Freud.
Ano passado, em livro que já comentei, Le crépuscule d’une idole - L’affabulation freudienne, Michel Onfray atacava o ídolo em que teria se convertido Freud e a vigarice que constitui a psicanálise. Era o que eu dizia nos anos 70. Pena que era gaúcho e não galo.
No livro, publicado em 2010, o autor acusa o pai da psicanálise de ser mentiroso, fracassado e defensor de regimes totalitários. A psicanálise é comparável a uma religião e sua capacidade de curar as pessoas é semelhante a da homeopatia. Freud teria tranformado seus próprios "instintos e necessidades fisiológicas" em uma doutrina com pretensão de ser universal. Mas, para Onfray, a psicanálise seria "uma disciplina verdadeira e justa no que diz respeito a Freud e ninguém mais".
Freud fracassou na cura de pacientes que ele mesmo atendeu, mas ocultou ou alterou suas histórias clínicas para dar a impressão de que o tratamento havia sido bem sucedido. Ele afirma, por exemplo, que Sergei Konstantinovitch, indicado por Freud como "o homem dos lobos", continuou fazendo psicanálise mais de meio século depois de ter sido supostamente curado por Freud. E diz que Bertha Pappenheim, conhecida como "Anna O." e apresentada por Freud como um caso em que o tratamento contra histeria e alucinações funcionou, continuou tendo recaídas.
"A psicanálise cura tanto quanto a homeopatia, o magnetismo, a radiestesia, a massagem do arco do pé ou o exorcismo feito por um sacerdote, quanto uma oração diante da gruta de Lourdes”, afirmou Onfray, em debate promovido pelo Nouvel Observateur. "Sabemos que o efeito do placebo constitui 30% da cura de um medicamento", acrescentou. "Por que a psicanálise escaparia desta lógica?"
Nada de novo sob o sol.
Foi lançado no Brasil, só agora em 2011, O Livro Negro da Psicanálise, publicado em Paris em 2005. A antologia de ensaios denuncia a psicanálise como um embuste e Freud como um charlatão. O livro certamente fará muito ruído chez nous, afinal sempre estamos na rabeira dos grandes debates. Se a pergunta entre americanos é se deve-se ou não acabar com os doutorados, em Paris a pergunta é outra, assim enunciada pelo Nouvel Observateur: "Deve-se acabar com a psicanálise?"
Qualquer uma das duas questões ainda causa perplexidade nesta terra de papagaios. No Estadão de hoje, lemos entrevista com a editora franco-argelina Catherine Meyer, responsável pela antologia. Interrogada sobre se Freud era um mentiroso, a moça não tem papas na língua:
- Sim, porque ele fraudou seus resultados. Não foi o único; há outros a trapacear no meio científico. Mas você sabe como as coisas funcionam na ciência: define-se uma hipótese, mesmo que inacreditável - como Édipo e o amor de um filho pela mãe e a pedra angular de nossa vida psíquica. Eis uma hipótese! Um filho tem desejo e quer ter relações sexuais com sua mãe. É o complexo de Édipo. Quando se faz uma hipótese científica, a seguir passa-se à fase de verificação. Procede-se um percurso de pesquisa para constatar a hipótese pela sua eficiência. Quando se imagina um medicamento para a tuberculose, ele é testado em várias pessoas. A seguir, usamos a lixeira para jogar fora todas as hipóteses refutadas. O que os teóricos explicam muito bem no Livro Negro da Psicanálise é que Freud lançou hipóteses e elas nunca deixaram de ser apenas isso: hipóteses. Ele traficou a realidade para confirmar suas hipóteses.
Claro que o livro vai gerar acerbos protestos, afinal demole com o ganha-pão de não poucos vigaristas em Pindorama. Mas o debate é antigo e já tem pelo menos 40 anos. Em 1965, os cientistas americanos Edward e Cathey Pinckney publicaram The Fallacy of Freud and Psychoanalysis, traduzida em 1970 no Brasil como Psicanálise, a Mistificação do Século, pela Edigraf, que reduzia Freud à condição de vigarista. No Brasil, Silva Mello publicou, em 1967, um gordo ensaio de 536 páginas, intitulado Ilusões da Psicanálise, publicado pela Civilização Brasileira.
Escrevem os Pinckney:- Não existe uma única prova científica em apoio de que a psicanálise – definida como Freud como uma forma de tratamento da doença mental – tenha curado alguém ou possa curar uma doença! Ao contrário, existem numerosas observações documentadas demonstrativas não apenas dos insucessos da psicanálise, mas ainda, o que é pior, das suas conseqüências prejudiciais.
- O que mais contribui para comprovar a mistificação psicanalítica é o fato de os psicanalistas se esforçarem desesperadamente para rotular de ciência o seu método de exploração, sem contudo preencher nenhum dos postulados estabelecidos e aceitos pelos cientistas de todo o mundo, os únicos capazes de permitir-lhe o reconhecimento como verdadeiramente científica.
Isto foi escrito em 1965, há 46 anos. Os autores continuam desancando Freud por mais 218 páginas.
Estes livros repercutiam denúncias anteriores da grande vigarice do século XX. A psicanálise, mal surgiu, foi violentamente contestada. Em Gog, publicado em 1932, Giovanni Papini via Freud como um médico fracassado com pendores literários. Incapaz para a medicina, Freud dedicou-se à ficção. Assim nasceu a psicanálise. Mr. Goggius, o personagem do escritor florentino, é um milionário americano que a certa altura de sua vida quis conhecer o mundo e sai a viajar para ouvir as maiores personalidades da política, da ciência e das letras de sua época. Na entrevista com Freud, diz o criador da psicanálise:
- Que minha cultura é essencialmente literária demonstram-no, abundantemente, as minhas contínuas citações de Goethe, Grilpazer, Heine e outros poetas. A forma de meu espírito está inclinada para o ensaio, para o paradoxo, para o dramatismo, e nada tem da rigidez pedante e técnica do verdadeiro homem de ciência. Há uma prova irrefutável: em todos os países em que a psicanálise penetrou, foi ela mais bem entendida e aplicada pelos escritores e pelos artistas do que pelos médicos. Por outro lado, meus livros se assemelham muito mais a obras de imaginação do que a tratados de patologia. Os meus estudos sobre a vida cotidiana e sobre os movimentos do espírito são verdadeira e genuína literatura, e em Totem e Tabu também me exercitei na novela histórica. O meu desejo mais antigo e tenaz seria escrever verdadeiras novelas: possuo um tesouro de material em primeira mão que faria a fortuna de cem novelistas. Mas receio que agora seja muito tarde.
- Seja como for, soube, transpondo as dificuldades, vencer o meu destino e logrei o meu sonho: continuar a ser um literato, embora com as aparências de médico. Em todos os grandes homens de ciência há o sopro da fantasia, mãe das intuições geniais; mas nenhum se propôs, com eu, a traduzir em teorias científicas as inspirações da literatura moderna.
Isto escrevia Papini em 1932. Há quase oitenta anos. Antes da morte de Freud.
Ano passado, em livro que já comentei, Le crépuscule d’une idole - L’affabulation freudienne, Michel Onfray atacava o ídolo em que teria se convertido Freud e a vigarice que constitui a psicanálise. Era o que eu dizia nos anos 70. Pena que era gaúcho e não galo.
No livro, publicado em 2010, o autor acusa o pai da psicanálise de ser mentiroso, fracassado e defensor de regimes totalitários. A psicanálise é comparável a uma religião e sua capacidade de curar as pessoas é semelhante a da homeopatia. Freud teria tranformado seus próprios "instintos e necessidades fisiológicas" em uma doutrina com pretensão de ser universal. Mas, para Onfray, a psicanálise seria "uma disciplina verdadeira e justa no que diz respeito a Freud e ninguém mais".
Freud fracassou na cura de pacientes que ele mesmo atendeu, mas ocultou ou alterou suas histórias clínicas para dar a impressão de que o tratamento havia sido bem sucedido. Ele afirma, por exemplo, que Sergei Konstantinovitch, indicado por Freud como "o homem dos lobos", continuou fazendo psicanálise mais de meio século depois de ter sido supostamente curado por Freud. E diz que Bertha Pappenheim, conhecida como "Anna O." e apresentada por Freud como um caso em que o tratamento contra histeria e alucinações funcionou, continuou tendo recaídas.
"A psicanálise cura tanto quanto a homeopatia, o magnetismo, a radiestesia, a massagem do arco do pé ou o exorcismo feito por um sacerdote, quanto uma oração diante da gruta de Lourdes”, afirmou Onfray, em debate promovido pelo Nouvel Observateur. "Sabemos que o efeito do placebo constitui 30% da cura de um medicamento", acrescentou. "Por que a psicanálise escaparia desta lógica?"
Nada de novo sob o sol.
terça-feira, 24 de maio de 2011
A IRMÃ DULCE E O STF
João Eichbaum
A irmã Dulce foi beatificada. A irmã Dulce, uma criatura magra, baixinha, encarquilhada, de olhar infeliz, o rosto cadavérico e aspecto doentio. Foi beatificada porque abdicou de si mesma, viveu para os outros, para os pobres, para os famintos, para os doentes, para todos os miseráveis com os quais nem Deus se preocupa, deixando-os penar, por penar, mesmo que o não mereçam. A irmã fez de sua vida um instrumento, senão de felicidade, pelo menos de esforço para atenuar a infelicidade dos desafortunados. Nada mais almejou senão a felicidade dos que sofriam. Claro, de quebra, certamente, almejava a felicidade eterna de sua alma, tal como a prometem o papa, os bispos, os cardeais, os padres e todos aqueles que, mesmo sem apresentarem procuração, se dizem representantes de Deus.
Outra coisa não fazia a irmã Dulce, a beata irmã Dulce, senão se preocupar com os direitos fundamentais das criaturas humanas, que se resumem no direito à vida sem dor e sem sofrimento.
Os ministros do Supremo Tribunal Federal, dotados de boa pança, de um modo geral, com direito a diárias, lanches, automóveis com motoristas e mesuras, todos tratados com a subserviência que lhes devotam humildes mas bem remunerados funcionários, pagos por nós, contribuintes, se debruçaram, outro dia, sobre os direitos fundamentais.
Só que tem um detalhe. Para os ministros do Supremo, todos apadrinhados, que chegaram àquele tribunal por graça de senhores influentes e a preço do esconjuro da própria personalidade, os direitos fundamentais são outros. Não são os direitos à vida e à sua inviolabilidade, que começam pela alimentação e pela saúde. Não. Os direitos fundamentais, para os ministros, são o direito de dar a bunda e de sugar clitóris, sem crítica, sem contestação, sem "homofobia", por ser a coisa mais natural do mundo. Direitos fundamentais, para os ministros do Supremo Tribunal Federal, são os direitos à promiscuidade, à deseducação de crianças que, ao invés de uma família, constituída por um pai e uma mãe, têm dois viados ou duas lésbicas a criá-las.
São assim esses animais, chamados seres humanos. Enquanto alguns poucos, muito poucos, como a Irmã Dulce, procuram dignificar a espécie, outros, a maioria, a degrada, fazendo de tudo para realçar a animalidade como seu direito fundamental. Mas muitos deles, a começar pelo presidente do STF, o carola César Peluso, ex-seminarista, certamente vivem recitando orações como essa, agradecendo a vida nababesca que levam, com a qual a irmã Dulce jamais sonhou:
O Senhor é o meu pastor e nada me faltará. Deita-me emverdes pastos e guia-me mansamente em águas tranqüilas.Refrigera a minha alma, guia-me pelas veredas da justiça,por amor do seu nome. Ainda que eu ande pelo vale da sombrada morte, não temerei mal algum, porque Tu estás comigo,a Tua vara e o Teu cajado me consolam. Prepara-me umamesa perante os meus inimigos, unge a minha cabeça comóleo, o meu cálice (de vinho e champanhe francesa) transborda. Certamente que a bondade e a misericórdia me seguirão todos os dias da minha vidae habitarei na casa do SENHOR por longos dias.
E só me resta dizer amém.
A irmã Dulce foi beatificada. A irmã Dulce, uma criatura magra, baixinha, encarquilhada, de olhar infeliz, o rosto cadavérico e aspecto doentio. Foi beatificada porque abdicou de si mesma, viveu para os outros, para os pobres, para os famintos, para os doentes, para todos os miseráveis com os quais nem Deus se preocupa, deixando-os penar, por penar, mesmo que o não mereçam. A irmã fez de sua vida um instrumento, senão de felicidade, pelo menos de esforço para atenuar a infelicidade dos desafortunados. Nada mais almejou senão a felicidade dos que sofriam. Claro, de quebra, certamente, almejava a felicidade eterna de sua alma, tal como a prometem o papa, os bispos, os cardeais, os padres e todos aqueles que, mesmo sem apresentarem procuração, se dizem representantes de Deus.
Outra coisa não fazia a irmã Dulce, a beata irmã Dulce, senão se preocupar com os direitos fundamentais das criaturas humanas, que se resumem no direito à vida sem dor e sem sofrimento.
Os ministros do Supremo Tribunal Federal, dotados de boa pança, de um modo geral, com direito a diárias, lanches, automóveis com motoristas e mesuras, todos tratados com a subserviência que lhes devotam humildes mas bem remunerados funcionários, pagos por nós, contribuintes, se debruçaram, outro dia, sobre os direitos fundamentais.
Só que tem um detalhe. Para os ministros do Supremo, todos apadrinhados, que chegaram àquele tribunal por graça de senhores influentes e a preço do esconjuro da própria personalidade, os direitos fundamentais são outros. Não são os direitos à vida e à sua inviolabilidade, que começam pela alimentação e pela saúde. Não. Os direitos fundamentais, para os ministros, são o direito de dar a bunda e de sugar clitóris, sem crítica, sem contestação, sem "homofobia", por ser a coisa mais natural do mundo. Direitos fundamentais, para os ministros do Supremo Tribunal Federal, são os direitos à promiscuidade, à deseducação de crianças que, ao invés de uma família, constituída por um pai e uma mãe, têm dois viados ou duas lésbicas a criá-las.
São assim esses animais, chamados seres humanos. Enquanto alguns poucos, muito poucos, como a Irmã Dulce, procuram dignificar a espécie, outros, a maioria, a degrada, fazendo de tudo para realçar a animalidade como seu direito fundamental. Mas muitos deles, a começar pelo presidente do STF, o carola César Peluso, ex-seminarista, certamente vivem recitando orações como essa, agradecendo a vida nababesca que levam, com a qual a irmã Dulce jamais sonhou:
O Senhor é o meu pastor e nada me faltará. Deita-me emverdes pastos e guia-me mansamente em águas tranqüilas.Refrigera a minha alma, guia-me pelas veredas da justiça,por amor do seu nome. Ainda que eu ande pelo vale da sombrada morte, não temerei mal algum, porque Tu estás comigo,a Tua vara e o Teu cajado me consolam. Prepara-me umamesa perante os meus inimigos, unge a minha cabeça comóleo, o meu cálice (de vinho e champanhe francesa) transborda. Certamente que a bondade e a misericórdia me seguirão todos os dias da minha vidae habitarei na casa do SENHOR por longos dias.
E só me resta dizer amém.
segunda-feira, 23 de maio de 2011
CRÔNICAS INDIGNADAS
VOZ NA MULTIDÃO
PAULO WAINBERG
www.http://paulowainberg.wordpress.com
@paulowainberg (Twitter)
Sou uma voz na multidão e a multidão, todos sabem, pensa e age de forma muito diferente do indivíduo.
A multidão, por exemplo, adora um escândalo enquanto o indivíduo fica indignado.
A multidão ulula na hora da execução, no momento da tragédia, diante do terremoto, enquanto o indivíduo sofre com as perdas, a destruição, a morte e a tristeza.
Os vinte ou trinta milhões que fazem parte da sociedade culta adoram os escândalos diários que Brasília proporciona, mas o indivíduo, eu dentre eles, fica indignado.
Sou uma voz na multidão, vibrando com a desgraça e indignado com ela.
Sarney, que está – eu acho – há trinta anos no Senado, não sabe o limite que pode gastar em jantares de homenagem. Então gasta quase trinta mil numa noitada, enrubesce ao ver que se passou e enrubesce ao devolver. Devolveu porque alguém, dentre as dezenas de assessores, alertou. Caso contrário, não devolveria, afinal fazer homenagens com o nosso dinheiro é bem mais em conta, para ele, do que usar o próprio dinheiro.
Seu feudo, também conhecido como Estado do Maranhão, está em primeiro lugar no índice da miséria brasileira, mas ele, pobre homem, é senador do Amapá, terra dadivosa que o acolheu, numa manobra espúria para que ele pudesse continuar senador desta pobre república brasileira.
Palocci multiplicou seu patrimônio por vinte, durante os quatro anos em que foi deputado federal e manteve, ao mesmo tempo, uma empresa de consultoria.
Comprou um apartamento e pagou mais de seis milhões de reais. Dando consultas? Com o salário e as benesses da deputância?
A oposição, frágil e comprometida, resolve convocar o ministro para explicar, mas o governo e seus deputados aliciados, impedem.
Delúbio, recebido com festa nababesca, de volta ao partido, viveu como, nestes anos em que esteve afastado? Com que dinheiro ele sustentou a família, pagou as contas, foi ao cinema e cuidou do jardim? Tinha alguma emprego, alguma fonte de renda?
Volto a dizer que sou uma voz na multidão. Imagino um diálogo entre os expoentes da política, ambos falando dos respectivos ganhos e um leve toque de ameaça na voz: – Se você contar, eu também conto.
Porque é assim que soa, as acusações são tênues, parece que todos os parlamentares vivem sob um regime de chantagem implícita, há um limite para o que é possível afirmar porque, quem afirma, pode ser o próximo a ser acusado.
Como é possível, pergunta esta minha voz, perdida na multidão, que um político como o Palocci, que perdeu o cargo por ter quebrado ilegalmente o sigilo bancário de um servidor, que se elegeu deputado e montou uma empresa de consultoria, tenha enriquecido tanto em apenas quatro anos?
E como é possível que o Governo, que a Presidenta, que o partido, não queira que isto se explique e, pior, impede que explicações sejam cobradas?
O que me traz de volta ao Delúbio e seu triunfal retorno. Este indivíduo foi o grande operador do Mensalão. Por ele passaram os milhões e ele foi o encarregado da distribuição.
