QUEM DIRIA!
João Eichbaum
A partir de amanhã estaremos nas mãos da Dilma. Comunista de carteirinha ou, para ser mais exato, comunista por herança, filha que é de um comunista, ela vai presidir um país capitalista por vocação.
Quando eu era criança, comunista era gente de meter medo. Por isso, os comunistas eram presos, tinham que responder a processos, viviam na clandestinidade.
O maior símbolo do comunismo no Brasil foi Luiz Carlos Prestes, um tipo que eu não consegui entender muito bem. Passou a vida inteira latindo contra o capitalismo, foi preso, exilado, foi congressista, casou ou se juntou com uma alemã, com quem teve uma filha, a filha nasceu na prisão e foi tirada da mãe. Uma história feita para arrancar lágrimas, de quem não sabe o que os comunistas, tipo Stalin e tantos são capazes de fazer.
Bem, mas eu falava do Luiz Carlos Prestes e dizia que nunca consegui entender muito bem esse personagem. Não sei quem o sustentou, quem o manteve, quem lhe dava casa, roupa e comida. Trabalhar foi coisa que ele nunca fez. Tinha sido militar, foi expulso do exército. Mas, ao fim e ao cabo, esse cara que passou latindo contra o capitalismo a vida inteira nunca conseguiu nada na política brasileira.
Diferentemente de Luiz Carlos Prestes, a comunista Dilma, que não latiu, mas agiu – e como agiu !- chegou à presidência da república, graças às manobras do Lula.
Lula, que não é comunista, nem capitalista, muito antes pelo contrário, latiu muito mais do que o Prestes, não propriamente contra o capitalismo, mas contra os patrões. Lula era contra os patrões.
Iletrado, sem conhecimentos mínimos de sociologia, o Lula não poderia assumir, conscientemente, uma posição política definida contra o capitalismo. De modo que, levado à presidência da república, governou este país capitalista com grandes pitadas de socialismo e criou, sem querer, sem qualquer argumento científico, um regime diferente: tirou de quem trabalha para dar a quem não trabalha. O tal de “bolsa-família”. Com isso, evidentemente, ganhou uma legião de admiradores e essa legião elegeu a Dilma.
É por isso que a Dilma, a partir de amanhã vai governar a gente.
Não sei se ela deletou toda sua teoria comunista ou apenas a arquivou. Inteligente, ela percebeu que foi muito mais fácil ser presidente de um país capitalista, do que o seria se o Lula não tivesse inventado o “bolsa-familia”. Por isso, para assessorá-la ela convocou, entre outros, um dos maiores capitalistas do Brasil, o Jorge Gerdau Johannpeter.
Duma coisa tenho certeza: o país continuará capitalista, com esse capitalismo “sui generis”, marca Lula, tirando de quem trabalha para dar a quem fica na rede, tomando pinga, ou invadindo propriedades alheias. Os bancos continuarão com lucros estratosféricos, porque a classe média, sem eles, vai continuar prensada, como sempre esteve, entre os que têm muito dinheiro e os que não têm vontade de trabalhar.
Enfim, a comunista vai presidir um país capitalista, sim, muito à vontade, porque sabe que, sem capital, não poderá manter a alegria daqueles que não trabalham, mas votam.
sexta-feira, 31 de dezembro de 2010
quinta-feira, 30 de dezembro de 2010
ESSE CIRCO CHAMADO JUSTIÇA
“EVITAÇÃO DE DESPICIENDA TAUTOLOGIA” (II)
João Eichbaum
Você, que tem um filho, uma filha, um sobrinho, um parente qualquer, ou você mesmo, que quer prestar concurso, faça um ensaio de interpretação do texto de ontem.
“Mas a juíza, uma magrinha com jeito de santa, (mas que, pelos despachos que profere, certamente gosta de ser chamada de puta) não aceitou o pedido do promotor.”
Assinale a resposta correta. O autor quis dizer que a juíza gosta de ser chamada de puta porque
a) gosta de acomodar suas nádegas em cima dos autos
b) senta em cima dos autos e tem a sensação de que alguém está lhe passando a mão na bunda
c) gosta de sentir aquela pontinha do grampo dos autos no clitóris
d) seus despachos são uma merda
e) goza, com a bunda em cima dos autos, só de ver a cara dos advogados que têm “habeas corpus” negados.
“Na mesma hora, para “salvar a honra da justiça”, a juíza decretou a prisão preventiva do José.”
Assinale a resposta correta. O autor quis dizer que
a) a justiça é muito honrada
b) estava perdida a honra da justiça, tanto quanto a duma virgem e a juíza a salvou
c) a juíza é uma exceção nessa lerdeza de tartaruga do Judiciário
d) só com cadeia se pode salvar a honra da justiça
e) a juíza é uma puta mesmo
“Evitação de despicienda tautologia”. Ao transcrever a frase do desembargador, o autor o fez porque:
a) é uma frase antológica, digna de figurar como modelo de linguagem jurídica
b) todo mundo sabe o que significa
c) quer fazer ressuscitar o gongorismo
d) ficou impressionado com a erudição do desembargador
e) quis mostrar que o dicionário não serve para disfarçar a burrice
Se você quiser conferir o número de acertos procure um juiz e verá o quanto este autor é estimado.
João Eichbaum
Você, que tem um filho, uma filha, um sobrinho, um parente qualquer, ou você mesmo, que quer prestar concurso, faça um ensaio de interpretação do texto de ontem.
“Mas a juíza, uma magrinha com jeito de santa, (mas que, pelos despachos que profere, certamente gosta de ser chamada de puta) não aceitou o pedido do promotor.”
Assinale a resposta correta. O autor quis dizer que a juíza gosta de ser chamada de puta porque
a) gosta de acomodar suas nádegas em cima dos autos
b) senta em cima dos autos e tem a sensação de que alguém está lhe passando a mão na bunda
c) gosta de sentir aquela pontinha do grampo dos autos no clitóris
d) seus despachos são uma merda
e) goza, com a bunda em cima dos autos, só de ver a cara dos advogados que têm “habeas corpus” negados.
“Na mesma hora, para “salvar a honra da justiça”, a juíza decretou a prisão preventiva do José.”
Assinale a resposta correta. O autor quis dizer que
a) a justiça é muito honrada
b) estava perdida a honra da justiça, tanto quanto a duma virgem e a juíza a salvou
c) a juíza é uma exceção nessa lerdeza de tartaruga do Judiciário
d) só com cadeia se pode salvar a honra da justiça
e) a juíza é uma puta mesmo
“Evitação de despicienda tautologia”. Ao transcrever a frase do desembargador, o autor o fez porque:
a) é uma frase antológica, digna de figurar como modelo de linguagem jurídica
b) todo mundo sabe o que significa
c) quer fazer ressuscitar o gongorismo
d) ficou impressionado com a erudição do desembargador
e) quis mostrar que o dicionário não serve para disfarçar a burrice
Se você quiser conferir o número de acertos procure um juiz e verá o quanto este autor é estimado.
quarta-feira, 29 de dezembro de 2010
ESSE CIRCO CHAMADO JUSTIÇA
“EVITAÇÃO DE DESPICIENDA TAUTOLOGIA”
João Eichbaum
José é o nome do réu, vereador numa cidade do interior do Estado, com muito prestígio e cacife político para ser prefeito. Foi denunciado por “lavagem” de dinheiro. O Promotor de Justiça, como bom representante do Ministério Público, essa entidade que disputa com a polícia federal o melhor lugar debaixo dos holofotes, resolveu pedir a prisão preventiva do José. Mas a juíza, uma magrinha com jeito de santa, (mas que, pelos despachos que profere, certamente gosta de ser chamada de puta) não aceitou o pedido do promotor.
Foi aí que apareceu uma terceira personagem. Uma advogada, uma, entre os milhares de bacharéis em direito que andam matando cachorro a grito, por esse Brasil afora, onde a maioria das pessoas pensa que um diploma universitário na mão resolve tudo.
Pois a dita advogada ligou para a esposa do José, oferecendo seus serviços profissionais. E se gabou: “sou muito amiga da juíza”.
Era tudo o que o agente do Ministério Público, queria: figurar na mídia. O telefone da casa do José estava grampeado e o promotor levou a notícia quentinha para a juíza. Na mesma hora, para “salvar a honra da justiça”, a juíza decretou a prisão preventiva do José. E não só fez isso, como ainda sentou em cima do processo. O José está preso há oito meses e não foi ouvida uma única testemunha residente na comarca. Estão sendo ouvidas, por precatória, as testemunhas residentes em outras cidades, mas o processo, na comarca de origem está acomodando as nádegas da juíza.
Então, os advogados do José ingressaram com pedido de “habeas corpus”, em razão do excesso de prazo de prisão, que não é permitido em lei.
Vocês acham que o representante do Ministério Público, junto à Terceira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do RS examinaria o processo com os dois olhos?
Claro que não. E aí exarou seu parecer, cheio de heresias jurídicas, que nem merecem menção.
Pois, o desembargador relator “adotou” o herético parecer do Ministério Público, sabem para quê? Para “evitação de despicienda tautologia”.
Sim, é isso mesmo, repito, para “evitação de despicienda tautologia”.
Entenderam? Vocês, que pagam o salário desse desembargador e que mereceriam o respeito dele, entenderam? Foi para vocês e para nós todos que ele falou “evitação de despicienda tautologia”, agredindo nosso bom gosto literário, nossos olhos, nossos ouvidos, nossos conhecimentos da língua portuguesa.
É esse o nível pelo qual se pode medir a cultura dos juízes: pelo uso do vernáculo. Se um desembargador, que já deve estar em fim de carreira, com o reumatismo chegando, além de não saber se expressar com clareza, sai atropelando a pureza da linguagem, empregando vocábulos com sentido inadequado, o que restará para os magistrados jovens, que se espelham nos “acórdãos”, na “jurisprudência”?
É isso. Quem julgou o habeas foi o Ministério Público, porque o desembargador não teve idéias próprias, não teve criatividade, pouco se lhe deu se a juíza está sentada em cima do processo, e preferiu copiar, para “evitação de despicienda tautologia”, porque, copiando ou lançando seu próprios argumentos (quando os tiver) nada mudará: nós continuaremos pagando seus polpudos subsídios, sem um puto vintém de desconto e ele continuará escrevendo “para evitação de despicienda tautologia” nos seus processos.
Ah, sim, antes que me esqueça: bunda de juiz ou de juíza em cima de processo de réu preso é coisa muito legal. Foi isso que os desembargadores da Terceira Câmara Criminal decretaram, mostrando que também têm pouca intimidade com vernáculo: “constrangimento ilegal não verificado”.
João Eichbaum
José é o nome do réu, vereador numa cidade do interior do Estado, com muito prestígio e cacife político para ser prefeito. Foi denunciado por “lavagem” de dinheiro. O Promotor de Justiça, como bom representante do Ministério Público, essa entidade que disputa com a polícia federal o melhor lugar debaixo dos holofotes, resolveu pedir a prisão preventiva do José. Mas a juíza, uma magrinha com jeito de santa, (mas que, pelos despachos que profere, certamente gosta de ser chamada de puta) não aceitou o pedido do promotor.
Foi aí que apareceu uma terceira personagem. Uma advogada, uma, entre os milhares de bacharéis em direito que andam matando cachorro a grito, por esse Brasil afora, onde a maioria das pessoas pensa que um diploma universitário na mão resolve tudo.
Pois a dita advogada ligou para a esposa do José, oferecendo seus serviços profissionais. E se gabou: “sou muito amiga da juíza”.
Era tudo o que o agente do Ministério Público, queria: figurar na mídia. O telefone da casa do José estava grampeado e o promotor levou a notícia quentinha para a juíza. Na mesma hora, para “salvar a honra da justiça”, a juíza decretou a prisão preventiva do José. E não só fez isso, como ainda sentou em cima do processo. O José está preso há oito meses e não foi ouvida uma única testemunha residente na comarca. Estão sendo ouvidas, por precatória, as testemunhas residentes em outras cidades, mas o processo, na comarca de origem está acomodando as nádegas da juíza.
Então, os advogados do José ingressaram com pedido de “habeas corpus”, em razão do excesso de prazo de prisão, que não é permitido em lei.
Vocês acham que o representante do Ministério Público, junto à Terceira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do RS examinaria o processo com os dois olhos?
Claro que não. E aí exarou seu parecer, cheio de heresias jurídicas, que nem merecem menção.
Pois, o desembargador relator “adotou” o herético parecer do Ministério Público, sabem para quê? Para “evitação de despicienda tautologia”.
Sim, é isso mesmo, repito, para “evitação de despicienda tautologia”.
Entenderam? Vocês, que pagam o salário desse desembargador e que mereceriam o respeito dele, entenderam? Foi para vocês e para nós todos que ele falou “evitação de despicienda tautologia”, agredindo nosso bom gosto literário, nossos olhos, nossos ouvidos, nossos conhecimentos da língua portuguesa.
É esse o nível pelo qual se pode medir a cultura dos juízes: pelo uso do vernáculo. Se um desembargador, que já deve estar em fim de carreira, com o reumatismo chegando, além de não saber se expressar com clareza, sai atropelando a pureza da linguagem, empregando vocábulos com sentido inadequado, o que restará para os magistrados jovens, que se espelham nos “acórdãos”, na “jurisprudência”?
É isso. Quem julgou o habeas foi o Ministério Público, porque o desembargador não teve idéias próprias, não teve criatividade, pouco se lhe deu se a juíza está sentada em cima do processo, e preferiu copiar, para “evitação de despicienda tautologia”, porque, copiando ou lançando seu próprios argumentos (quando os tiver) nada mudará: nós continuaremos pagando seus polpudos subsídios, sem um puto vintém de desconto e ele continuará escrevendo “para evitação de despicienda tautologia” nos seus processos.
Ah, sim, antes que me esqueça: bunda de juiz ou de juíza em cima de processo de réu preso é coisa muito legal. Foi isso que os desembargadores da Terceira Câmara Criminal decretaram, mostrando que também têm pouca intimidade com vernáculo: “constrangimento ilegal não verificado”.
terça-feira, 28 de dezembro de 2010
ESSE CIRCO CHAMADO JUSTIÇA
Veículo: O Estado de S. Paulo - 27/12/2010
Caixa-preta no STF
Há uma traça roendo o cabeçalho virtual dos processos no Supremo Tribunal Federal. Ela é seletiva: apaga na internet apenas o nome dos réus, e troca pelas iniciais. Graças ao repórter Felipe Recondo, do Estado, sabemos que políticos sub judice foram ajudados pelo "bug".
O "J B J R" denunciado em inquérito por estelionato e formação de quadrilha é o senador João Ribeiro (PR-TO). E o "A R R G D A S" que pediu habeas corpus para sair da prisão preventiva é o prefeito de Macapá, Roberto Góes (PDT).
Mas quais os nomes de "U A P", funcionário público processado por crime contra a administração, ou do senador "J B P P", acusado de usar documento falso? Quem é o prefeito cearense "E R", réu por crime de responsabilidade? Só privilegiados podem saber.
Não são exceções nem casos secretos. Trata-se de uma nova regra do STF, defendida por seu presidente, Cezar Peluso, e que deve ser aplicada inclusive aos processos não protegidos por segredo de Justiça. O motivo? Preservar a honra dos réus.
Seria bonito, se não fosse obscurantista e discriminatório. Pela lógica de Peluso, uns poucos iluminados têm o discernimento necessário e, portanto, o direito de ter acesso a informações públicas. Os ignaros, que formamos o resto majoritário da sociedade, não.
Nada a ver com o WikiLeaks e o vazamento de informações secretas ou confidenciais.
Trata-se, no caso do STF, da simples divulgação daquilo que é de interesse coletivo, e, em última análise, pertence à sociedade: dados públicos em poder do Estado.
Um dos maiores ganhos da incensada democracia digital é dar acesso instantâneo, para qualquer um, ao que se encontra sob tutela dos poderosos. Afinal, ter informação é o primeiro passo para o cidadão fiscalizar os feitos, bons e maus, de governantes, juízes e congressistas.
Como escreveu Louis Brandeis (1856-1941), um dos mais influentes ministros da Suprema Corte dos EUA: "A luz do sol é o melhor desinfetante." Ele criou a metáfora para defender a transparência em casos de interesse público, sempre.
A luz ou a escuridão devem valer para todos. Assim, se os poderosos podem se beneficiar do anonimato proporcionado pela caixa preta do Supremo Tribunal Federal, por que não generalizar para os cidadãos comuns acusados pela polícia, denunciados e julgados em primeira instância?
O ministro Peluso deveria estender a regra contra o que chama de "divulgação desnecessária" a todo o sistema judicial, inclusive, quem sabe, às transmissões ao vivo das sessões plenárias de sua corte pela TV Justiça. Mas parece nem sequer tê-la discutido com os colegas de tribunal.
Segundo reportagem do Estado, o ministro Marco Aurélio Mello se opõe ao uso das iniciais e disse que os nomes serão escritos na íntegra nos processos sob sua responsabilidade. Ou seja, a regra de Peluso não é regra. Prevalece o lugar-comum "cada cabeça uma sentença". Um ministro decidirá que o nome do réu deve se tornar público, o outro não?
Como se escreveria no site do Supremo, o tribunal não pode correr o risco de virar a "C da M J".
Um cidadão polido poderia perguntar: "Não há lei para regular essa zona?" A resposta é "ainda não".
Aprovado há meses na Câmara, o projeto de lei que garante acesso às informações públicas vai entrar em 2011 dormitando nos escaninhos do Senado (nem sempre os parlamentares têm a mesma agilidade demonstrada ao aprovar o aumento dos próprios salários).
Assim, o Brasil completará mais um ano como uma das raras democracias que não regulamentaram o seu, o meu, o nosso direito de saber o que há nas gavetas e arquivos públicos. A lei dos EUA tem mais de 40 anos. A do México é uma das mais avançadas do mundo.
O projeto de lei brasileiro foi apresentado pelo governo federal, mas só depois de haver muita pressão por parte da chamada sociedade civil, principalmente através do Fórum de Acesso a Informações Públicas, que reúne organizações não governamentais como Transparência Brasil, Abraji e OAB.
Pelo que o STF já demonstrou, se a sociedade não voltar à carga, não apenas o projeto da lei de acesso vai criar teias de aranha no Senado, como há o perigo iminente de retrocesso. Iniciativas para dar à luz informações de interesse público são sempre um parto a fórceps.
Caixa-preta no STF
Há uma traça roendo o cabeçalho virtual dos processos no Supremo Tribunal Federal. Ela é seletiva: apaga na internet apenas o nome dos réus, e troca pelas iniciais. Graças ao repórter Felipe Recondo, do Estado, sabemos que políticos sub judice foram ajudados pelo "bug".
O "J B J R" denunciado em inquérito por estelionato e formação de quadrilha é o senador João Ribeiro (PR-TO). E o "A R R G D A S" que pediu habeas corpus para sair da prisão preventiva é o prefeito de Macapá, Roberto Góes (PDT).
Mas quais os nomes de "U A P", funcionário público processado por crime contra a administração, ou do senador "J B P P", acusado de usar documento falso? Quem é o prefeito cearense "E R", réu por crime de responsabilidade? Só privilegiados podem saber.
Não são exceções nem casos secretos. Trata-se de uma nova regra do STF, defendida por seu presidente, Cezar Peluso, e que deve ser aplicada inclusive aos processos não protegidos por segredo de Justiça. O motivo? Preservar a honra dos réus.
Seria bonito, se não fosse obscurantista e discriminatório. Pela lógica de Peluso, uns poucos iluminados têm o discernimento necessário e, portanto, o direito de ter acesso a informações públicas. Os ignaros, que formamos o resto majoritário da sociedade, não.
Nada a ver com o WikiLeaks e o vazamento de informações secretas ou confidenciais.
Trata-se, no caso do STF, da simples divulgação daquilo que é de interesse coletivo, e, em última análise, pertence à sociedade: dados públicos em poder do Estado.
Um dos maiores ganhos da incensada democracia digital é dar acesso instantâneo, para qualquer um, ao que se encontra sob tutela dos poderosos. Afinal, ter informação é o primeiro passo para o cidadão fiscalizar os feitos, bons e maus, de governantes, juízes e congressistas.
Como escreveu Louis Brandeis (1856-1941), um dos mais influentes ministros da Suprema Corte dos EUA: "A luz do sol é o melhor desinfetante." Ele criou a metáfora para defender a transparência em casos de interesse público, sempre.
A luz ou a escuridão devem valer para todos. Assim, se os poderosos podem se beneficiar do anonimato proporcionado pela caixa preta do Supremo Tribunal Federal, por que não generalizar para os cidadãos comuns acusados pela polícia, denunciados e julgados em primeira instância?
O ministro Peluso deveria estender a regra contra o que chama de "divulgação desnecessária" a todo o sistema judicial, inclusive, quem sabe, às transmissões ao vivo das sessões plenárias de sua corte pela TV Justiça. Mas parece nem sequer tê-la discutido com os colegas de tribunal.
Segundo reportagem do Estado, o ministro Marco Aurélio Mello se opõe ao uso das iniciais e disse que os nomes serão escritos na íntegra nos processos sob sua responsabilidade. Ou seja, a regra de Peluso não é regra. Prevalece o lugar-comum "cada cabeça uma sentença". Um ministro decidirá que o nome do réu deve se tornar público, o outro não?
Como se escreveria no site do Supremo, o tribunal não pode correr o risco de virar a "C da M J".
Um cidadão polido poderia perguntar: "Não há lei para regular essa zona?" A resposta é "ainda não".
Aprovado há meses na Câmara, o projeto de lei que garante acesso às informações públicas vai entrar em 2011 dormitando nos escaninhos do Senado (nem sempre os parlamentares têm a mesma agilidade demonstrada ao aprovar o aumento dos próprios salários).
Assim, o Brasil completará mais um ano como uma das raras democracias que não regulamentaram o seu, o meu, o nosso direito de saber o que há nas gavetas e arquivos públicos. A lei dos EUA tem mais de 40 anos. A do México é uma das mais avançadas do mundo.
O projeto de lei brasileiro foi apresentado pelo governo federal, mas só depois de haver muita pressão por parte da chamada sociedade civil, principalmente através do Fórum de Acesso a Informações Públicas, que reúne organizações não governamentais como Transparência Brasil, Abraji e OAB.
