quarta-feira, 27 de julho de 2016

 CHEIRO DE CIO NO AR

G. Della Quercia

  Hoje, seu Afranio saiu pela orelha, do Studio de Pilates. Dona Mercedes tolera suas escapadas para a Esquina do Cotovelo, no Calçadão, mas babar em cima de sirigaita loira, já é demais. Descaradamente, sem Jimo Cupim na cara. 
  Ouve-se por aí que Pilates é coisa pra veados. Ele, porém, se acha no ponto para pular a cerca e levar a vida como se fosse um viagra. O garanhão de cabanha premiada, sabia, como ninguém, dar a volta em Dona Mercedes. Mulher bonita, morena cor de jambo, olhos verdes como cuspida de chimarrão e um par de ancas a deixar cãibras em genitalia de marmanjo. E, o touro velho saiu pinçado direto pra casa, sem escala no Banco do Cotovelo. 
   Juntos há cinquenta anos, filhos no Exterior, a enorme casa é compartilhada com Melissa e Napoleão, Napinha, para os íntimos. Melissa foi beneficiada, Napinha escapou por pouco. Nos últimos dias, os dois transformaram em penico a sala de Dona Mercedes. Napinha mirava o alvo :perna alçada, era só lançar o esguicho. Pronto. Território demarcado, mesmo com o benefício feito. 
   Seu Afranio louco pra dar um tapa no visual e sair de fininho para a rua, disse que era cheiro de cio no ar. Mas logo passava. Era só questão de dias. Nada mais. 
   Cheiro de cio no ar. Dona Mercedes lembrou do vinho, do aconchego, do "entrelaçamento íntimo agudo", da malandragem da Natureza : o movimento cíclico das Estações. Inverno. Acasalamento. 
   Estaria a loira no cio? Bela. Nada recatada. Toda do bar. Pernas longas. Botas tipo Xuxa, Rainha dos Baixinhos. Salto 15. Pretas. Fêmea de passarela, mexia o corpo feito cobra do deserto : um rastro na areia quente. 
   Os olhos azuis chispavam. Sim. Eram azuis não verdes. Trocavam a cor por causa da raiva. A boca espumava. A corcovear, batia o salto na laje, sentindo comichão no meio das pernas. Rodopiava,  como a chave nas mãos de seu Afranio. 
   Brava. Raivosa, se achando cheia de graça, como a Virgem no dia da Anunciação. Estavam de brincadeira com ela. Só pode. 
   Explico: invadiu garagem alheia, assim como os machos invadiam suas entranhas. E, deu no que deu. 
   Chegou da farra com as amigas, dormiu até tarde. Tinha compromisso, hora marcada na Capital. Pulava. Sapateava. Espumava. E, o importado, câmbio automático ali, sem se mexer, colado na bunda do seminovo recém comprado. Não cobrava programas, apenas os quinhentos para o táxi. 
   Seu carro descansava na garagem da Pilateira de Dona Mercedes. Moça fina, bons modos, trabalhadeira. Mas não deixaria o trabalho para livrar a traseira do seminovo. 
   Foi assim que a chave do importado primeira linha, caiu de paraquedas na mão de seu Afranio. Mas ele só conhecia câmbio manual e a loira só guiava fusqueta. E, para o câmbio manual seu Afranio precisava de gasolina aditivada: viagra. E estava desprovido. Apenas babava. 
   Então sentiu a orelha arder: macho ele era, longe da mulher. Sem mais delongas se foi rua a fora, pinto encolhido dentro das calças. 
   Não sei a que horas a loira saiu com sua fusqueta. Mas seu Afranio tem certeza, não basta levantar a perna e esguichar. É  Dona Mercedes quem demarca território. 


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