É o homem que sabe demais, o homem a ser temido, o homem que, se revelar tudo o que sabe, faz a casa cair e pouquíssimos sobreviverão.
Eu, esta tênue voz na multidão, repito que as mudanças que nossas instituições precisam, e nelas incluo os Três Poderes da Nação, não serão feitas de dentro para fora.
Há muito dinheiro em jogo, muita fortuna a preservar e muita riqueza a ser perdida se as coisas realmente mudarem.
Para que mudem nós, os vinte ou trinta milhões que formam a sociedade culta do país, devemos unir nossas vozes e formar uma grande multidão indignada, deixando de lado a complacência e a acomodação e partir para a salvação da nossa democracia, tão profundamente ameaçada pelo descaso, pela desfaçatez e pelo escárnio com que agem executivos, magistrados e parlamentares.
É possível fazer um país honesto, basta querer, basta mudar.
PAULO WAINBERG
www.http://paulowainberg.wordpress.com
@paulowainberg (Twitter)
Sou uma voz na multidão e a multidão, todos sabem, pensa e age de forma muito diferente do indivíduo.
A multidão, por exemplo, adora um escândalo enquanto o indivíduo fica indignado.
A multidão ulula na hora da execução, no momento da tragédia, diante do terremoto, enquanto o indivíduo sofre com as perdas, a destruição, a morte e a tristeza.
Os vinte ou trinta milhões que fazem parte da sociedade culta adoram os escândalos diários que Brasília proporciona, mas o indivíduo, eu dentre eles, fica indignado.
Sou uma voz na multidão, vibrando com a desgraça e indignado com ela.
Sarney, que está – eu acho – há trinta anos no Senado, não sabe o limite que pode gastar em jantares de homenagem. Então gasta quase trinta mil numa noitada, enrubesce ao ver que se passou e enrubesce ao devolver. Devolveu porque alguém, dentre as dezenas de assessores, alertou. Caso contrário, não devolveria, afinal fazer homenagens com o nosso dinheiro é bem mais em conta, para ele, do que usar o próprio dinheiro.
Seu feudo, também conhecido como Estado do Maranhão, está em primeiro lugar no índice da miséria brasileira, mas ele, pobre homem, é senador do Amapá, terra dadivosa que o acolheu, numa manobra espúria para que ele pudesse continuar senador desta pobre república brasileira.
Palocci multiplicou seu patrimônio por vinte, durante os quatro anos em que foi deputado federal e manteve, ao mesmo tempo, uma empresa de consultoria.
Comprou um apartamento e pagou mais de seis milhões de reais. Dando consultas? Com o salário e as benesses da deputância?
A oposição, frágil e comprometida, resolve convocar o ministro para explicar, mas o governo e seus deputados aliciados, impedem.
Delúbio, recebido com festa nababesca, de volta ao partido, viveu como, nestes anos em que esteve afastado? Com que dinheiro ele sustentou a família, pagou as contas, foi ao cinema e cuidou do jardim? Tinha alguma emprego, alguma fonte de renda?
Volto a dizer que sou uma voz na multidão. Imagino um diálogo entre os expoentes da política, ambos falando dos respectivos ganhos e um leve toque de ameaça na voz: – Se você contar, eu também conto.
Porque é assim que soa, as acusações são tênues, parece que todos os parlamentares vivem sob um regime de chantagem implícita, há um limite para o que é possível afirmar porque, quem afirma, pode ser o próximo a ser acusado.
Como é possível, pergunta esta minha voz, perdida na multidão, que um político como o Palocci, que perdeu o cargo por ter quebrado ilegalmente o sigilo bancário de um servidor, que se elegeu deputado e montou uma empresa de consultoria, tenha enriquecido tanto em apenas quatro anos?
E como é possível que o Governo, que a Presidenta, que o partido, não queira que isto se explique e, pior, impede que explicações sejam cobradas?
O que me traz de volta ao Delúbio e seu triunfal retorno. Este indivíduo foi o grande operador do Mensalão. Por ele passaram os milhões e ele foi o encarregado da distribuição.
É o homem que sabe demais, o homem a ser temido, o homem que, se revelar tudo o que sabe, faz a casa cair e pouquíssimos sobreviverão.
Eu, esta tênue voz na multidão, repito que as mudanças que nossas instituições precisam, e nelas incluo os Três Poderes da Nação, não serão feitas de dentro para fora.
Há muito dinheiro em jogo, muita fortuna a preservar e muita riqueza a ser perdida se as coisas realmente mudarem.
Para que mudem nós, os vinte ou trinta milhões que formam a sociedade culta do país, devemos unir nossas vozes e formar uma grande multidão indignada, deixando de lado a complacência e a acomodação e partir para a salvação da nossa democracia, tão profundamente ameaçada pelo descaso, pela desfaçatez e pelo escárnio com que agem executivos, magistrados e parlamentares.
É possível fazer um país honesto, basta querer, basta mudar.
sexta-feira, 20 de maio de 2011
LIÇÕES DE DIREITO PARA ASSESSORES, AUXILIARES, SECRETÁRIOS E ESTAGIÁRIOS DE JUIZES, DESEMBARGADORES E MINISTROS
João Eichbaum
O Luiz Fux começa assim o seu prolixo voto, no julgamento da questão “homoafetiva” – como é chamado o ajuntamento de viados:
“De acordo com a teoria dos deveres de proteção, os direitos fundamentais não cuidam apenas do estabelecimento de relações entre os indivíduos e o Estado, de modo a impor a este último abstenções ou o fornecimento de prestações positivas.
Primeira pergunta: vocês entenderam alguma coisa?
Não, não fiquem aí pensando que vocês são uns ignorantes. Vocês não entenderam, porque têm pela frente um texto ambíguo, sinuoso, composto de vocábulos inadequados, provavelmente escrito por alguém que o copiou de algum lugar e, para que a cópia não parecesse literal, mudou algumas palavras. Para pior, é claro: ...os direitos fundamentais não cuidam apenas do estabelecimento de relações entre os indivíduos e o Estado, de modo a impor a este último abstenções ou o fornecimento de prestações positivas.
Gente, os direitos fundamentais não “cuidam” de bosta nenhuma. “Cuidar” significa cogitar, imaginar, pensar, julgar, achar, supor, cercar de cuidados. Como é que os “direitos fundamentais” iriam cogitar, pensar, achar, cercar de cuidados alguma coisa?
Há um verbo que todos nós conhecemos e que serve para transmitir a idéia que o texto do ministro não conseguiu: abranger.
Mas, vamos adiante: ...não cuidam ... do estabelecimento de relações entre os indivíduos e o Estado, de modo a impor a este último abstenções ou o fornecimento de prestações positivas
Estabelecimento significa fundação, instituição, instituto. O que é que esse “estabelecimento” está fazendo aí, qual é a contribuição dele para a fiel expressão da idéia?
... os direitos fundamentais não cuidam...de modo a impor a este último abstenções.
Isso quer dizer que os “direitos fundamentais” não “pensam” o suficiente para impor ao Estado abstenções...
Entenderam?
Nem eu, nem ninguém que seja medianamente inteligente.
“Fornecimento de prestações positivas...” O que é isso, minha gente?
Prestação, segundo o Caldas Aulete, é o ato de dar ou fazer o que se ajustou em contrato, a contribuição a que alguém está obrigado. E também, segundo o Larousse, fornecimento.
Então, o que o Fux escreveu foi isso: fornecimento de fornecimentos positivos...
Faz sentido?
Não, pelo menos em língua portuguesa.
E mais: vocês conhecem algum fornecimento “negativo”? Ou alguma “prestação negativa”? Não, não estou gozando, foi isso mesmo que disse no seu voto o ministro Fux..
Notem: não são os “direitos fundamentais”, propriamente, que estabelecem sua dimensão – como disse o senhor Fux – mas, sim, o conceito, a idéia, a configuração axiológica que se lhes empresta. Em outras palavras: a força da extensão do direito não está nele mesmo, mas no conceito que o estabelece.
Puta merda, já to falando difícil...
A abstenção e a ação (a que Fux se referiu como “abstenções e o fornecimento de prestações positivas”) integram o conteúdo dessas relações, mas não são ingredientes necessários no conceito de “direitos fundamentais”. O enunciado se refere à dimensão dos “direitos fundamentais” e não ao conteúdo das relações entre o indivíduo e o Estado.
Ah, sim, antes que me esqueça, se existe a tal de “teoria dos deveres de proteção” é pura conversa fiada, coisa de quem não tem nada a fazer na vida. O dever de proteção, enquanto ônus do Estado, é uma exigência da organização da sociedade. Simplesmente isso. E pra isso não precisa teoria de porra nenhuma. Se o indivíduo existe, participa de uma sociedade, se submete às regras, evidentemente ele tem direitos, que correspondem aos deveres do Estado. Só que nem sempre o Estado cumpre tais deveres... Há Estados que não tão nem aí.
Pra que serve, então, a tal teoria? Só para vender livros?
Bom, por hoje chega de blá,blá, blá, pra não encher o saco de vocês. Ainda há muita asneira para ser decifrada, nesse voto do Fux. Mas resumindo, o que o Fux tinha vontade de dizer, mas seu vocabulário não chegou lá era o seguinte: “o conceito de direitos fundamentais não abrange apenas as relações entre os indivíduos e o Estado.
O Luiz Fux começa assim o seu prolixo voto, no julgamento da questão “homoafetiva” – como é chamado o ajuntamento de viados:
“De acordo com a teoria dos deveres de proteção, os direitos fundamentais não cuidam apenas do estabelecimento de relações entre os indivíduos e o Estado, de modo a impor a este último abstenções ou o fornecimento de prestações positivas.
Primeira pergunta: vocês entenderam alguma coisa?
Não, não fiquem aí pensando que vocês são uns ignorantes. Vocês não entenderam, porque têm pela frente um texto ambíguo, sinuoso, composto de vocábulos inadequados, provavelmente escrito por alguém que o copiou de algum lugar e, para que a cópia não parecesse literal, mudou algumas palavras. Para pior, é claro: ...os direitos fundamentais não cuidam apenas do estabelecimento de relações entre os indivíduos e o Estado, de modo a impor a este último abstenções ou o fornecimento de prestações positivas.
Gente, os direitos fundamentais não “cuidam” de bosta nenhuma. “Cuidar” significa cogitar, imaginar, pensar, julgar, achar, supor, cercar de cuidados. Como é que os “direitos fundamentais” iriam cogitar, pensar, achar, cercar de cuidados alguma coisa?
Há um verbo que todos nós conhecemos e que serve para transmitir a idéia que o texto do ministro não conseguiu: abranger.
Mas, vamos adiante: ...não cuidam ... do estabelecimento de relações entre os indivíduos e o Estado, de modo a impor a este último abstenções ou o fornecimento de prestações positivas
Estabelecimento significa fundação, instituição, instituto. O que é que esse “estabelecimento” está fazendo aí, qual é a contribuição dele para a fiel expressão da idéia?
... os direitos fundamentais não cuidam...de modo a impor a este último abstenções.
Isso quer dizer que os “direitos fundamentais” não “pensam” o suficiente para impor ao Estado abstenções...
Entenderam?
Nem eu, nem ninguém que seja medianamente inteligente.
“Fornecimento de prestações positivas...” O que é isso, minha gente?
Prestação, segundo o Caldas Aulete, é o ato de dar ou fazer o que se ajustou em contrato, a contribuição a que alguém está obrigado. E também, segundo o Larousse, fornecimento.
Então, o que o Fux escreveu foi isso: fornecimento de fornecimentos positivos...
Faz sentido?
Não, pelo menos em língua portuguesa.
E mais: vocês conhecem algum fornecimento “negativo”? Ou alguma “prestação negativa”? Não, não estou gozando, foi isso mesmo que disse no seu voto o ministro Fux..
Notem: não são os “direitos fundamentais”, propriamente, que estabelecem sua dimensão – como disse o senhor Fux – mas, sim, o conceito, a idéia, a configuração axiológica que se lhes empresta. Em outras palavras: a força da extensão do direito não está nele mesmo, mas no conceito que o estabelece.
Puta merda, já to falando difícil...
A abstenção e a ação (a que Fux se referiu como “abstenções e o fornecimento de prestações positivas”) integram o conteúdo dessas relações, mas não são ingredientes necessários no conceito de “direitos fundamentais”. O enunciado se refere à dimensão dos “direitos fundamentais” e não ao conteúdo das relações entre o indivíduo e o Estado.
Ah, sim, antes que me esqueça, se existe a tal de “teoria dos deveres de proteção” é pura conversa fiada, coisa de quem não tem nada a fazer na vida. O dever de proteção, enquanto ônus do Estado, é uma exigência da organização da sociedade. Simplesmente isso. E pra isso não precisa teoria de porra nenhuma. Se o indivíduo existe, participa de uma sociedade, se submete às regras, evidentemente ele tem direitos, que correspondem aos deveres do Estado. Só que nem sempre o Estado cumpre tais deveres... Há Estados que não tão nem aí.
Pra que serve, então, a tal teoria? Só para vender livros?
Bom, por hoje chega de blá,blá, blá, pra não encher o saco de vocês. Ainda há muita asneira para ser decifrada, nesse voto do Fux. Mas resumindo, o que o Fux tinha vontade de dizer, mas seu vocabulário não chegou lá era o seguinte: “o conceito de direitos fundamentais não abrange apenas as relações entre os indivíduos e o Estado.
quinta-feira, 19 de maio de 2011
A BÍBLIA LIDA PELO DIABO
João Eichbaum
29 E disse Deus: eis que vos tenho dado toda a erva que dá semente, que está sobre a face de toda a terra; e toda a árvore em que há fruto de árvore, que dá semente, ser-vos-á para mantimento.30 E todo o animal da terra, e toda a ave dos céus e todo o réptil da terra em que há alma vivente, toda a erva verde será para mantimento: e assim foi
Não é bem assim, véio. Aquela ervinha de deixar pirado, que as autoridades proíbem, pode dar cadeia, em vez de semente. E não vai atrás dessa que “toda a árvore em que há fruto de árvore serve de mantimento”. Experimenta mastigar uma bolota de carvalho e vai ver o que te acontece!
Todo o animal da terra? Você já experimentou gato, cachorro, tigre, vivo ou morto, já comeu carne de cobra, que tem “alma vivente”?
Ta vendo? Nem tudo saiu de acordo com o projeto.
31 E viu Deus tudo quanto tinha feito e eis que era muito bom: e foi a tarde e a manhã, o dia sexto.
Tipo assim, ó: Ele relaxou, foi pra frente do espelho, perguntando se tinha alguém que fazia coisas tão boas quanto Ele. Claro que o espelho não respondeu nada, e Ele pensou: quem cala consente. E é por isso que está escrito na Bíblia que tudo era muito bom.
Mas, cá pra nós, será que Ele, conscientemente, fez tudo mesmo, como era para ser feito? Será que Ele fez o máximo que sua criatividade permitia?
Só que tem um detalhe: tudo foi feito de manhã e de tarde, no dia sexto. Hoje, pra fazer um homem e uma mulher nem precisa tanto.
2 Assim, os céus e a terra e todo o seu exército foram acabados.
Quer dizer, o palco com os respectivos artistas, para desempenharem um papel muito curto, chamado vida.
2 E havendo Deus acabado no dia sétimo a sua obra, que tudo tinha feito, descansou no sétimo dia de toda sua obra que tinha feito.3 E abençoou Deus o dia sétimo e o santificou, porque nele descansou de toda sua obra, que Deus criara e fizera.
O que é que acharam dessa? Um Cara que nunca fez porra nenhuma durante toda sua eternidade, não fez força pra nada, só mandou “faça-se isso, faça-se aquilo”, as coisas foram aparecendo do nada, nem foi preciso transar pra fazer um homem e uma mulher, e ainda se achou no direito de descansar?
Nesse quesito, o homem é igualzinho a Ele: adora um descanso.
Bom, não foi só Ele: todo mundo abençoa o domingo, nem que tenha que ir visitar a sogra.
29 E disse Deus: eis que vos tenho dado toda a erva que dá semente, que está sobre a face de toda a terra; e toda a árvore em que há fruto de árvore, que dá semente, ser-vos-á para mantimento.30 E todo o animal da terra, e toda a ave dos céus e todo o réptil da terra em que há alma vivente, toda a erva verde será para mantimento: e assim foi
Não é bem assim, véio. Aquela ervinha de deixar pirado, que as autoridades proíbem, pode dar cadeia, em vez de semente. E não vai atrás dessa que “toda a árvore em que há fruto de árvore serve de mantimento”. Experimenta mastigar uma bolota de carvalho e vai ver o que te acontece!
Todo o animal da terra? Você já experimentou gato, cachorro, tigre, vivo ou morto, já comeu carne de cobra, que tem “alma vivente”?
Ta vendo? Nem tudo saiu de acordo com o projeto.
31 E viu Deus tudo quanto tinha feito e eis que era muito bom: e foi a tarde e a manhã, o dia sexto.
Tipo assim, ó: Ele relaxou, foi pra frente do espelho, perguntando se tinha alguém que fazia coisas tão boas quanto Ele. Claro que o espelho não respondeu nada, e Ele pensou: quem cala consente. E é por isso que está escrito na Bíblia que tudo era muito bom.
Mas, cá pra nós, será que Ele, conscientemente, fez tudo mesmo, como era para ser feito? Será que Ele fez o máximo que sua criatividade permitia?
Só que tem um detalhe: tudo foi feito de manhã e de tarde, no dia sexto. Hoje, pra fazer um homem e uma mulher nem precisa tanto.
2 Assim, os céus e a terra e todo o seu exército foram acabados.
Quer dizer, o palco com os respectivos artistas, para desempenharem um papel muito curto, chamado vida.
2 E havendo Deus acabado no dia sétimo a sua obra, que tudo tinha feito, descansou no sétimo dia de toda sua obra que tinha feito.3 E abençoou Deus o dia sétimo e o santificou, porque nele descansou de toda sua obra, que Deus criara e fizera.
O que é que acharam dessa? Um Cara que nunca fez porra nenhuma durante toda sua eternidade, não fez força pra nada, só mandou “faça-se isso, faça-se aquilo”, as coisas foram aparecendo do nada, nem foi preciso transar pra fazer um homem e uma mulher, e ainda se achou no direito de descansar?