Pelo que o STF já demonstrou, se a sociedade não voltar à carga, não apenas o projeto da lei de acesso vai criar teias de aranha no Senado, como há o perigo iminente de retrocesso. Iniciativas para dar à luz informações de interesse público são sempre um parto a fórceps.
segunda-feira, 27 de dezembro de 2010
COM A PALAVRA, JANER CRISTALDO
NATAL EM BERLIM
Já não lembro quando estive pela primeira vez em Berlim. Terá sido no final dos 70. O Muro parecia uma fronteira erguida para a eternidade e ninguém sonhava, naqueles dias, que um dia pudesse ser demolido. Berlim Ocidental era uma ilha de prosperidade em pleno deserto socialista. Você embarcava em alguma cidade fronteiriça da Alemanha Ocidental e no trem já sentia o cheiro do socialismo. Trens vagabundos, policiais carrancudos acompanhados por cães também policiais, um tratamento hostil dos passageiros, mais ou menos do tipo “o que você veio fazer aqui?” Ao desembarcar na Berlim Ocidental, a volta ao conforto e bem-estar. A cidade era rica e privilegiada. Funcionava como uma vitrine do capitalismo em meio ao inferno socialista. O Senado berlinense proporcionava uma série de subsídios a quem lá vivia, para manter habitada a vitrine. Era uma das cidades mais confortáveis e baratas da Europa. A amiga que me recebia vivia em um belo apartamento de quatro quartos, cujo aluguel era a metade do que eu pagava em Paris por um quarto-e-sala. Berlim era a cidade preferida de aposentados e de jovens que preferiam não entrar de rijo na competição capitalista. Um pequeno paraíso incrustado no mundo soviético. A Kurfürstendamm, Kudamm para os íntimos, com suas lojas e restaurantes suntuosos, fazia um contraste escandaloso à miséria do outro lado do Muro. Minha amiga levou-me lá, para sentir o cheiro do socialismo. Não estou falando por metáforas. Socialismo cheira mal mesmo. Mal atravessei a fronteira, um odor desagradável de carvão vegetal inundou-me as narinas.
As diferenças começavam já na travessia do Muro. Do lado de cá, ao entrar no metrô, você punha o tíquete numa máquina eletrônica, que o devolvia do outro lado. Do lado de lá, você tinha de picotar o tíquete em uma alavanca enferrujada. Na fronteira, um policial com cara de buldogue olhava um minuto para sua foto no passaporte e mais outro minuto para seu rosto. Quem vive em Livramento ou Rivera, onde se passa de um pais a outro sem dar satisfação a autoridade alguma, ficaria perplexo ante a Berlim de então.
Minha cicerone queria mostrar-me como era um restaurante socialista. Primeiro, precisamos achá-lo, que no paraíso soviético restaurantes não têm placas. Após uma boa hora pela neve, interrogando pessoas na rua, achamos um. Ficava no primeiro andar de um prédio qualquer, sem qualquer indicação de restaurante. Na escadaria, sem calefação alguma, uma boa dezena de pessoas esperavam na fila. Mais de meia hora de espera. Lá dentro, de fato todas as mesas estavam lotadas. Mas as mesas eram imensas, a ponto de dificultar a conversação. E ficavam a meia légua uma da outra. Fossem menores e estivessem mais próximas, a sala teria seu espaço útil triplicado, sem desconforto algum.
Os garçons, nem te ligo. Não recebiam gorjeta, não havia então porque preocupar-se com o cliente. Lá pelas tantas, um deles dignou-se vir até minha mesa. Pedi o cardápio. Teria umas quinze opções de pratos. Fui pedindo, um a um, para ouvir sempre um invariável “não tem”. Cheguei ao último. Era o prato do dia, o único que serviam. O cardápio era de mentirinha, resquícios de uma Alemanha que ainda não era comunista. Do outro lado do Muro, na Berlim ocidental, os restaurantes regurgitavam de gente, sem fila alguma e com cardápios de verdade.
Berlim hoje é uma só. Não há mais distinção de tratamento entre ocidentais e orientais. A cidade não está dividida por uma fronteira. Se você quer ver as diferenças entre as antigas cidades, a Ocidental e capitalista, e a Oriental e comunista, procure o filme "Adeus, Lênin", de Wolfgang Becker, uma das mais belas sátiras sobre o socialismo que vi nos últimos anos. Uma senhora, comunista devota, entra em coma antes da queda do Muro. E só sai do coma depois. O filho, que já havia se libertado das tralhas e hábitos socialistas, não quer chocá-la. Sai então a buscar no lixo os ícones socialistas. Entre eles, um poster de Che Guevara. O que é simbólico. Enquanto na América Latina ainda se cultua o celerado argentino, na Alemanha já o jogaram na famosa lata de lixo da História.
Em meio a isso, espanta constatar que muito universitário brasileiro, e mesmo professores universitários, 21 anos após a queda do Muro, ainda não sabem o que aconteceu no dia Nove de Novembro de 1989, uma das duas datas mais significativas do século passado.
Neste Natal, Berlim está soterrada pelas neves e não convida ao passeio. Melhor enfurnar-se nos Stuben e curtir o bom vinho ou a boa cerveja, rematando com uma kirschwasser ou akvavit. Até a Kurfürstendamm, sempre gloriosa, está agora feia, manchada pelo barro que a neve produz.
Segunda-feira, volto para Paris, onde o clima é mais ameno.
Já não lembro quando estive pela primeira vez em Berlim. Terá sido no final dos 70. O Muro parecia uma fronteira erguida para a eternidade e ninguém sonhava, naqueles dias, que um dia pudesse ser demolido. Berlim Ocidental era uma ilha de prosperidade em pleno deserto socialista. Você embarcava em alguma cidade fronteiriça da Alemanha Ocidental e no trem já sentia o cheiro do socialismo. Trens vagabundos, policiais carrancudos acompanhados por cães também policiais, um tratamento hostil dos passageiros, mais ou menos do tipo “o que você veio fazer aqui?” Ao desembarcar na Berlim Ocidental, a volta ao conforto e bem-estar. A cidade era rica e privilegiada. Funcionava como uma vitrine do capitalismo em meio ao inferno socialista. O Senado berlinense proporcionava uma série de subsídios a quem lá vivia, para manter habitada a vitrine. Era uma das cidades mais confortáveis e baratas da Europa. A amiga que me recebia vivia em um belo apartamento de quatro quartos, cujo aluguel era a metade do que eu pagava em Paris por um quarto-e-sala. Berlim era a cidade preferida de aposentados e de jovens que preferiam não entrar de rijo na competição capitalista. Um pequeno paraíso incrustado no mundo soviético. A Kurfürstendamm, Kudamm para os íntimos, com suas lojas e restaurantes suntuosos, fazia um contraste escandaloso à miséria do outro lado do Muro. Minha amiga levou-me lá, para sentir o cheiro do socialismo. Não estou falando por metáforas. Socialismo cheira mal mesmo. Mal atravessei a fronteira, um odor desagradável de carvão vegetal inundou-me as narinas.
As diferenças começavam já na travessia do Muro. Do lado de cá, ao entrar no metrô, você punha o tíquete numa máquina eletrônica, que o devolvia do outro lado. Do lado de lá, você tinha de picotar o tíquete em uma alavanca enferrujada. Na fronteira, um policial com cara de buldogue olhava um minuto para sua foto no passaporte e mais outro minuto para seu rosto. Quem vive em Livramento ou Rivera, onde se passa de um pais a outro sem dar satisfação a autoridade alguma, ficaria perplexo ante a Berlim de então.
Minha cicerone queria mostrar-me como era um restaurante socialista. Primeiro, precisamos achá-lo, que no paraíso soviético restaurantes não têm placas. Após uma boa hora pela neve, interrogando pessoas na rua, achamos um. Ficava no primeiro andar de um prédio qualquer, sem qualquer indicação de restaurante. Na escadaria, sem calefação alguma, uma boa dezena de pessoas esperavam na fila. Mais de meia hora de espera. Lá dentro, de fato todas as mesas estavam lotadas. Mas as mesas eram imensas, a ponto de dificultar a conversação. E ficavam a meia légua uma da outra. Fossem menores e estivessem mais próximas, a sala teria seu espaço útil triplicado, sem desconforto algum.
Os garçons, nem te ligo. Não recebiam gorjeta, não havia então porque preocupar-se com o cliente. Lá pelas tantas, um deles dignou-se vir até minha mesa. Pedi o cardápio. Teria umas quinze opções de pratos. Fui pedindo, um a um, para ouvir sempre um invariável “não tem”. Cheguei ao último. Era o prato do dia, o único que serviam. O cardápio era de mentirinha, resquícios de uma Alemanha que ainda não era comunista. Do outro lado do Muro, na Berlim ocidental, os restaurantes regurgitavam de gente, sem fila alguma e com cardápios de verdade.
Berlim hoje é uma só. Não há mais distinção de tratamento entre ocidentais e orientais. A cidade não está dividida por uma fronteira. Se você quer ver as diferenças entre as antigas cidades, a Ocidental e capitalista, e a Oriental e comunista, procure o filme "Adeus, Lênin", de Wolfgang Becker, uma das mais belas sátiras sobre o socialismo que vi nos últimos anos. Uma senhora, comunista devota, entra em coma antes da queda do Muro. E só sai do coma depois. O filho, que já havia se libertado das tralhas e hábitos socialistas, não quer chocá-la. Sai então a buscar no lixo os ícones socialistas. Entre eles, um poster de Che Guevara. O que é simbólico. Enquanto na América Latina ainda se cultua o celerado argentino, na Alemanha já o jogaram na famosa lata de lixo da História.
Em meio a isso, espanta constatar que muito universitário brasileiro, e mesmo professores universitários, 21 anos após a queda do Muro, ainda não sabem o que aconteceu no dia Nove de Novembro de 1989, uma das duas datas mais significativas do século passado.
Neste Natal, Berlim está soterrada pelas neves e não convida ao passeio. Melhor enfurnar-se nos Stuben e curtir o bom vinho ou a boa cerveja, rematando com uma kirschwasser ou akvavit. Até a Kurfürstendamm, sempre gloriosa, está agora feia, manchada pelo barro que a neve produz.
Segunda-feira, volto para Paris, onde o clima é mais ameno.
sexta-feira, 24 de dezembro de 2010
COM A PALAVRA, PAULO WAINBERG
Chanuca, natal e ano novo
Judas Macabeu liderou a revolta dos judeus contra o rei grego Antíoco IV, recuperando o Templo e o domínio de Israel.
Dois milagres teriam ocorrido.
O primeiro foi a vitória em si, pois os combatentes judeus eram camponeses, não preparados para a batalha que foi ganha graças à inteligência estratégica e tática de Judas Macabeu, filho de Matatias, que empregou técnicas de guerrilha contra o poderoso exército grego.
O segundo milagre consistiu no fato de uma lamparina, com azeite para apenas um dia, ter permanecido acesa durante oito dias, quando a produção de óleo novo ficou pronta.
Essa única luz permaneceu milagrosamente acesa, iluminando o Templo que fora purificado, eliminando-se os vestígios da ocupação grega.
O oitavo dia caiu no dia 25 de dezembro de 164 antes de Cristo.
Desde então os judeus celebram o Chanucá, a festa das luzes, ocasião em que acendem a menorá, castiçal para nove velas, cada uma delas simbolizando cada um dos oito dias e a nona utilizada para acender as demais.
É uma festa de alegria, de canto e dança, as pessoas se beijam, se abraçam e trocam presente, e vem logo após a festa de Sucot, a festa da colheita.
No século XVI o papa Gregório III instituiu o novo calendário, chamado calendário gregoriano, sob o qual orientam-se a maioria dos povos da terra, salvo uns poucos como os eslovenos, que ainda seguem o substituído calendário Juliano, remanescente do Império Romano.
O calendário gregoriano instituiu o dia 25 de dezembro com data de nascimento de Jesus Cristo e o dia primeiro de janeiro para o início do ano novo.
Há correspondência entre as principais festas cristãs e as anteriores, judaicas, inclusive no tocante à proximidade das datas, é notória e incontestável.
A Páscoa, corresponde ao Pessach. Celebram coisas diferentes, mas simbolizam o mesmo: a liberdade, a ressurreição, a nova vida. Em geral são celebradas em épocas muito próximas, entre final de março e abril.
O Dia de Finados e o Yom Kipur – Dia do Perdão -, festas reflexivas, de reverência ao passado, aos ancestrais, datas de expiação e perdão. Finados em novembro, Dia do Perdão em meados de setembro.
Inúmeras outras celebrações e festividades, ao longo de um ano, correspondem, em ambas as religiões e também na muçulmana, mostrando que cada uma das igrejas respeita o passado comum, adaptando as datas às respectivas doutrinas.
Se o Chanucá é uma festa judaica, o Natal, de há muito, transcendeu o cristianismo e assumiu a condição de grande festa da humanidade.
Impossível não ser contagiado pelo clima edificante deste período do ano e, malgrado sua abusiva comercialização, gera nas pessoas um indizível sentimento bom, como se nossos corações fossem impregnados só de bondade, afeto e querer bem.
Chanucá e Natal são festas de luzes, cidades se iluminam, fogos de artifícios nos iluminam, presentes são dados e trocados e só o que se deseja é tudo de bom para o outro.
São festas de se abraçar, trocar carinhos, dizer belas palavras ou, simplesmente, ficar quieto, absorvendo a fantástica energia do bem que percorre o planeta.
No mundo inteiro, independente da origem de cada um, a humanidade se compraz, assume o rosto da satisfação e sorri muito mais do que chora.
Alguém pode me perguntar a razão de estar escrevendo sobre isto.
Explico-me: eu também me impregno de tudo isto e, ainda que minha razão exija a crítica, meu coração não resiste e se entrega ao espírito das festas, contaminado por todas as coisas boas que são possíveis de sentir.
Não há motivo para lutar contra isso. Nenhum motivo.
Não há nenhuma razão que me impeça de desejar tudo de bom para todo o mundo.
Então aí vai:
Tudo de bom para todos. Feliz Chanucá, Feliz Natal, Feliz Ano Novo.
Judas Macabeu liderou a revolta dos judeus contra o rei grego Antíoco IV, recuperando o Templo e o domínio de Israel.
Dois milagres teriam ocorrido.
O primeiro foi a vitória em si, pois os combatentes judeus eram camponeses, não preparados para a batalha que foi ganha graças à inteligência estratégica e tática de Judas Macabeu, filho de Matatias, que empregou técnicas de guerrilha contra o poderoso exército grego.
O segundo milagre consistiu no fato de uma lamparina, com azeite para apenas um dia, ter permanecido acesa durante oito dias, quando a produção de óleo novo ficou pronta.
Essa única luz permaneceu milagrosamente acesa, iluminando o Templo que fora purificado, eliminando-se os vestígios da ocupação grega.
O oitavo dia caiu no dia 25 de dezembro de 164 antes de Cristo.
Desde então os judeus celebram o Chanucá, a festa das luzes, ocasião em que acendem a menorá, castiçal para nove velas, cada uma delas simbolizando cada um dos oito dias e a nona utilizada para acender as demais.
É uma festa de alegria, de canto e dança, as pessoas se beijam, se abraçam e trocam presente, e vem logo após a festa de Sucot, a festa da colheita.
No século XVI o papa Gregório III instituiu o novo calendário, chamado calendário gregoriano, sob o qual orientam-se a maioria dos povos da terra, salvo uns poucos como os eslovenos, que ainda seguem o substituído calendário Juliano, remanescente do Império Romano.
O calendário gregoriano instituiu o dia 25 de dezembro com data de nascimento de Jesus Cristo e o dia primeiro de janeiro para o início do ano novo.
Há correspondência entre as principais festas cristãs e as anteriores, judaicas, inclusive no tocante à proximidade das datas, é notória e incontestável.
A Páscoa, corresponde ao Pessach. Celebram coisas diferentes, mas simbolizam o mesmo: a liberdade, a ressurreição, a nova vida. Em geral são celebradas em épocas muito próximas, entre final de março e abril.
O Dia de Finados e o Yom Kipur – Dia do Perdão -, festas reflexivas, de reverência ao passado, aos ancestrais, datas de expiação e perdão. Finados em novembro, Dia do Perdão em meados de setembro.
Inúmeras outras celebrações e festividades, ao longo de um ano, correspondem, em ambas as religiões e também na muçulmana, mostrando que cada uma das igrejas respeita o passado comum, adaptando as datas às respectivas doutrinas.
Se o Chanucá é uma festa judaica, o Natal, de há muito, transcendeu o cristianismo e assumiu a condição de grande festa da humanidade.
Impossível não ser contagiado pelo clima edificante deste período do ano e, malgrado sua abusiva comercialização, gera nas pessoas um indizível sentimento bom, como se nossos corações fossem impregnados só de bondade, afeto e querer bem.
Chanucá e Natal são festas de luzes, cidades se iluminam, fogos de artifícios nos iluminam, presentes são dados e trocados e só o que se deseja é tudo de bom para o outro.
São festas de se abraçar, trocar carinhos, dizer belas palavras ou, simplesmente, ficar quieto, absorvendo a fantástica energia do bem que percorre o planeta.
No mundo inteiro, independente da origem de cada um, a humanidade se compraz, assume o rosto da satisfação e sorri muito mais do que chora.
Alguém pode me perguntar a razão de estar escrevendo sobre isto.
Explico-me: eu também me impregno de tudo isto e, ainda que minha razão exija a crítica, meu coração não resiste e se entrega ao espírito das festas, contaminado por todas as coisas boas que são possíveis de sentir.
Não há motivo para lutar contra isso. Nenhum motivo.
Não há nenhuma razão que me impeça de desejar tudo de bom para todo o mundo.
Então aí vai:
Tudo de bom para todos. Feliz Chanucá, Feliz Natal, Feliz Ano Novo.
quinta-feira, 23 de dezembro de 2010
CRÔNICAS IMPUDICAS
CRÔNICA NADA NATALINA
João Eichbaum
Política é assim, ó. PT, sabendo que não elegeria sua candidata com as próprias forças, se uniu ao PMDB que, de sua parte, também não teria cacife para eleger candidato próprio. Juntaram-se os dois, para nos impingir a Dilma.
Bem, ganha a eleição, começam as cobranças: eu quero isso e aquilo. Não eu só te dou isso e aquilo. Enfim, a oração de São Francisco, naquela parte que incentiva a suruba, é rezada com toda a devoção: é dando que se recebe.
Nessa troca de favores e pagamento de promessas, o PMDB, entre outros ministérios, ganhou o Ministério do Turismo e indicou um velhinho de oitenta anos para o cargo. O ancião se chama Pedro Novais, e é deputado pelo Maranhão.
Do Maranhão. Só podia. A terra do Sarney.
Pois não é que o velhinho, em plenos oitenta anos, resolveu fazer festa num motel, com vários casais, para tornar realidade a poética oração de São Francisco, exatamente naquela que é a parte angular da política brasileira: é dando que se recebe.
Nunca esquecendo que o velhinho será o Ministro do Turismo da Dilma.
Bem, meus amigos, que o velhinho vá se esbaldar em motéis, tudo bem, ele deve ter saúde ou Viagra suficiente para tanta festa. Mas que nos faça padecer, por trás, as mesmas estocadas que outros, lá dentro do motel, padeceram, isso já é demais.
Traduzo, se é que vocês não entenderam: o velhinho quer botar no nosso também. Ele apresentou à Câmara a conta do motel, para ser ressarcido pela “verba indenizatória do mês”, ou seja, quer que nós, os contribuintes, paguemos a conta.
Procurado para dar explicações, o candidato à presidência da Câmara, um metalúrgico (metalúrgico, de novo?) de Canoas, chamado Marco Maia, que também está se arreglando com o PMDB do Sarney, para se eleger, saiu pela tangente: “nós agora estamos preocupados e focados com o tema que diz respeito à construção de um processo que seja mais aberto e mais transparente e garanta a representação de todos os partidos”.
Ah, bom. Entendi. Ele quis dizer o seguinte: não sou contra, nem a favor, muito antes pelo contrário...
Moral da história: vocês sabem agora porque os deputados aumentaram seus ganhos?
Haja motéis, pelo Brasil afora. Para a prática do Turismo, naturalmente, incentivado pelo futuro Ministro, com o aval do Marco Maia e da Dilma Roussef.
João Eichbaum
Política é assim, ó. PT, sabendo que não elegeria sua candidata com as próprias forças, se uniu ao PMDB que, de sua parte, também não teria cacife para eleger candidato próprio. Juntaram-se os dois, para nos impingir a Dilma.
Bem, ganha a eleição, começam as cobranças: eu quero isso e aquilo. Não eu só te dou isso e aquilo. Enfim, a oração de São Francisco, naquela parte que incentiva a suruba, é rezada com toda a devoção: é dando que se recebe.
Nessa troca de favores e pagamento de promessas, o PMDB, entre outros ministérios, ganhou o Ministério do Turismo e indicou um velhinho de oitenta anos para o cargo. O ancião se chama Pedro Novais, e é deputado pelo Maranhão.
Do Maranhão. Só podia. A terra do Sarney.
Pois não é que o velhinho, em plenos oitenta anos, resolveu fazer festa num motel, com vários casais, para tornar realidade a poética oração de São Francisco, exatamente naquela que é a parte angular da política brasileira: é dando que se recebe.
Nunca esquecendo que o velhinho será o Ministro do Turismo da Dilma.
Bem, meus amigos, que o velhinho vá se esbaldar em motéis, tudo bem, ele deve ter saúde ou Viagra suficiente para tanta festa. Mas que nos faça padecer, por trás, as mesmas estocadas que outros, lá dentro do motel, padeceram, isso já é demais.
Traduzo, se é que vocês não entenderam: o velhinho quer botar no nosso também. Ele apresentou à Câmara a conta do motel, para ser ressarcido pela “verba indenizatória do mês”, ou seja, quer que nós, os contribuintes, paguemos a conta.
Procurado para dar explicações, o candidato à presidência da Câmara, um metalúrgico (metalúrgico, de novo?) de Canoas, chamado Marco Maia, que também está se arreglando com o PMDB do Sarney, para se eleger, saiu pela tangente: “nós agora estamos preocupados e focados com o tema que diz respeito à construção de um processo que seja mais aberto e mais transparente e garanta a representação de todos os partidos”.
Ah, bom. Entendi. Ele quis dizer o seguinte: não sou contra, nem a favor, muito antes pelo contrário...
Moral da história: vocês sabem agora porque os deputados aumentaram seus ganhos?
Haja motéis, pelo Brasil afora. Para a prática do Turismo, naturalmente, incentivado pelo futuro Ministro, com o aval do Marco Maia e da Dilma Roussef.
quarta-feira, 22 de dezembro de 2010
COM A PALAVRA, JANER CRISTALDO
CAFE EN SEINE
Neva com gosto em Dublin. Fui hoje ao Trinity College, visitar a Old Library. Lah encontrei uma das mais antigas biblias do mundo, o livro de Kell. Rendi minhas homenagens a Swift e tambem a Wilde.De volta para casa, tropecei num bar divino, o Cafe en Seine. Noooossa! Conheco os melhores cafes de Madri, Paris, Viena, Roma e nunca vi algo igual. Amanha, vou almocar lah. Para dar uma espiadela: http://www.cafeenseine.ie/
-
QUESTOES DE GOSTO
Do Roberto Veiga, recebo:Hehehehe... rende um bom debate. Claro que é questão de gosto pessoal, e cada um sabe porque gosta disso ou daquilo. Vivo na França ha cerca de dois anos e penso, apos fazer um pos-doutorado, até mesmo em voltar pra ca. Gosto de muita coisa aqui, mas... não gosto da comida. Minto, adoro as sobremesas, que são realmente de sonho. Não sei se tu sabes, mas li em algum lugar que a França é o segundo pais do mundo em consumo per capita de McDonalds, atras apenas dos EUA. E, aqui em Lyon, que eles dizem ser a capital gastronomica francesa, os restaurantes mais comuns são os kebabs :-) Ou seja, até os franceses parecem ter uma certa reserva quanto à sua propria culinaria, preferindo o que vem de fora.