Nesse quesito, o homem é igualzinho a Ele: adora um descanso.
Bom, não foi só Ele: todo mundo abençoa o domingo, nem que tenha que ir visitar a sogra.
quarta-feira, 18 de maio de 2011
MEC QUER ERIGIR LULA AO STATUS DE CAMÕES DE UMA NOVA LINGUA
Janer Cristaldo
Você passa na feira e ouve: “vendo três pexe por dez real. O freguês qué comprá?” Dá pra entender? Dá. A comunicação é eficaz? É. Mas obviamente não é correta.
Nasci em geografia em que se comiam as consoantes finais das palavras. Erres e esses era como se não existissem. Tanto que, quando chegava alguém da cidade, costumava-se dizer: fulano é cheio de erres e esses. E aí se pronunciava o r e o s finais, para bem definir o forasteiro. Apesar de ter sido alfabetizado, eu também não usava essas consoantes. Soaria como um tanto pernóstico lá no Ponche Verde. E mesmo em Dom Pedrito. Até hoje, coloquialmente, costumo dizer “tu vai hoje ao cinema?” Mas isso com pessoas muito íntimas. Não vou dizer “tu vai” para alguém que acabo de conhecer, muito menos em uma palestra.
Está provocando celeuma o livro Por uma Vida Melhor, adotado pelo Ministério da Educação, que considera ser válido o uso da língua popular, ainda que com seus erros gramaticais. Dizer "Nós pega o peixe" ou "os menino pega o peixe", seria aceitável. Para quem não tem escola, sem dúvida é aceitável. Mas a escola existe para ensinar os alunos a falar corretamente. Se não ensina, não tem porque existir. Um livro, adotado pelo MEC, não pode abrir tal exceção.
Em minhas viagens, conheci poliglotas analfabetos. Em geral nos souks de países árabes, mas também vi isto na Grécia. É típico de povos comerciantes falar várias línguas, embora não entendam nenhuma. Cansei de ver crianças e mesmo adultos oferecendo quinquilharias a turistas em sueco, alemão, inglês, francês, italiano, espanhol e até mesmo em português. Eles têm uma intuição extraordinária para adivinhar a nacionalidade do cliente. Só de me olhar, já vão perguntando: Brasilia, Brasilia?
O vocabulário é escasso, é verdade. Em geral se compõe de apenas três ou quatro palavras, mas que servem para o que se quer: barato, quer entrar, bonito, muito obrigado e números, obviamente. Eles sabem contar até cem em diversas línguas. A dor ensina a gemer.
O turista também acaba apelando a recurso semelhante. Quando giramos por vários países, as línguas se embaralham. Já foi inclusive proposta uma nova língua na Europa, o europanto. To speakare europanto, tu basta mixare alles wat tu know in extranges linguas. Seria a única língua do mundo que se aprende quase sem estudá-la. Teria 42% de inglês, 38% de francês, uns 15% de um misto de outras línguas européias e uns 5% de fantasia. No est englado, non est espano, no est franzo, no est keine known lingua aber du understande. Wat tu know nicht, keine worry, tu invente.
Terá futuro? Acho que não. Mas de vez em quando, principalmente quando ando pelo norte da Europa, me surpreendo falando um europanto rudimentar. Sem querer. É um pidgin mais sofisticado, que envolve não apenas duas línguas fronteiriças, mas as várias línguas de muitas fronteiras.
Lê-se no livro do MEC: "Você pode estar se perguntando: "Mas eu posso falar "os livro"?" Claro que pode. Mas fique atento, porque, dependendo da situação, você corre o risco de ser vítima de preconceito lingüístico. Muita gente diz o que se deve e o que não se deve falar e escrever, tomando as regras estabelecidas para a norma culta como padrão de correção de todas as formas lingüísticas".
É óbvio que pode. Falar errado não é crime. Tanto que a maior parte do povo fala errado. Pior ainda, há muito advogado e jornalista falando errado. Já li petições que são um insulto à inteligência. Fosse juiz, eu a devolveria incontinenti e mandaria o advogado repetir o primário.
Tive uma educação rígida no ginásio, naqueles dias em que reprovar fazia parte da vida escolar. Meu professor de português descontou certa vez dois pontos de um aluno por ter escrito “feichão”. Saí do colégio com uma redação impecável. Ou não sairia do colégio. Duas décadas mais tarde, fui professor de Letras na graduação e pós-graduação, na UFSC, e tive de reprovar alunas em fase final de curso porque escreviam coisas como "eu poço", "eu fasso" e outras do gênero. Ou seja, vinte anos depois, a universidade sequer chegava ao nível de meu ensino ginasial.
Minhas aluninhas reclamavam. Que eu deveria ser professor de Língua, não de Letras. Que me desculpassem. Não consegue degustar filé quem não domina o feijão com arroz. Ao final de cada ano, era choro e ranger de dentes. “Mas eu estou com meu nome impresso no convite de formatura”. Que façam então novo convite. “Mas meu pai organizou um churrasco”. Que organize. Ano que vem terás churrasco de novo.
Mas voltemos ao Vida Melhor. Absurdo falar em vítimas de preconceito lingüístico e afirmar que muita gente toma as regras estabelecidas para a norma culta como padrão de correção de todas as formas lingüísticas. As regras de norma culta são, sim senhor, padrão de correção das formas lingüísticas. Não fosse isso, a língua implodiria, dando lugar a um patois qualquer. Não duvido que tenha existido algum desses novos pedagogos na Roma antiga, que liquidaram com o latim e deram origem ao italiano, português, espanhol e romeno. Nada contra. Mas uma língua, se quiser persistir no tempo, tem de ter suas defesas.
Curiosamente, nestes dias em que velhos comunistas querem purificar o vernáculo, proibindo anglicismos, o MEC quer introduzir na língua um anglicismo atroz. Pois isso de “eu vai, tu vai, ele vais, nós vai, eles vai” é puro inglês. É algo que facilita a língua, sem dúvida alguma. Mas sempre exigirá o pronome. A flexão da forma verbal permite eduzir o falante.
Idiossincrasias de cada língua. O problema é que, depois de Lula, analfabetismo passou a dar prestígio. Para que ser culto, se um analfabeto – que se gaba de ser analfabeto - pode chegar à Presidência da República? E ainda recebe 200 mil dólares para fazer palestras, paga que professor universitário nem sonha em receber. Estudar é perda de tempo. O livro do MEC, no fundo, quer erigir o Supremo Apedeuta à condição de um Camões da nova língua.
Você passa na feira e ouve: “vendo três pexe por dez real. O freguês qué comprá?” Dá pra entender? Dá. A comunicação é eficaz? É. Mas obviamente não é correta.
Nasci em geografia em que se comiam as consoantes finais das palavras. Erres e esses era como se não existissem. Tanto que, quando chegava alguém da cidade, costumava-se dizer: fulano é cheio de erres e esses. E aí se pronunciava o r e o s finais, para bem definir o forasteiro. Apesar de ter sido alfabetizado, eu também não usava essas consoantes. Soaria como um tanto pernóstico lá no Ponche Verde. E mesmo em Dom Pedrito. Até hoje, coloquialmente, costumo dizer “tu vai hoje ao cinema?” Mas isso com pessoas muito íntimas. Não vou dizer “tu vai” para alguém que acabo de conhecer, muito menos em uma palestra.
Está provocando celeuma o livro Por uma Vida Melhor, adotado pelo Ministério da Educação, que considera ser válido o uso da língua popular, ainda que com seus erros gramaticais. Dizer "Nós pega o peixe" ou "os menino pega o peixe", seria aceitável. Para quem não tem escola, sem dúvida é aceitável. Mas a escola existe para ensinar os alunos a falar corretamente. Se não ensina, não tem porque existir. Um livro, adotado pelo MEC, não pode abrir tal exceção.
Em minhas viagens, conheci poliglotas analfabetos. Em geral nos souks de países árabes, mas também vi isto na Grécia. É típico de povos comerciantes falar várias línguas, embora não entendam nenhuma. Cansei de ver crianças e mesmo adultos oferecendo quinquilharias a turistas em sueco, alemão, inglês, francês, italiano, espanhol e até mesmo em português. Eles têm uma intuição extraordinária para adivinhar a nacionalidade do cliente. Só de me olhar, já vão perguntando: Brasilia, Brasilia?
O vocabulário é escasso, é verdade. Em geral se compõe de apenas três ou quatro palavras, mas que servem para o que se quer: barato, quer entrar, bonito, muito obrigado e números, obviamente. Eles sabem contar até cem em diversas línguas. A dor ensina a gemer.
O turista também acaba apelando a recurso semelhante. Quando giramos por vários países, as línguas se embaralham. Já foi inclusive proposta uma nova língua na Europa, o europanto. To speakare europanto, tu basta mixare alles wat tu know in extranges linguas. Seria a única língua do mundo que se aprende quase sem estudá-la. Teria 42% de inglês, 38% de francês, uns 15% de um misto de outras línguas européias e uns 5% de fantasia. No est englado, non est espano, no est franzo, no est keine known lingua aber du understande. Wat tu know nicht, keine worry, tu invente.
Terá futuro? Acho que não. Mas de vez em quando, principalmente quando ando pelo norte da Europa, me surpreendo falando um europanto rudimentar. Sem querer. É um pidgin mais sofisticado, que envolve não apenas duas línguas fronteiriças, mas as várias línguas de muitas fronteiras.
Lê-se no livro do MEC: "Você pode estar se perguntando: "Mas eu posso falar "os livro"?" Claro que pode. Mas fique atento, porque, dependendo da situação, você corre o risco de ser vítima de preconceito lingüístico. Muita gente diz o que se deve e o que não se deve falar e escrever, tomando as regras estabelecidas para a norma culta como padrão de correção de todas as formas lingüísticas".
É óbvio que pode. Falar errado não é crime. Tanto que a maior parte do povo fala errado. Pior ainda, há muito advogado e jornalista falando errado. Já li petições que são um insulto à inteligência. Fosse juiz, eu a devolveria incontinenti e mandaria o advogado repetir o primário.
Tive uma educação rígida no ginásio, naqueles dias em que reprovar fazia parte da vida escolar. Meu professor de português descontou certa vez dois pontos de um aluno por ter escrito “feichão”. Saí do colégio com uma redação impecável. Ou não sairia do colégio. Duas décadas mais tarde, fui professor de Letras na graduação e pós-graduação, na UFSC, e tive de reprovar alunas em fase final de curso porque escreviam coisas como "eu poço", "eu fasso" e outras do gênero. Ou seja, vinte anos depois, a universidade sequer chegava ao nível de meu ensino ginasial.
Minhas aluninhas reclamavam. Que eu deveria ser professor de Língua, não de Letras. Que me desculpassem. Não consegue degustar filé quem não domina o feijão com arroz. Ao final de cada ano, era choro e ranger de dentes. “Mas eu estou com meu nome impresso no convite de formatura”. Que façam então novo convite. “Mas meu pai organizou um churrasco”. Que organize. Ano que vem terás churrasco de novo.
Mas voltemos ao Vida Melhor. Absurdo falar em vítimas de preconceito lingüístico e afirmar que muita gente toma as regras estabelecidas para a norma culta como padrão de correção de todas as formas lingüísticas. As regras de norma culta são, sim senhor, padrão de correção das formas lingüísticas. Não fosse isso, a língua implodiria, dando lugar a um patois qualquer. Não duvido que tenha existido algum desses novos pedagogos na Roma antiga, que liquidaram com o latim e deram origem ao italiano, português, espanhol e romeno. Nada contra. Mas uma língua, se quiser persistir no tempo, tem de ter suas defesas.
Curiosamente, nestes dias em que velhos comunistas querem purificar o vernáculo, proibindo anglicismos, o MEC quer introduzir na língua um anglicismo atroz. Pois isso de “eu vai, tu vai, ele vais, nós vai, eles vai” é puro inglês. É algo que facilita a língua, sem dúvida alguma. Mas sempre exigirá o pronome. A flexão da forma verbal permite eduzir o falante.
Idiossincrasias de cada língua. O problema é que, depois de Lula, analfabetismo passou a dar prestígio. Para que ser culto, se um analfabeto – que se gaba de ser analfabeto - pode chegar à Presidência da República? E ainda recebe 200 mil dólares para fazer palestras, paga que professor universitário nem sonha em receber. Estudar é perda de tempo. O livro do MEC, no fundo, quer erigir o Supremo Apedeuta à condição de um Camões da nova língua.
terça-feira, 17 de maio de 2011
NOVA MINISTRA DO TST
O gabinete de 70 m² com vista para o Lago Paranoá em nada se parece com a casa humilde retratada nas fotografias sobre a mesa da ministra Delaíde Miranda Alves, do TST (Tribunal Superior do Trabalho). Mas elas estão ali para lembrá-la pelo que teve de passar até chegar a um lugar que jamais pensou que alcançaria. Aos 59 anos, Delaíde começou a carreira na cidade de Pontalina, a 130 km de Goiânia, como empregada doméstica. Carreira é o termo mais apropriado porque para esta mulher, que faz aniversário justamente no Dia do Trabalhador, a labuta na roça moldou todo o entendimento profissional de sua vida. - Sou uma magistrada privilegiada porque conheço a realidade. Não sou apenas uma pessoa que estudou, se debruçou nos livros e atravessou barreiras. Além da formação teórica, pude advogar para empregados, empresas e ter o conhecimento em campo do que é a realidade de uma pessoa que tem uma meta e cuja meta é vencer barreiras. Delaíde nasceu na roça goiana, como gosta de dizer. Ajudava o pai na lavoura, colocando a mão na terra para plantar milho e feijão. Aos 14, decidiu que não podia ficar mais ali e foi terminar o ensino fundamental na cidade. Trabalhou por um ano e meio como doméstica e dois anos como recepcionista no consultório de um médico, o mesmo médico que alguns anos depois a incentivaria a tentar a vida em Goiânia. - Ele me achava inteligente, estudiosa e dizia que eu tinha de ir para Goiânia para fazer o curso normal, para ser professora. Eu adoro a profissão, respeito os professores, mas a minha profissão sempre foi ser advogada. Aos 18 anos, já em Goiânia, voltou a trabalhar como doméstica. Com a ajuda do médico, que era casado com uma prima, conseguiu emprego na casa de outra família. Ganhava cama e comida em troca de serviços domésticos. Enquanto isso, estudava e lia tudo o que estivesse ao seu alcance. Cinco anos depois passou no vestibular para direito em uma faculdade particular. Conseguiu uma bolsa no antigo crédito educativo. O governo pagava as mensalidades diretamente à universidade e Delaíde teria 48 meses de carência para começar a quitar. Com o ensino superior vieram mudanças bruscas. Trocou o trabalho doméstico por um estágio em um escritório de advocacia. Apaixonou-se pelo direito trabalhista, ao qual chama de segundo casamento. O primeiro veio dois anos após entrar na faculdade, quando conheceu o atual marido, Aldo Arantes. Ex-deputado federal, Arantes foi presidente da UNE (União Nacional dos Estudantes) poucos anos antes da ditadura militar (1964-19885). Do casamento, vieram duas filhas e um neto, de 11 anos. DireitoA paixão de Delaíde pelo direito começou ainda em Pontalina. Antes mesmo de lidar com os escovões e vassouras nas casas onde trabalhou, a então menina gostava de assistir aos julgamentos no tribunal da cidade. - No interior não tem muita opção. Não tinha peça de teatro, não tinha cinema, e uma coisa no interior que é muito forte, ainda hoje, são as sessões do júri. A cidade inteira assiste. Tenho a impressão que eu fui influenciada a fazer direito por assistir a esses júris, pelo aspecto teatral daquilo tudo. À reportagem do R7, a ministra confidenciou uma passagem de sua vida que nunca revelou publicamente. Em uma das sessões do júri, deparou-se com um tio seu que estava sendo julgado por homicídio. - Eu tinha mais ou menos uns seis anos. Foi um crime banal. Uma pessoa assassinou uma tia minha, irmã do meu pai, e esse meu tio vingou a morte da minha tia. Era muito comum antigamente, chamam de crime de vendeta . Esse tio foi a júri por três vezes e absolvido nas três vezes por 7 a 0. Eu assistia a esses júris e achava tudo um espetáculo. TrabalhoApós cursar a faculdade, Delaíde mergulhou na profissão. Estagiou e em pouco tempo abriu o seu próprio escritório de advocacia, especializado em relações trabalhistas, e que hoje é tocado pelas filhas. Por 30 anos lidou com todos os tipos de clientes, de empregadas domésticas, como ela fora, até grandes empresas. A base que adquiriu foi suficiente para ser indicada pela OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) para ocupar uma vaga no TST. E foi a própria presidente Dilma Rousseff quem decidiu escolher o nome de Delaíde. No mesmo gabinete espaçoso, as estantes ainda não estão todas ocupadas. De acordo com a ministra, parte da biblioteca está em casa e outra parte ainda em Goiânia. A parte que cabe ao escritório ainda não havia chegado até o dia da entrevista. As gavetas, no entanto, estão entupidas. Delaíde conta que tomou posse no dia 24 de março com 11 mil processos à sua espera. - Em Goiás, as varas do trabalho, que são mais de 30, têm em média 2.000 cada uma. Mas não posso reclamar. Considero que não posso fazer um esforço concentrado no sentido de diminuir apenas volume. Preciso aliar o julgamento dos processos à qualidade do trabalho. São 11 mil vidas atrás dos processos. São 11 mil pessoas e 11 mil empregos que dependem de uma decisão minha. Para dar conta do trabalho, a ministra chega ao tribunal entre 8h e 8h30 e não sai antes das 20h, podendo estender a jornada até as 22h. São de 12 a 14 horas de trabalho diárias, mas nada que se compare àquela rotina de doméstica nos idos de 1950, quando labutava em Pontalina.
Fonte :R7.com
Comentários de João Eichbaum: nem precisa de concurso, vocês podem chegar lá também, ainda no governo da Dilma, se casarem com um político comunista, agitador, companheiro e amigo da presidente, aí vocês vão poder juntar os contra-cheques de ministro do TST e deputado, terão os salários mais altos deste país capitalista, onde os comunistas enriquecem.