Ha certas comidas aqui que são simplesmente nojentas. Tem até, me disseram, um "queijo que anda" la na Corsega, por causa dos vermes que crescem dentro dele. Ja provei muita coisa bizarra aqui, de estomago de pato até um tipo de pudim em forma de linguiça feito de sangue de porco sem uma gota de sal (o estomago ja revoltou aqui, so de lembrar do tal de boudin). Confesso que meu estomago é fraco pra esse tipo de coisa. Mil vezes uma picanha no alho, bem simples e saborosa.Roberto
Questão de gosto, meu caro Roberto. O boudin é o primeiro prato que busco em Paris. Depois, as andouilletes, uma tripa recheada de tripas. Dei um tequinho a uma amiga para provar, ela quase vomitou.Quanto aos queijos que andam, são meus prediletos. Cada vez que levo um camembert para o Brasil, minha assessora de assuntos domesticos reclama: "Seu Janer, tem algo podre na geladeira". Nao é podre, Cristina, é assim mesmo.
Neva com gosto em Dublin. Fui hoje ao Trinity College, visitar a Old Library. Lah encontrei uma das mais antigas biblias do mundo, o livro de Kell. Rendi minhas homenagens a Swift e tambem a Wilde.De volta para casa, tropecei num bar divino, o Cafe en Seine. Noooossa! Conheco os melhores cafes de Madri, Paris, Viena, Roma e nunca vi algo igual. Amanha, vou almocar lah. Para dar uma espiadela: http://www.cafeenseine.ie/
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QUESTOES DE GOSTO
Do Roberto Veiga, recebo:Hehehehe... rende um bom debate. Claro que é questão de gosto pessoal, e cada um sabe porque gosta disso ou daquilo. Vivo na França ha cerca de dois anos e penso, apos fazer um pos-doutorado, até mesmo em voltar pra ca. Gosto de muita coisa aqui, mas... não gosto da comida. Minto, adoro as sobremesas, que são realmente de sonho. Não sei se tu sabes, mas li em algum lugar que a França é o segundo pais do mundo em consumo per capita de McDonalds, atras apenas dos EUA. E, aqui em Lyon, que eles dizem ser a capital gastronomica francesa, os restaurantes mais comuns são os kebabs :-) Ou seja, até os franceses parecem ter uma certa reserva quanto à sua propria culinaria, preferindo o que vem de fora.
Ha certas comidas aqui que são simplesmente nojentas. Tem até, me disseram, um "queijo que anda" la na Corsega, por causa dos vermes que crescem dentro dele. Ja provei muita coisa bizarra aqui, de estomago de pato até um tipo de pudim em forma de linguiça feito de sangue de porco sem uma gota de sal (o estomago ja revoltou aqui, so de lembrar do tal de boudin). Confesso que meu estomago é fraco pra esse tipo de coisa. Mil vezes uma picanha no alho, bem simples e saborosa.Roberto
Questão de gosto, meu caro Roberto. O boudin é o primeiro prato que busco em Paris. Depois, as andouilletes, uma tripa recheada de tripas. Dei um tequinho a uma amiga para provar, ela quase vomitou.Quanto aos queijos que andam, são meus prediletos. Cada vez que levo um camembert para o Brasil, minha assessora de assuntos domesticos reclama: "Seu Janer, tem algo podre na geladeira". Nao é podre, Cristina, é assim mesmo.
terça-feira, 21 de dezembro de 2010
CRÔNICAS RETROSPECTIVAS
PAULO WAINBERG
Já contei que, nos primórdios, fui jornalista e, quando me encarregaram de fazer o horóscopo do jornal, meus dons se esgotaram em uma semana.
Resolvi o problema copiando o horóscopo de ano anterior, no mesmo dia e mês, e fui muito bem-sucedido. Por pouco não ganhei o prêmio de horoscopista do ano.
Assim, seguindo minha tradição de profeta do passado, apresento aqui as previsões para 2011, que são exatamente as mesmas que fiz no ano passado, para 2010.
Mudanças nos destaques do ano.
Época de previsões para o ano que vem e escolha dos melhores do ano passado.
Para quê? Nem as previsões se confirmam nem a escolha dos melhores vai além de opiniões subjetivas a enfei(t)ar as paredes dos escolhidos.
Portanto, vamos lá.
Prevejo que as esperanças do dia 31 de Dezembro desaparecerão no dia Primeiro de Janeiro, durante a ressaca pós porre.
Prevejo que a alegria do carnaval desaparecerá depois do desfile.
Prevejo muito dinheiro no bolso de quem tem muito dinheiro. Prevejo escândalos, corrupção e roubo. Prevejo assaltos, assassinatos, mortes no trânsito, violência, terremotos, furacões, ciclones tropicais, tufões, restaurantes lotados, leis inócuas e mil outras alegrias da mídia, além de guerras institucionais e outras de ocasião.
Prevejo o Papa orando pela paz, cada religião adjudicando-se o poder da salvação. Prevejo as esquerdas querendo o dinheiro alheio e as direitas gastando o dinheiro de todos. Prevejo o divórcio de dezenas de artistas e o casamento de outros tantos. Prevejo campanhas de solidariedade e festas beneficentes sem a presença dos beneficiários. Prevejo búzios jogados, tarôs tirados, espíritos em comunicação, almas penadas, bordéis refinados, direitos humanos defendidos, direitos humanos ofendidos, baleias salvas, juros altos e bolsas de valores instáveis.
Prevejo pedidos de desculpas, amores desfeitos, luas cheias e quartos minguantes, fugas do presídio, combate ao tráfico e caos no tráfego. Prevejo fome na África, abundância em Dubai, quatro novos vírus letais, doze mil explicações e uma ou duas soluções.
Prevejo formaturas, casamentos e batizados. Prevejo listas de aprovados, relação de inadimplentes, briga de camelôs, ações terroristas, roupas no varal e dez bilhões de metros quadrados novos.
Prevejo ovinhos de páscoa, feriadões enrustidos, invasões de terras, conflitos ideológicos e carros estragados. Prevejo que o mundo melhor será adiado por mais um ano, vários milionários arruinados, novos milionários lotéricos, fome no Nordeste, torcidas enlouquecidas e críticas à Seleção.
Prevejo pais nervosos e filhos-calendário com hora marcada no colégio, no balé, no inglês, na escolinha de artes, de futebol, de tênis ou abandonadas nas ruas.
Prevejo para o ano novo a repetição do ano velho. Prevejo tradicionalistas preocupados com a modernidade, modernistas ambicionando o futuro, futurólogos adivinhando o passado, historiadores criando versões, nenhuma fé removendo montanhas a não ser que fé signifique bomba.
Prevejo tudo de velho para o ano novo. E assim prevendo passo às minhas escolhas pessoais que tomaram mais de dez minutos do meu tempo.
Os destaques do ano foram:
Escândalo: Empate técnico entre Senado, Sarney, Câmara de Deputados e Judiciário.
Fofoca: Pirarucu do Tucunaré e disseram que fui eu.
Novidade: Empate técnico: Desfile das Escolas na Sapucaí, corrupção e perda da Copa do Mundo.
Falta de Criatividade: Empate técnico: Novelas de TV e prêmio Jabuti.
Homem do ano: José Serra.
Mulher do ano: Empate técnico: Judith Dent, a “M” dos filmes de James Bond e Marisa Lula da Silva.
Imbecil: O presidente do Irã.
Corja : Os que apóiam o Imbecil.
Partido político: PTPMDBPL.
Turista: Lula (tricampeão).
Governador : Ninguém votou.
Deputado Federal: idem
Senador: Quando for extinto o Senado, qualquer um.
Discernimento: Supremo Tribunal Federal
Facilitador: Supremo Tribunal Federal
O Mundo não é o bastante: Lula
Quase aconteceu: A reforma política.
Nunca vai acontecer: A revitalização do porto de Porto Alegre.
Futebol: Não quero nem falar.
O melhor discriminador racial: Morto.
Repetindo:
Costumo dizer que quando o leitor não compreende a ironia é porque o escritor não foi suficientemente irônico. Espero ter sido, para não ofender ninguém com as minhas. Há quem confunda sarcasmo com ironia. Não faça isso, por favor. O sarcasmo é um estilo provocador, quase sempre picante e que muitas vezes pode expressar um conteúdo ofensivo.
A ironia é uma espécie de prima-irmã do sarcasmo, uma forma mais branda de se dizer exatamente o oposto daquilo que se queria dizer. A ironia não tem a ferocidade ácida do sarcasmo.
Exemplo de ironia: Depois de um dia todo errado você vai tomar banho e falta água. Você exclama, ironicamente, “Perfeito”. Entendeu? A falta de água resulta ser o complemento “perfeito” para o tudo de ruim que aconteceu naquele dia.
Exemplo de sarcasmo: Alguém lhe pergunta: Quer levar um soco na cara? E você: – É claro, e um na boca do estômago também, se for possível. Ou quando lhe chamam de barbeiro no trânsito e você responde: é, mas sua mãe não reclama. E assim por diante.
Olhando bem talvez eu tenha sido meio sarcástico lá em cima, mas palavra de honra que eu queria ser apenas irônico.
Prefiro a ironia ao sarcasmo. O comentário irônico quase sempre faz rir. O sarcasmo dá vontade de brigar.
Portanto se eu perguntar se você gostou desta crônica responda ironicamente: muito. Não seja sarcástico, não acrescente: por que não escreve outra?
Voltando ao tema, prevejo confusão pela frente.
Já contei que, nos primórdios, fui jornalista e, quando me encarregaram de fazer o horóscopo do jornal, meus dons se esgotaram em uma semana.
Resolvi o problema copiando o horóscopo de ano anterior, no mesmo dia e mês, e fui muito bem-sucedido. Por pouco não ganhei o prêmio de horoscopista do ano.
Assim, seguindo minha tradição de profeta do passado, apresento aqui as previsões para 2011, que são exatamente as mesmas que fiz no ano passado, para 2010.
Mudanças nos destaques do ano.
Época de previsões para o ano que vem e escolha dos melhores do ano passado.
Para quê? Nem as previsões se confirmam nem a escolha dos melhores vai além de opiniões subjetivas a enfei(t)ar as paredes dos escolhidos.
Portanto, vamos lá.
Prevejo que as esperanças do dia 31 de Dezembro desaparecerão no dia Primeiro de Janeiro, durante a ressaca pós porre.
Prevejo que a alegria do carnaval desaparecerá depois do desfile.
Prevejo muito dinheiro no bolso de quem tem muito dinheiro. Prevejo escândalos, corrupção e roubo. Prevejo assaltos, assassinatos, mortes no trânsito, violência, terremotos, furacões, ciclones tropicais, tufões, restaurantes lotados, leis inócuas e mil outras alegrias da mídia, além de guerras institucionais e outras de ocasião.
Prevejo o Papa orando pela paz, cada religião adjudicando-se o poder da salvação. Prevejo as esquerdas querendo o dinheiro alheio e as direitas gastando o dinheiro de todos. Prevejo o divórcio de dezenas de artistas e o casamento de outros tantos. Prevejo campanhas de solidariedade e festas beneficentes sem a presença dos beneficiários. Prevejo búzios jogados, tarôs tirados, espíritos em comunicação, almas penadas, bordéis refinados, direitos humanos defendidos, direitos humanos ofendidos, baleias salvas, juros altos e bolsas de valores instáveis.
Prevejo pedidos de desculpas, amores desfeitos, luas cheias e quartos minguantes, fugas do presídio, combate ao tráfico e caos no tráfego. Prevejo fome na África, abundância em Dubai, quatro novos vírus letais, doze mil explicações e uma ou duas soluções.
Prevejo formaturas, casamentos e batizados. Prevejo listas de aprovados, relação de inadimplentes, briga de camelôs, ações terroristas, roupas no varal e dez bilhões de metros quadrados novos.
Prevejo ovinhos de páscoa, feriadões enrustidos, invasões de terras, conflitos ideológicos e carros estragados. Prevejo que o mundo melhor será adiado por mais um ano, vários milionários arruinados, novos milionários lotéricos, fome no Nordeste, torcidas enlouquecidas e críticas à Seleção.
Prevejo pais nervosos e filhos-calendário com hora marcada no colégio, no balé, no inglês, na escolinha de artes, de futebol, de tênis ou abandonadas nas ruas.
Prevejo para o ano novo a repetição do ano velho. Prevejo tradicionalistas preocupados com a modernidade, modernistas ambicionando o futuro, futurólogos adivinhando o passado, historiadores criando versões, nenhuma fé removendo montanhas a não ser que fé signifique bomba.
Prevejo tudo de velho para o ano novo. E assim prevendo passo às minhas escolhas pessoais que tomaram mais de dez minutos do meu tempo.
Os destaques do ano foram:
Escândalo: Empate técnico entre Senado, Sarney, Câmara de Deputados e Judiciário.
Fofoca: Pirarucu do Tucunaré e disseram que fui eu.
Novidade: Empate técnico: Desfile das Escolas na Sapucaí, corrupção e perda da Copa do Mundo.
Falta de Criatividade: Empate técnico: Novelas de TV e prêmio Jabuti.
Homem do ano: José Serra.
Mulher do ano: Empate técnico: Judith Dent, a “M” dos filmes de James Bond e Marisa Lula da Silva.
Imbecil: O presidente do Irã.
Corja : Os que apóiam o Imbecil.
Partido político: PTPMDBPL.
Turista: Lula (tricampeão).
Governador : Ninguém votou.
Deputado Federal: idem
Senador: Quando for extinto o Senado, qualquer um.
Discernimento: Supremo Tribunal Federal
Facilitador: Supremo Tribunal Federal
O Mundo não é o bastante: Lula
Quase aconteceu: A reforma política.
Nunca vai acontecer: A revitalização do porto de Porto Alegre.
Futebol: Não quero nem falar.
O melhor discriminador racial: Morto.
Repetindo:
Costumo dizer que quando o leitor não compreende a ironia é porque o escritor não foi suficientemente irônico. Espero ter sido, para não ofender ninguém com as minhas. Há quem confunda sarcasmo com ironia. Não faça isso, por favor. O sarcasmo é um estilo provocador, quase sempre picante e que muitas vezes pode expressar um conteúdo ofensivo.
A ironia é uma espécie de prima-irmã do sarcasmo, uma forma mais branda de se dizer exatamente o oposto daquilo que se queria dizer. A ironia não tem a ferocidade ácida do sarcasmo.
Exemplo de ironia: Depois de um dia todo errado você vai tomar banho e falta água. Você exclama, ironicamente, “Perfeito”. Entendeu? A falta de água resulta ser o complemento “perfeito” para o tudo de ruim que aconteceu naquele dia.
Exemplo de sarcasmo: Alguém lhe pergunta: Quer levar um soco na cara? E você: – É claro, e um na boca do estômago também, se for possível. Ou quando lhe chamam de barbeiro no trânsito e você responde: é, mas sua mãe não reclama. E assim por diante.
Olhando bem talvez eu tenha sido meio sarcástico lá em cima, mas palavra de honra que eu queria ser apenas irônico.
Prefiro a ironia ao sarcasmo. O comentário irônico quase sempre faz rir. O sarcasmo dá vontade de brigar.
Portanto se eu perguntar se você gostou desta crônica responda ironicamente: muito. Não seja sarcástico, não acrescente: por que não escreve outra?
Voltando ao tema, prevejo confusão pela frente.
segunda-feira, 20 de dezembro de 2010
ESSE CIRCO CHAMADO JUSTIÇA
O EXAME DA OAB
João Eichbaum
Noticia-se que um desembargador do Ceará “julgou inscontitucional” o exame exigido pela Ordem dos Advogados para que bacharéis em direito possam advogar.
A repercussão da decisão do desembargador foi imensa. Candidatos reprovados em exames anteriores aplaudiram. Candidatos que estão a depender do dito exame também aplaudiram.
Mas a Ordem dos Advogados do Brasil não aplaudiu.
O Presidente da entidade nacional saiu a campo, em defesa do exame, sustentando que o faz, visando o benefício da sociedade. Segundo ele e segundo todas as pessoas que deparam com bacharéis despreparados, a indústria dos diplomas de direito, que é praticada largamente no país, é a responsável por tal exigência.
Em qualquer canto deste Brasil existe uma “faculdade “ de Direito. E isso, pela simples razão de que o direito é curso que não exige investimentos consideráveis. Basta amizade com políticos que tenham livre acesso no Ministério da Educação e já está disponível um balcão para fornecimento de diplomas, mediante régio pagamento, naturalmente.
Assim como as faculdades de direito viraram comércio, onde qualquer pessoa semialfabetizada obtém seu diploma, a própria profissão de advogado adquiriu a mesma característica. Juristas, hoje - pessoas com uma cultura considerável, com domínio de vários idiomas, conhecimentos básicos de filosofia e o uso irrepreensível do vernáculo – são uma espécie em extinção. Já não os há nos tribunais, nem nos juizados de primeira instância. E no campo da advocacia, onde, sem alternativa para superarem concursos, se concentram milhares e milhares de bacharéis em direito, a luta pela sobrevivência obriga ao exercício da mercancia.
Há muitas décadas, quando havia juristas, quando as pessoas, ao concluirem o segundo grau, portavam uma carga considerável de cultura e sabiam, pelo menos, escrever uma frase sem agressões ao vernáculo, não havia necessidade de exame específico para o exercício da advocacia. O exame só se tornou necessário a partir do momento em que o comércio das faculdades de direito passou a despejar no mercado milhares de semialfabetizados com o diploma na mão.
E para provar tudo o que disse acima, que já não há juristas nem nos tribunais, eis o argumento básico (não revelado no texto da decisão) que levou o desembargador cearense a conceder a liminar, impedindo o exame da OAB: seu filho foi desaprovado no dito exame.
João Eichbaum
Noticia-se que um desembargador do Ceará “julgou inscontitucional” o exame exigido pela Ordem dos Advogados para que bacharéis em direito possam advogar.
A repercussão da decisão do desembargador foi imensa. Candidatos reprovados em exames anteriores aplaudiram. Candidatos que estão a depender do dito exame também aplaudiram.
Mas a Ordem dos Advogados do Brasil não aplaudiu.
O Presidente da entidade nacional saiu a campo, em defesa do exame, sustentando que o faz, visando o benefício da sociedade. Segundo ele e segundo todas as pessoas que deparam com bacharéis despreparados, a indústria dos diplomas de direito, que é praticada largamente no país, é a responsável por tal exigência.
Em qualquer canto deste Brasil existe uma “faculdade “ de Direito. E isso, pela simples razão de que o direito é curso que não exige investimentos consideráveis. Basta amizade com políticos que tenham livre acesso no Ministério da Educação e já está disponível um balcão para fornecimento de diplomas, mediante régio pagamento, naturalmente.
Assim como as faculdades de direito viraram comércio, onde qualquer pessoa semialfabetizada obtém seu diploma, a própria profissão de advogado adquiriu a mesma característica. Juristas, hoje - pessoas com uma cultura considerável, com domínio de vários idiomas, conhecimentos básicos de filosofia e o uso irrepreensível do vernáculo – são uma espécie em extinção. Já não os há nos tribunais, nem nos juizados de primeira instância. E no campo da advocacia, onde, sem alternativa para superarem concursos, se concentram milhares e milhares de bacharéis em direito, a luta pela sobrevivência obriga ao exercício da mercancia.
Há muitas décadas, quando havia juristas, quando as pessoas, ao concluirem o segundo grau, portavam uma carga considerável de cultura e sabiam, pelo menos, escrever uma frase sem agressões ao vernáculo, não havia necessidade de exame específico para o exercício da advocacia. O exame só se tornou necessário a partir do momento em que o comércio das faculdades de direito passou a despejar no mercado milhares de semialfabetizados com o diploma na mão.
E para provar tudo o que disse acima, que já não há juristas nem nos tribunais, eis o argumento básico (não revelado no texto da decisão) que levou o desembargador cearense a conceder a liminar, impedindo o exame da OAB: seu filho foi desaprovado no dito exame.
sexta-feira, 17 de dezembro de 2010
CRÔNICAS IMPUDICAS
O MINISTÉRIO PÚBLICO NAS BALADAS
João Eichbaum
Sim, estou lendo no jornal: “o Ministério Público estadual instaurou inquérito civil para investigar se as casas noturnas de Santa Maria oferecem acesso a pessoas com deficiência.”
Não sei se vocês sabem, mas a demolição do Baronda, do histórico Baronda de Capão da Canoa, começou com o Ministério Público.
Então, é isso aí. O que interessa o Ministério Público é estar na crista da onda, seja no “bar”, seja nas casas noturnas. Uma instituição que não tem nada mais sério para fazer, tem mesmo que se dedicar a essas coisas que chamam a atenção, quer pela agressão a costumes enraizados, quer pelo ridículo.
Entre instaurar procedimento por atropelamento de galinhas e inquérito civil para investigar se as casas noturnas oferecem acesso a pessoas com deficiência, não há diferença no nível do ridículo: é coisa de quem não tem o que fazer.
Me digam se é necessário instaurar “inquérito civil”, para isso? Quantas pessoas são necessárias para trabalhar num “inquérito”, quanto papel vai fora...
Tudo para saber se existem condições de acesso a pessoas deficientes...
Pergunto a vocês: o que é que uma “casa noturna” pode oferecer a “deficientes”? O que é que um “deficiente” vai fazer numa “casa noturna”. Quantos “deficientes” costumam frequentar “casas noturnas”?
Bem, o conceito de “casa noturna” é muito amplo. No meu tempo se chamava cabaré, e pronto. A gente ia lá para fazer, basicamente, três coisas dançar, beber e levar uma mulher para cama.
Hoje é meio relativo. A última etapa pode ou não acontecer. Depende da “casa noturna”. A menos que a “casa noturna” tenha como finalidade específica essa última etapa, ela só vai acontecer se “pintar o clima”.
Então, o que resta para um “deficiente”, nesse caso? Beber e dançar. Beber, tudo bem. Mas, dançar? Como irá dançar um deficiente?
Então, minha gente, em resumo, o Ministério Público está instaurando inquérito civil, gastando o nosso dinheiro, para que os deficientes, os poucos, os raríssimos “deficientes” que frequentam “casas noturnas” possam encher a cara. A notícia não fala de que o “inquérito” vai se estender a todos os barzinhos, a todos os botecos... Não: só as “casas noturnas” têm direito a inquérito civil.
Mas, me digam uma coisa: quando é que o Ministério Público vai instaurar “inquérito civil” para verificar as causas das filas no INSS, por exemplo, que são formadas só por doentes, deficientes e velhinhos? Ou as filas dos bancos, em cujas portas velhinhos trôpegos suspiram, esperando seus minguados reais?
Bem, da minha parte, vou esperar sentado por alguma ação do Ministério Público que saia da área do ridículo. Só não posso impedir que saia do meu bolso o dinheiro que sustenta tantas asneiras.
João Eichbaum
Sim, estou lendo no jornal: “o Ministério Público estadual instaurou inquérito civil para investigar se as casas noturnas de Santa Maria oferecem acesso a pessoas com deficiência.”
Não sei se vocês sabem, mas a demolição do Baronda, do histórico Baronda de Capão da Canoa, começou com o Ministério Público.
Então, é isso aí. O que interessa o Ministério Público é estar na crista da onda, seja no “bar”, seja nas casas noturnas. Uma instituição que não tem nada mais sério para fazer, tem mesmo que se dedicar a essas coisas que chamam a atenção, quer pela agressão a costumes enraizados, quer pelo ridículo.
Entre instaurar procedimento por atropelamento de galinhas e inquérito civil para investigar se as casas noturnas oferecem acesso a pessoas com deficiência, não há diferença no nível do ridículo: é coisa de quem não tem o que fazer.
Me digam se é necessário instaurar “inquérito civil”, para isso? Quantas pessoas são necessárias para trabalhar num “inquérito”, quanto papel vai fora...
Tudo para saber se existem condições de acesso a pessoas deficientes...
Pergunto a vocês: o que é que uma “casa noturna” pode oferecer a “deficientes”? O que é que um “deficiente” vai fazer numa “casa noturna”. Quantos “deficientes” costumam frequentar “casas noturnas”?
Bem, o conceito de “casa noturna” é muito amplo. No meu tempo se chamava cabaré, e pronto. A gente ia lá para fazer, basicamente, três coisas dançar, beber e levar uma mulher para cama.
Hoje é meio relativo. A última etapa pode ou não acontecer. Depende da “casa noturna”. A menos que a “casa noturna” tenha como finalidade específica essa última etapa, ela só vai acontecer se “pintar o clima”.
Então, o que resta para um “deficiente”, nesse caso? Beber e dançar. Beber, tudo bem. Mas, dançar? Como irá dançar um deficiente?
Então, minha gente, em resumo, o Ministério Público está instaurando inquérito civil, gastando o nosso dinheiro, para que os deficientes, os poucos, os raríssimos “deficientes” que frequentam “casas noturnas” possam encher a cara. A notícia não fala de que o “inquérito” vai se estender a todos os barzinhos, a todos os botecos... Não: só as “casas noturnas” têm direito a inquérito civil.
Mas, me digam uma coisa: quando é que o Ministério Público vai instaurar “inquérito civil” para verificar as causas das filas no INSS, por exemplo, que são formadas só por doentes, deficientes e velhinhos? Ou as filas dos bancos, em cujas portas velhinhos trôpegos suspiram, esperando seus minguados reais?
Bem, da minha parte, vou esperar sentado por alguma ação do Ministério Público que saia da área do ridículo. Só não posso impedir que saia do meu bolso o dinheiro que sustenta tantas asneiras.
quinta-feira, 16 de dezembro de 2010
COM A PALAVRA, JANER CRISTALDO
ANARQUISTAS DE TODO MUNDO, ANIMAI-VOS!
Paris é cidade que reúne muita inteligência por metro quadrado. Ocorre que a estupidez é universal. Prova disto são as declarações do ex-jogador francês de futebol Eric Cantona, um ídolo na França e na Inglaterra, onde fez carreira. Pois não é que o ídolo destruir o sistema bancário francês, nada menos que isso? Em outubro passado, Cantona sugeriu em um vídeo que as pessoas retirassem todo o dinheiro que mantêm nos bancos. Na semana passada o ex-craque prometeu, em entrevista ao jornal Libération, que faria a sua parte nesta última terça-feira."A revolução é muito simples de ser feita hoje. Ao invés de ir às ruas fazer quilômetros de manifestações, você vai ao banco da sua cidade e retira todo o teu dinheiro", conclamou o ex-atacante da seleção francesa e ídolo do Manchester United, argumentando que se 20 milhões de pessoas decidem fazer o mesmo, o sistema bancário desmoronaria. "É uma revolução sem armas, nem sangue. Estou constatando essa estranha solidariedade que está nascendo, então, sim, no dia 7 de dezembro, eu irei ao banco", disse o animal.
O espantoso é que a imprensa francesa tenha feito uma polemica em torno a tais sandices. A criação do sistema bancário representou uma revolução extraordinária na organização da sociedade e da vida pessoal de cada cidadão. Ninguém precisou mais guardar dinheiro em cofres ou colchões, muito menos carregar um saco de moedas ou cédulas ao fazer uma transação importante. Leio nos jornais que os meios de comunicação franceses repercutiram a declaração e em poucas horas os internautas começaram a se manifestar em sites e em redes sociais, afirmando que fariam o mesmo."O dinheiro dos bancos é o nosso dinheiro e nós o ganhamos com muito suor. Temos o direito de fazermos o que bem entendermos com ele", disse Jean-Jacques Saliou, uma das pessoas que promete acompanhar Cantona na "revolução". "Não podemos continuar pagando os salários milionários dos grandões das finanças sem dizer nada", afirmou Evelyne Maller.
Curiosamente, jornalista algum perguntou a Cantona se ele se disporia a ir buscar na sede de seu clube seus salários, que certamente farão bom volume nos bolsos. Se toparia ir até os PTT com euros em punho pagar sua conta de telefone, até a EDF pagar sua conta de luz. Ou portar uma mala de papel-moeda para pagar um carro ou um apartamento. A proposta do ex-jogador. que pode até fascinar anarquistas saudosos,é de uma precariedade total. O que espanta em tudo isto é que até altas autoridades tenham se preocupado com tais bobagens.
Christine Lagarde, a ministra da Economia, comentou o assunto, dizendo que "existem pessoas que jogam magnificamente futebol, mas eu não me arriscaria. Acho que cada um tem de se concentrar nas suas competências". O ministro do Orçamento, François Baroin, por sua vez, foi mais duro nos comentários, chamando a iniciativa de "grotesca e irresponsável". "Cantona como conselheiro financeiro não pode ser levado a sério. Cada um na sua área", disse Baroin.
Espanta ainda mais que esta idéia estapafúrdia esteja fazendo fortuna além-fronteiras. Segundo o Libé, na Bélgica, a cenarista Géraldine Feullien abriu um site, Bankrun2010.com, através do qual espera conquistar seguidores no mundo inteiro. O endereço tem tradução em oito línguas. "Com ou sem a nossa contribuição, esse sistema bancário atual irresponsável vai explodir mais cedo ou mais tarde. O melhor é nos prevenirmos e agirmos desde já, guardando o nosso dinheiro em casa ou em bens", defendeu Feuillien. "Independente dos resultados desta ação, as pessoas terão a ocasião de pensar sobre o imenso golpe que representa o sistema monetário de hoje. É o momento de se exigir que se construa um outro que seja verdadeiramente a serviço do cidadão."Bem que Cantona podia ser mais radical em sua proposta. Que tal voltar ao escambo. Eu jogo futebol sem receber um vintém e meu time ergue minha casa. Vou a padaria e troco as laranjas de meu pomar por pães. Vou à Fnac e troco À la recherche du temps perdu por uma caixa de CDs do Jacques Brel.
Mas ainda mais espantoso é ver economistas preocupados com a idéia estúpida. Segundo Jézabel Couppey-Soubeyran, da Universidade Paris 1 - Panthéon-Sorbonne, se 20 milhões de pessoas decidissem retirar o seu dinheiro ao longo de alguns dias, essa atitude colocaria os bancos em risco. "Não é o mais adequado a se fazer para se rebelar, porque, por mais descontentes que estejamos, o nossos sistema todo ainda depende dos bancos." Sem liquidez, os bancos cessariam os pagamentos e as poupanças dos correntistas seriam as primeiras prejudicadas. Os juros explodiriam e provocariam a alta das taxas de inflação, levando a economia inteira de um país ao desequilíbrio, já que os financiamentos - e consequentemente, os investimentos - ficariam suspensos. A revolução prejudicaria, sim, os bancos, que seriam obrigados a decretar falência. Mas a medida extremista também afetaria gravemente todo o restante da sociedade.
Anarquistas de todo mundo, animai-vos! A estupidez, além de universal, é eterna.
Paris é cidade que reúne muita inteligência por metro quadrado. Ocorre que a estupidez é universal. Prova disto são as declarações do ex-jogador francês de futebol Eric Cantona, um ídolo na França e na Inglaterra, onde fez carreira. Pois não é que o ídolo destruir o sistema bancário francês, nada menos que isso? Em outubro passado, Cantona sugeriu em um vídeo que as pessoas retirassem todo o dinheiro que mantêm nos bancos. Na semana passada o ex-craque prometeu, em entrevista ao jornal Libération, que faria a sua parte nesta última terça-feira."A revolução é muito simples de ser feita hoje. Ao invés de ir às ruas fazer quilômetros de manifestações, você vai ao banco da sua cidade e retira todo o teu dinheiro", conclamou o ex-atacante da seleção francesa e ídolo do Manchester United, argumentando que se 20 milhões de pessoas decidem fazer o mesmo, o sistema bancário desmoronaria. "É uma revolução sem armas, nem sangue. Estou constatando essa estranha solidariedade que está nascendo, então, sim, no dia 7 de dezembro, eu irei ao banco", disse o animal.
O espantoso é que a imprensa francesa tenha feito uma polemica em torno a tais sandices. A criação do sistema bancário representou uma revolução extraordinária na organização da sociedade e da vida pessoal de cada cidadão. Ninguém precisou mais guardar dinheiro em cofres ou colchões, muito menos carregar um saco de moedas ou cédulas ao fazer uma transação importante. Leio nos jornais que os meios de comunicação franceses repercutiram a declaração e em poucas horas os internautas começaram a se manifestar em sites e em redes sociais, afirmando que fariam o mesmo."O dinheiro dos bancos é o nosso dinheiro e nós o ganhamos com muito suor. Temos o direito de fazermos o que bem entendermos com ele", disse Jean-Jacques Saliou, uma das pessoas que promete acompanhar Cantona na "revolução". "Não podemos continuar pagando os salários milionários dos grandões das finanças sem dizer nada", afirmou Evelyne Maller.
Curiosamente, jornalista algum perguntou a Cantona se ele se disporia a ir buscar na sede de seu clube seus salários, que certamente farão bom volume nos bolsos. Se toparia ir até os PTT com euros em punho pagar sua conta de telefone, até a EDF pagar sua conta de luz. Ou portar uma mala de papel-moeda para pagar um carro ou um apartamento. A proposta do ex-jogador. que pode até fascinar anarquistas saudosos,é de uma precariedade total. O que espanta em tudo isto é que até altas autoridades tenham se preocupado com tais bobagens.
Christine Lagarde, a ministra da Economia, comentou o assunto, dizendo que "existem pessoas que jogam magnificamente futebol, mas eu não me arriscaria. Acho que cada um tem de se concentrar nas suas competências". O ministro do Orçamento, François Baroin, por sua vez, foi mais duro nos comentários, chamando a iniciativa de "grotesca e irresponsável". "Cantona como conselheiro financeiro não pode ser levado a sério. Cada um na sua área", disse Baroin.
Espanta ainda mais que esta idéia estapafúrdia esteja fazendo fortuna além-fronteiras. Segundo o Libé, na Bélgica, a cenarista Géraldine Feullien abriu um site, Bankrun2010.com, através do qual espera conquistar seguidores no mundo inteiro. O endereço tem tradução em oito línguas. "Com ou sem a nossa contribuição, esse sistema bancário atual irresponsável vai explodir mais cedo ou mais tarde. O melhor é nos prevenirmos e agirmos desde já, guardando o nosso dinheiro em casa ou em bens", defendeu Feuillien. "Independente dos resultados desta ação, as pessoas terão a ocasião de pensar sobre o imenso golpe que representa o sistema monetário de hoje. É o momento de se exigir que se construa um outro que seja verdadeiramente a serviço do cidadão."Bem que Cantona podia ser mais radical em sua proposta. Que tal voltar ao escambo. Eu jogo futebol sem receber um vintém e meu time ergue minha casa. Vou a padaria e troco as laranjas de meu pomar por pães. Vou à Fnac e troco À la recherche du temps perdu por uma caixa de CDs do Jacques Brel.
Mas ainda mais espantoso é ver economistas preocupados com a idéia estúpida. Segundo Jézabel Couppey-Soubeyran, da Universidade Paris 1 - Panthéon-Sorbonne, se 20 milhões de pessoas decidissem retirar o seu dinheiro ao longo de alguns dias, essa atitude colocaria os bancos em risco. "Não é o mais adequado a se fazer para se rebelar, porque, por mais descontentes que estejamos, o nossos sistema todo ainda depende dos bancos." Sem liquidez, os bancos cessariam os pagamentos e as poupanças dos correntistas seriam as primeiras prejudicadas. Os juros explodiriam e provocariam a alta das taxas de inflação, levando a economia inteira de um país ao desequilíbrio, já que os financiamentos - e consequentemente, os investimentos - ficariam suspensos. A revolução prejudicaria, sim, os bancos, que seriam obrigados a decretar falência. Mas a medida extremista também afetaria gravemente todo o restante da sociedade.
Anarquistas de todo mundo, animai-vos! A estupidez, além de universal, é eterna.
quarta-feira, 15 de dezembro de 2010
CRÔNICAS IMPUDICAS
AGRADEÇO À POLÍCIA FEDERAL
João Eichbaum
Sou do tempo em que a gente se vestia de terno e gravata para viajar de avião, as refeições a bordo eram lautas, precedidas por um carrinho cheio de bons aperitivos, champanhe, wisky estrangeiro, os cafés da manhã eram de arrasar, assim como os lanches, entre uma refeição e outra.
Portanto, não sou do tempo das barrinhas de cereais, das torradinhas de amendoim, e dos copinhos plásticos com refrigerante e, muito menos, do tempo dos voos cancelados, dos aeroportos abrigando multidões, com gente deitada pelos cantos, enrodilhada em mantas, ouvindo berros de protestos dos mais exaltados em razão dos péssimos serviços prestados pelas companhias aéreas, pela ANAC, pelo Nelson Jobim, pela Infraero, etc.
Por tudo isso, deixei de viajar, há bastante tempo. Se é para sair de casa e passar trabalho, trocando meu colchão macio pelos pisos dos aeroportos, tendo que abdicar dos meus bons uísques ao alcance da mão, ficando de pé, por horas e horas em filas, prefiro não viajar.
Com o passar do tempo, meu passaporte venceu.
E aí, gente, com a vitória do Inter na Libertadores, padeci uma tentação, a que não resisti. Resolvi viajar de novo, conhecer os Emirados Árabes, Abu Dabi, vibrar com o Inter, no mundial de Clubes, ainda que não pudesse beber à vontade, ainda que me privasse de ver belas mulheres com belos corpos, naquele mundo muçulmano, cheio de proibições hipócritas.
E agendei, pela Internet, a renovação do passaporte. Marcados dia e hora, me dei conta de que o boleto que me fora passado, através da impressão pelo computador, não continha data de vencimento, nem valor. Estranhei, tentei reimprimir, mas não deu certo, o programa não aceitava a reimpressão, porque esta estava vinculado ao agendamento. Outra impressão, só com outro agendamento.
Bem, pensei, tudo fica resolvido ao pagar, certamente o banco sabe o valor.
Mas não foi assim. No dia em que deveria comparecer à Polícia Federal, fui ao banco e, para minha surpresa, espanto, decepção e raiva, o sistema não aceitou o pagamento, sob a alegação de que o título já estava vencido. Pois, vencido também pela raiva, desisti de pedir renovação de passaporte. E xinguei o Brasil, e xinguei a Polícia Federal pelo excesso de burocracia, pelo desrespeito ao Estatuto do Idoso, pela deficiência de seus técnicos, que não oferecem serviços eficazes. E não quis mais saber de viajar.
Bom, aí o Inter começou a desandar: o Renan e o Alecsandro começaram a mostrar que o tempo deles já passou, que o Fernando Carvalho só vive do passado e que o Celso Roth deveria ter ficado em Caxias, trabalhando como “instrutor” de academia, área em que ele dever ser muito bom. E quando o time empatou com o último colocado no campeonato brasileiro, em pleno Beira- Rio, é claro que eu comecei a agradecer à Polícia Federal, pelos seus maus serviços.
Precisa dizer mais?
João Eichbaum
Sou do tempo em que a gente se vestia de terno e gravata para viajar de avião, as refeições a bordo eram lautas, precedidas por um carrinho cheio de bons aperitivos, champanhe, wisky estrangeiro, os cafés da manhã eram de arrasar, assim como os lanches, entre uma refeição e outra.
Portanto, não sou do tempo das barrinhas de cereais, das torradinhas de amendoim, e dos copinhos plásticos com refrigerante e, muito menos, do tempo dos voos cancelados, dos aeroportos abrigando multidões, com gente deitada pelos cantos, enrodilhada em mantas, ouvindo berros de protestos dos mais exaltados em razão dos péssimos serviços prestados pelas companhias aéreas, pela ANAC, pelo Nelson Jobim, pela Infraero, etc.
Por tudo isso, deixei de viajar, há bastante tempo. Se é para sair de casa e passar trabalho, trocando meu colchão macio pelos pisos dos aeroportos, tendo que abdicar dos meus bons uísques ao alcance da mão, ficando de pé, por horas e horas em filas, prefiro não viajar.
Com o passar do tempo, meu passaporte venceu.
E aí, gente, com a vitória do Inter na Libertadores, padeci uma tentação, a que não resisti. Resolvi viajar de novo, conhecer os Emirados Árabes, Abu Dabi, vibrar com o Inter, no mundial de Clubes, ainda que não pudesse beber à vontade, ainda que me privasse de ver belas mulheres com belos corpos, naquele mundo muçulmano, cheio de proibições hipócritas.
E agendei, pela Internet, a renovação do passaporte. Marcados dia e hora, me dei conta de que o boleto que me fora passado, através da impressão pelo computador, não continha data de vencimento, nem valor. Estranhei, tentei reimprimir, mas não deu certo, o programa não aceitava a reimpressão, porque esta estava vinculado ao agendamento. Outra impressão, só com outro agendamento.
Bem, pensei, tudo fica resolvido ao pagar, certamente o banco sabe o valor.
Mas não foi assim. No dia em que deveria comparecer à Polícia Federal, fui ao banco e, para minha surpresa, espanto, decepção e raiva, o sistema não aceitou o pagamento, sob a alegação de que o título já estava vencido. Pois, vencido também pela raiva, desisti de pedir renovação de passaporte. E xinguei o Brasil, e xinguei a Polícia Federal pelo excesso de burocracia, pelo desrespeito ao Estatuto do Idoso, pela deficiência de seus técnicos, que não oferecem serviços eficazes. E não quis mais saber de viajar.
Bom, aí o Inter começou a desandar: o Renan e o Alecsandro começaram a mostrar que o tempo deles já passou, que o Fernando Carvalho só vive do passado e que o Celso Roth deveria ter ficado em Caxias, trabalhando como “instrutor” de academia, área em que ele dever ser muito bom. E quando o time empatou com o último colocado no campeonato brasileiro, em pleno Beira- Rio, é claro que eu comecei a agradecer à Polícia Federal, pelos seus maus serviços.
Precisa dizer mais?
terça-feira, 14 de dezembro de 2010
DOS CONTOS ABSURDOS, DE PAULO WAINBERG
A força do carvão de pedra
Quando descobriram que a gengiva e o gengibre haviam ficado, foi o maior escândalo, a maior pauleira. Como? O que foi isso que acabei de dizer? Escândalo? Escândalo foi pouco, meu! Bafo total, de morro para baixo! Algo assim como uma convenção de trutas de água doce ou uma batalha entre esteroides e anabolizantes pela ocupação de um fórceps.
No mesmo dia outras revelações foram feitas, daquelas de não tirar nem por e ai de quem estivesse por perto. Mais tarde, Pepino e Popeye assumiram seu caso, deixando as adolescentes prostradas e os ferrolhos com os cabelos em pé.
Legalmente falando, nada havia a fazer. Nem mesmo uma suspeita de impedimento para lavar a alma ou servir um cafezinho.
Tiveram que engasgar em seco, como se fossem bafos na nuca.
Realmente.
Diversos estetoscópios, calores mis e uma fralda molhada foram impedidos de sair por falta de escrotos, ao passo que as armas dos barões, assinaladas, penetravam aos borbotões.
Um abrolho. Sem falar nos emolumentos, fermentos e excrementos.
No auge da panacéia ouviu-se um gemido, em árabe, vindo de uns matos: – Te amo, meu xeque-mate. Te amo, uiuiui.
Qual o quê, quem sabe não viu e se subiu, não sei não. Porque, sinceramente, não era coisa de se botar nos joelhos, de se lançar ao éter ou de se mijar nas calças.
Mais groselhas para cá, menos groselhas para lá, al fim e al cabo, tudo se resumiu, deixando um rastro na mancebia e uma mancha na lapela: Quatro estivadores e um guarda-noturno. Nem mais, nem menos.
Quando nada mais parecia acontecer, os bridões entraram a mil, fazendo mortos, feridos e nenhuma vítima, o que foi sucedido por uma incrível sub-reptícia, justo na porta da servidão. Grossas camadas, minha gente, grossas camadas. Mas foi em vão, em vim e em vindo.
Superou-se.
————————-
Quando descobriram que a gengiva e o gengibre haviam ficado, foi o maior escândalo, a maior pauleira. Como? O que foi isso que acabei de dizer? Escândalo? Escândalo foi pouco, meu! Bafo total, de morro para baixo! Algo assim como uma convenção de trutas de água doce ou uma batalha entre esteroides e anabolizantes pela ocupação de um fórceps.
No mesmo dia outras revelações foram feitas, daquelas de não tirar nem por e ai de quem estivesse por perto. Mais tarde, Pepino e Popeye assumiram seu caso, deixando as adolescentes prostradas e os ferrolhos com os cabelos em pé.
Legalmente falando, nada havia a fazer. Nem mesmo uma suspeita de impedimento para lavar a alma ou servir um cafezinho.
Tiveram que engasgar em seco, como se fossem bafos na nuca.
Realmente.
Diversos estetoscópios, calores mis e uma fralda molhada foram impedidos de sair por falta de escrotos, ao passo que as armas dos barões, assinaladas, penetravam aos borbotões.
Um abrolho. Sem falar nos emolumentos, fermentos e excrementos.
No auge da panacéia ouviu-se um gemido, em árabe, vindo de uns matos: – Te amo, meu xeque-mate. Te amo, uiuiui.
Qual o quê, quem sabe não viu e se subiu, não sei não. Porque, sinceramente, não era coisa de se botar nos joelhos, de se lançar ao éter ou de se mijar nas calças.
Mais groselhas para cá, menos groselhas para lá, al fim e al cabo, tudo se resumiu, deixando um rastro na mancebia e uma mancha na lapela: Quatro estivadores e um guarda-noturno. Nem mais, nem menos.
Quando nada mais parecia acontecer, os bridões entraram a mil, fazendo mortos, feridos e nenhuma vítima, o que foi sucedido por uma incrível sub-reptícia, justo na porta da servidão. Grossas camadas, minha gente, grossas camadas. Mas foi em vão, em vim e em vindo.
Superou-se.
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segunda-feira, 13 de dezembro de 2010
ESSE CIRCO CHAMADO JUSTIÇA
AS SÚMULAS DO SUPREMO: PREGUIÇA
João Eichbaum
Leiam a notícia que segue.
O ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), concedeu liminar em Habeas Corpus (HC 106435) a um homem preso em Sumaré (SP) desde o dia 24 de maio de 2004, sem ter sido julgado. De acordo com a defesa, ele cumpria prisão cautelar desde então.