Fonte :R7.com
Comentários de João Eichbaum: nem precisa de concurso, vocês podem chegar lá também, ainda no governo da Dilma, se casarem com um político comunista, agitador, companheiro e amigo da presidente, aí vocês vão poder juntar os contra-cheques de ministro do TST e deputado, terão os salários mais altos deste país capitalista, onde os comunistas enriquecem.
segunda-feira, 16 de maio de 2011
PUBLICAÇÃO DA GAZETA DO POVO
Ingerência totalitária
Continua-se a negar o reconhecimento de direitos reais a quem não
defina sexualmente sua relação não matrimonial com um companheiro
A constituição de uma família sempre foi protegida pelo Estado por facilitar que as próximas gerações fossem ter, de modo geral – leis são sempre generalizações, por valerem para todos –, uma célula familiar estável nos anos de sua formação. Para falar de maneira mais vulgar, um papel social importantíssimo da instituição do matrimônio é evitar que o marido troque a mulher de 40 por duas de 20, garantindo a sua presença na casa e evitando que a mulher tenha que criar os filhos sozinha. O matrimônio garante o futuro.
O reconhecimento do matrimônio pelo Estado não é, portanto, o reconhecimento de um afeto presente, sim de uma instituição natural que prepara a ordem social futura. Ao contrário, até: um papel importante do matrimônio é garantir que não seja o afeto a formar e desfazer as relações de acordo com os ventos, exigindo que se mantenha o compromisso assumido de estar ao lado do cônjuge nos bons e nos maus momentos. Nos bons é fácil; nos maus só se permanece por senso de responsabilidade, e para isso é bom que haja ajuda.
O objetivo da proteção estatal do matrimônio é protegê-lo contra os afetos que vão e vêm, contra o desejo sexual que muda de alvo, para que a criança não chegue à idade adulta tendo passado por vários padrastos e sem conhecer um pai. Mais vale proteger o matrimônio agora que construir cadeias no futuro.
Um objetivo secundário, que sempre poderia – se o Estado deixasse – ser obtido de outras maneiras, é garantir que o patrimônio comum construído em comum não seja arrancado do cônjuge que sobrevive à morte do outro. Ou seja: a proteção do passado.
A ideia que parece ter orientado os votos do STF é, contudo, completamente diferente. O que se tem é uma celebração do afeto e da sexualidade presentes, que são premiados com o reconhecimento de direitos patrimoniais (que não têm nada a ver com sexo ou afeto) sem que seja assumido qualquer compromisso com o futuro.
Não se garante, contudo, o patrimônio construído em comum por pessoas que não tenham relações sexuais (duas irmãs solteironas que morem juntas, uma comunidade hippie ou religiosa, dois amigos etc.). É o sexo que se torna gerador de direitos.
Legisla-se sobre “uniões homoafetivas”, ou seja, uniões afetivas entre pessoas do mesmo sexo, e dá-se a essas uniões os mesmos direitos da chamada “união estável”. É a celebração do sexo e do afeto no presente, sem cuidado com o futuro.
Ao equiparar a “união homoafetiva” ao matrimônio light já existente na “união estável”, mostra-se, definitivamente, que o Estado não está interessado em garantir o futuro, sim em meter o bedelho em afetos e relações sexuais existentes, que não são nem poderiam ser da alçada dele.
Não sei, caro leitor, se lhe interessa ter ministros do STF, juízes, deputados e burocratas em geral no seu quarto. A mim não interessa; a minha vida sexual e afetiva não é da alçada do Estado.
É uma ingerência totalitária querer legislar o sexo e o afeto. É uma injustiça e uma perversão criar por lei paródias sexocêntricas da célula familiar, orientadas para o presente e não – como o matrimônio – para o futuro, concebidas e definidas em torno de emoções passageiras e da vida sexual. Para piorar, continua-se a negar o reconhecimento de direitos reais a quem não defina sexualmente sua relação não matrimonial com um companheiro.
Se o patrimônio construído em comum sem sexo continua sem proteção e ao mesmo tempo não há mais proteção da instituição matrimonial, mais valeria eliminar todo o direito de família, acabar com o casamento civil, a união estável e o que mais inventem, e tratar tudo como sociedades contratuais. Assim, pelo menos, o Estado não teria desculpas para se meter na cama das pessoas.
Comentário do João Eichbaum: o autor desse texto jamais poderia ser ministro do Supremo Tribunal Federal, porque é uma pessoa muito inteligente.
Continua-se a negar o reconhecimento de direitos reais a quem não
defina sexualmente sua relação não matrimonial com um companheiro
A constituição de uma família sempre foi protegida pelo Estado por facilitar que as próximas gerações fossem ter, de modo geral – leis são sempre generalizações, por valerem para todos –, uma célula familiar estável nos anos de sua formação. Para falar de maneira mais vulgar, um papel social importantíssimo da instituição do matrimônio é evitar que o marido troque a mulher de 40 por duas de 20, garantindo a sua presença na casa e evitando que a mulher tenha que criar os filhos sozinha. O matrimônio garante o futuro.
O reconhecimento do matrimônio pelo Estado não é, portanto, o reconhecimento de um afeto presente, sim de uma instituição natural que prepara a ordem social futura. Ao contrário, até: um papel importante do matrimônio é garantir que não seja o afeto a formar e desfazer as relações de acordo com os ventos, exigindo que se mantenha o compromisso assumido de estar ao lado do cônjuge nos bons e nos maus momentos. Nos bons é fácil; nos maus só se permanece por senso de responsabilidade, e para isso é bom que haja ajuda.
O objetivo da proteção estatal do matrimônio é protegê-lo contra os afetos que vão e vêm, contra o desejo sexual que muda de alvo, para que a criança não chegue à idade adulta tendo passado por vários padrastos e sem conhecer um pai. Mais vale proteger o matrimônio agora que construir cadeias no futuro.
Um objetivo secundário, que sempre poderia – se o Estado deixasse – ser obtido de outras maneiras, é garantir que o patrimônio comum construído em comum não seja arrancado do cônjuge que sobrevive à morte do outro. Ou seja: a proteção do passado.
A ideia que parece ter orientado os votos do STF é, contudo, completamente diferente. O que se tem é uma celebração do afeto e da sexualidade presentes, que são premiados com o reconhecimento de direitos patrimoniais (que não têm nada a ver com sexo ou afeto) sem que seja assumido qualquer compromisso com o futuro.
Não se garante, contudo, o patrimônio construído em comum por pessoas que não tenham relações sexuais (duas irmãs solteironas que morem juntas, uma comunidade hippie ou religiosa, dois amigos etc.). É o sexo que se torna gerador de direitos.
Legisla-se sobre “uniões homoafetivas”, ou seja, uniões afetivas entre pessoas do mesmo sexo, e dá-se a essas uniões os mesmos direitos da chamada “união estável”. É a celebração do sexo e do afeto no presente, sem cuidado com o futuro.
Ao equiparar a “união homoafetiva” ao matrimônio light já existente na “união estável”, mostra-se, definitivamente, que o Estado não está interessado em garantir o futuro, sim em meter o bedelho em afetos e relações sexuais existentes, que não são nem poderiam ser da alçada dele.
Não sei, caro leitor, se lhe interessa ter ministros do STF, juízes, deputados e burocratas em geral no seu quarto. A mim não interessa; a minha vida sexual e afetiva não é da alçada do Estado.
É uma ingerência totalitária querer legislar o sexo e o afeto. É uma injustiça e uma perversão criar por lei paródias sexocêntricas da célula familiar, orientadas para o presente e não – como o matrimônio – para o futuro, concebidas e definidas em torno de emoções passageiras e da vida sexual. Para piorar, continua-se a negar o reconhecimento de direitos reais a quem não defina sexualmente sua relação não matrimonial com um companheiro.
Se o patrimônio construído em comum sem sexo continua sem proteção e ao mesmo tempo não há mais proteção da instituição matrimonial, mais valeria eliminar todo o direito de família, acabar com o casamento civil, a união estável e o que mais inventem, e tratar tudo como sociedades contratuais. Assim, pelo menos, o Estado não teria desculpas para se meter na cama das pessoas.
Comentário do João Eichbaum: o autor desse texto jamais poderia ser ministro do Supremo Tribunal Federal, porque é uma pessoa muito inteligente.
sexta-feira, 13 de maio de 2011
LIÇÕES DE DIREITO PARA ASSESSORES E SECRETÁRIOS DE JUIZES, DESEMBARGADORES E MINISTROS - João Eichbaum
O VOTO DO LUIZ FUX
Vou começar hoje, citando o meu ídolo, Janer Cristaldo: “Quem escreve mal não pode ser bom caráter - disse alguém, já não lembro quem. O ministro Ayres Britto – como também seus pares dos diversos tribunais – bem que estão precisando de um cursinho elementar de redação, para aprender a falar como falam os demais mortais.”
Realmente, os juízes, os desembargadores e os ministros dos tribunais não sabem que a linguagem é o único instrumento da, chamada, ciência jurídica, popularmente conhecida como Direito. É por isso que eles não sabem se expressar, não conseguem transmitir seus pensamentos com clareza, se enrolam num vocabulário hermético que, se contar bem, não passa de duzentas palavras.
Bom, além de ter enormes dificuldades no emprego do vernáculo, o mal dos magistrados é que eles não são capazes de elaborar um silogismo. Porque não sabem pensar. E a razão é muito simples: no direito, nada se cria, tudo se copia. A primeira fonte foi o Direito Romano. A partir daí, um país copia do outro. E o Brasil é o campeão: copia tudo dos outros países, porque seus “juristas” não têm criatividade.
Ah, sim, agora chegamos no ponto. Vocês, estagiários, assessores, secretários e auxiliares de magistrados, como não têm o mínimo preparo, não têm a mais puta idéia de como armar um silogismo, não têm outra alternativa, a não ser copiar. E hoje, com o computador, é a maior barbada: é só clicar em “copiar” e “colar”.
É por isso que, numa sessão da Câmara ou da Turma, são “julgados” centenas de processos num dia só: pura cópia, feita por vocês.
Então, resumindo: vocês passam o dia inteiro copiando. Ou copiam a sentença, para negar provimento, ou copiam jurisprudência, para dar provimento. Brabo mesmo é para o assessor do juiz de primeiro grau, que não tem sentença para copiar e acaba copiando qualquer bobagem.
Eu sei. É assim que funciona.
E para mostrar que, tanto vocês como os ministros do Supremo Tribunal Federal, só copiam ou, quando não copiam, não dizem merda nenhuma que se aproveite, vou transcrever a íntegra do voto do festejado Luiz Fux, na questão dos viados e das lésbicas, que é tratada com um palavrão chamado “homoafetividade”.
O Fux é tido como um dos luminares da ciência jurídica do país... Imaginem o que sobra para os outros...
Mas como o voto dele é um saco, uma encheção de lingüiça, um paradigma de prolixidade, deixo os comentários para as próximas semanas.
Senão, o que vai ficar chato será esta coluna.
Vou começar hoje, citando o meu ídolo, Janer Cristaldo: “Quem escreve mal não pode ser bom caráter - disse alguém, já não lembro quem. O ministro Ayres Britto – como também seus pares dos diversos tribunais – bem que estão precisando de um cursinho elementar de redação, para aprender a falar como falam os demais mortais.”
Realmente, os juízes, os desembargadores e os ministros dos tribunais não sabem que a linguagem é o único instrumento da, chamada, ciência jurídica, popularmente conhecida como Direito. É por isso que eles não sabem se expressar, não conseguem transmitir seus pensamentos com clareza, se enrolam num vocabulário hermético que, se contar bem, não passa de duzentas palavras.
Bom, além de ter enormes dificuldades no emprego do vernáculo, o mal dos magistrados é que eles não são capazes de elaborar um silogismo. Porque não sabem pensar. E a razão é muito simples: no direito, nada se cria, tudo se copia. A primeira fonte foi o Direito Romano. A partir daí, um país copia do outro. E o Brasil é o campeão: copia tudo dos outros países, porque seus “juristas” não têm criatividade.
Ah, sim, agora chegamos no ponto. Vocês, estagiários, assessores, secretários e auxiliares de magistrados, como não têm o mínimo preparo, não têm a mais puta idéia de como armar um silogismo, não têm outra alternativa, a não ser copiar. E hoje, com o computador, é a maior barbada: é só clicar em “copiar” e “colar”.
É por isso que, numa sessão da Câmara ou da Turma, são “julgados” centenas de processos num dia só: pura cópia, feita por vocês.
Então, resumindo: vocês passam o dia inteiro copiando. Ou copiam a sentença, para negar provimento, ou copiam jurisprudência, para dar provimento. Brabo mesmo é para o assessor do juiz de primeiro grau, que não tem sentença para copiar e acaba copiando qualquer bobagem.
Eu sei. É assim que funciona.
E para mostrar que, tanto vocês como os ministros do Supremo Tribunal Federal, só copiam ou, quando não copiam, não dizem merda nenhuma que se aproveite, vou transcrever a íntegra do voto do festejado Luiz Fux, na questão dos viados e das lésbicas, que é tratada com um palavrão chamado “homoafetividade”.
O Fux é tido como um dos luminares da ciência jurídica do país... Imaginem o que sobra para os outros...
Mas como o voto dele é um saco, uma encheção de lingüiça, um paradigma de prolixidade, deixo os comentários para as próximas semanas.
Senão, o que vai ficar chato será esta coluna.
quinta-feira, 12 de maio de 2011
A BÍBLIA LIDA PELO DIABO - João Eichbaum
26 E disse Deus: façamos o homem à nossa imagem e conforme nossa semelhança; e domine ele sobre os peixes do mar e sobre as aves do céu, sobre o gado, e sobre a terra, e sobre todo o réptil que se move sobre a terra.
Vamos devagar. Qual era a “imagem” dele, o Deus? Espírito, por acaso, tem imagem, figura, forma? Para que haja “semelhança” é necessário um termo de comparação; no mínimo, um ponto de referência. Qual seria essa referência?
Sem imagem, sem referência não existe matéria para construir a semelhança.
Então, Mané, é tudo conversa fiada. E é por isso que o homem tem muito mais de macaco do que de divino.
Quanto a dominar sobre os peixes do mar, só se os peixes estiverem a fim. Sem tarrafa, sem carretilha, sem anzol, oh, não mesmo! E para os peixes dos rios e das lagoas não sobrou uma palavrinha sequer?
Réptil? Ande de pés descalços, muito à vontade, e só de cuecas no meio de um matagal. Experimente passar distraído debaixo duma árvore da qual pende uma jibóia... E aí você vai ver que não domina bosta nenhuma.
27 E criou Deus o homem à sua imagem e semelhança: à imagem de Deus o criou: macho e fêmea os criou.
Quer dizer, sem nenhum dilema ético, baixou o download dele mesmo.
Quem sai aos seus, não degenera – diz há muito tempo o ditado, explicando a genética. Pode o espírito não ter forma, mas é nele que se concentram todos os defeitos e virtudes – de natureza espiritual, claro.
Então vocês sabem agora porque o homem é colérico, vingativo, ambicioso, gosta das coisas fáceis, adora trivialidades e, de vez em quando, resvala na pieguice: foi criado à imagem do Javé. Ah, sim, e lascivo. Tanto que o Velho teve de criar a fêmea, em seguida.
28 E Deus os abençoou, e Deus lhes disse: frutificai e multiplicai-vos e enchei a terra e sujeitai-a; e dominai sobre os peixes do mar e sobre as aves do céu e sobre todo o animal que se move sobre a terra.
E se não tivesse abençoado faria alguma diferença? Pelo que o povão todo tem visto até hoje, não. A bênção não resolveu bosta nenhuma, como se verá.
Pra “frutificar” legal, cada macho ganhou duas bolas. E uma coisa incômoda, muito mal colocada no quadro geral, chamada próstata. Mas tanto ele como a fêmea se amarraram nessa onda de “multiplicar-se”.
Com a espécie se “multiplicando”, mesmo que não houvesse ordem, a terra tinha que se sujeitar, dê-lhe rede, anzol, carretilha, arrastões em cima dos peixes, chumbo nas aves e muito derramamento de sangue dos animais de quatro patas.
Aquecimento global? Respeito pelo meio ambiente? O que que é isso, gente? O povo só quer saber de se multiplicar, não ta nem aí pro planeta, sobra pra toda a natureza. Tudo ordem do Velho Javé.
Vamos devagar. Qual era a “imagem” dele, o Deus? Espírito, por acaso, tem imagem, figura, forma? Para que haja “semelhança” é necessário um termo de comparação; no mínimo, um ponto de referência. Qual seria essa referência?
Sem imagem, sem referência não existe matéria para construir a semelhança.
Então, Mané, é tudo conversa fiada. E é por isso que o homem tem muito mais de macaco do que de divino.
Quanto a dominar sobre os peixes do mar, só se os peixes estiverem a fim. Sem tarrafa, sem carretilha, sem anzol, oh, não mesmo! E para os peixes dos rios e das lagoas não sobrou uma palavrinha sequer?
Réptil? Ande de pés descalços, muito à vontade, e só de cuecas no meio de um matagal. Experimente passar distraído debaixo duma árvore da qual pende uma jibóia... E aí você vai ver que não domina bosta nenhuma.
27 E criou Deus o homem à sua imagem e semelhança: à imagem de Deus o criou: macho e fêmea os criou.
Quer dizer, sem nenhum dilema ético, baixou o download dele mesmo.
Quem sai aos seus, não degenera – diz há muito tempo o ditado, explicando a genética. Pode o espírito não ter forma, mas é nele que se concentram todos os defeitos e virtudes – de natureza espiritual, claro.
Então vocês sabem agora porque o homem é colérico, vingativo, ambicioso, gosta das coisas fáceis, adora trivialidades e, de vez em quando, resvala na pieguice: foi criado à imagem do Javé. Ah, sim, e lascivo. Tanto que o Velho teve de criar a fêmea, em seguida.
28 E Deus os abençoou, e Deus lhes disse: frutificai e multiplicai-vos e enchei a terra e sujeitai-a; e dominai sobre os peixes do mar e sobre as aves do céu e sobre todo o animal que se move sobre a terra.
E se não tivesse abençoado faria alguma diferença? Pelo que o povão todo tem visto até hoje, não. A bênção não resolveu bosta nenhuma, como se verá.
Pra “frutificar” legal, cada macho ganhou duas bolas. E uma coisa incômoda, muito mal colocada no quadro geral, chamada próstata. Mas tanto ele como a fêmea se amarraram nessa onda de “multiplicar-se”.
Com a espécie se “multiplicando”, mesmo que não houvesse ordem, a terra tinha que se sujeitar, dê-lhe rede, anzol, carretilha, arrastões em cima dos peixes, chumbo nas aves e muito derramamento de sangue dos animais de quatro patas.
Aquecimento global? Respeito pelo meio ambiente? O que que é isso, gente? O povo só quer saber de se multiplicar, não ta nem aí pro planeta, sobra pra toda a natureza. Tudo ordem do Velho Javé.
quarta-feira, 11 de maio de 2011
CRÔNICAS INDIGNADAS - Paulo Wainberg
DESABAFO
www.http://paulowainberg.wordpress.com
@paulowainberg (Twitter)
A volta de Delúbio, ícone do MENSALÃO, significa muito mais do que a decadência moral de um partido, sem considerar a hipótese de uma chantagem explícita.
Ela revela que a classe política, como um todo, acredita que nós, brasileiros, somos ignorantes, irresponsáveis e desonestos.
Infelizmente, os políticos têm razão, somos tudo isto e muito mais.
Nunca antes neste País tivemos mais de cento e noventa milhões de habitantes, dos quais dezesseis milhões vivem na miséria absoluta.
Dos cento e setenta milhões que sobram, podemos considerar que temos cerca de vinte a trinta milhões que fazem parte da sociedade culta, isto é, pessoas como nós, com boa formação e boa informação. E mais ou menos cento e trinta milhões de pessoas vivem no limbo intelectual dos que lutam, trabalham e ganham para sobreviver e se contentam com as vidas paralelas das novelas e dos BBBs.
Quem anda na região do Centro das grandes capitais brasileiras vê uma população apressada, pobre, feia, mal vestida e ar doente, em busca de solução para problemas cotidianos, caras emburradas e brabas, expressões de desalento e perplexidade, sujeira, confusão e tristeza.
É para esta massa desmotivada e desmemoriada que os políticos falam, é para eles que Lula dirigiu seus mais messiânicos discursos, é com eles que os parlamentares contam para acessar a corrupta Brasília e seus Poderes corruptos.
Não é à toa que se perpetuam Sarneys, Ramalhos, Calheiros, Simons, Magalhães, Inocêncios e o quase milhar de indivíduos, amparados pelo voto das pessoas ignorantes, pobres, tristes e desonestas que somos todos.
Assistir, ao vivo, sessões do Congresso ou de assembléias legislativas estaduais, é suficiente para ver o tipo de gente que lá circula, com suas gravatas e ternos de mau gosto, seu Português errado, seus sotaques escrachados, seus deboches e falsas indignações.
Não é à toa que, dos mais de seiscentos parlamentares em ação, ouvimos falar de meia dúzia e, na maioria das vezes, falar mal.
Assistir à uma sessão do STF é conviver com um cenário de vaidades escrotas, disputas de beleza, escárnios e gozações, num linguajar solene e ininteligível para o grande público.
Porém, não são os milhões da miséria absoluta e os do limbo que assistem isto. Somos nós, os vinte ou trinta milhões cultos, quando nos damos o trabalho ou estamos a fim de ficarmos irritados.
Logo, não há motivo para o mosqueiro brasiliense preocupar-se com a nossa opinião e o nosso sentimento, nós da sociedade culta.
Lá eles sabem, desde criança, que latimos mas não mordemos e, salvo uma ou outra escoriação leve, quando a indignação individual chega ao limite, eles fazem tudo, como e quando querem.
Eles sabem que escândalos menores, como comprar carros novos para senadores, como Renan ir para a comissão de ética, como terem mais de vinte mil pessoas trabalhando para eles, como gozarem mil vantagens, como transformar o pulgueiro em balcão de negócios, logo saem da mira da imprensa, substituídos por outros escândalos menores que logo perderão impacto, sucessiva, sucessiva e sucessivamente.
Não há democracia sem Parlamento. Porém é muito frágil a democracia quando o parlamento é corrupto, nem é democrático o país com mais de cento e noventa milhões de pessoas das quais apenas vinte ou trinta milhões têm condições de pensar.
Os analistas políticos e econômicos falam com palavras que a grande massa não compreende e não quer compreender, produto interno bruto, renda per capita, coalizão, medida provisória, pauta emperrada, termos que, para zeladores, domésticas, bombeiros de postos de gasolina, pequenos e grandes vigaristas, camelôs e o manancial maltratado de pessoas sobreviventes do país são tão estranhos que poderiam ser usadas em mandarim ou japonês.
Durante a ditadura, os ditadores deram aparência democrática ao Poder que exerceram a ferro e fogo.
A aberrante Constituição Cidadã, obra e graça dos políticos que viveram da Ditadura, dela se beneficiaram e com ela compactuaram, manteve a farsa.
Hoje, no Brasil, de democracia temos algumas vantagens, aparente liberdade de imprensa (desde que não afete interesses dos anunciantes), direito de expressão, direito de criticar e de, como estou fazendo, ficar indignado.
Indignar-se é preciso, é preciso mudar, elaborar uma nova Constituição que seja eficaz e aplicável e que, de uma vez por todas e com clareza, exija dos homens públicos duas mínimas qualidades para que continuem homens públicos: Honestidade e integridade.
www.http://paulowainberg.wordpress.com
@paulowainberg (Twitter)
A volta de Delúbio, ícone do MENSALÃO, significa muito mais do que a decadência moral de um partido, sem considerar a hipótese de uma chantagem explícita.
Ela revela que a classe política, como um todo, acredita que nós, brasileiros, somos ignorantes, irresponsáveis e desonestos.
Infelizmente, os políticos têm razão, somos tudo isto e muito mais.
Nunca antes neste País tivemos mais de cento e noventa milhões de habitantes, dos quais dezesseis milhões vivem na miséria absoluta.
Dos cento e setenta milhões que sobram, podemos considerar que temos cerca de vinte a trinta milhões que fazem parte da sociedade culta, isto é, pessoas como nós, com boa formação e boa informação. E mais ou menos cento e trinta milhões de pessoas vivem no limbo intelectual dos que lutam, trabalham e ganham para sobreviver e se contentam com as vidas paralelas das novelas e dos BBBs.
Quem anda na região do Centro das grandes capitais brasileiras vê uma população apressada, pobre, feia, mal vestida e ar doente, em busca de solução para problemas cotidianos, caras emburradas e brabas, expressões de desalento e perplexidade, sujeira, confusão e tristeza.
É para esta massa desmotivada e desmemoriada que os políticos falam, é para eles que Lula dirigiu seus mais messiânicos discursos, é com eles que os parlamentares contam para acessar a corrupta Brasília e seus Poderes corruptos.
Não é à toa que se perpetuam Sarneys, Ramalhos, Calheiros, Simons, Magalhães, Inocêncios e o quase milhar de indivíduos, amparados pelo voto das pessoas ignorantes, pobres, tristes e desonestas que somos todos.
Assistir, ao vivo, sessões do Congresso ou de assembléias legislativas estaduais, é suficiente para ver o tipo de gente que lá circula, com suas gravatas e ternos de mau gosto, seu Português errado, seus sotaques escrachados, seus deboches e falsas indignações.
Não é à toa que, dos mais de seiscentos parlamentares em ação, ouvimos falar de meia dúzia e, na maioria das vezes, falar mal.
Assistir à uma sessão do STF é conviver com um cenário de vaidades escrotas, disputas de beleza, escárnios e gozações, num linguajar solene e ininteligível para o grande público.
Porém, não são os milhões da miséria absoluta e os do limbo que assistem isto. Somos nós, os vinte ou trinta milhões cultos, quando nos damos o trabalho ou estamos a fim de ficarmos irritados.
Logo, não há motivo para o mosqueiro brasiliense preocupar-se com a nossa opinião e o nosso sentimento, nós da sociedade culta.
Lá eles sabem, desde criança, que latimos mas não mordemos e, salvo uma ou outra escoriação leve, quando a indignação individual chega ao limite, eles fazem tudo, como e quando querem.
Eles sabem que escândalos menores, como comprar carros novos para senadores, como Renan ir para a comissão de ética, como terem mais de vinte mil pessoas trabalhando para eles, como gozarem mil vantagens, como transformar o pulgueiro em balcão de negócios, logo saem da mira da imprensa, substituídos por outros escândalos menores que logo perderão impacto, sucessiva, sucessiva e sucessivamente.
Não há democracia sem Parlamento. Porém é muito frágil a democracia quando o parlamento é corrupto, nem é democrático o país com mais de cento e noventa milhões de pessoas das quais apenas vinte ou trinta milhões têm condições de pensar.
Os analistas políticos e econômicos falam com palavras que a grande massa não compreende e não quer compreender, produto interno bruto, renda per capita, coalizão, medida provisória, pauta emperrada, termos que, para zeladores, domésticas, bombeiros de postos de gasolina, pequenos e grandes vigaristas, camelôs e o manancial maltratado de pessoas sobreviventes do país são tão estranhos que poderiam ser usadas em mandarim ou japonês.
Durante a ditadura, os ditadores deram aparência democrática ao Poder que exerceram a ferro e fogo.
A aberrante Constituição Cidadã, obra e graça dos políticos que viveram da Ditadura, dela se beneficiaram e com ela compactuaram, manteve a farsa.
Hoje, no Brasil, de democracia temos algumas vantagens, aparente liberdade de imprensa (desde que não afete interesses dos anunciantes), direito de expressão, direito de criticar e de, como estou fazendo, ficar indignado.
Indignar-se é preciso, é preciso mudar, elaborar uma nova Constituição que seja eficaz e aplicável e que, de uma vez por todas e com clareza, exija dos homens públicos duas mínimas qualidades para que continuem homens públicos: Honestidade e integridade.
terça-feira, 10 de maio de 2011
E SE O HOMOAFETIVO QUISER DESOMOAFETIVAR-SE DE SEU HOMOAFETO?
Quem escreve mal não pode ser bom caráter - disse alguém, já não lembro quem. O ministro Ayres Britto – como também seus pares dos diversos tribunais – bem que estão precisando de um cursinho elementar de redação, para aprender a falar como falam os demais mortais. O voto do ministro sobre a tal de homoafetividade lembra desde as enxúndias de Rui Barbosa ao falar arrevesado de Yoda, o mestre Jedi de Guerra nas Estrelas. No que não tem nada de original, este modo afetado de redigir é vício profissional dos causídicos. Contamina desde os vulturinos ministros dos Supremos aos rábulas de porta de cadeia. Como se falar difícil fosse demonstração de inteligência. Para estes senhores, colocar o adjetivo antes do verbo é atestado de estilo.
Defendendo a tal de união estável entre homoafetivos, o ministro apela a Platão e Max Scheler: “É Platão quem o diz -, “quem não começa pelo amor nunca saberá o que é filosofia”. É a categoria do afeto como pré-condição do pensamento, o que levou Max Scheler a também ajuizar que “o ser humano, antes de um ser pensante ou volitivo, é um ser amante”.Mas que tem a ver esse amor que leva à filosofia ou o ser amante de Scheler com homossexualismo? Impertérrito, o ministro vai adiante e cita Nietzsche e Hegel: “Um tipo de liberdade que é, em si e por si, um autêntico bem de personalidade. Um dado elementar da criatura humana em sua intrínseca dignidade de universo à parte. Algo já transposto ou catapultado para a inviolável esfera da autonomia de vontade do indivíduo, na medida em que sentido e praticado como elemento da compostura anímica e psicofísica (volta-se a dizer) do ser humano em busca de sua plenitude existencial. Que termina sendo uma busca de si mesmo, na luminosa trilha do “Torna-te quem és”, tão bem teoricamente explorada por Friedrich Nietzsche. Uma busca da irrepetível identidade individual que, transposta para o plano da aventura humana como um todo, levou Hegel a sentenciar que a evolução do espírito do tempo se define como um caminhar na direção do aperfeiçoamento de si mesmo”.
Como se o “torna-te quem és” nietzscheano fosse uma apologia do homossexualismo e o Zeitgeist hegeliano estivesse a serviço dos movimentos gays. Zeitgeist é o espírito do tempo. Pode tanto significar – como significou – nazismo ou comunismo. Zeitgeist, para a Alemanha nazista, era o extermínio dos judeus. Zeitgeist, para a União Soviética, era a ditadura do proletariado, a eliminação da propriedade privada e dos dissidentes. Zeitgeist não quer dizer caminhar na direção do aperfeiçoamento de si mesmo, como pretendia Hegel.Conhecesse a obra de Nietzsche, o ministro teria melhores momentos a citar. Como este, por exemplo, do Anti-Cristo. Nas páginas finais do ensaio, lemos um projeto de Lei contra o Cristianismo, dada no dia da Salvação do ano Um (a 30 de setembro de 1888, pelo falso calendário).“Art. 1º - É vício qualquer tipo de antinatureza. A mais viciosa espécie de homens é o padre: ele ensina a antinatureza. Contra o padre não temos razões, temos a casa de correção”.Pois foram os padres do cristianismo que transformaram o que era normal em anormalidade. Em seu ímpeto filosofante, Ayres Britto não se detém e joga Descartes e Fernando Pessoa em seus arrazoados: “Donde René Descartes emitir a célebre e corajosa proposição de que “Não me impressiona o argumento de autoridade, mas, sim, a autoridade do argumento”, numa época tão marcada pelo dogma da infalibilidade papal e da fórmula absolutista de que “O rei não pode errar” (The king can do no wrong”). Reverência ao valor da verdade que também se lê nestes conhecidos versos de Fernando Pessoa, três séculos depois da proclamação cartesiana: “O universo não é uma idéia minha./A idéia que eu tenho do universo é que é uma idéia minha”.Pelo jeito, o ministro andou fazendo gazeta nas aulas de Filosofia, se é que um dia as teve. A célebre e corajosa proposição de Descartes tem apenas mais de dois mil anos de idade. Está no Organon de Aristóteles, onde o chamado argumentum ad verecundiam - apelo à autoridade - é qualificado como sofisma. O ministro situa este argumento em uma época “marcada pelo dogma da infalibilidade papal e da fórmula absolutista de que “o rei não pode errar”. Ora, a lógica aristotélica vem de uma época em que não havia papas nem reis.Mais infeliz é o apelo a Fernando Pessoa. Ao afirmar que “a idéia que eu tenho do universo é que é uma idéia minha”, o poeta não pretendia de forma alguma defender comportamentos sexuais. Conhecesse Ayres Britto a obra de Pessoa, poderia ter feito citação mais pertinente:O amor é que é essencial. O sexo é só um acidente. Pode ser igual Ou diferente. O homem não é um animal: É uma carne inteligente, Embora às vezes doente.O ministro-relator – ou talvez seus assessores, não sei –, para demonstrar uma erudição que a nada leva, faz citações destrambelhadas que nada têm a ver com o assunto. Concluo com mais um pérola do ministro:“Que termina sendo a própria simbiose do corpo e da alma de pessoas que apenas desejam conciliar pelo modo mais solto e orgânico possível sua dualidade personativa em um sólido conjunto, experimentando aquela nirvânica aritmética amorosa que Jean-Paul Sartre sintetizou na fórmula de que: na matemática do amor, um mais um... é igual a um;“VI – enfim, assim como não se pode separar as pessoas naturais do sistema de órgãos que lhes timbra a anatomia e funcionalidade sexuais, também não se pode excluir do direito à intimidade e à vida privada dos indivíduos a dimensão sexual do seu telúrico existir”.Que quer dizer o ministro, em seus arroubos poéticos, com telúrico existir? Ou com nirvânica aritmética amorosa? Que tem a ver nirvana com amor ou aritmética? Mas o melhor é a dualidade personativa. Que quer dizer com dualidade personativa? Consulto meus dicionários, desde o Caldas Aulete até o Houaiss, e não encontro verbete algum para personativa.
Em sua pretensão de parecer moderninho, de obedecer ao Zeitgeist de nossos dias – o politicamente correto – o ministro faz da filosofia um coquetel e junta palavras sem sentido para justificar o injustificável, a revogação de um preceito constitucional por um colegiado de pavões. Nada tenho contra uniões homossexuais. Mas há um dispositivo na Carta Magna que reconhece “a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento”.
O caminho correto seria uma reforma constitucional, via Congresso. Há vários projetos de legalização da união estável no Congresso. Mas os parlamentares, com medo de definir-se e perder votos, sempre os protelaram. Seja como for, quem legisla – quando deveria apenas julgar - devia pensar nas conseqüências futuras das leis que elabora.Todo contrato tem distrato, inclusive o casamento. É claro que aqueles padres para os quais Nietzsche recomendava a casa de correção sempre detestaram esta idéia. Para estes outros personagens vulturinos, casamento é dogma, sacramento instituído pela divindade e portanto eterno. O Brasil libertou-se tardiamente desta ditadura vaticana. Antes tarde do que nunca.Que acontecerá quando um homoafetivo quiser desomoafetivar-se de seu homoafeto? Se o divórcio já está previsto para o casamento, não vejo nada de parecido para as tais de uniões estáveis. Pelo jeito, o STF finalmente realizou o sonho da Santa Madre, o restabelecimento no Brasil das uniões para a eternidade.
Defendendo a tal de união estável entre homoafetivos, o ministro apela a Platão e Max Scheler: “É Platão quem o diz -, “quem não começa pelo amor nunca saberá o que é filosofia”. É a categoria do afeto como pré-condição do pensamento, o que levou Max Scheler a também ajuizar que “o ser humano, antes de um ser pensante ou volitivo, é um ser amante”.Mas que tem a ver esse amor que leva à filosofia ou o ser amante de Scheler com homossexualismo? Impertérrito, o ministro vai adiante e cita Nietzsche e Hegel: “Um tipo de liberdade que é, em si e por si, um autêntico bem de personalidade. Um dado elementar da criatura humana em sua intrínseca dignidade de universo à parte. Algo já transposto ou catapultado para a inviolável esfera da autonomia de vontade do indivíduo, na medida em que sentido e praticado como elemento da compostura anímica e psicofísica (volta-se a dizer) do ser humano em busca de sua plenitude existencial. Que termina sendo uma busca de si mesmo, na luminosa trilha do “Torna-te quem és”, tão bem teoricamente explorada por Friedrich Nietzsche. Uma busca da irrepetível identidade individual que, transposta para o plano da aventura humana como um todo, levou Hegel a sentenciar que a evolução do espírito do tempo se define como um caminhar na direção do aperfeiçoamento de si mesmo”.