Ao tomar a decisão, o ministro superou o enunciado da Súmula 691, que impede o STF de analisar habeas corpus que tenha tido liminar negada e ainda esteja em curso em outro tribunal superior. A súmula seria cabível ao caso porque a defesa do preso recorreu ao Supremo contra decisão de ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que negou o pedido de liberdade.
No entanto, o ministro Celso de Mello lembrou que o STF tem admitido o afastamento da súmula em caráter extraordinário, quando fica comprovado o constrangimento ilegal. Em sua opinião, “a situação exposta nesta impetração ajusta-se às hipóteses que autorizam a superação do obstáculo representado pela Súmula 691”.
Bem, o negócio é o seguinte: o cara estava preso há seis anos, sem ter sido julgado. Ou seja, foi condenado a seis anos de prisão, sem sentença. Um ministro do STJ (a notícia suprime o nome do ministro, que certamente é dotado de “notório”saber jurídico, mas que não tá nem aí) negou a liminar para que o preso fosse solto. Há uma súmula do STF que impede o conhecimento de “habeas corpus” contra “liminar”.
Bem, para quem não sabe: súmula é um pré-julgamento, uma determinação para que não se julgue matéria já antecipada pelos tribunais. Uma espécie de tábula rasa, tipo decisões por atacado.
Se decidisse por conta dessa “súmula”, o Marco Aurélio não poderia mandar soltar o preso.
Pois é gente. O que domina, em geral, é a preguiça. “Súmula” é coisa de preguiçoso. As “súmulas” do STF foram inventadas para facilitar a preguiça dos ministros. Se o caso está contra a “súmula” eles se livram do processo e a justiça que se foda. Os ministros do STF não são pagos para “fazer justiça”, mas para “lavrar acórdãos”. O que importa não é fazer justiça, mas arquivar processos.
Por isso inventaram as “súmulas”.
Se fosse para fazer justiça eles teriam que examinar caso a caso, processo por processo, mas isso eles não querem, pois não teriam tempo para viajar pelo mundo afora às nossas custas. Por isso, repito, inventaram as “súmulas”.
O Marco Aurélio saiu pela tangente. Não foi homem suficiente para vociferar contra a preguiça, autorizada pelas “súmulas”. Mas,afinal, fez justiça e merece aplauso.
João Eichbaum
Leiam a notícia que segue.
O ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), concedeu liminar em Habeas Corpus (HC 106435) a um homem preso em Sumaré (SP) desde o dia 24 de maio de 2004, sem ter sido julgado. De acordo com a defesa, ele cumpria prisão cautelar desde então.
Ao tomar a decisão, o ministro superou o enunciado da Súmula 691, que impede o STF de analisar habeas corpus que tenha tido liminar negada e ainda esteja em curso em outro tribunal superior. A súmula seria cabível ao caso porque a defesa do preso recorreu ao Supremo contra decisão de ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que negou o pedido de liberdade.
No entanto, o ministro Celso de Mello lembrou que o STF tem admitido o afastamento da súmula em caráter extraordinário, quando fica comprovado o constrangimento ilegal. Em sua opinião, “a situação exposta nesta impetração ajusta-se às hipóteses que autorizam a superação do obstáculo representado pela Súmula 691”.
Bem, o negócio é o seguinte: o cara estava preso há seis anos, sem ter sido julgado. Ou seja, foi condenado a seis anos de prisão, sem sentença. Um ministro do STJ (a notícia suprime o nome do ministro, que certamente é dotado de “notório”saber jurídico, mas que não tá nem aí) negou a liminar para que o preso fosse solto. Há uma súmula do STF que impede o conhecimento de “habeas corpus” contra “liminar”.
Bem, para quem não sabe: súmula é um pré-julgamento, uma determinação para que não se julgue matéria já antecipada pelos tribunais. Uma espécie de tábula rasa, tipo decisões por atacado.
Se decidisse por conta dessa “súmula”, o Marco Aurélio não poderia mandar soltar o preso.
Pois é gente. O que domina, em geral, é a preguiça. “Súmula” é coisa de preguiçoso. As “súmulas” do STF foram inventadas para facilitar a preguiça dos ministros. Se o caso está contra a “súmula” eles se livram do processo e a justiça que se foda. Os ministros do STF não são pagos para “fazer justiça”, mas para “lavrar acórdãos”. O que importa não é fazer justiça, mas arquivar processos.
Por isso inventaram as “súmulas”.
Se fosse para fazer justiça eles teriam que examinar caso a caso, processo por processo, mas isso eles não querem, pois não teriam tempo para viajar pelo mundo afora às nossas custas. Por isso, repito, inventaram as “súmulas”.
O Marco Aurélio saiu pela tangente. Não foi homem suficiente para vociferar contra a preguiça, autorizada pelas “súmulas”. Mas,afinal, fez justiça e merece aplauso.
sexta-feira, 10 de dezembro de 2010
COM A PALAVRA, JANER CRISTALDO
SÃO PAULO QUER LEGALIZAR
PROFISSÃO DE ASSALTANTE
Há dois ou três dias falei da vocação deste país nosso para a criação de profissões inúteis. O Brasil é um dos raros países que conheço onde existem ascensoristas. Como se quem usa um elevador fosse incapaz de apertar um botão. Onde existem também cobradores nos ônibus. Pior ainda: quando se introduziram catracas nos ônibus de São Paulo, os sindicatos protestaram e mantiveram os cobradores. Hoje, você tem catracas e mais um cobrador, que olha você colocar seu tíquete na catraca. Ou aproveita seu ócio para dormir.Em setembro passado, comentei que, por R$ 51 mensais, um sindicato em São Paulo oferece "segurança jurídica", uniformes, cadastro e registro profissional em carteira de trabalho para flanelinhas da capital. No vácuo da ausência de regras municipais, a entidade, que abriu as portas ao público em agosto, tem como respaldo uma lei federal de 1975. A promessa é de que o associado nunca será preso se apresentar o registro de "guardador e lavador de veículos automotores".
Ou seja: a extorsão está legalizada em São Paulo. Por 51 reais, está garantido a qualquer vagabundo extorquir seu dinheiro. Caso você não pague, terá o carro riscado ou os pneus furados. São ameaças que não me atingem. Não tenho carro, nunca tive. Primeiro porque não gosto de carro. Segundo, porque com carro não se vai longe. Um outro motivo são os flanelinhas. Às vezes, de carona com algum amigo, somos atacados por um desses extortores. Minha vontade é de enfiar-lhe uma bala na testa. Ainda bem que tampouco tenho revólver.
Se um sindicato dava suporte legal à extorsão, agora é a Prefeitura de São Paulo e a Polícia Militar que planejam legalizar de vez a extorsão. Com o pretexto de fazer um projeto piloto para combater flanelinhas ilegais que atuam na cidade, pretende-se agora legalizar o assalto perpetrado por marginais contra qualquer pessoa que tenha carro. Cadastramento na Secretaria Municipal do Trabalho, uso de uniformes oficiais e fiscalização específica por agentes das subprefeituras, PM e Guarda Civil Metropolitana são algumas das ações cogitadas no plano. As possibilidades foram discutidas no dia 25 do mês passado, em reunião com o Ministério Público Estadual (MPE).
O local onde o projeto será testado - um "ponto crítico" de atuação de flanelinhas - deve ser definido ainda neste mês. Os pontos cogitados até aqui são áreas conhecidas pela presença de "guardadores de carros" na cidade: vias próximas da Rua 25 de Março, no centro, arredores do Anhembi, na zona norte, e o Estádio do Pacaembu, na zona oeste. Nesses locais, aponta o MPE, são cobrados entre R$ 5 e R$ 20 para deixar o carro na rua. Em julho, o MPE instaurou inquérito exigindo enfrentamento do problema por prefeitura e PM.
Flanelinha é assaltante. Que país é este em que se regulamenta a profissão de assaltante? Onde há um sindicato de assaltantes? Não tenho carro. Mas me indigno pelos que têm. Você paga à Prefeitura para estacionar e além disso tem de pagar ao vagabundo para não ter o carro danificado. A lei confere ao assaltante o direito de assaltar. Pior que tudo, os proprietários de carros aceitam passivamente a extorsão, como se assaltar fosse direito líquido e certo de quem quer que se habilite ao ofício.
Se sem uniforme os marginais já achacavam os proprietários de veículos, imagine agora com a autoridade que confere um uniforme. Há alguns anos, em Curitiba, se pretendeu regulamentar a profissão de mendigo. Cada pedinte teria uma carteirinha que lhe daria direito a esmolar. Creio que a brilhante idéia não vingou. O sindicato que dá suporte legal aos assaltantes estima que a capital tenha 15 mil flanelinhas.
No que depender da Prefeitura, nos próximos dias teremos 15 mil marginais com o direito de assaltar garantido por lei.
PROFISSÃO DE ASSALTANTE
Há dois ou três dias falei da vocação deste país nosso para a criação de profissões inúteis. O Brasil é um dos raros países que conheço onde existem ascensoristas. Como se quem usa um elevador fosse incapaz de apertar um botão. Onde existem também cobradores nos ônibus. Pior ainda: quando se introduziram catracas nos ônibus de São Paulo, os sindicatos protestaram e mantiveram os cobradores. Hoje, você tem catracas e mais um cobrador, que olha você colocar seu tíquete na catraca. Ou aproveita seu ócio para dormir.Em setembro passado, comentei que, por R$ 51 mensais, um sindicato em São Paulo oferece "segurança jurídica", uniformes, cadastro e registro profissional em carteira de trabalho para flanelinhas da capital. No vácuo da ausência de regras municipais, a entidade, que abriu as portas ao público em agosto, tem como respaldo uma lei federal de 1975. A promessa é de que o associado nunca será preso se apresentar o registro de "guardador e lavador de veículos automotores".
Ou seja: a extorsão está legalizada em São Paulo. Por 51 reais, está garantido a qualquer vagabundo extorquir seu dinheiro. Caso você não pague, terá o carro riscado ou os pneus furados. São ameaças que não me atingem. Não tenho carro, nunca tive. Primeiro porque não gosto de carro. Segundo, porque com carro não se vai longe. Um outro motivo são os flanelinhas. Às vezes, de carona com algum amigo, somos atacados por um desses extortores. Minha vontade é de enfiar-lhe uma bala na testa. Ainda bem que tampouco tenho revólver.
Se um sindicato dava suporte legal à extorsão, agora é a Prefeitura de São Paulo e a Polícia Militar que planejam legalizar de vez a extorsão. Com o pretexto de fazer um projeto piloto para combater flanelinhas ilegais que atuam na cidade, pretende-se agora legalizar o assalto perpetrado por marginais contra qualquer pessoa que tenha carro. Cadastramento na Secretaria Municipal do Trabalho, uso de uniformes oficiais e fiscalização específica por agentes das subprefeituras, PM e Guarda Civil Metropolitana são algumas das ações cogitadas no plano. As possibilidades foram discutidas no dia 25 do mês passado, em reunião com o Ministério Público Estadual (MPE).
O local onde o projeto será testado - um "ponto crítico" de atuação de flanelinhas - deve ser definido ainda neste mês. Os pontos cogitados até aqui são áreas conhecidas pela presença de "guardadores de carros" na cidade: vias próximas da Rua 25 de Março, no centro, arredores do Anhembi, na zona norte, e o Estádio do Pacaembu, na zona oeste. Nesses locais, aponta o MPE, são cobrados entre R$ 5 e R$ 20 para deixar o carro na rua. Em julho, o MPE instaurou inquérito exigindo enfrentamento do problema por prefeitura e PM.
Flanelinha é assaltante. Que país é este em que se regulamenta a profissão de assaltante? Onde há um sindicato de assaltantes? Não tenho carro. Mas me indigno pelos que têm. Você paga à Prefeitura para estacionar e além disso tem de pagar ao vagabundo para não ter o carro danificado. A lei confere ao assaltante o direito de assaltar. Pior que tudo, os proprietários de carros aceitam passivamente a extorsão, como se assaltar fosse direito líquido e certo de quem quer que se habilite ao ofício.
Se sem uniforme os marginais já achacavam os proprietários de veículos, imagine agora com a autoridade que confere um uniforme. Há alguns anos, em Curitiba, se pretendeu regulamentar a profissão de mendigo. Cada pedinte teria uma carteirinha que lhe daria direito a esmolar. Creio que a brilhante idéia não vingou. O sindicato que dá suporte legal aos assaltantes estima que a capital tenha 15 mil flanelinhas.
No que depender da Prefeitura, nos próximos dias teremos 15 mil marginais com o direito de assaltar garantido por lei.
quinta-feira, 9 de dezembro de 2010
CRÔNICAS IMPUDICAS
ACREDITE: JÁ FOI PIOR
João Eichbaum
Para você, certamente, como para mim, em tempos idos, Frei Caneca não passava de um nome de rua. Alguma coisa ouvimos sobre ele, nas aulas de história do Brasil, mas como simples personagem, sem muito importância, longe do papel principal.
O papel principal sempre esteve com D. Pedro I, o proclamador da independência, às margens plácidas do Ipiranga, que ouviram, “ao som do mar e à luz do céu profundo”o grito de “independência e morte”. Para nós, alunos da história do Brasil, e talvez até para a nossa professora, o verdadeiro herói era somente D.Pedro I, que teve a “coragem” de nos libertar de Portugal.
Mas, não foi bem assim, gente. Hoje, o Laurentino Gomes, nos desvenda melhor a história, em seus livros 1808 e 1822.
Frei Joaquim do Amor Divino Caneca, ou simplesmente Frei Caneca, assim como José Bonifácio de Andrada e Silva, foi um dos homens que começaram a fazer, a executar, a tornar realidade a verdadeira independência do Brasil. A diferença entre um e outro residia nas idéias: José Bonifácio queria um império constitucional, Frei Caneca, uma república.
Mas, as idéias de Frei Caneca lhe custaram a vida. Como um dos líderes da Confederação do Equador, que pregava a desvinculação com a monarquia e a separação de Pernambuco, frei Caneca foi preso e condenado à morte, por enforcamento.
Conta Laurentino Gomes que “Caneca dormia profundamente quando o capelão foi chamá-lo na cela em que estava recolhido. Antes de subir ao patíbulo, submeteu-se a um ritual humilhante de destituição das ordens sacras”: paramentaram-no, como se fosse celebrar missa, mas em seguida foi despido das vestes sacerdotais por dois padres. Foi levado para o alto do patíbulo, “de onde pendia a corda da forca”, mas não foi executado. A ingrata missão foi recusada pelos carrascos. Então, por ordem de Francisco Lima e Silva, pai do futuro Duque de Caxias, foi fuzilado.
Fuzilado por ter idéias republicanas, assim como Tiradentes fora esquartejado por ter idéias de libertação.
Era assim que se fazia política. Era assim que os governantes se livravam da oposição.
As asneiras que o Lula diz, as patacoadas do PT e a eleição de uma comunista para presidir um país capitalista, não são coisas tão inomináveis, como as praticadas pelo príncipe D.Pedro, mulherengo e tarado, que até uma freira levou para a cama, e que nunca demonstrou remorso pelo que fez contra sua mulher, a princesa Leopoldina. Grávida, Leopoldina foi agredida por ele, com um pontapé na barriga, porque se negara a participar de uma cerimônia na qual estava presente a amante oficial do príncipe. A consequência da agressão foi um aborto, que lhe causou a morte.
Conclusões: a independência se consolidou com sangue e não com “brados heróicos”; a política, no Brasil, já foi pior do que é.
João Eichbaum
Para você, certamente, como para mim, em tempos idos, Frei Caneca não passava de um nome de rua. Alguma coisa ouvimos sobre ele, nas aulas de história do Brasil, mas como simples personagem, sem muito importância, longe do papel principal.
O papel principal sempre esteve com D. Pedro I, o proclamador da independência, às margens plácidas do Ipiranga, que ouviram, “ao som do mar e à luz do céu profundo”o grito de “independência e morte”. Para nós, alunos da história do Brasil, e talvez até para a nossa professora, o verdadeiro herói era somente D.Pedro I, que teve a “coragem” de nos libertar de Portugal.
Mas, não foi bem assim, gente. Hoje, o Laurentino Gomes, nos desvenda melhor a história, em seus livros 1808 e 1822.
Frei Joaquim do Amor Divino Caneca, ou simplesmente Frei Caneca, assim como José Bonifácio de Andrada e Silva, foi um dos homens que começaram a fazer, a executar, a tornar realidade a verdadeira independência do Brasil. A diferença entre um e outro residia nas idéias: José Bonifácio queria um império constitucional, Frei Caneca, uma república.
Mas, as idéias de Frei Caneca lhe custaram a vida. Como um dos líderes da Confederação do Equador, que pregava a desvinculação com a monarquia e a separação de Pernambuco, frei Caneca foi preso e condenado à morte, por enforcamento.
Conta Laurentino Gomes que “Caneca dormia profundamente quando o capelão foi chamá-lo na cela em que estava recolhido. Antes de subir ao patíbulo, submeteu-se a um ritual humilhante de destituição das ordens sacras”: paramentaram-no, como se fosse celebrar missa, mas em seguida foi despido das vestes sacerdotais por dois padres. Foi levado para o alto do patíbulo, “de onde pendia a corda da forca”, mas não foi executado. A ingrata missão foi recusada pelos carrascos. Então, por ordem de Francisco Lima e Silva, pai do futuro Duque de Caxias, foi fuzilado.
Fuzilado por ter idéias republicanas, assim como Tiradentes fora esquartejado por ter idéias de libertação.
Era assim que se fazia política. Era assim que os governantes se livravam da oposição.
As asneiras que o Lula diz, as patacoadas do PT e a eleição de uma comunista para presidir um país capitalista, não são coisas tão inomináveis, como as praticadas pelo príncipe D.Pedro, mulherengo e tarado, que até uma freira levou para a cama, e que nunca demonstrou remorso pelo que fez contra sua mulher, a princesa Leopoldina. Grávida, Leopoldina foi agredida por ele, com um pontapé na barriga, porque se negara a participar de uma cerimônia na qual estava presente a amante oficial do príncipe. A consequência da agressão foi um aborto, que lhe causou a morte.
Conclusões: a independência se consolidou com sangue e não com “brados heróicos”; a política, no Brasil, já foi pior do que é.
quarta-feira, 8 de dezembro de 2010
COM A PALAVRA, JANER CRISTALDO
JORNALISTA ANALFABETO ACUSA ATEUS PELOS MALES DO MUNDO
Um apresentador de televisão, truculento e analfabeto, o tal de José Luiz Datena, andou afirmando em julho passado que crime é coisa de pessoas que não acreditam em Deus. “Porque o sujeito que é ateu, na minha modesta opinião, não tem limites, é por isso que a gente vê esses crimes aí”. E continuou em seu discurso sem nexo: “É por isso que o mundo está essa porcaria. Guerra, peste, fome e tudo mais, entendeu? São os caras do mal. Se bem que tem ateu que não é do mal, mas, é ..., o sujeito que não respeita os limites de Deus, é porque não sei, não respeita limite nenhum”.
O pronunciamento do bronco vem agora à tona porque o Ministério Público Federal (MPF) ajuizou ação civil pública obrigando a TV Bandeirantes exibir uma mensagem de retratação de declarações ofensivas aos ateus durante seu programa.
Para o Procurador Regional dos Direitos do Cidadão Jefferson Aparecido Dias, autor da ação, ao veicular as declarações preconceituosas contra pessoas que não compartilham o mesmo modo de pensar do apresentador, a emissora descumpriu a finalidade educativa e informativa, com respeito aos valores éticos e sociais da pessoa, prestou um desserviço para a comunicação social, uma vez que encoraja a atuação de grupos radicais de perseguição de minorias, podendo, inclusive, aumentar a intolerância e a violência contra os ateus. “Evidentemente, houve atitudes extremamente preconceituosas uma vez que as declarações do apresentador e do repórter ofenderam a honra e a imagem das pessoas atéias. O apresentador e o repórter ironizaram, inferiorizaram, imputaram crimes, 'responsabilizaram' os ateus por todas as 'desgraças do mundo'”, afirma o procurador. O procurador revelou-se tão analfabeto quanto o estúpido apresentador. Conhecesse um pouco de história da literatura, teria de processar Dostoievski. E também Sartre, que distorceu o pensamento de Dostoievski. Mais a novel presidenta, que participa do mesmo analfabetismo.
Já comentei, comento de novo. No início deste ano, pretendendo posar de intelectual, Dilma Rousseff, ao falar sobre religião, mencionou os romances de Fiódor Dostoiévski, permeados do conceito de que, "se Deus não existe, tudo é permitido".
A ex-terrorista dificilmente terá lido Dostoievski. Esta frase, atribuída ao escritor russo, é mais uma daquelas bobagens recorrentes – semelhante àquela outra, de que Guernica, de Picasso, tem algo a ver com o suposto bombardeio da cidade basca – que são repetidas ad nauseam por jornalistas. Dona Dilma, na verdade, ouviu o galo cantar, mas não sabe onde.
Os católicos ocidentais adoram empunhar esta deturpação do pensamento do escritor católico ortodoxo. Querem colocar Deus como fundamento de toda ética, como se não pudesse existir ética sem a crença em Deus. Esta frase estaria em Os Irmãos Karamazov. Ora, Dostoievski jamais escreveu isto. Foi Sartre quem lhe atribuiu esta frase. Quem a menciona são geralmente pessoas que nunca leram Dostoievski e o citam de ouvir falar. Há algum tempo atrás, me dei ao trabalho de reler Os Irmãos Karamazov para ver se Dostoievski havia realmente escrito tal bobagem. Não encontrei. O mais próximo que existe é isto: - Ivan Fiodorovitch ajuntou entre parênteses que lá está toda a lei natural, de maneira que se você destrói no homem a fé na sua imortalidade, não somente o amor nele perecerá, mas também a força de continuar a vida no mundo. Mais ainda, não existiria nada mais que fosse imoral; tudo será autorizado, mesmo a antropofagia. E não é tudo: ele acaba afirmando que para todo indivíduo que não crê em Deus nem em sua própria imortalidade, a lei moral da natureza deveria imediamente tornar-se o inverso absoluto da precedente lei religiosa; que o egoísmo, mesmo levado ao crime, deveria não somente ser autorizado, mas reconhecido como uma solução necessária, a mais razoável e quase a mais nobre. Após um tal paradoxo, julgai, senhores, julgai o que nosso caro e excêntrico Ivan Fiodorovitch julga bom proclamar e suas eventuais intenções.
Mais adiante, Mitia se pergunta: - Mas então, que se tornaria o homem, sem Deus e a imortalidade? Tudo é permitido e, conseqüentemente, tudo é lícito? (...) Que fazer, se Deus não existe, se Rakitine tem razão ao pretender que é uma idéia forjada pela humanidade? Neste caso, o homem seria o rei da terra, do universo. Muito bem! Mas como ele seria virtuoso sem Deus?
Ou seja, a pergunta não é exatamente sobre Deus, mas sobre Deus e a imortalidade. Imortalidade significa punições e recompensas. Os teístas querem ver nos personagens de Dostoievski a impossibilidade de uma ética sem Deus. No entanto, o que o autor empunha é a promessa de céu... ou de inferno. O fundamento de sua moral - ou da de Ivan Karamazov, como quisermos - não é exatamente Deus, mas a esperança ou o medo.