Como se o “torna-te quem és” nietzscheano fosse uma apologia do homossexualismo e o Zeitgeist hegeliano estivesse a serviço dos movimentos gays. Zeitgeist é o espírito do tempo. Pode tanto significar – como significou – nazismo ou comunismo. Zeitgeist, para a Alemanha nazista, era o extermínio dos judeus. Zeitgeist, para a União Soviética, era a ditadura do proletariado, a eliminação da propriedade privada e dos dissidentes. Zeitgeist não quer dizer caminhar na direção do aperfeiçoamento de si mesmo, como pretendia Hegel.Conhecesse a obra de Nietzsche, o ministro teria melhores momentos a citar. Como este, por exemplo, do Anti-Cristo. Nas páginas finais do ensaio, lemos um projeto de Lei contra o Cristianismo, dada no dia da Salvação do ano Um (a 30 de setembro de 1888, pelo falso calendário).“Art. 1º - É vício qualquer tipo de antinatureza. A mais viciosa espécie de homens é o padre: ele ensina a antinatureza. Contra o padre não temos razões, temos a casa de correção”.Pois foram os padres do cristianismo que transformaram o que era normal em anormalidade. Em seu ímpeto filosofante, Ayres Britto não se detém e joga Descartes e Fernando Pessoa em seus arrazoados: “Donde René Descartes emitir a célebre e corajosa proposição de que “Não me impressiona o argumento de autoridade, mas, sim, a autoridade do argumento”, numa época tão marcada pelo dogma da infalibilidade papal e da fórmula absolutista de que “O rei não pode errar” (The king can do no wrong”). Reverência ao valor da verdade que também se lê nestes conhecidos versos de Fernando Pessoa, três séculos depois da proclamação cartesiana: “O universo não é uma idéia minha./A idéia que eu tenho do universo é que é uma idéia minha”.Pelo jeito, o ministro andou fazendo gazeta nas aulas de Filosofia, se é que um dia as teve. A célebre e corajosa proposição de Descartes tem apenas mais de dois mil anos de idade. Está no Organon de Aristóteles, onde o chamado argumentum ad verecundiam - apelo à autoridade - é qualificado como sofisma. O ministro situa este argumento em uma época “marcada pelo dogma da infalibilidade papal e da fórmula absolutista de que “o rei não pode errar”. Ora, a lógica aristotélica vem de uma época em que não havia papas nem reis.Mais infeliz é o apelo a Fernando Pessoa. Ao afirmar que “a idéia que eu tenho do universo é que é uma idéia minha”, o poeta não pretendia de forma alguma defender comportamentos sexuais. Conhecesse Ayres Britto a obra de Pessoa, poderia ter feito citação mais pertinente:O amor é que é essencial. O sexo é só um acidente. Pode ser igual Ou diferente. O homem não é um animal: É uma carne inteligente, Embora às vezes doente.O ministro-relator – ou talvez seus assessores, não sei –, para demonstrar uma erudição que a nada leva, faz citações destrambelhadas que nada têm a ver com o assunto. Concluo com mais um pérola do ministro:“Que termina sendo a própria simbiose do corpo e da alma de pessoas que apenas desejam conciliar pelo modo mais solto e orgânico possível sua dualidade personativa em um sólido conjunto, experimentando aquela nirvânica aritmética amorosa que Jean-Paul Sartre sintetizou na fórmula de que: na matemática do amor, um mais um... é igual a um;“VI – enfim, assim como não se pode separar as pessoas naturais do sistema de órgãos que lhes timbra a anatomia e funcionalidade sexuais, também não se pode excluir do direito à intimidade e à vida privada dos indivíduos a dimensão sexual do seu telúrico existir”.Que quer dizer o ministro, em seus arroubos poéticos, com telúrico existir? Ou com nirvânica aritmética amorosa? Que tem a ver nirvana com amor ou aritmética? Mas o melhor é a dualidade personativa. Que quer dizer com dualidade personativa? Consulto meus dicionários, desde o Caldas Aulete até o Houaiss, e não encontro verbete algum para personativa.
Em sua pretensão de parecer moderninho, de obedecer ao Zeitgeist de nossos dias – o politicamente correto – o ministro faz da filosofia um coquetel e junta palavras sem sentido para justificar o injustificável, a revogação de um preceito constitucional por um colegiado de pavões. Nada tenho contra uniões homossexuais. Mas há um dispositivo na Carta Magna que reconhece “a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento”.
O caminho correto seria uma reforma constitucional, via Congresso. Há vários projetos de legalização da união estável no Congresso. Mas os parlamentares, com medo de definir-se e perder votos, sempre os protelaram. Seja como for, quem legisla – quando deveria apenas julgar - devia pensar nas conseqüências futuras das leis que elabora.Todo contrato tem distrato, inclusive o casamento. É claro que aqueles padres para os quais Nietzsche recomendava a casa de correção sempre detestaram esta idéia. Para estes outros personagens vulturinos, casamento é dogma, sacramento instituído pela divindade e portanto eterno. O Brasil libertou-se tardiamente desta ditadura vaticana. Antes tarde do que nunca.Que acontecerá quando um homoafetivo quiser desomoafetivar-se de seu homoafeto? Se o divórcio já está previsto para o casamento, não vejo nada de parecido para as tais de uniões estáveis. Pelo jeito, o STF finalmente realizou o sonho da Santa Madre, o restabelecimento no Brasil das uniões para a eternidade.
segunda-feira, 9 de maio de 2011
DA SODOMIA COMO FONTE DE DIREITOS E OBRIGAÇÕES - João Eichbaum
O macaco homem nunca deixará de ser macaco. Podem até botar uma toga nele, chamá-lo de excelência, que sua animalidade sempre prevalecerá sobre sua inteligência.
Dar o orifício aquele que se situa no vale das nádegas, ou dele se servir para obter satisfação sexual, ou seja, curtir anal, a partir de sexta-feira, dia 6 último, por decisão do Supremo Tribunal Federal, tornou-se uma forma lícita de adquirir direitos e gerar obrigações. Segundo decidiram todos os ministros, - de cuja masculinidade me sinto no direito de duvidar - tanto o que dá, como o que traça o traseiro, se não quiser trabalhar, não precisa: poderá viver disso pelo resto da vida, pois terá direito a pensão alimentícia.
Vocês já pensaram ? Que magnífico meio de vida, adquirir direitos através do ânus!
Ah, e tem mais: essa troca de repugnantes favores sexuais, foi batizada pelos ministros do Supremo Tribunal Federal como “entidade familiar”.
Eu não queria ser tão grosseiro assim, falando em comer bunda. Preferiria dizer que, a partir da decisão do Supremo Tribunal Federal, decretando que as bichas é que mandam no mundo, reconhecendo as animalidades homossexuais como “entidade familiar”, a sodomia passou a ser uma fonte de direitos. Mas, não dá. Sodomia, cópula anal, são termos sublimes demais para descerem até a baixeza desse tema que ocupou o “notório saber jurídico” dos ministros do Supremo Tribunal Federal.
Mas, adquirir direito a pensão alimentícia, dando ou comendo traseiro, ainda não é tudo. Qualquer um dos parceiros, tanto o que estiver em cima como o que estiver em baixo, terá direito à pensão previdenciária, quando se tornar sobrevivente duma relação de sodomia. E nós, os contribuintes, os que somos coagidos a fornecer receita para o INSS, com o fruto do nosso trabalho, de sol a sol, bancaremos a pensão deles, cujo direito foi adquirido levando ferro ou metendo ferro no traseiro, em baixo dos lençóis.
A isso é que os ministros chamam de isonomia: o suor causado pelo trabalho tem o mesmo valor do suor causado pela trepada anal. E essa prática é que inspirou manifestações de emoção, como as de Ayres Britto, que se serve da toga para fazer poesias idiotas, e de Luiz Fux que, segundo a imprensa, “até embargou a voz”. Certamente, naquele momento, ambos estavam embalados pelo seguinte argumento jurídico: “pô, não tem coisa mais linda, do que dois viados se comendo...”
Foi uma decisão história, dizem os jornais. Realmente, essa foi uma decisão histórica: jamais, em toda a história do Supremo, tinha dado tamanho apagão na vergonha dos ministros; nunca aquela corte havia tomado uma decisão tão obscena, obrigando-nos a nós, contribuintes, a pagar por pegadas anais de que não fizemos parte.
Quer dizer, botaram no nosso também.
Dar o orifício aquele que se situa no vale das nádegas, ou dele se servir para obter satisfação sexual, ou seja, curtir anal, a partir de sexta-feira, dia 6 último, por decisão do Supremo Tribunal Federal, tornou-se uma forma lícita de adquirir direitos e gerar obrigações. Segundo decidiram todos os ministros, - de cuja masculinidade me sinto no direito de duvidar - tanto o que dá, como o que traça o traseiro, se não quiser trabalhar, não precisa: poderá viver disso pelo resto da vida, pois terá direito a pensão alimentícia.
Vocês já pensaram ? Que magnífico meio de vida, adquirir direitos através do ânus!
Ah, e tem mais: essa troca de repugnantes favores sexuais, foi batizada pelos ministros do Supremo Tribunal Federal como “entidade familiar”.
Eu não queria ser tão grosseiro assim, falando em comer bunda. Preferiria dizer que, a partir da decisão do Supremo Tribunal Federal, decretando que as bichas é que mandam no mundo, reconhecendo as animalidades homossexuais como “entidade familiar”, a sodomia passou a ser uma fonte de direitos. Mas, não dá. Sodomia, cópula anal, são termos sublimes demais para descerem até a baixeza desse tema que ocupou o “notório saber jurídico” dos ministros do Supremo Tribunal Federal.
Mas, adquirir direito a pensão alimentícia, dando ou comendo traseiro, ainda não é tudo. Qualquer um dos parceiros, tanto o que estiver em cima como o que estiver em baixo, terá direito à pensão previdenciária, quando se tornar sobrevivente duma relação de sodomia. E nós, os contribuintes, os que somos coagidos a fornecer receita para o INSS, com o fruto do nosso trabalho, de sol a sol, bancaremos a pensão deles, cujo direito foi adquirido levando ferro ou metendo ferro no traseiro, em baixo dos lençóis.
A isso é que os ministros chamam de isonomia: o suor causado pelo trabalho tem o mesmo valor do suor causado pela trepada anal. E essa prática é que inspirou manifestações de emoção, como as de Ayres Britto, que se serve da toga para fazer poesias idiotas, e de Luiz Fux que, segundo a imprensa, “até embargou a voz”. Certamente, naquele momento, ambos estavam embalados pelo seguinte argumento jurídico: “pô, não tem coisa mais linda, do que dois viados se comendo...”
Foi uma decisão história, dizem os jornais. Realmente, essa foi uma decisão histórica: jamais, em toda a história do Supremo, tinha dado tamanho apagão na vergonha dos ministros; nunca aquela corte havia tomado uma decisão tão obscena, obrigando-nos a nós, contribuintes, a pagar por pegadas anais de que não fizemos parte.
Quer dizer, botaram no nosso também.
sexta-feira, 6 de maio de 2011
LIÇÕES DE DIREITO PARA ESTAGIÁRIOS E ASSESSORES DE JUIZES, DESEMBARGADORES E MINISTROS - João Eichbaum
EMBARGOS DECLARATÓRIOS
O seguinte. Para fixar o percentual dos honorários advocatícios, o acórdão utilizou o valor do contrato firmado entre as partes, emprestando-lhe o nome de “valor da causa”. O valor da causa, que o inciso V do art. 282 do Código de Processo Civil exige como elemento integrante da petição inicial não correspondia, no caso, ao valor do contrato que se discutia.
É quase comum esse expediente que os advogados usam, para economizar custas e emolumentos: declaram, na petição inicial, um valor que não corresponde, efetivamente, à pretensão econômica em discussão no processo.
Aproveitando-se então da expressão empregada pelo acórdão (“valor da causa”) o advogado da parte sucumbente (professor de Processo Civil) ajuizou embargos declaratórios. Para isso invocou erro material do acórdão, mostrando a divergência entre o valor dado à causa e o “valor da causa” que o acórdão utilizara como ponto de partida para a fixação dos honorários.
Em primeiro lugar, a isso não se pode chamar de “erro material” O acórdão se limitou a interpretar, como ponto de partida, para a fixação dos honorários, o valor do contrato, emprestando-lhe o nomen juris de valor da causa, não no sentido específico, para efeitos fiscais, mas no sentido genérico, enquanto valor emergente de um contrato.
Não se pode elogiar a terminologia utilizada pelo acórdão exatamente porque produziu uma interpretação inadequada. Expressões técnicas, nomes específicos de atos ou figuras processuais não devem ser empregados em sentido comum, exatamente para que não se gere confusão.
Mas também o advogado da parte embargante (um professor de Processo Civil) se equivocou ao ajuizar embargos declaratórios. Os “embargos declaratórios” não se prestam para corrigir erros materiais. A lei limita aquele tipo de embargos à contradição, à obscuridade e à omissão “de ponto sobre o qual devia o tribunal se pronunciar”. E no caso nenhuma dessas hipóteses, que figuram no art. 535 do Código de Processo Civil, foi apontada como fundamento dos ditos embargos. O advogado insistiu apenas na existência de “erro material”.
Não havendo recurso próprio para a correção de “erro material”, uma “questão de fato” pode ser argüida durante o julgamento, se estiver presente o advogado. Se não, uma simples petição é o bastante para elucidar o erro.
O seguinte. Para fixar o percentual dos honorários advocatícios, o acórdão utilizou o valor do contrato firmado entre as partes, emprestando-lhe o nome de “valor da causa”. O valor da causa, que o inciso V do art. 282 do Código de Processo Civil exige como elemento integrante da petição inicial não correspondia, no caso, ao valor do contrato que se discutia.
É quase comum esse expediente que os advogados usam, para economizar custas e emolumentos: declaram, na petição inicial, um valor que não corresponde, efetivamente, à pretensão econômica em discussão no processo.
Aproveitando-se então da expressão empregada pelo acórdão (“valor da causa”) o advogado da parte sucumbente (professor de Processo Civil) ajuizou embargos declaratórios. Para isso invocou erro material do acórdão, mostrando a divergência entre o valor dado à causa e o “valor da causa” que o acórdão utilizara como ponto de partida para a fixação dos honorários.
Em primeiro lugar, a isso não se pode chamar de “erro material” O acórdão se limitou a interpretar, como ponto de partida, para a fixação dos honorários, o valor do contrato, emprestando-lhe o nomen juris de valor da causa, não no sentido específico, para efeitos fiscais, mas no sentido genérico, enquanto valor emergente de um contrato.
Não se pode elogiar a terminologia utilizada pelo acórdão exatamente porque produziu uma interpretação inadequada. Expressões técnicas, nomes específicos de atos ou figuras processuais não devem ser empregados em sentido comum, exatamente para que não se gere confusão.
Mas também o advogado da parte embargante (um professor de Processo Civil) se equivocou ao ajuizar embargos declaratórios. Os “embargos declaratórios” não se prestam para corrigir erros materiais. A lei limita aquele tipo de embargos à contradição, à obscuridade e à omissão “de ponto sobre o qual devia o tribunal se pronunciar”. E no caso nenhuma dessas hipóteses, que figuram no art. 535 do Código de Processo Civil, foi apontada como fundamento dos ditos embargos. O advogado insistiu apenas na existência de “erro material”.
Não havendo recurso próprio para a correção de “erro material”, uma “questão de fato” pode ser argüida durante o julgamento, se estiver presente o advogado. Se não, uma simples petição é o bastante para elucidar o erro.
quinta-feira, 5 de maio de 2011
A BÍBLIA LIDA PELO DIABO - João Eichbaum
21 E Deus criou as grandes baleias e todo o réptil de alma vivente que as águas abundantemente produziram conforme suas espécies; e toda a ave de asas, conforme sua espécie. E viu Deus que era bom.
Quer dizer, liberou geral. Só que faltou um item: os tubarões.
Mesmo assim, Javé achou que estava se dando bem no mercado, curtiu sua obra e babou na barba: tá muito bom!
E botou mais essa no currículo dele.
Mas, cá pra nós: por acaso havia alguém, ali na hora, que tivesse peito pra criticar ou botar defeito?
22 E Deus as abençoou, dizendo: frutificai-vos e multiplicai-vos e enchei as águas dos mares; e as aves se multipliquem na terra.
Depois disso, aconteceu aquela pegação que acontece até hoje, em baixo d’água, na terra, em cima de árvores. É só ter uma fêmea a jeito.
23 E foi a tarde e a manhã do dia quinto.
Puxa! E precisava dois turnos pra isso?
A CRIAÇÃO DOS SERES VIVENTES
24 E disse Deus: produza a terra alma vivente conforme a sua espécie; gado e répteis e bestas feras da terra, conforme a sua espécie. E assim foi. 25 E fez Deus as bestas feras da terra conforme a sua espécie e o gado conforme a sua espécie, e todo o réptil da terra conforme a sua espécie. E viu Deus que era bom.
Será que Ele encheu a terra com essa bicharada toda, duma vez só? Ou só se ocupou dos casais de cada espécie que, depois da primeira trepada, passaram a reproduzir, não para encher a terra, como Ele queria, mas porque transa é uma coisa boa, independente do resultado? Claro, né? Se reproduzir não fosse gostoso, tudo tinha terminado por ali mesmo.
E Ele sempre curtindo, sempre achando bom.
Quer dizer, liberou geral. Só que faltou um item: os tubarões.
Mesmo assim, Javé achou que estava se dando bem no mercado, curtiu sua obra e babou na barba: tá muito bom!
E botou mais essa no currículo dele.
Mas, cá pra nós: por acaso havia alguém, ali na hora, que tivesse peito pra criticar ou botar defeito?
22 E Deus as abençoou, dizendo: frutificai-vos e multiplicai-vos e enchei as águas dos mares; e as aves se multipliquem na terra.
Depois disso, aconteceu aquela pegação que acontece até hoje, em baixo d’água, na terra, em cima de árvores. É só ter uma fêmea a jeito.
23 E foi a tarde e a manhã do dia quinto.
Puxa! E precisava dois turnos pra isso?
A CRIAÇÃO DOS SERES VIVENTES
24 E disse Deus: produza a terra alma vivente conforme a sua espécie; gado e répteis e bestas feras da terra, conforme a sua espécie. E assim foi. 25 E fez Deus as bestas feras da terra conforme a sua espécie e o gado conforme a sua espécie, e todo o réptil da terra conforme a sua espécie. E viu Deus que era bom.
Será que Ele encheu a terra com essa bicharada toda, duma vez só? Ou só se ocupou dos casais de cada espécie que, depois da primeira trepada, passaram a reproduzir, não para encher a terra, como Ele queria, mas porque transa é uma coisa boa, independente do resultado? Claro, né? Se reproduzir não fosse gostoso, tudo tinha terminado por ali mesmo.
E Ele sempre curtindo, sempre achando bom.
quarta-feira, 4 de maio de 2011
LIÇÕES DE LINGUISTICA PARA DEPUTADOS E OUTROS INCULTOS - João Eichbaum
Duma coisa tenho certeza: o comunista Raul Carrion, deputado estadual do Rio Grande do Sul, autor de uma lei que proíbe o uso de palavras estrangeiras em publicidade e documentos oficiais,
não sabe o que é morfologia.
Morfologia provém do grego: morphé (forma) lógos (palavra) e indica, em sentido próprio, a “formação das palavras”. Sentido esse que engloba, entre outros meios de formação de palavras, a transição de uma língua para outra.
É público e notório que a linguagem de um país se forma, em primeiro lugar, com o uso. É o povo, falando, que faz a língua do seu país (e não as leis). E a linguagem do povo evolui, não é estática. De geração em geração novos vocábulos são incorporados ao idioma, em razão do uso, que é dinâmico.
Quem cria a gíria, senão o povo? E a gíria muda, em menos de uma geração, tal é a dinâmica do uso.
Há alguns anos atrás, “gata” não era senão o feminino de “gato”, aqueles bichinhos domésticos. Hoje “gata’ é sinônimo de mulher bonita e “gato”, de homem bonito.
Isso é apenas um dos milhares de exemplos que se poderia aqui trazer, para mostrar que quem faz o idioma é o povo.
A “importação” de termos ou palavras estrangeiras, quer se queira ou não, é um dos meios de formação do idioma. A morfologia não a arreda, dentro dessa perspectiva. Ela permite o neologismo.
Hoje, com a globalização e a expansão da tecnologia, com maior razão o uso de palavras estrangeiras se insere no dia a dia da linguagem, quer popular, quer técnica.
Não seria necessário repetir aqui o que tantos críticos da lei de autoria desse desconhecido senhor Carrion têm lembrado: na linguagem da informática, pouquíssimas são as palavras geradas no próprio idioma português.
Além de não ter noções mínimas de linguìstica, nem de ridículo, Raul Carrion passa um atestado público de ignorância acerca da natureza da lei. Ele não sabe que usos e costumes têm tanta força quanto a lei.
A democracia, que outra coisa não representa senão a força do povo, não faz bem para os comunistas. Aldo Rabelo, deputado federal, comunista também, acalenta idéias semelhantes às de Raul Carrion. Comunismo para eles, assim como para Fidel Castro, é sinônimo de antiamericanismo. Tudo o que vem dos Estados Unidos é impróprio. A começar pela linguagem. É por isso que eles querem, através de leis, barrar a globalização, que passa pelos Estados Unidos.
Mas, o povo não ta nem aí e, antes de ir para a loja, não procura saber se existe no vocabulário brasileiro uma palavra que indique o seu sonho de consumo: o “Ipad”.
não sabe o que é morfologia.
Morfologia provém do grego: morphé (forma) lógos (palavra) e indica, em sentido próprio, a “formação das palavras”. Sentido esse que engloba, entre outros meios de formação de palavras, a transição de uma língua para outra.
É público e notório que a linguagem de um país se forma, em primeiro lugar, com o uso. É o povo, falando, que faz a língua do seu país (e não as leis). E a linguagem do povo evolui, não é estática. De geração em geração novos vocábulos são incorporados ao idioma, em razão do uso, que é dinâmico.
Quem cria a gíria, senão o povo? E a gíria muda, em menos de uma geração, tal é a dinâmica do uso.
Há alguns anos atrás, “gata” não era senão o feminino de “gato”, aqueles bichinhos domésticos. Hoje “gata’ é sinônimo de mulher bonita e “gato”, de homem bonito.
Isso é apenas um dos milhares de exemplos que se poderia aqui trazer, para mostrar que quem faz o idioma é o povo.
A “importação” de termos ou palavras estrangeiras, quer se queira ou não, é um dos meios de formação do idioma. A morfologia não a arreda, dentro dessa perspectiva. Ela permite o neologismo.
Hoje, com a globalização e a expansão da tecnologia, com maior razão o uso de palavras estrangeiras se insere no dia a dia da linguagem, quer popular, quer técnica.
Não seria necessário repetir aqui o que tantos críticos da lei de autoria desse desconhecido senhor Carrion têm lembrado: na linguagem da informática, pouquíssimas são as palavras geradas no próprio idioma português.
Além de não ter noções mínimas de linguìstica, nem de ridículo, Raul Carrion passa um atestado público de ignorância acerca da natureza da lei. Ele não sabe que usos e costumes têm tanta força quanto a lei.
A democracia, que outra coisa não representa senão a força do povo, não faz bem para os comunistas. Aldo Rabelo, deputado federal, comunista também, acalenta idéias semelhantes às de Raul Carrion. Comunismo para eles, assim como para Fidel Castro, é sinônimo de antiamericanismo. Tudo o que vem dos Estados Unidos é impróprio. A começar pela linguagem. É por isso que eles querem, através de leis, barrar a globalização, que passa pelos Estados Unidos.
Mas, o povo não ta nem aí e, antes de ir para a loja, não procura saber se existe no vocabulário brasileiro uma palavra que indique o seu sonho de consumo: o “Ipad”.
terça-feira, 3 de maio de 2011
SIC TRANSIT GLORIA MUNDI - Janer Cristaldo
Se há algo que não entendo no mundo, é o culto a personagens míticas. Por exemplo, as bodas reais na Inglaterra. Que fizeram de importante na vida o príncipe William e a Kate Middleton para atraírem a atenção de dois bilhões de pessoas no mundo, que é o número estimado de telespectadores do enlace? Um nasceu príncipe e ela, plebéia, foi a eleita do príncipe.
E daí? O culto a eles prestado pelas multidões em nada difere ao culto um dia prestado a Hitler ou Stalin, Mao ou Kim Il Sung, Beatles ou Bono Vox.
Ou melhor, talvez entenda. Estes espécimes foram muito bem definidos no século passado por um judeu da Ucrânia. É o Kleinen Mann, de Wilhelm Reich. Ou o Zé Ninguém, como foi traduzido em português: “O homem pequeno é aquele que não reconhece sua pequenez e teme reconhecê-la; que procura mascarar a sua tacanhez e estreiteza de vistas com ilusões de força e grandeza, força e grandezas alheias. Que se orgulha de seus grandes generais mas não de si próprio. Que admira as idéias que não teve, mas jamais as que teve. Que acredita mais arraigadamente nas coisas que menos entende, e que não acredita no que quer que lhe pareça fácil de assimilar”.
Daí a acreditar no papa, em Hitler ou Stalin, basta um pequeno passo. Estas gentes, eu as conheço desde minha adolescência. Continua Reich: “Tu mesmo te desprezas, Zé Ninguém. Dizes: ‘quem sou eu para ter opinião própria, para decidir sobre minha própria vida e ter o mundo como meu?’ E tens razão: quem és tu para reclamar direitos sobre tua vida? Deixa-me dizer-te.“Diferes dos grandes homens que verdadeiramente o são apenas num ponto: todo grande homem foi um dia um Zé Ninguém que desenvolveu apenas uma outra qualidade: a de reconhecer as áreas em que havia limitações e estreiteza em seu modo de pensar e agir. O grande homem é pois aquele que reconhece quando e em que é pequeno”.Mas Reich falava do grande homem. Que grandeza tem o principito? Se tem alguma, desconhecemos. Ao que tudo indica, a época anda carente de contos de fada, com príncipes e cinderelas, carruagens e castelos. Só falta o dragão. Dragão tem pouco prestígio nos dias que correm. Milhares de pessoas estão acampando nas proximidades da Abadia de Westminster para esperar a passagem dos noivos. Até parecem os panacas que em São Paulo acamparam junto ao Morumbi para ver um apologista das drogas e um sonegador do imposto de renda, o McCartney e o Bono Vox.
Não tenho apreço nenhum por esses personagens construídos pela mídia. Sim, porque é a mídia quem os constrói. Os jornalistas os criam e depois passam a prestar-lhes culto, como se algum valor tivessem. Para que serve um rei? Pelo que sei, para receber colegas e posar para cartões postais. Não por acaso, a imprensa – a mesma que os alimenta – criou a expressão “rainha da Inglaterra”, para definir a condição de um político que ocupa um alto cargo mas não dispõe de poder algum.
Gilles Lapouge, o correspondente do Estadão em Paris, tenta uma resposta ao enigma, em sua coluna de ontem: “A questão é a seguinte. Por que ato de prestidigitação essa monarquia, que não serve para absolutamente nada, continua a fascinar? Lembremos que o rei tem três funções apenas: ele outorga honrarias, nomeia o primeiro-ministro que o Parlamento lhe diz para nomear e dissolve, nas mesmas condições, o Parlamento. “A essa pergunta, podemos dar respostas racionais. "Esse sistema assegura a permanência de uma classe dominante competente, unida pelos laços de família, de geração em geração", disse Edmund Burke, no século 17". Será que assegura? Os franceses guilhotinaram seus reizinhos e a França, hoje, bem ou mal, é dirigida por uma classe dominante competente. Verdade que, ao visitarmos os castelos da realeza francesa, as guias turísticas a ela se referem com um ar nostálgico. Suponho que os franceses, diante da pompa toda de Londres, a cada vez que ocorrem tais bodas, sintam-se profundamente arrependidos de terem cortado a cabeça de seus reis.
Já estive perto de rainhas e príncipes. Mas por acaso, quase sem saber. Faz uns bons vinte anos, talvez trinta. Eu estava em Madri, no hotel Inglés, na Calle Del Viejo Idiota. Ou seja, na Calle de Echegaray. José Echegaray, personagem polêmico de fins do século XIX, era engenheiro, matemático, dramaturgo, político... e recebeu o prêmio Nobel de Literatura em 1904. Valle-Inclán, escritor galego que vivia na mesma rua, dava como endereço Calle del Viejo Idiota. E consta que mesmo grafando assim o endereço, recebia correspondência.Já contei, mas o caso é pertinente. Na Calle del Viejo Idiota há um restaurante que nada tem demais, a não ser ser simpático. É o La Cacerola. Antes de las doce del medio-día, você paga apenas o que come. O que bebe é brinde. Como em viagens não sou de acordar cedo e considero que dez horas é um momento indelicado para tomar café, começo com alguns pinchos regados a cerveja ou vinho. Naquele dia havia uma excitação inusual no boteco. Uma velhota saía e voltava a toda hora para limpar as vitrines pelo lado de fora. Era a cozinheira do Cacerola. Eu ainda não havia lido os jornais, não imaginava o que me esperava.Lá pelas tantas, a faxineira entra aos pulos na sala, gritando: “yo lo he visto. El principito. Y me hacía así”. E fez o sinal de quem acenava. Só então me dei conta que estava presenciando um momento histórico e não sabia. Saí do bar e olhei para a Carrera de San Jerónimo, que corta a Calle del Viejo Idiota. Um aparato colossal de segurança, que se estendia do Palácio Real até o Paseo del Prado, tomava conta das ruas e telhados. Era o juramento do príncipe Filipe às Cortes Espanholas. Junto com o príncipe vinham rei, rainha e as infantas, mais um corpo de cavalaria mais ajaezado que um toureiro com seu traje de luces. A cozinheira ganhou seu dia naquela manhã. Deve ter passado meses e meses feliz, sentindo-se íntima do principito.Estranho o poder dos donos do mundo. Quantas pessoas Filipito terá feito feliz, com um simples olhar dirigido à Calle del Viejo Idiota?Abril de 1980 foi um mês pródigo para tropeçar em personalidades. No dia 16, eu bebericava uma cerveja e lia no Select, no Boulevard du Montparnasse. Lá pelas tantas, um burburinho perpassou o café e muita gente foi para a rua. É que passava na esquina, rumo ao cemitério Montparnasse, um ilustre cadáver, o de Sartre. Certamente, o mais famoso e equivocado pensador do século passado. Nem retirei meus olhos do livro. Podia estar passando ali o cadáver de De Gaulle, não me diria nada.
No dia 30 do mesmo abril, estive na coroação da rainha Beatrix, na Holanda. Também por acaso. Era feriadão na França e levei duas amigas parisienses para conhecer Amsterdã. Não havia uma mísera vaga nos hotéis. A menos que buscássemos um a pelo menos cem quilômetros de distância. Decidimos dormir no carro, à beira de um canal. Acordei cheio de pelos com um cachorro me lambendo a barba. Da Beatrix, só tenho uma lembrança. Atrapalhou meus dias de Amsterdã.
Ah! E também já vi o papa. No caso, o João Paulo II, que domingo competiu postumamente com as bodas de Londres, no dia de sua beatificação. Quem deve estar vibrando, lá no Além, é o sacerdote mexicano Marcial Maciel, o fundador dos Legionários de Cristo, morto em 2008. Acusado de abusar sexualmente de mais de 20 seminaristas - incluindo os próprios filhos - Maciel teve filhos com várias mulheres e, como um outro santo moderno, o Martin Luther King, foi plagiador emérito: plagiou descaradamente o livro de cabeceira da legião, intitulado Saltério de Meus Dias, e impôs a toda a organização um quarto voto de silêncio para se proteger de denúncias. Um de seus antigos colaboradores o acusa inclusive de ter envenenado seu tio-avô, o bispo Guízar, que apoiou a bem-sucedida carreira eclesiástica do sobrinho no México dos anos 1930.
Deste santo senhor, temos fartas fotos sendo abençoado pelo papa João Paulo II, recebido em audiência especial no Vaticano. Centenas de denúncias sobre o padre Maciel chegaram à mesa de Wojtyla. O papa as desprezou. Maciel enchia praças e estádios de futebol em suas viagens pelo mundo. Era merecedor da benção papal. Não é todos os dias que um pedófilo priva com um papa. Daqui a dois dias, um milhão de pessoas estará homenageando o santo homem que abençoou um criminoso.Mas falava que vi Sua Santidade. Eu passeava às margens do Tibre, quando ouvi uma voz tronituante que vinha dos céus. Pensei ser o próprio Cara. Mas falava em italiano. Como era de supor-se que Jeová falasse hebraico, conclui que devia ser seu vice. Era. Uma multidão de carolas o ouvia na Piazza San Pietro.
Em suma, se coincidi num mesmo ponto geográfico com essas sumidades, foi por mero acaso. Sou um pouco como Julien Sorel, o personagem de Stendhal, que estava na batalha de Waterloo e não tinha idéia precisa do que acontecia ali. Não tenho preocupação alguma com o tal de sucesso. Sucesso é uma soma de equívocos. Mas guardo ternas lembranças dos bons momentos que passei com anônimos amigos e namoradas, em singelos botecos da vida.
E daí? O culto a eles prestado pelas multidões em nada difere ao culto um dia prestado a Hitler ou Stalin, Mao ou Kim Il Sung, Beatles ou Bono Vox.
Ou melhor, talvez entenda. Estes espécimes foram muito bem definidos no século passado por um judeu da Ucrânia. É o Kleinen Mann, de Wilhelm Reich. Ou o Zé Ninguém, como foi traduzido em português: “O homem pequeno é aquele que não reconhece sua pequenez e teme reconhecê-la; que procura mascarar a sua tacanhez e estreiteza de vistas com ilusões de força e grandeza, força e grandezas alheias. Que se orgulha de seus grandes generais mas não de si próprio. Que admira as idéias que não teve, mas jamais as que teve. Que acredita mais arraigadamente nas coisas que menos entende, e que não acredita no que quer que lhe pareça fácil de assimilar”.
Daí a acreditar no papa, em Hitler ou Stalin, basta um pequeno passo. Estas gentes, eu as conheço desde minha adolescência. Continua Reich: “Tu mesmo te desprezas, Zé Ninguém. Dizes: ‘quem sou eu para ter opinião própria, para decidir sobre minha própria vida e ter o mundo como meu?’ E tens razão: quem és tu para reclamar direitos sobre tua vida? Deixa-me dizer-te.“Diferes dos grandes homens que verdadeiramente o são apenas num ponto: todo grande homem foi um dia um Zé Ninguém que desenvolveu apenas uma outra qualidade: a de reconhecer as áreas em que havia limitações e estreiteza em seu modo de pensar e agir. O grande homem é pois aquele que reconhece quando e em que é pequeno”.Mas Reich falava do grande homem. Que grandeza tem o principito? Se tem alguma, desconhecemos. Ao que tudo indica, a época anda carente de contos de fada, com príncipes e cinderelas, carruagens e castelos. Só falta o dragão. Dragão tem pouco prestígio nos dias que correm. Milhares de pessoas estão acampando nas proximidades da Abadia de Westminster para esperar a passagem dos noivos. Até parecem os panacas que em São Paulo acamparam junto ao Morumbi para ver um apologista das drogas e um sonegador do imposto de renda, o McCartney e o Bono Vox.
Não tenho apreço nenhum por esses personagens construídos pela mídia. Sim, porque é a mídia quem os constrói. Os jornalistas os criam e depois passam a prestar-lhes culto, como se algum valor tivessem. Para que serve um rei? Pelo que sei, para receber colegas e posar para cartões postais. Não por acaso, a imprensa – a mesma que os alimenta – criou a expressão “rainha da Inglaterra”, para definir a condição de um político que ocupa um alto cargo mas não dispõe de poder algum.