O tal de Datena, como a novel presidenta, também ouviu o galo cantar, mas tampouco sabe onde. O promotor muito menos. Os ateus, que certamente estão por trás de tal ação, idem. Qualquer dia ainda pedem a proibição de Os Irmãos Karamazov. Há ateus que estão transformando o ateísmo em religião e se pretendem discriminados. Mais um pouco e pedirão cotas na universidade.
Ateus, se Datena e dona Dilma não sabem, também têm ética. Mais ainda, nossa ética é gratuita e não depende de recompensas no Além. O crente, ao manter um comportamento ético, busca o conforto na imortalidade. Nós, que não cremos nessas patacoadas, não esperamos o paraíso por sermos honestos nem tememos o inferno por não sermos honestos. Somos éticos porque julgamos ser esta a melhor fórmula de conviver com nossos semelhantes.
O analfabetismo, ao que tudo indica, invadiu não apenas o jornalismo, mas também o universo jurídico.
Um apresentador de televisão, truculento e analfabeto, o tal de José Luiz Datena, andou afirmando em julho passado que crime é coisa de pessoas que não acreditam em Deus. “Porque o sujeito que é ateu, na minha modesta opinião, não tem limites, é por isso que a gente vê esses crimes aí”. E continuou em seu discurso sem nexo: “É por isso que o mundo está essa porcaria. Guerra, peste, fome e tudo mais, entendeu? São os caras do mal. Se bem que tem ateu que não é do mal, mas, é ..., o sujeito que não respeita os limites de Deus, é porque não sei, não respeita limite nenhum”.
O pronunciamento do bronco vem agora à tona porque o Ministério Público Federal (MPF) ajuizou ação civil pública obrigando a TV Bandeirantes exibir uma mensagem de retratação de declarações ofensivas aos ateus durante seu programa.
Para o Procurador Regional dos Direitos do Cidadão Jefferson Aparecido Dias, autor da ação, ao veicular as declarações preconceituosas contra pessoas que não compartilham o mesmo modo de pensar do apresentador, a emissora descumpriu a finalidade educativa e informativa, com respeito aos valores éticos e sociais da pessoa, prestou um desserviço para a comunicação social, uma vez que encoraja a atuação de grupos radicais de perseguição de minorias, podendo, inclusive, aumentar a intolerância e a violência contra os ateus. “Evidentemente, houve atitudes extremamente preconceituosas uma vez que as declarações do apresentador e do repórter ofenderam a honra e a imagem das pessoas atéias. O apresentador e o repórter ironizaram, inferiorizaram, imputaram crimes, 'responsabilizaram' os ateus por todas as 'desgraças do mundo'”, afirma o procurador. O procurador revelou-se tão analfabeto quanto o estúpido apresentador. Conhecesse um pouco de história da literatura, teria de processar Dostoievski. E também Sartre, que distorceu o pensamento de Dostoievski. Mais a novel presidenta, que participa do mesmo analfabetismo.
Já comentei, comento de novo. No início deste ano, pretendendo posar de intelectual, Dilma Rousseff, ao falar sobre religião, mencionou os romances de Fiódor Dostoiévski, permeados do conceito de que, "se Deus não existe, tudo é permitido".
A ex-terrorista dificilmente terá lido Dostoievski. Esta frase, atribuída ao escritor russo, é mais uma daquelas bobagens recorrentes – semelhante àquela outra, de que Guernica, de Picasso, tem algo a ver com o suposto bombardeio da cidade basca – que são repetidas ad nauseam por jornalistas. Dona Dilma, na verdade, ouviu o galo cantar, mas não sabe onde.
Os católicos ocidentais adoram empunhar esta deturpação do pensamento do escritor católico ortodoxo. Querem colocar Deus como fundamento de toda ética, como se não pudesse existir ética sem a crença em Deus. Esta frase estaria em Os Irmãos Karamazov. Ora, Dostoievski jamais escreveu isto. Foi Sartre quem lhe atribuiu esta frase. Quem a menciona são geralmente pessoas que nunca leram Dostoievski e o citam de ouvir falar. Há algum tempo atrás, me dei ao trabalho de reler Os Irmãos Karamazov para ver se Dostoievski havia realmente escrito tal bobagem. Não encontrei. O mais próximo que existe é isto: - Ivan Fiodorovitch ajuntou entre parênteses que lá está toda a lei natural, de maneira que se você destrói no homem a fé na sua imortalidade, não somente o amor nele perecerá, mas também a força de continuar a vida no mundo. Mais ainda, não existiria nada mais que fosse imoral; tudo será autorizado, mesmo a antropofagia. E não é tudo: ele acaba afirmando que para todo indivíduo que não crê em Deus nem em sua própria imortalidade, a lei moral da natureza deveria imediamente tornar-se o inverso absoluto da precedente lei religiosa; que o egoísmo, mesmo levado ao crime, deveria não somente ser autorizado, mas reconhecido como uma solução necessária, a mais razoável e quase a mais nobre. Após um tal paradoxo, julgai, senhores, julgai o que nosso caro e excêntrico Ivan Fiodorovitch julga bom proclamar e suas eventuais intenções.
Mais adiante, Mitia se pergunta: - Mas então, que se tornaria o homem, sem Deus e a imortalidade? Tudo é permitido e, conseqüentemente, tudo é lícito? (...) Que fazer, se Deus não existe, se Rakitine tem razão ao pretender que é uma idéia forjada pela humanidade? Neste caso, o homem seria o rei da terra, do universo. Muito bem! Mas como ele seria virtuoso sem Deus?
Ou seja, a pergunta não é exatamente sobre Deus, mas sobre Deus e a imortalidade. Imortalidade significa punições e recompensas. Os teístas querem ver nos personagens de Dostoievski a impossibilidade de uma ética sem Deus. No entanto, o que o autor empunha é a promessa de céu... ou de inferno. O fundamento de sua moral - ou da de Ivan Karamazov, como quisermos - não é exatamente Deus, mas a esperança ou o medo.
O tal de Datena, como a novel presidenta, também ouviu o galo cantar, mas tampouco sabe onde. O promotor muito menos. Os ateus, que certamente estão por trás de tal ação, idem. Qualquer dia ainda pedem a proibição de Os Irmãos Karamazov. Há ateus que estão transformando o ateísmo em religião e se pretendem discriminados. Mais um pouco e pedirão cotas na universidade.
Ateus, se Datena e dona Dilma não sabem, também têm ética. Mais ainda, nossa ética é gratuita e não depende de recompensas no Além. O crente, ao manter um comportamento ético, busca o conforto na imortalidade. Nós, que não cremos nessas patacoadas, não esperamos o paraíso por sermos honestos nem tememos o inferno por não sermos honestos. Somos éticos porque julgamos ser esta a melhor fórmula de conviver com nossos semelhantes.
O analfabetismo, ao que tudo indica, invadiu não apenas o jornalismo, mas também o universo jurídico.
terça-feira, 7 de dezembro de 2010
MEMÓRIA DO JUDICIÁRIO
O "Juiz" de Porto Murtinho
Por Vladimir Passos de Freitas
Belmonte e Amaraí, dois grandes cantores da boa e velha música caipira, com a voz modulada cantavam "Pé de Cedro", e assim começavam "Foi no belo Mato Grosso, há vinte anos atrás, naqueles tempos queridos, que não voltam nunca mais".
Assim também começa a coluna desta semana. No belo Mato Grosso, só que 52 anos atrás. Mais precisamente, em Porto Murtinho, nas barrancas do rio Paraguai, fronteira com a nação hermana, em outubro de 1958.
O estado de Mato Grosso era um só. Enorme, um gigante adormecido. Seus limites iam do Pará, ao norte, ao Paraguai, no sul. Cuiabá, sua capital, era uma distante e provinciana cidade com menos de 60.000 habitantes.
Porto Murtinho dela ficava cerca de 1.050 km, em estrada sem pavimento. Sua população talvez não chegasse a 5.000 habitantes. A viagem era longa e cansativa, sempre a depender das condições do tempo. Era rotina o uso de correntes nas rodas dos carros, balsas para a travessia de rios e animais na pista.
Naquele tempo os candidatos ao cargo de Juiz de Direito eram poucos. Os vencimentos modestos e o isolamento em pequenas cidades desestimulavam os pretendentes. Em muitas comarcas, quem exercia a jurisdição era o Juiz de Paz, leigo em Direito.
É neste panorama que, em 20 de outubro de 1958, chega à cidade de Porto Murtinho Salvador Pacheco. Homem educado, pouco mais de 30 anos de idade, estatura média, moreno, cabelos negros lisos repartidos do lado direito e um bigode à la Carlos Gardel, típico da época.
Apresentou-se no Fórum no dia seguinte e comunicou que pretendia tomar posse em ato solene. Educado e cerimonioso, terno de linho branco, às 15 horas daquele dia, reunidas as autoridades locais, todos trajados convenientemente, Salvador Pacheco apresentou-se como o novo juiz substituto. Recebeu os cumprimentos e lançou-se ao trabalho, demonstrando que não tinha ido a passeio.
Após alguns dias despachando os processos que, bem atrasados, se achavam nos dois cartórios da comarca, convocou o Tribunal do Júri e marcou o dia 24 de novembro para o julgamento de caso rumoroso. Logo se tornou conhecido como o novo juiz e os que com ele cruzavam, nas poucas e vazias ruas da pequena cidade de fronteira, cumprimentavam-no tirando o chapéu, em sinal de respeito.
No dia 30 daquele mês e ano, Salvador Pacheco resolveu ir à vizinha cidade de Jardim, distante algumas horas. Solicitou ao Comandante da Segunda Companhia de Fronteira do Exército uma viatura e motorista, sendo logo atendido. Ao Escrivão do Cartório do 1º ofício, pediu dois revólveres, um para si e outro para o motorista, para eventual necessidade no trajeto. E lá se foi pelas estradas empoeiradas que mais serviam às boiadas do que a veículos.
Em Jardim pediu ao Comandante do C.E.R.-3 outra viatura, para seguir viagem para Aquidauana. Mas daí a sorte abandonou-o.
O Dr. Adolpho Augusto de Barros, que era o Juiz de Direito de Aquidauana, ao tomar conhecimento da presença de Salvador Pacheco comunicou ao Promotor Cesar Froes, de Porto Murtinho: é um impostor. É que o “doutor” já havia feito o mesmo na comarca de Rio Brilhante, próxima de Dourados. A ordem de prisão foi imediata.
O Promotor Froes, no dia 31 de outubro, mandou um ofício ao Delegado de Polícia, Capitão Paulo Xavier, da Polícia Militar, requisitando inquérito policial. Este, no mesmo dia, nomeou Israel Jarbas Vicente Escrivão ad hoc, pois titular não havia. Em tempo recorde o inquérito policial foi enviado ao Fórum.
O representante do Ministério Público, que não devia estar nada contente, porque também foi um dos enganados, ofereceu denúncia no dia 4 de dezembro por usurpação de função pública e estelionato. O Juiz de Paz, na falta de Juiz de Direito despachou no mesmo dia com uma letra caprichada: N. A. a conclusão, ou seja, "nos autos, à conclusão". Todos queriam Justiça o mais rápido possível, certamente sentindo-se envergonhadas vítimas.
O "juiz substituto" foi preso em Nioaque. Com certeza não havia mandado de prisão, mas sim um telegrama. Colocaram-no, sob escolta, em um trem com destino a Campo Grande, que já era a maior cidade do sul do então estado de Mato Grosso.
Aí sobreveio o inesperado. A notícia chegou a Cuiabá e as autoridades previram o que viria depois: uma caçoada geral. Seria uma vergonha para todos os matogrossenses, especialmente ao Poder Judiciário, pois ficariam expostos ao riso de todo o Brasil.
Veio aí a solução, que segundo fontes fidedignas, teria sido dada pelo Dr. Heitor Medeiros, Secretário da Justiça, sugerindo que facilitassem a fuga do "magistrado".
Diz a lenda que a escolta levava Salvador de trem e em uma parada deixou o homem descer para fazer suas necessidades. Ele, ao ver-se sozinho, escapuliu. E o trem seguiu viagem. Concluíram todos que era melhor ele fugir, e o caso ser esquecido, do que ficar preso e expor ao ridículo a Justiça de Mato Grosso. E assim foi feito.
A Ação Penal prosseguiu, citado o réu por edital e ouvidas as oito testemunhas da denúncia, a maior parte delas funcionários do Fórum. Ao final foi julgada procedente, condenado o falso juiz. No entanto, a sentença nunca foi executada. Anos depois, mais exatamente em 5 de abril de 1974, decisão judicial declarava extinta a punibilidade da execução da pena, pela prescrição.
O estado se dividiu em 1 de janeiro de 1979, criou-se o Mato Grosso do Sul, Porto Murtinho cresceu, o mundo ficou pequeno e a internet ligou sua gente ao resto do planeta. O "juiz substituto" Salvador Pacheco tomou rumo ignorado e dele nunca mais se soube. No entanto, na memória do Judiciário do estado ele nunca será esquecido.
Fonte: Consultor Jurídico
Por Vladimir Passos de Freitas
Belmonte e Amaraí, dois grandes cantores da boa e velha música caipira, com a voz modulada cantavam "Pé de Cedro", e assim começavam "Foi no belo Mato Grosso, há vinte anos atrás, naqueles tempos queridos, que não voltam nunca mais".
Assim também começa a coluna desta semana. No belo Mato Grosso, só que 52 anos atrás. Mais precisamente, em Porto Murtinho, nas barrancas do rio Paraguai, fronteira com a nação hermana, em outubro de 1958.
O estado de Mato Grosso era um só. Enorme, um gigante adormecido. Seus limites iam do Pará, ao norte, ao Paraguai, no sul. Cuiabá, sua capital, era uma distante e provinciana cidade com menos de 60.000 habitantes.
Porto Murtinho dela ficava cerca de 1.050 km, em estrada sem pavimento. Sua população talvez não chegasse a 5.000 habitantes. A viagem era longa e cansativa, sempre a depender das condições do tempo. Era rotina o uso de correntes nas rodas dos carros, balsas para a travessia de rios e animais na pista.
Naquele tempo os candidatos ao cargo de Juiz de Direito eram poucos. Os vencimentos modestos e o isolamento em pequenas cidades desestimulavam os pretendentes. Em muitas comarcas, quem exercia a jurisdição era o Juiz de Paz, leigo em Direito.
É neste panorama que, em 20 de outubro de 1958, chega à cidade de Porto Murtinho Salvador Pacheco. Homem educado, pouco mais de 30 anos de idade, estatura média, moreno, cabelos negros lisos repartidos do lado direito e um bigode à la Carlos Gardel, típico da época.
Apresentou-se no Fórum no dia seguinte e comunicou que pretendia tomar posse em ato solene. Educado e cerimonioso, terno de linho branco, às 15 horas daquele dia, reunidas as autoridades locais, todos trajados convenientemente, Salvador Pacheco apresentou-se como o novo juiz substituto. Recebeu os cumprimentos e lançou-se ao trabalho, demonstrando que não tinha ido a passeio.
Após alguns dias despachando os processos que, bem atrasados, se achavam nos dois cartórios da comarca, convocou o Tribunal do Júri e marcou o dia 24 de novembro para o julgamento de caso rumoroso. Logo se tornou conhecido como o novo juiz e os que com ele cruzavam, nas poucas e vazias ruas da pequena cidade de fronteira, cumprimentavam-no tirando o chapéu, em sinal de respeito.
No dia 30 daquele mês e ano, Salvador Pacheco resolveu ir à vizinha cidade de Jardim, distante algumas horas. Solicitou ao Comandante da Segunda Companhia de Fronteira do Exército uma viatura e motorista, sendo logo atendido. Ao Escrivão do Cartório do 1º ofício, pediu dois revólveres, um para si e outro para o motorista, para eventual necessidade no trajeto. E lá se foi pelas estradas empoeiradas que mais serviam às boiadas do que a veículos.
Em Jardim pediu ao Comandante do C.E.R.-3 outra viatura, para seguir viagem para Aquidauana. Mas daí a sorte abandonou-o.
O Dr. Adolpho Augusto de Barros, que era o Juiz de Direito de Aquidauana, ao tomar conhecimento da presença de Salvador Pacheco comunicou ao Promotor Cesar Froes, de Porto Murtinho: é um impostor. É que o “doutor” já havia feito o mesmo na comarca de Rio Brilhante, próxima de Dourados. A ordem de prisão foi imediata.
O Promotor Froes, no dia 31 de outubro, mandou um ofício ao Delegado de Polícia, Capitão Paulo Xavier, da Polícia Militar, requisitando inquérito policial. Este, no mesmo dia, nomeou Israel Jarbas Vicente Escrivão ad hoc, pois titular não havia. Em tempo recorde o inquérito policial foi enviado ao Fórum.
O representante do Ministério Público, que não devia estar nada contente, porque também foi um dos enganados, ofereceu denúncia no dia 4 de dezembro por usurpação de função pública e estelionato. O Juiz de Paz, na falta de Juiz de Direito despachou no mesmo dia com uma letra caprichada: N. A. a conclusão, ou seja, "nos autos, à conclusão". Todos queriam Justiça o mais rápido possível, certamente sentindo-se envergonhadas vítimas.
O "juiz substituto" foi preso em Nioaque. Com certeza não havia mandado de prisão, mas sim um telegrama. Colocaram-no, sob escolta, em um trem com destino a Campo Grande, que já era a maior cidade do sul do então estado de Mato Grosso.
Aí sobreveio o inesperado. A notícia chegou a Cuiabá e as autoridades previram o que viria depois: uma caçoada geral. Seria uma vergonha para todos os matogrossenses, especialmente ao Poder Judiciário, pois ficariam expostos ao riso de todo o Brasil.
Veio aí a solução, que segundo fontes fidedignas, teria sido dada pelo Dr. Heitor Medeiros, Secretário da Justiça, sugerindo que facilitassem a fuga do "magistrado".
Diz a lenda que a escolta levava Salvador de trem e em uma parada deixou o homem descer para fazer suas necessidades. Ele, ao ver-se sozinho, escapuliu. E o trem seguiu viagem. Concluíram todos que era melhor ele fugir, e o caso ser esquecido, do que ficar preso e expor ao ridículo a Justiça de Mato Grosso. E assim foi feito.
A Ação Penal prosseguiu, citado o réu por edital e ouvidas as oito testemunhas da denúncia, a maior parte delas funcionários do Fórum. Ao final foi julgada procedente, condenado o falso juiz. No entanto, a sentença nunca foi executada. Anos depois, mais exatamente em 5 de abril de 1974, decisão judicial declarava extinta a punibilidade da execução da pena, pela prescrição.
O estado se dividiu em 1 de janeiro de 1979, criou-se o Mato Grosso do Sul, Porto Murtinho cresceu, o mundo ficou pequeno e a internet ligou sua gente ao resto do planeta. O "juiz substituto" Salvador Pacheco tomou rumo ignorado e dele nunca mais se soube. No entanto, na memória do Judiciário do estado ele nunca será esquecido.
Fonte: Consultor Jurídico
segunda-feira, 6 de dezembro de 2010
COM A PALAVRA, HUGO CASSEL
AGUAS CALIENTES
A maior preocupação mundial, no momento, embora as medidas aparentemente não sejam levadas muito a sério por alguns segmentos da sociedade humana, é a falta da água. O drama da sede que a imprensa não destaca muito, mas que na Internet chega a arrepiar, podendo num futuro não muito distante liquidar com a vida no planeta. Água é vida. Sem ela nada sobrevive. A água em forma de gelo nas montanhas, está a cada ano menor. Em alguns países da Europa, onde o turismo depende da neve o do gelo, as autoridades estão chegando ao extremo de proteger o gelo com enormes coberturas de plástico para evitar que derretam. No Brasil dezenas de roteiros de turismo têm as águas como atração. Já imaginou o leitor caminhar no leito seco do amazonas? Nenhuma gota caindo das pedras nas cataratas de Iguaçu? Nenhuma gota para extrair do Aqüífero Guarani? Ficção científica ? Nem tanto. Água faz bem à saúde, em todas as suas formas, Gelo, neve, fria ou quente. Em boa hora, a ATHISC ,Associação de Turismo Hidro Mineral de Santa Catarina, desenvolve um programa de divulgação da potencialidade das Estâncias em nosso Estado, líder no Brasil de locais com “Águas Calientes”. Da mais alta qualificação. Vários workshops foram realizados em cidades como Curitiba, Porto Alegre, Gramado, Florianópolis, e Blumenau, destacando a estrutura dos estabelecimentos. O público ficou sabendo tudo de Termas da Guarda, Rio do Pouso, Gravatal, Santa Rosa de Lima, Santo Amaro da Imperatriz, ( a segunda melhor do mundo), Águas Mornas, Piratuba, Itá , Treze tílias, Águas de Chapecó, São Carlos , Palmitos, São João do Oeste e Quilombo, nas quatro regiões do Estado. É preciso porém que tais informações sejam completadas, com a participação de agentes de viagem, montando pacotes “turismo saúde” e mais ainda com Empresas de transporte, para que se saiba “Como Chegar”. Nem todo turista viaja de carro. Muitos , (principalmente idosos) preferem ônibus. O programa pode assim ser otimizado.
GUERRA DO RIO
Nunca antes neste país, como diz o “já vai tarde”, havia acontecido uma conjugação de esforços no sentido de tomar uma atitude drástica contra o desafio continuado da criminalidade, no Rio de Janeiro. Fica aqui o jornalista, a pensar, o que terá acontecido para que de repente, na repetição dos velhos desafios de queimar ônibus, atirar contra as delegacias, e determinar leis para as favelas, as autoridades tolerantes tenham mudado. Quem teria sido prejudicado? Vamos aguardar, pois não se imagine que com a prisão de dezenas de traficantes, apreensão das toneladas de drogas, motos, carros, e valores, o problema esteja resolvido em definitivo. Onde estão as centenas de jovens que fugiram? Vão fazer o que para sobreviver? Assaltos ? Arrastão nas praias? Limpar as favelas é uma medida profilática, temporária, pois o grande desafio se chama Educação e Trabalho, coisa que nenhum governo até agora conseguiu resolver, embora as mentiras dos últimos 8 anos do governo (des) Lula, que preferiu “encher a barriga “ dos pobres ao invés de “encher a cabeça” com educação. O caminho da primeira é o esgoto. Da segunda o sucesso na vida. É bom também lembrar que os chefetes das favelas, são “segundo escalão”, enquanto os verdadeiros chefes moram em São Conrado, Ipanema, Copacabana, e Barra. Continuem pois a ver na TV o ator dizer convictamente: Aqui tem Educação”!
LIXO
Consta que os autores de Novelas da Globo são gays. De todos os lixos que desfilam em horário nobre “Passione” bateu o recorde: Só tem escória moral e social.
A maior preocupação mundial, no momento, embora as medidas aparentemente não sejam levadas muito a sério por alguns segmentos da sociedade humana, é a falta da água. O drama da sede que a imprensa não destaca muito, mas que na Internet chega a arrepiar, podendo num futuro não muito distante liquidar com a vida no planeta. Água é vida. Sem ela nada sobrevive. A água em forma de gelo nas montanhas, está a cada ano menor. Em alguns países da Europa, onde o turismo depende da neve o do gelo, as autoridades estão chegando ao extremo de proteger o gelo com enormes coberturas de plástico para evitar que derretam. No Brasil dezenas de roteiros de turismo têm as águas como atração. Já imaginou o leitor caminhar no leito seco do amazonas? Nenhuma gota caindo das pedras nas cataratas de Iguaçu? Nenhuma gota para extrair do Aqüífero Guarani? Ficção científica ? Nem tanto. Água faz bem à saúde, em todas as suas formas, Gelo, neve, fria ou quente. Em boa hora, a ATHISC ,Associação de Turismo Hidro Mineral de Santa Catarina, desenvolve um programa de divulgação da potencialidade das Estâncias em nosso Estado, líder no Brasil de locais com “Águas Calientes”. Da mais alta qualificação. Vários workshops foram realizados em cidades como Curitiba, Porto Alegre, Gramado, Florianópolis, e Blumenau, destacando a estrutura dos estabelecimentos. O público ficou sabendo tudo de Termas da Guarda, Rio do Pouso, Gravatal, Santa Rosa de Lima, Santo Amaro da Imperatriz, ( a segunda melhor do mundo), Águas Mornas, Piratuba, Itá , Treze tílias, Águas de Chapecó, São Carlos , Palmitos, São João do Oeste e Quilombo, nas quatro regiões do Estado. É preciso porém que tais informações sejam completadas, com a participação de agentes de viagem, montando pacotes “turismo saúde” e mais ainda com Empresas de transporte, para que se saiba “Como Chegar”. Nem todo turista viaja de carro. Muitos , (principalmente idosos) preferem ônibus. O programa pode assim ser otimizado.
GUERRA DO RIO
Nunca antes neste país, como diz o “já vai tarde”, havia acontecido uma conjugação de esforços no sentido de tomar uma atitude drástica contra o desafio continuado da criminalidade, no Rio de Janeiro. Fica aqui o jornalista, a pensar, o que terá acontecido para que de repente, na repetição dos velhos desafios de queimar ônibus, atirar contra as delegacias, e determinar leis para as favelas, as autoridades tolerantes tenham mudado. Quem teria sido prejudicado? Vamos aguardar, pois não se imagine que com a prisão de dezenas de traficantes, apreensão das toneladas de drogas, motos, carros, e valores, o problema esteja resolvido em definitivo. Onde estão as centenas de jovens que fugiram? Vão fazer o que para sobreviver? Assaltos ? Arrastão nas praias? Limpar as favelas é uma medida profilática, temporária, pois o grande desafio se chama Educação e Trabalho, coisa que nenhum governo até agora conseguiu resolver, embora as mentiras dos últimos 8 anos do governo (des) Lula, que preferiu “encher a barriga “ dos pobres ao invés de “encher a cabeça” com educação. O caminho da primeira é o esgoto. Da segunda o sucesso na vida. É bom também lembrar que os chefetes das favelas, são “segundo escalão”, enquanto os verdadeiros chefes moram em São Conrado, Ipanema, Copacabana, e Barra. Continuem pois a ver na TV o ator dizer convictamente: Aqui tem Educação”!
LIXO
Consta que os autores de Novelas da Globo são gays. De todos os lixos que desfilam em horário nobre “Passione” bateu o recorde: Só tem escória moral e social.
sexta-feira, 3 de dezembro de 2010
COM A PALAVRA, JANER CRISTALDO
PERSONAL SEX TRAINER, A MAIS NOVA VIGARICE
Essa agora! Leio na Folha de São Paulo que existe no país uma nova e promissora profissão, a de personal sex trainer. Ou seja, uma profissional que, por módicos 500 reais, dá orientação por uma hora e meia ao casal, para fazer aquilo que se nasce sabendo. O preço da - como direi? – consultoria, pode chegar aos 2500 reais. Uma viagem de ida-e-volta a Paris.
Antes tínhamos sexólogos, vigaristas ao melhor estilo de astrólogos e psicanalistas, que pretendiam ensiná-lo como portar-se na cama. Agora, ao que tudo indica, temos um atendimento mais personalizado. Não sei bem como age a sex trainer, mas suponho que um bom atendimento só pode ser feito ao lado da cama, no momento dos acontecimentos. Agora você tira daqui e põe ali. Me passa um pouquinho isso aí, vou mostrar como se faz. Agora, ponha o dedinho aqui. Mais rápido, por favor. Não concebo de outra forma o exercício da novel profissão. Pelo que li, é mais uma moda que importamos dos States, o tal de sex coaching. Mais um pouco, e teremos sex trainer para cães e gatos. Cachorro também é gente.
Algo que nunca entendi foi a educação sexual nas escolas. Que se ensine a fisiologia do sexo, tudo bem, pouco conhecemos sobre nossos órgãos quando adolescentes. Prevenção contra doenças venéreas, ótimo. Daí a pretender ensinar o know how, me parece uma solene idiotice. Sexo é bom quando o descobrimos sem ter a mínima idéia de como seja, quando mergulhamos no desconhecido com medo e excitação. O grande sexólogo de minha geração foi Carlos Zéfiro, o dos catecismos. Os livrinhos suecos e a policromia roubaram seu mercado, mas suas revistas em quadrinhos foram os guias sexuais dos anos 50 e 60. Havia também A Nossa Vida Sexual, do Fritz Kahn, livro considerado obsceno na época, e que hoje faria morrer de rir um adolescente.
Outro “instrutor” daqueles dias foi Henry Miller. Livros como Trópico de Câncer e Trópico de Capricórnio faziam furor entre adolescentes. Já Primavera Negra, onde nada havia de sexo, pouco vendeu. Os Livros em Minha Vida, um belo ensaio sobre leituras, sequer foi traduzido no Brasil. Miller atribuía seu êxito literário à Segunda Guerra. Os soldados se muniam de seus livros quando iam para o front. Verdade que Miller não vendia apenas pelo erotismo. Além de erotismo, trazia o cotidiano de Paris. E sexo em Paris é sempre mais interessante que sexo em Dom Pedrito.
Sexo é coisa que se aprende sozinho. Por tentativa e erro. Basta um pouco de imaginação para se chegar a grandes achados. Dá prazer? Vamos lá. Na cama só não vale dedo no olho e mandar o parceiro para o hospital.
O repórter da Folha nos fala de uma sex trainer que foi visitar um casal, portando algemas e vibradores. Vibrador até que entendo, é infatigável e vem do fim dos tempos. Do Alto Paleolítico, segundo arqueólogos. Os dildos foram muito populares nas antigas Roma e Grécia. Mas algemas? Que me desculpem os adeptos da prática. Alguém precisa ser muito doente – ou muito idiota – para usar algemas na relação sexual. Não vejo nada de erótico em um parceiro subjugado. Tais práticas, a meu ver, são modas vendidas pelo cinema e televisão. O espectador passa a acreditar que aquilo é excitante. E acaba se excitando. Se lhe passarem a idéia de que uma banana é algo erótico, vai se excitar até em fruteiras.Certa noite, zapeando pela TV a cabo, vi no GNT reportagem sobre uma estranha modalidade sexual. Modalidade ianque, pra variar. Homens e mulheres, devidamente encilhados com selins e estribos, eram cavalgados por seus parceiros. Pode isso excitar alguém? A meu ver, o filme era publicidade disfarçada de artigos de couro. Compre couro e seja sexualmente feliz. Vestes de couro sempre excitam, sei lá porquê. Mas selins? Não entendi.
A nova profissão está provocando ciumeira no mercado. Segundo a reportagem, o papel de treinadores sexuais é questionado por sexólogos, em especial quando envolve aconselhamento de casais. "Elas dão conselhos sem ter nenhuma formação", critica Maria Luiza Macedo de Araújo, presidente da Sociedade Brasileira de Estudos em Sexualidade Humana. A moça está dizendo que, para entender de sexo, é necessário formação. Preferentemente superior. Giacomo Casanova deve estar rindo em sua tumba."Nós lidamos com coisas muito mais complexas do que isso de "beija aqui, põe a mão ali", conselhos que qualquer amigo de bar dá", continua Maria Luiza. Com a diferença que o amigo de bar não cobra nada. E por isso sua orientação não é valorizada. As pessoas não valorizam o que recebem de graça. Apenas o que pagam. Tenho uma amiga que faz psicanálise e não dá valor algum ao que digo. Mas leva em conta o que lhe diz a analista, afinal ela a paga para isso. Mas atenção: a analista nada lhe diz. “Quanto menos ela fala, mais gosto da análise”. Ou seja, as pessoas estão pagando para serem ouvidas. Propus-lhe então que, quando nos encontrássemos, eu permaneceria em silêncio e ela pagava pelo menos o almoço. Não topou. Não tenho formação na área. Uma coisa é o silêncio do analista. Silêncio de leigo é o mesmo, mas não vale nada.
Segundo a psiquiatra Carmita Abdo, do Programa de Estudos em Sexualidade do Hospital das Clínicas, "o trabalho do personal pode ser interessante para casais que têm muita falta de percepção deles mesmos, mas se o problema é uma disfunção sexual ou um conflito psicológico, daí só o terapeuta é que pode resolver". É outra que está preocupada com reserva de mercado. Mais um pouco e a guilda do sexo exigirá formação superior para as consultorias eróticas.
O que me lembra uma colunista de auto-ajuda da Veja, Betty Milan. Sua coluna é feita de respostas a cartas obviamente forjadas, já que todos os missivistas têm o mesmo estilo. Ao relatarem seus problemas sexuais, invariavelmente recebem uma só resposta: procure um terapeuta. O que nos leva a uma pergunta: como conseguiu a humanidade sobreviver às épocas em que não existiam terapeutas, nem mesmo sex trainers?O Brasil é pródigo na criação de profissões inúteis. Somos um dos raros países do mundo onde existem ascensoristas. Como se quem toma um elevador não soubesse apertar um botão. Temos agora profissionais para nos ensinarem – mediante régio pagamento, é claro – a fazer o que nascemos sabendo fazer.
Essa agora! Leio na Folha de São Paulo que existe no país uma nova e promissora profissão, a de personal sex trainer. Ou seja, uma profissional que, por módicos 500 reais, dá orientação por uma hora e meia ao casal, para fazer aquilo que se nasce sabendo. O preço da - como direi? – consultoria, pode chegar aos 2500 reais. Uma viagem de ida-e-volta a Paris.
Antes tínhamos sexólogos, vigaristas ao melhor estilo de astrólogos e psicanalistas, que pretendiam ensiná-lo como portar-se na cama. Agora, ao que tudo indica, temos um atendimento mais personalizado. Não sei bem como age a sex trainer, mas suponho que um bom atendimento só pode ser feito ao lado da cama, no momento dos acontecimentos. Agora você tira daqui e põe ali. Me passa um pouquinho isso aí, vou mostrar como se faz. Agora, ponha o dedinho aqui. Mais rápido, por favor. Não concebo de outra forma o exercício da novel profissão. Pelo que li, é mais uma moda que importamos dos States, o tal de sex coaching. Mais um pouco, e teremos sex trainer para cães e gatos. Cachorro também é gente.
Algo que nunca entendi foi a educação sexual nas escolas. Que se ensine a fisiologia do sexo, tudo bem, pouco conhecemos sobre nossos órgãos quando adolescentes. Prevenção contra doenças venéreas, ótimo. Daí a pretender ensinar o know how, me parece uma solene idiotice. Sexo é bom quando o descobrimos sem ter a mínima idéia de como seja, quando mergulhamos no desconhecido com medo e excitação. O grande sexólogo de minha geração foi Carlos Zéfiro, o dos catecismos. Os livrinhos suecos e a policromia roubaram seu mercado, mas suas revistas em quadrinhos foram os guias sexuais dos anos 50 e 60. Havia também A Nossa Vida Sexual, do Fritz Kahn, livro considerado obsceno na época, e que hoje faria morrer de rir um adolescente.
Outro “instrutor” daqueles dias foi Henry Miller. Livros como Trópico de Câncer e Trópico de Capricórnio faziam furor entre adolescentes. Já Primavera Negra, onde nada havia de sexo, pouco vendeu. Os Livros em Minha Vida, um belo ensaio sobre leituras, sequer foi traduzido no Brasil. Miller atribuía seu êxito literário à Segunda Guerra. Os soldados se muniam de seus livros quando iam para o front. Verdade que Miller não vendia apenas pelo erotismo. Além de erotismo, trazia o cotidiano de Paris. E sexo em Paris é sempre mais interessante que sexo em Dom Pedrito.
Sexo é coisa que se aprende sozinho. Por tentativa e erro. Basta um pouco de imaginação para se chegar a grandes achados. Dá prazer? Vamos lá. Na cama só não vale dedo no olho e mandar o parceiro para o hospital.
O repórter da Folha nos fala de uma sex trainer que foi visitar um casal, portando algemas e vibradores. Vibrador até que entendo, é infatigável e vem do fim dos tempos. Do Alto Paleolítico, segundo arqueólogos. Os dildos foram muito populares nas antigas Roma e Grécia. Mas algemas? Que me desculpem os adeptos da prática. Alguém precisa ser muito doente – ou muito idiota – para usar algemas na relação sexual. Não vejo nada de erótico em um parceiro subjugado. Tais práticas, a meu ver, são modas vendidas pelo cinema e televisão. O espectador passa a acreditar que aquilo é excitante. E acaba se excitando. Se lhe passarem a idéia de que uma banana é algo erótico, vai se excitar até em fruteiras.Certa noite, zapeando pela TV a cabo, vi no GNT reportagem sobre uma estranha modalidade sexual. Modalidade ianque, pra variar. Homens e mulheres, devidamente encilhados com selins e estribos, eram cavalgados por seus parceiros. Pode isso excitar alguém? A meu ver, o filme era publicidade disfarçada de artigos de couro. Compre couro e seja sexualmente feliz. Vestes de couro sempre excitam, sei lá porquê. Mas selins? Não entendi.
A nova profissão está provocando ciumeira no mercado. Segundo a reportagem, o papel de treinadores sexuais é questionado por sexólogos, em especial quando envolve aconselhamento de casais. "Elas dão conselhos sem ter nenhuma formação", critica Maria Luiza Macedo de Araújo, presidente da Sociedade Brasileira de Estudos em Sexualidade Humana. A moça está dizendo que, para entender de sexo, é necessário formação. Preferentemente superior. Giacomo Casanova deve estar rindo em sua tumba."Nós lidamos com coisas muito mais complexas do que isso de "beija aqui, põe a mão ali", conselhos que qualquer amigo de bar dá", continua Maria Luiza. Com a diferença que o amigo de bar não cobra nada. E por isso sua orientação não é valorizada. As pessoas não valorizam o que recebem de graça. Apenas o que pagam. Tenho uma amiga que faz psicanálise e não dá valor algum ao que digo. Mas leva em conta o que lhe diz a analista, afinal ela a paga para isso. Mas atenção: a analista nada lhe diz. “Quanto menos ela fala, mais gosto da análise”. Ou seja, as pessoas estão pagando para serem ouvidas. Propus-lhe então que, quando nos encontrássemos, eu permaneceria em silêncio e ela pagava pelo menos o almoço. Não topou. Não tenho formação na área. Uma coisa é o silêncio do analista. Silêncio de leigo é o mesmo, mas não vale nada.
Segundo a psiquiatra Carmita Abdo, do Programa de Estudos em Sexualidade do Hospital das Clínicas, "o trabalho do personal pode ser interessante para casais que têm muita falta de percepção deles mesmos, mas se o problema é uma disfunção sexual ou um conflito psicológico, daí só o terapeuta é que pode resolver". É outra que está preocupada com reserva de mercado. Mais um pouco e a guilda do sexo exigirá formação superior para as consultorias eróticas.
O que me lembra uma colunista de auto-ajuda da Veja, Betty Milan. Sua coluna é feita de respostas a cartas obviamente forjadas, já que todos os missivistas têm o mesmo estilo. Ao relatarem seus problemas sexuais, invariavelmente recebem uma só resposta: procure um terapeuta. O que nos leva a uma pergunta: como conseguiu a humanidade sobreviver às épocas em que não existiam terapeutas, nem mesmo sex trainers?O Brasil é pródigo na criação de profissões inúteis. Somos um dos raros países do mundo onde existem ascensoristas. Como se quem toma um elevador não soubesse apertar um botão. Temos agora profissionais para nos ensinarem – mediante régio pagamento, é claro – a fazer o que nascemos sabendo fazer.
quinta-feira, 2 de dezembro de 2010
CRÔNICAS IMPUDICAS
HIPOCRISIA (II)
João Eichbaum
Todo mundo sabe que os políticos são hipócritas, enganadores, mentirosos, e muito se fala nisso. Embora, nem adiante falar, porque eles continuam sendo eleitos, dando tapinhas nas costas, vivendo uma boa vida, com tudo pago por quem trabalha, e não tão nem aí pras nossas críticas.
Mas há uma hipocrisia oficial de que poucos se dão conta e sobre a qual muito poucos têm coragem de falar. É a hipocrisia da Igreja Católica, Apostólica, Romana.
Como toda e qualquer religião, a Igreja Católica se aproveita da ignorância e do medo da morte, que domina a maioria absoluta dos seres humanos, para pregar suas idéias e impor suas mentiras, a fim de manter o “status” de seus dirigentes.
E uma das mentiras mais desmentidas é a da “castidade” do clero.
Não é necessário ser sábio, não é necessário ser versado profundamente em biologia para saber da importância que tem o sexo na vida animal. Sem sexo, não há vida. Sem vida, não há sexo.
O sexo tem uma função substancial no sistema fisiológico, é uma exigência biológica tão necessária, quanto a defecação, a expulsão da urina, a fome, a sede, etc. Nem mesmo seres animais com alguma deficiência se livram das exigências do sexo, que são funções precípuas da natureza para a preservação da espécie.
Apesar de todas as evidências, a Igreja Católica, desde priscas eras, teima em tapar o sol com a peneira. Tendo transformado a função sexual em “pecado”, com ameaça de danação ao inferno, se não for exercida dentro do casamento, pretendeu suprimir, pelo medo, essa exigência da natureza. E, não contente com isso, inventou o “voto de castidade”, para homens e mulheres que se querem dedicar à profissão de religiosos.
Sem falar no trauma criado em milhões e milhões de pessoas que, na adolescência, eram obrigadas a reprimir suas funções fisiológicas, a Igreja oficializou sua hipocrisia, ao tentar fazer crer, que o clero, desde o papa ao mais ignoto irmão leigo, é uma casta superior às leis da biologia.
É claro que essa hipocrisia não durou e, desde que foi oficializada, até hoje, vem sendo desmascarada. Não só o atualíssimo livro “I papi ed il sesso”, de Eric Frattini, como muitas outras obras revelam a prática, não só de sexo, mas de orgias inomináveis de papas. À chamada “pedofilia” clerical, que hoje chegou ao conhecimento de todos, não tem como resistir a hipocrisia do “voto de castidade”. Poucos são os dias em que não são tornadas públicas patifarias sexuais de padres, que nem a sacristia respeitam para desafogar o ganso. E a história está cheia de “ilustres” padres que tinham vida sexual ativa, como qualquer homem.
Então, meus amigos, me respondam: essa hipocrisia combina com uma instituição que se diz fundada e protegida por um deus, chamado Jesus Cristo (tu és Pedro e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela)?
João Eichbaum
Todo mundo sabe que os políticos são hipócritas, enganadores, mentirosos, e muito se fala nisso. Embora, nem adiante falar, porque eles continuam sendo eleitos, dando tapinhas nas costas, vivendo uma boa vida, com tudo pago por quem trabalha, e não tão nem aí pras nossas críticas.
Mas há uma hipocrisia oficial de que poucos se dão conta e sobre a qual muito poucos têm coragem de falar. É a hipocrisia da Igreja Católica, Apostólica, Romana.
Como toda e qualquer religião, a Igreja Católica se aproveita da ignorância e do medo da morte, que domina a maioria absoluta dos seres humanos, para pregar suas idéias e impor suas mentiras, a fim de manter o “status” de seus dirigentes.
E uma das mentiras mais desmentidas é a da “castidade” do clero.
Não é necessário ser sábio, não é necessário ser versado profundamente em biologia para saber da importância que tem o sexo na vida animal. Sem sexo, não há vida. Sem vida, não há sexo.
O sexo tem uma função substancial no sistema fisiológico, é uma exigência biológica tão necessária, quanto a defecação, a expulsão da urina, a fome, a sede, etc. Nem mesmo seres animais com alguma deficiência se livram das exigências do sexo, que são funções precípuas da natureza para a preservação da espécie.
Apesar de todas as evidências, a Igreja Católica, desde priscas eras, teima em tapar o sol com a peneira. Tendo transformado a função sexual em “pecado”, com ameaça de danação ao inferno, se não for exercida dentro do casamento, pretendeu suprimir, pelo medo, essa exigência da natureza. E, não contente com isso, inventou o “voto de castidade”, para homens e mulheres que se querem dedicar à profissão de religiosos.
Sem falar no trauma criado em milhões e milhões de pessoas que, na adolescência, eram obrigadas a reprimir suas funções fisiológicas, a Igreja oficializou sua hipocrisia, ao tentar fazer crer, que o clero, desde o papa ao mais ignoto irmão leigo, é uma casta superior às leis da biologia.
É claro que essa hipocrisia não durou e, desde que foi oficializada, até hoje, vem sendo desmascarada. Não só o atualíssimo livro “I papi ed il sesso”, de Eric Frattini, como muitas outras obras revelam a prática, não só de sexo, mas de orgias inomináveis de papas. À chamada “pedofilia” clerical, que hoje chegou ao conhecimento de todos, não tem como resistir a hipocrisia do “voto de castidade”. Poucos são os dias em que não são tornadas públicas patifarias sexuais de padres, que nem a sacristia respeitam para desafogar o ganso. E a história está cheia de “ilustres” padres que tinham vida sexual ativa, como qualquer homem.
Então, meus amigos, me respondam: essa hipocrisia combina com uma instituição que se diz fundada e protegida por um deus, chamado Jesus Cristo (tu és Pedro e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela)?
quarta-feira, 1 de dezembro de 2010
COM A PALAVRA, JANER CRISTALDO
HABEAS FELICITATEM?
Primeiro, foi o Butão, aquele pequeno país isolado no Himalaia, cujo rei, Sua Majestade Jigme Singye Wangchuck – o primeiro marajá da dinastia dos Wangchuk a auto-intitular-se rei – decidiu abandonar os obsoletos índices de Produto Interno Bruto e substitui-lo por um índice de Felicidade Interna Bruta. Abaixo o PIB, viva a FIB. Sua jogada de marketing parece ter agradado às eternas e azedas esquerdas, que acham que PIB não quer dizer nada. Não que acreditem nisso, mas como o PIB das nações capitalistas sempre foi superior ao das socialistas, então o PIB “é do mal”.
Segundo pesquisa feita há quatro anos pelo economista britânico Richard Layard, em Happiness: Lessons From a New Science, a felicidade residiria no reino budista do Butão. Segundo Jigme Singye Wangchuck, quanto mais uma pessoa assiste televisão, menos feliz ela é. A solução então é simples: retire a televisão da sala e suas chances de ser feliz aumentarão. Sua Majestade parece ter conseguido vender ao Ocidente a idéia de que, para a felicidade geral das nações, é melhor renunciar ao presente e encerrar-se nas trevas do passado. Sob o repúdio à televisão, o livro esconde uma tese safada: informação é infelicidade. O PT, penhorado, agradece.