Gilles Lapouge, o correspondente do Estadão em Paris, tenta uma resposta ao enigma, em sua coluna de ontem: “A questão é a seguinte. Por que ato de prestidigitação essa monarquia, que não serve para absolutamente nada, continua a fascinar? Lembremos que o rei tem três funções apenas: ele outorga honrarias, nomeia o primeiro-ministro que o Parlamento lhe diz para nomear e dissolve, nas mesmas condições, o Parlamento. “A essa pergunta, podemos dar respostas racionais. "Esse sistema assegura a permanência de uma classe dominante competente, unida pelos laços de família, de geração em geração", disse Edmund Burke, no século 17". Será que assegura? Os franceses guilhotinaram seus reizinhos e a França, hoje, bem ou mal, é dirigida por uma classe dominante competente. Verdade que, ao visitarmos os castelos da realeza francesa, as guias turísticas a ela se referem com um ar nostálgico. Suponho que os franceses, diante da pompa toda de Londres, a cada vez que ocorrem tais bodas, sintam-se profundamente arrependidos de terem cortado a cabeça de seus reis.
Já estive perto de rainhas e príncipes. Mas por acaso, quase sem saber. Faz uns bons vinte anos, talvez trinta. Eu estava em Madri, no hotel Inglés, na Calle Del Viejo Idiota. Ou seja, na Calle de Echegaray. José Echegaray, personagem polêmico de fins do século XIX, era engenheiro, matemático, dramaturgo, político... e recebeu o prêmio Nobel de Literatura em 1904. Valle-Inclán, escritor galego que vivia na mesma rua, dava como endereço Calle del Viejo Idiota. E consta que mesmo grafando assim o endereço, recebia correspondência.Já contei, mas o caso é pertinente. Na Calle del Viejo Idiota há um restaurante que nada tem demais, a não ser ser simpático. É o La Cacerola. Antes de las doce del medio-día, você paga apenas o que come. O que bebe é brinde. Como em viagens não sou de acordar cedo e considero que dez horas é um momento indelicado para tomar café, começo com alguns pinchos regados a cerveja ou vinho. Naquele dia havia uma excitação inusual no boteco. Uma velhota saía e voltava a toda hora para limpar as vitrines pelo lado de fora. Era a cozinheira do Cacerola. Eu ainda não havia lido os jornais, não imaginava o que me esperava.Lá pelas tantas, a faxineira entra aos pulos na sala, gritando: “yo lo he visto. El principito. Y me hacía así”. E fez o sinal de quem acenava. Só então me dei conta que estava presenciando um momento histórico e não sabia. Saí do bar e olhei para a Carrera de San Jerónimo, que corta a Calle del Viejo Idiota. Um aparato colossal de segurança, que se estendia do Palácio Real até o Paseo del Prado, tomava conta das ruas e telhados. Era o juramento do príncipe Filipe às Cortes Espanholas. Junto com o príncipe vinham rei, rainha e as infantas, mais um corpo de cavalaria mais ajaezado que um toureiro com seu traje de luces. A cozinheira ganhou seu dia naquela manhã. Deve ter passado meses e meses feliz, sentindo-se íntima do principito.Estranho o poder dos donos do mundo. Quantas pessoas Filipito terá feito feliz, com um simples olhar dirigido à Calle del Viejo Idiota?Abril de 1980 foi um mês pródigo para tropeçar em personalidades. No dia 16, eu bebericava uma cerveja e lia no Select, no Boulevard du Montparnasse. Lá pelas tantas, um burburinho perpassou o café e muita gente foi para a rua. É que passava na esquina, rumo ao cemitério Montparnasse, um ilustre cadáver, o de Sartre. Certamente, o mais famoso e equivocado pensador do século passado. Nem retirei meus olhos do livro. Podia estar passando ali o cadáver de De Gaulle, não me diria nada.
No dia 30 do mesmo abril, estive na coroação da rainha Beatrix, na Holanda. Também por acaso. Era feriadão na França e levei duas amigas parisienses para conhecer Amsterdã. Não havia uma mísera vaga nos hotéis. A menos que buscássemos um a pelo menos cem quilômetros de distância. Decidimos dormir no carro, à beira de um canal. Acordei cheio de pelos com um cachorro me lambendo a barba. Da Beatrix, só tenho uma lembrança. Atrapalhou meus dias de Amsterdã.
Ah! E também já vi o papa. No caso, o João Paulo II, que domingo competiu postumamente com as bodas de Londres, no dia de sua beatificação. Quem deve estar vibrando, lá no Além, é o sacerdote mexicano Marcial Maciel, o fundador dos Legionários de Cristo, morto em 2008. Acusado de abusar sexualmente de mais de 20 seminaristas - incluindo os próprios filhos - Maciel teve filhos com várias mulheres e, como um outro santo moderno, o Martin Luther King, foi plagiador emérito: plagiou descaradamente o livro de cabeceira da legião, intitulado Saltério de Meus Dias, e impôs a toda a organização um quarto voto de silêncio para se proteger de denúncias. Um de seus antigos colaboradores o acusa inclusive de ter envenenado seu tio-avô, o bispo Guízar, que apoiou a bem-sucedida carreira eclesiástica do sobrinho no México dos anos 1930.
Deste santo senhor, temos fartas fotos sendo abençoado pelo papa João Paulo II, recebido em audiência especial no Vaticano. Centenas de denúncias sobre o padre Maciel chegaram à mesa de Wojtyla. O papa as desprezou. Maciel enchia praças e estádios de futebol em suas viagens pelo mundo. Era merecedor da benção papal. Não é todos os dias que um pedófilo priva com um papa. Daqui a dois dias, um milhão de pessoas estará homenageando o santo homem que abençoou um criminoso.Mas falava que vi Sua Santidade. Eu passeava às margens do Tibre, quando ouvi uma voz tronituante que vinha dos céus. Pensei ser o próprio Cara. Mas falava em italiano. Como era de supor-se que Jeová falasse hebraico, conclui que devia ser seu vice. Era. Uma multidão de carolas o ouvia na Piazza San Pietro.
Em suma, se coincidi num mesmo ponto geográfico com essas sumidades, foi por mero acaso. Sou um pouco como Julien Sorel, o personagem de Stendhal, que estava na batalha de Waterloo e não tinha idéia precisa do que acontecia ali. Não tenho preocupação alguma com o tal de sucesso. Sucesso é uma soma de equívocos. Mas guardo ternas lembranças dos bons momentos que passei com anônimos amigos e namoradas, em singelos botecos da vida.
segunda-feira, 2 de maio de 2011
ADENDO NECESSÁRIO
O belíssimo texto publicado abaixo, "Paixões Cotidianas", sub-título de "Crônicas Provocantes", é de autoria do brilhante PAULO WAINBERG - como não poderia deixar de ser.
PAIXÕES COTIDIANAS
No final do dia, Clarinha entrou no ônibus, lotado como sempre, para ir para casa.
Empurrando e sendo empurrada, finalmente acomodou-se, em pé, segurando a barra transversal, para garantir o equilíbrio durante o percurso. Mal notou Haroldo, ao seu lado, fazendo a mesma coisa.
Depois de alguma espera e quando não cabia sequer uma mosca dentro, o ônibus deu a partida sem dó nem piedade, provocando uma convulsão entre as trinta e cinco pessoas amontoadas.
Qual melancias na carruagem, os passageiros trataram de se acomodar, empurrando mais um pouco, um passinho à frente, outro de lado, ocupando os menores espaços, pois o motorista não fazia cerimônia e enfiava o pé no acelerador e no freio com a mesma força, enfrentando o trânsito cerrado daquele horário.
Haroldo viu-se às costas de Clarinha, sua mão ao lado dela, na barra transversal. Cuidou para não encostar nela, mesmo que a distância entre eles fosse de poucos centímetros.
Clarinha olhou para trás e deu um sorriso conformado, de quem entende o problema, sorriso este que abalou Haroldo. E a ela também.
Sem mais nem menos, uma faísca uniu os dois corpos, que permaneceram separados por centímetros. Como se uma onde de energia, sensual, tensa e emocionante unisse os dois à distância. Haroldo sentiu isto de imediato e Clarinha, olhando fixamente para a frente, deixava inundar-se da sensação, nova ou há muito esquecida.
O ônibus seguiu o percurso, passageiros embarcaram e desembarcaram e eles permaneceram imóveis, ligados pela corrente fulminante que seus corpos produziam, um no outro.
Não viram o tempo passar e levaram um susto quando o condutor anunciou: – Fim da linha.
Ambos haviam perdido os pontos de descida e estavam praticamente sozinhos dentro do ônibus, paralisados, sem se tocar mas presos por um calor ardente, intenso e fulminante.
Sem jeito, Clarinha desceu e Haroldo foi atrás. Na calçada ele se aproximou:
– Oi, desculpe eu... não sei o que houve..
– Sim?
– É que, sei lá, você me... Olhe, meu nome é Haroldo.
– Muito prazer, Clarinha. E estendeu a mão.
Haroldo segurou a mão dela e aí sim, dez mil watts de eletricidade percorreu a alma de ambos, presos pelas mãos, incapazes de se separar e de tirar os olhos um do outro.
Então Clarinha, delicadamente, tirou a mão, os olhares ainda fixos.
De repente uma frio esquisito envolveu os dois. Como se uma nuvem recheada de neve houvesse pousado sobre eles, extinguindo as labaredas de emoção que ardiam em suas almas.
Clarinha apertou a bolsa contra o estômago e Haroldo enfiou as mãos no bolso.
Olharam ao redor, sem saber onde estavam, nenhum deles jamais tinha ido ao fim daquela linha.
– Vamos pegar um táxi – disse Haroldo – deixo você em casa e depois vou a minha.
Sentados lado a lado, no banco traseiro, não trocaram uma única palavra. Não tinham o que dizer, não sabiam exatamente o que havia acontecido.
Clarinha entrou no seu apartamento completamente exausta. Mal cumprimentou o marido e os filhos e, alegando uma forte enxaqueca, foi direto para o quarto. Sem tomar banho ou escovar os dentes, tirou a roupa, vestiu a camisola e caiu na cama, totalmente exaurida, sem forças para nada, caindo num sono profundo e pesado.
Haroldo, chegando em casa, beijou sua esposa, fez um afago no filho de seis anos, avisou que estava exausto, não queria jantar, precisava dormir que o dia havia sido de amargar.
Na manhã seguinte, Clarinha acordou tomada por uma estranha letargia. Era como se tivesse tido um orgasmo sem gozo. Normalmente, após um orgasmo, ela ficava agitada, alegre, quase hiper-ativa. Desta vez, sentia-se pesada, os movimentos lentos, como se estivesse dentro d’água.
Preparou o café da manhã para o marido e os filhos e quando eles saíram, foi para o chuveiro, onde permaneceu um longo tempo sob a água tépida.
Depois vestiu-se e foi para o trabalho.
O dia não passava. Ela ansiava pela hora de ir para o terminal de ônibus, encontrar Haroldo e reviver a sensação aguda da véspera.
Desta vez, não foi o acaso, ambos se posicionaram da mesma forma e esperaram. Esperaram. E nada aconteceu. A magia de ontem não se reproduzia, eram passageiros comuns, amontoados num ônibus lotado.
Clarinha, na ânsia de recuperar as sensações, moveu-se levemente, encostando-se na virilha de Haroldo.
Ele aceitou o convite e encostou-se definitivamente nela, os dois se esfregando em busca da eletricidade, em busca do coração disparando, em busca da ardência.
Mas nada aconteceu.
Deram-se conta da grosseria da situação e, envergonhados, separaram- se.
Haroldo deus um jeito de sair de trás dela.
Cada um desceu no seu ponto.
Clarinha entrou e beijou os filhos carinhosamente. Mais tarde, na cama, procurou o marido, provocante e sensual, fizeram amor intenso e mais tarde, deitada com os olhos fechados, algo estranho aconteceu.
Ela sentiu uma luz piscar em sua mente, como se fosse um sinal luminoso vermelho, anunciando a contagem regressiva de uma bomba-relógio.
Tentou identificar o sentimento, o que seria aquilo, justo ela que estava feliz, possuía uma família feliz, que amava o marido e os filhos, o que significava aquele alerta, aquele alarme?
Assim adormeceu.
Na manhã seguinte, ao acordar, estava tudo claro em sua mente. O episódio no ônibus revelava uma Clarinha insuspeita, uma que estava escondida, amortecida pelos prazeres cotidianos e que, finalmente, vinha à tona.
Clarinha sabia, agora, que queria muito mais do que tinha. E que tinha muito mais para dar.
Naquela noite, dentro do ônibus, procurou Haroldo:
– Quem sabe a gente desce e vai tomar alguma coisa num bar?
No final do dia, Clarinha entrou no ônibus, lotado como sempre, para ir para casa.
Empurrando e sendo empurrada, finalmente acomodou-se, em pé, segurando a barra transversal, para garantir o equilíbrio durante o percurso. Mal notou Haroldo, ao seu lado, fazendo a mesma coisa.
Depois de alguma espera e quando não cabia sequer uma mosca dentro, o ônibus deu a partida sem dó nem piedade, provocando uma convulsão entre as trinta e cinco pessoas amontoadas.
Qual melancias na carruagem, os passageiros trataram de se acomodar, empurrando mais um pouco, um passinho à frente, outro de lado, ocupando os menores espaços, pois o motorista não fazia cerimônia e enfiava o pé no acelerador e no freio com a mesma força, enfrentando o trânsito cerrado daquele horário.
Haroldo viu-se às costas de Clarinha, sua mão ao lado dela, na barra transversal. Cuidou para não encostar nela, mesmo que a distância entre eles fosse de poucos centímetros.
Clarinha olhou para trás e deu um sorriso conformado, de quem entende o problema, sorriso este que abalou Haroldo. E a ela também.
Sem mais nem menos, uma faísca uniu os dois corpos, que permaneceram separados por centímetros. Como se uma onde de energia, sensual, tensa e emocionante unisse os dois à distância. Haroldo sentiu isto de imediato e Clarinha, olhando fixamente para a frente, deixava inundar-se da sensação, nova ou há muito esquecida.
O ônibus seguiu o percurso, passageiros embarcaram e desembarcaram e eles permaneceram imóveis, ligados pela corrente fulminante que seus corpos produziam, um no outro.
Não viram o tempo passar e levaram um susto quando o condutor anunciou: – Fim da linha.
Ambos haviam perdido os pontos de descida e estavam praticamente sozinhos dentro do ônibus, paralisados, sem se tocar mas presos por um calor ardente, intenso e fulminante.
Sem jeito, Clarinha desceu e Haroldo foi atrás. Na calçada ele se aproximou:
– Oi, desculpe eu... não sei o que houve..
– Sim?
– É que, sei lá, você me... Olhe, meu nome é Haroldo.
– Muito prazer, Clarinha. E estendeu a mão.
Haroldo segurou a mão dela e aí sim, dez mil watts de eletricidade percorreu a alma de ambos, presos pelas mãos, incapazes de se separar e de tirar os olhos um do outro.
Então Clarinha, delicadamente, tirou a mão, os olhares ainda fixos.
De repente uma frio esquisito envolveu os dois. Como se uma nuvem recheada de neve houvesse pousado sobre eles, extinguindo as labaredas de emoção que ardiam em suas almas.
Clarinha apertou a bolsa contra o estômago e Haroldo enfiou as mãos no bolso.
Olharam ao redor, sem saber onde estavam, nenhum deles jamais tinha ido ao fim daquela linha.
– Vamos pegar um táxi – disse Haroldo – deixo você em casa e depois vou a minha.
Sentados lado a lado, no banco traseiro, não trocaram uma única palavra. Não tinham o que dizer, não sabiam exatamente o que havia acontecido.
Clarinha entrou no seu apartamento completamente exausta. Mal cumprimentou o marido e os filhos e, alegando uma forte enxaqueca, foi direto para o quarto. Sem tomar banho ou escovar os dentes, tirou a roupa, vestiu a camisola e caiu na cama, totalmente exaurida, sem forças para nada, caindo num sono profundo e pesado.
Haroldo, chegando em casa, beijou sua esposa, fez um afago no filho de seis anos, avisou que estava exausto, não queria jantar, precisava dormir que o dia havia sido de amargar.
Na manhã seguinte, Clarinha acordou tomada por uma estranha letargia. Era como se tivesse tido um orgasmo sem gozo. Normalmente, após um orgasmo, ela ficava agitada, alegre, quase hiper-ativa. Desta vez, sentia-se pesada, os movimentos lentos, como se estivesse dentro d’água.
Preparou o café da manhã para o marido e os filhos e quando eles saíram, foi para o chuveiro, onde permaneceu um longo tempo sob a água tépida.
Depois vestiu-se e foi para o trabalho.
O dia não passava. Ela ansiava pela hora de ir para o terminal de ônibus, encontrar Haroldo e reviver a sensação aguda da véspera.
Desta vez, não foi o acaso, ambos se posicionaram da mesma forma e esperaram. Esperaram. E nada aconteceu. A magia de ontem não se reproduzia, eram passageiros comuns, amontoados num ônibus lotado.
Clarinha, na ânsia de recuperar as sensações, moveu-se levemente, encostando-se na virilha de Haroldo.
Ele aceitou o convite e encostou-se definitivamente nela, os dois se esfregando em busca da eletricidade, em busca do coração disparando, em busca da ardência.
Mas nada aconteceu.
Deram-se conta da grosseria da situação e, envergonhados, separaram- se.
Haroldo deus um jeito de sair de trás dela.
Cada um desceu no seu ponto.
Clarinha entrou e beijou os filhos carinhosamente. Mais tarde, na cama, procurou o marido, provocante e sensual, fizeram amor intenso e mais tarde, deitada com os olhos fechados, algo estranho aconteceu.
Ela sentiu uma luz piscar em sua mente, como se fosse um sinal luminoso vermelho, anunciando a contagem regressiva de uma bomba-relógio.
Tentou identificar o sentimento, o que seria aquilo, justo ela que estava feliz, possuía uma família feliz, que amava o marido e os filhos, o que significava aquele alerta, aquele alarme?
Assim adormeceu.
Na manhã seguinte, ao acordar, estava tudo claro em sua mente. O episódio no ônibus revelava uma Clarinha insuspeita, uma que estava escondida, amortecida pelos prazeres cotidianos e que, finalmente, vinha à tona.
Clarinha sabia, agora, que queria muito mais do que tinha. E que tinha muito mais para dar.
Naquela noite, dentro do ônibus, procurou Haroldo:
– Quem sabe a gente desce e vai tomar alguma coisa num bar?
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