Agora é o Reino Unido, que pretende criar um índice que determinará o maior ou menor grau de felicidade dos súditos de Sua Majestade. Quinta-feira passada, foi lançada uma consulta pública para definir como fazer uma pesquisa para medir o grau de felicidade. O governo quer saber o que torna felizes os cidadãos britânicos. Dinheiro, emprego, saúde, bom relacionamento com amigos e parentes, sensação de que vive num lugar seguro, atividades culturais, meio ambiente preservado...
A universidade de Leicester já havia elaborado, há quatro anos, o que seria o primeiro mapa mundial da felicidade, em um estudo que reuniu 177 países. Segundo este, os dinamarqueses e os suíços são os mais felizes. Depois destes, vêm os cidadãos da Áustria, Islândia, Bahamas, Finlândia e Suécia. Zimbabuanos e burundineses estão nos postos mais baixos e os brasileiros em 81º lugar. Dentro de meu conceito, já não digo de felicidade, que é muito relativo, mas de bem-estar, parece-me um mapa sensato. Que a vida é agradável na Dinamarca e Suíça, disto estou ciente. Que deve ser dura no Zimbábue e Burundi, disto também estou ciente, mesmo sem jamais ter postos os pés naquelas plagas.
Por outro lado, a New Economics Foundation e a ONG Friends of Earth criaram o Happy Planet Index, segundo o qual a felicidade teria estabelecido sua morada no arquipélago de Vanuatu – 83 ilhas no Pacífico, com 209 mil habitantes, na maioria pescadores e agricultores que vivem numa economia pouco além do nível da subsistência. Os vanuatuenses tiveram a melhor média de três indicadores básicos: esperança de vida ao nascer, bem-estar humano e nível dos danos ambientais causados ao país.
Nesse índice, o Brasil ficou em 65º lugar, atrás da Colômbia, da Argentina, do Chile e do Paraguai – até de Bangladesh. Os Estados Unidos ficaram com o 150º lugar, um dos últimos entre 178 países. O Happy Planet Index quer evidenciar que "não é necessário esgotar os recursos naturais da Terra para se ter uma vida relativamente longa e feliz". Seus critérios são, no fundo, um panfleto contra tudo o que de bom o Ocidente oferece.
Os britânicos estão querendo medir o imensurável. Ora, tudo depende de ambições. Certa vez, eu conversava com uma balconista que servia cafezinho no terminal de Cumbica, na Praça da República. É um trabalho duro, oito ou mais horas em pé, no espaço exíguo da cafeteria. Ela estava feliz. “Adoro trabalhar aqui. Se não tivesse este trabalho, estaria no cabo da enxada, na roça”. É o tipo de trabalho que não me faria feliz, e muito menos o leitor. Para ela, era o paraíso.
Minha idéia de felicidade é um pouco mais ampla. Eu me sentiria terrivelmente deprimido se não pudesse ir a Paris quando quero ir a Paris. Conheço não pouca gente que se deprime por muito menos. Porque não tem casa na praia, porque não tem o carro do ano, Com perdão pela obviedade, felicidade é algo muito relativo.
Há quem seja feliz com muito pouco. Há muitos anos, aqui em São Paulo, numa fria madrugada de agosto, vi um mendigo que ria sozinho, atirado na rua, apoiado em uma garrafa de cachaça. “Como eu sou feliz”, dizia. E não seria eu quem duvidaria de que ele fosse feliz. Há quem se sinta desgraçado quando seu time perde um campeonato. E isto ocorre até mesmo com pessoas sem nenhum problema econômico. FIB é relativa. Enquanto que o velho PIB é objetivo e nos dá bons indícios da FIB.
Diria que os britânicos seriam bem mais precisos se medissem os índices de infelicidade. Ser infeliz é algo bem mais preciso. É infeliz toda pessoa que porta doença grave, que está num hospital ou que perdeu amigos ou parentes. Ou que não tem emprego, ou vive acossado por dívidas, ou tem um filho drogado ou criminoso. Isso sem falar que felicidade ou infelicidade são estados cambiantes. Se hoje estou feliz, posso estar profundamente infeliz amanhã. Isso nem depende de condições econômicas, como de fatos totalmente aleatórios, como um acidente ou morte em família. Uma crise econômica pode tornar todo um país infeliz do dia para a noite. Que sentido tem então medir o que muda com os ventos?A moda, pelo jeito, veio para ficar. Segundo os jornais, a idéia foi sugerida pelo Nobel de Economia Joseph Stiglitz, que diz que os países precisam colocar menos ênfase em números de indústria e comércio e mais no efeito que isso provoca na sociedade. França e Canadá também estudam seu índice da felicidade. No Brasil, fomos mais longe. Tramita no Congresso uma proposta de emenda constitucional criando nada menos que o direito à felicidade, do senador Cristovam Buarque. O ócio é a mãe de todos os vícios, dizem as gentes. Tivessem os senadores trabalho com que se ocupar, certamente não estariam propondo bobagens. Se o direito à felicidade é algo garantido por lei, que recursos serão concedidos ao cidadão infeliz? Poderá entrar com um habeas felicitatem contra o Estado?
Primeiro, foi o Butão, aquele pequeno país isolado no Himalaia, cujo rei, Sua Majestade Jigme Singye Wangchuck – o primeiro marajá da dinastia dos Wangchuk a auto-intitular-se rei – decidiu abandonar os obsoletos índices de Produto Interno Bruto e substitui-lo por um índice de Felicidade Interna Bruta. Abaixo o PIB, viva a FIB. Sua jogada de marketing parece ter agradado às eternas e azedas esquerdas, que acham que PIB não quer dizer nada. Não que acreditem nisso, mas como o PIB das nações capitalistas sempre foi superior ao das socialistas, então o PIB “é do mal”.
Segundo pesquisa feita há quatro anos pelo economista britânico Richard Layard, em Happiness: Lessons From a New Science, a felicidade residiria no reino budista do Butão. Segundo Jigme Singye Wangchuck, quanto mais uma pessoa assiste televisão, menos feliz ela é. A solução então é simples: retire a televisão da sala e suas chances de ser feliz aumentarão. Sua Majestade parece ter conseguido vender ao Ocidente a idéia de que, para a felicidade geral das nações, é melhor renunciar ao presente e encerrar-se nas trevas do passado. Sob o repúdio à televisão, o livro esconde uma tese safada: informação é infelicidade. O PT, penhorado, agradece.
Agora é o Reino Unido, que pretende criar um índice que determinará o maior ou menor grau de felicidade dos súditos de Sua Majestade. Quinta-feira passada, foi lançada uma consulta pública para definir como fazer uma pesquisa para medir o grau de felicidade. O governo quer saber o que torna felizes os cidadãos britânicos. Dinheiro, emprego, saúde, bom relacionamento com amigos e parentes, sensação de que vive num lugar seguro, atividades culturais, meio ambiente preservado...
A universidade de Leicester já havia elaborado, há quatro anos, o que seria o primeiro mapa mundial da felicidade, em um estudo que reuniu 177 países. Segundo este, os dinamarqueses e os suíços são os mais felizes. Depois destes, vêm os cidadãos da Áustria, Islândia, Bahamas, Finlândia e Suécia. Zimbabuanos e burundineses estão nos postos mais baixos e os brasileiros em 81º lugar. Dentro de meu conceito, já não digo de felicidade, que é muito relativo, mas de bem-estar, parece-me um mapa sensato. Que a vida é agradável na Dinamarca e Suíça, disto estou ciente. Que deve ser dura no Zimbábue e Burundi, disto também estou ciente, mesmo sem jamais ter postos os pés naquelas plagas.
Por outro lado, a New Economics Foundation e a ONG Friends of Earth criaram o Happy Planet Index, segundo o qual a felicidade teria estabelecido sua morada no arquipélago de Vanuatu – 83 ilhas no Pacífico, com 209 mil habitantes, na maioria pescadores e agricultores que vivem numa economia pouco além do nível da subsistência. Os vanuatuenses tiveram a melhor média de três indicadores básicos: esperança de vida ao nascer, bem-estar humano e nível dos danos ambientais causados ao país.
Nesse índice, o Brasil ficou em 65º lugar, atrás da Colômbia, da Argentina, do Chile e do Paraguai – até de Bangladesh. Os Estados Unidos ficaram com o 150º lugar, um dos últimos entre 178 países. O Happy Planet Index quer evidenciar que "não é necessário esgotar os recursos naturais da Terra para se ter uma vida relativamente longa e feliz". Seus critérios são, no fundo, um panfleto contra tudo o que de bom o Ocidente oferece.
Os britânicos estão querendo medir o imensurável. Ora, tudo depende de ambições. Certa vez, eu conversava com uma balconista que servia cafezinho no terminal de Cumbica, na Praça da República. É um trabalho duro, oito ou mais horas em pé, no espaço exíguo da cafeteria. Ela estava feliz. “Adoro trabalhar aqui. Se não tivesse este trabalho, estaria no cabo da enxada, na roça”. É o tipo de trabalho que não me faria feliz, e muito menos o leitor. Para ela, era o paraíso.
Minha idéia de felicidade é um pouco mais ampla. Eu me sentiria terrivelmente deprimido se não pudesse ir a Paris quando quero ir a Paris. Conheço não pouca gente que se deprime por muito menos. Porque não tem casa na praia, porque não tem o carro do ano, Com perdão pela obviedade, felicidade é algo muito relativo.
Há quem seja feliz com muito pouco. Há muitos anos, aqui em São Paulo, numa fria madrugada de agosto, vi um mendigo que ria sozinho, atirado na rua, apoiado em uma garrafa de cachaça. “Como eu sou feliz”, dizia. E não seria eu quem duvidaria de que ele fosse feliz. Há quem se sinta desgraçado quando seu time perde um campeonato. E isto ocorre até mesmo com pessoas sem nenhum problema econômico. FIB é relativa. Enquanto que o velho PIB é objetivo e nos dá bons indícios da FIB.
Diria que os britânicos seriam bem mais precisos se medissem os índices de infelicidade. Ser infeliz é algo bem mais preciso. É infeliz toda pessoa que porta doença grave, que está num hospital ou que perdeu amigos ou parentes. Ou que não tem emprego, ou vive acossado por dívidas, ou tem um filho drogado ou criminoso. Isso sem falar que felicidade ou infelicidade são estados cambiantes. Se hoje estou feliz, posso estar profundamente infeliz amanhã. Isso nem depende de condições econômicas, como de fatos totalmente aleatórios, como um acidente ou morte em família. Uma crise econômica pode tornar todo um país infeliz do dia para a noite. Que sentido tem então medir o que muda com os ventos?A moda, pelo jeito, veio para ficar. Segundo os jornais, a idéia foi sugerida pelo Nobel de Economia Joseph Stiglitz, que diz que os países precisam colocar menos ênfase em números de indústria e comércio e mais no efeito que isso provoca na sociedade. França e Canadá também estudam seu índice da felicidade. No Brasil, fomos mais longe. Tramita no Congresso uma proposta de emenda constitucional criando nada menos que o direito à felicidade, do senador Cristovam Buarque. O ócio é a mãe de todos os vícios, dizem as gentes. Tivessem os senadores trabalho com que se ocupar, certamente não estariam propondo bobagens. Se o direito à felicidade é algo garantido por lei, que recursos serão concedidos ao cidadão infeliz? Poderá entrar com um habeas felicitatem contra o Estado?
terça-feira, 30 de novembro de 2010
CRÔNICAS IMPUDICAS
HIPOCRISIA
João Eichbaum
A hipocrisia é um dos componentes radicais da estrutura anímica. Todo o animal a cultiva, no mínimo por exigência do instinto de sobrevivência. A tocaia, o ataque inesperado à descuidada vítima, menos por impulso de violência do que por necessidade do alimento, deve ter sido a primeira forma de hipocrisia.
Daí para diante, a dissimulação foi evoluindo à medida que evoluía o primata, esse tipo que desembocou na figura que conhecemos hoje como “homo sapiens”. Nessa evolução, o homem jamais abandonou essa companheira, que faz parte de sua estrutura bio-psicológica e a foi trabalhando, conforme o exigia sua necessidade de sobrevivência, de poder, ou de simples interesse pessoal.
Até que se tornou, em nossos tempos, oficial. Hoje, todo mundo é obrigado a ser hipócrita, como diz Simas, em seu excelente artigo, cheio de humor e verdade, publicado neste blog semana passada: negrão não pode ser chamado de negrão, bicha não pode ser chamado de bicha, sapatão não pode ser chamado de sapatão. Ah e, finalmente, todo o macho está obrigado a se tornar corno manso, porque se der uma surra na mulher que o corneou ele vai parar nas mãos da Maria da Penha.
Sem falar nos direitos humanos, uma das tantas outras hipocrisias, porque tais direitos só alguns os têm: os bandidos. Esses devem ser tratados como “seres humanos” cheios de direitos e prerrogativas, ao contrário das vítimas, de quem, depois de mortas, as autoridades não falam.
Claro que essa hipocrisia oficial só pode vir dos líderes, dos políticos. Ninguém mais hipócrita do que os políticos. A primeira condição para que alguém seja político é que saiba enganar, que saiba ludibriar, que saiba mentir com a maior cara de pau. Depois, o resto todo mundo já sabe: surgem as leis idiotas, as campanhas mentirosas. As leis de trânsito, por exemplo. Você pensa que a exigência do cinto de segurança é, primordialmente, para salvar sua vida? Aqui, ó! A verdadeira intenção do Estado é embolsar a multa. E por aí vai. O Estado mente que cuida de você, para se apossar do seu dinheiro. Porque aquilo que ele devia cuidar, não cuida: saúde, segurança, educação.
Ah, sim, e para não deixar sem comentário mais uma vez a hipocrisia oficial: a operação no Complexo do Alemão, não foi para garantir a segurança da população, mas, sim, para limpar a área e fazer bonito para a Copa do Mundo.
João Eichbaum
A hipocrisia é um dos componentes radicais da estrutura anímica. Todo o animal a cultiva, no mínimo por exigência do instinto de sobrevivência. A tocaia, o ataque inesperado à descuidada vítima, menos por impulso de violência do que por necessidade do alimento, deve ter sido a primeira forma de hipocrisia.
Daí para diante, a dissimulação foi evoluindo à medida que evoluía o primata, esse tipo que desembocou na figura que conhecemos hoje como “homo sapiens”. Nessa evolução, o homem jamais abandonou essa companheira, que faz parte de sua estrutura bio-psicológica e a foi trabalhando, conforme o exigia sua necessidade de sobrevivência, de poder, ou de simples interesse pessoal.
Até que se tornou, em nossos tempos, oficial. Hoje, todo mundo é obrigado a ser hipócrita, como diz Simas, em seu excelente artigo, cheio de humor e verdade, publicado neste blog semana passada: negrão não pode ser chamado de negrão, bicha não pode ser chamado de bicha, sapatão não pode ser chamado de sapatão. Ah e, finalmente, todo o macho está obrigado a se tornar corno manso, porque se der uma surra na mulher que o corneou ele vai parar nas mãos da Maria da Penha.
Sem falar nos direitos humanos, uma das tantas outras hipocrisias, porque tais direitos só alguns os têm: os bandidos. Esses devem ser tratados como “seres humanos” cheios de direitos e prerrogativas, ao contrário das vítimas, de quem, depois de mortas, as autoridades não falam.
Claro que essa hipocrisia oficial só pode vir dos líderes, dos políticos. Ninguém mais hipócrita do que os políticos. A primeira condição para que alguém seja político é que saiba enganar, que saiba ludibriar, que saiba mentir com a maior cara de pau. Depois, o resto todo mundo já sabe: surgem as leis idiotas, as campanhas mentirosas. As leis de trânsito, por exemplo. Você pensa que a exigência do cinto de segurança é, primordialmente, para salvar sua vida? Aqui, ó! A verdadeira intenção do Estado é embolsar a multa. E por aí vai. O Estado mente que cuida de você, para se apossar do seu dinheiro. Porque aquilo que ele devia cuidar, não cuida: saúde, segurança, educação.
Ah, sim, e para não deixar sem comentário mais uma vez a hipocrisia oficial: a operação no Complexo do Alemão, não foi para garantir a segurança da população, mas, sim, para limpar a área e fazer bonito para a Copa do Mundo.
segunda-feira, 29 de novembro de 2010
COM A PALAVRA, JANER CRISTALDO
QUE TAL NAPALM?-
A que ponto chegamos... – me dizia um companheiro de boteco, a propósito dos recentes acontecimentos no Rio. Não me parece que seja o comentário mais pertinente. A meu ver, uma pergunta se impõe: como é que chegamos a esse ponto? E a resposta não me parece exigir argúcias de sociólogo ou urbanista.
Há um erro fundamental na concepção do Rio. Normalmente, os pontos mais privilegiados de uma geografia são de uso exclusivo dos ricos. Não sei se por falta de visão, ou talvez por preguiça, o carioca não quis subir o morro. Entregou-o às favelas. Que ficaram numa posição estratégica para atacar a cidade.
Todo brasileiro que um dia passou pela Costa Amalfitana, na Itália, terá tido uma estranha sensação de déjà-vu. Amalfi, Positano, Maiori, Minori, Ravello, nos remetem imediatamente aos morros cariocas. Com pelo menos duas diferenças. Para começar, quem os ocupa não é uma massa de miseráveis, mas uma elite endinheirada. Continuando, são cidades de lazer e trabalho, e não bantustões onde impera o tráfico de drogas.
O Rio nasceu errado. Não bastasse nascer errada, a cidade continuou torta existência afora. Lá surgiu, mais do que em nenhuma outra cidade do Brasil, uma convivência amistosa entre o lícito e o ilícito, entre a vida honesta e a criminalidade. O bicheiro é um personagem folclórico, que merece um tapinha nas costas, e os barões do bicho são personagens beneméritos que patrocinam desfiles de carnaval. Os traficantes assumiram brechas deixadas pelo Estado ou pela sociedade organizada e assumiram até mesmo a distribuição de luz ou gás nas favelas.Tudo isso contribui para um exótico modus vivendi, onde uma tênue fímbria separa o mundo do trabalho do mundo do crime. Para encanto dos europeus. Para um francês ou italiano, vir ao Brasil e não visitar a favela é como ir a Roma e não ver o papa. A bandidagem sabe disso e criou corredores especiais para uso de turistas. Quem organiza o turismo no morro não é o Estado, mas o tráfico. A polícia, particularmente durante o governo Brizola, participou de um afável acordo não de cavaleiros, mas de bandoleiros. Eu finjo que reprimo o tráfico, você finge que não vende drogas. Por favor, seja discreto na hora de entregar a muamba. No Rio, até o Cristo faz que não vê o que acontece sob seu olhar complacente.
Os grandes conflitos no Rio, de modo geral, não ocorrem entre polícia e bandidos, como seria a ordem natural das coisas, mas entre bandidos e bandidos, pela conquista de territórios. Em um país em que o desarmamento é imposição legal, os soldados do tráfico desfilam com a nonchalance dos justos, armados de fuzis que nem a polícia possui. Vai daí que um dia o Estado inventa de retomar o poder que deveria exercer e nunca exerceu. Tarde demais. A bandidagem reivindica usucapião. Durante muito tempo se discutiu se o poder paralelo das favelas deveria ser combatido pelas Forças Armadas. E durante muito tempo a resposta foi não. Não é função das Forças Armadas. A função das Forças Armadas é combater o inimigo externo. No Haiti, sim. Lá o Exército Nacional colabora voluntariamente na repressão ao crime. No Brasil, não é sua função. Talvez tenha sido esta intervenção no Haiti o que levou, finalmente, nossas autoridades militares a olhar para o descalabro dos morros.
Outro argumento é que soldados não estão preparados para combater o tráfico e podem ser contaminados pelo mesmo. Se assim se pensava ano passado, hoje assim não se pensa mais. Se estão ou não preparados, se serão ou não contaminados, só o futuro dirá. O que está acontecendo hoje no Rio é mais ou menos o que aconteceu na casbá de Argel, no final dos 50. Por razões diferentes, é claro. Estamos em plena guerrilha urbana e, cá com meus botões, me pergunto se guerrilha urbana se combate com tanques. O que as Forças Armadas têm feito por enquanto é expulsar a bandidagem de uma favela para outra. Segundo os jornais, há hoje seiscentos traficantes encurralados no morro do Alemão. Serão presos esses seiscentos? Me permito duvidar.
Outra peculiaridade nossa é que os generais do tráfico comandam a guerrilha de dentro... dos presídios. As ordens para ataques criminosos partiram dos traficantes Márcio Santos Nepomuceno, o Marcinho VP, e Elias Pereira da Silva, o Elias Maluco, de dentro do presídio federal de segurança máxima de Catanduvas (PR), afirma a Justiça do Rio. Os generais do tráfico sequer correm o risco de seus soldados. O estado maior esta protegido em presídios de segurança máxima. Os soldados estão sujeitos a chuvas (de bala) e trovoadas.Seus ordenanças são advogados, normalmente inscritos na Ordem dos Advogados do Brasil. Que esperança de vitória pode alimentar o Estado quando advogados são estafetas do alto comando da droga?Jornais e televisão estão saudando a investida das Forças Armadas como o dia D da guerra contra o tráfico, numa alusão ao desembarque das tropas aliadas na Normandia. Santa ilusão. Um batalhão de bandidos foi expulso de um morro para o outro e há centenas de morros no Rio, todos dominados pelo tráfico. Ficarão os militares permanentemente nos morros que estão ocupando? Claro que não ficarão. Quando saírem, a turma volta.
Mal o Estado marca um mísero pontinho na luta contra o tráfego, os incondicionais defensores dos tais de direitos humanos saem de suas confortáveis tocas. A Anistia Internacional criticou ontem em nota a atuação da polícia no Rio. Disse que a reação aos ataques do tráfico está colocando comunidades em risco e pode acabar em carnificina. Sob o título "violência no Rio de Janeiro condenada", a nota clama para que "as autoridades brasileiras ajam dentro da lei na resposta à onda de violência".
O guerrilheiro nada como um peixe no mar do povo, dizia Mao. Parafraseando o Grande Timoneiro: o traficante nada como um peixe no mar da favela. Há solução para o problema no tráfico no Rio? Eu diria que há, e são duas. A primeira é elementar. Legaliza-se de vez a droga e, no dia seguinte, sem um tiro sequer, não existe tráfico algum no país. A outra é um pouco mais polêmica: napalm.
Mas aí a Anistia Internacional vai chiar.
A que ponto chegamos... – me dizia um companheiro de boteco, a propósito dos recentes acontecimentos no Rio. Não me parece que seja o comentário mais pertinente. A meu ver, uma pergunta se impõe: como é que chegamos a esse ponto? E a resposta não me parece exigir argúcias de sociólogo ou urbanista.
Há um erro fundamental na concepção do Rio. Normalmente, os pontos mais privilegiados de uma geografia são de uso exclusivo dos ricos. Não sei se por falta de visão, ou talvez por preguiça, o carioca não quis subir o morro. Entregou-o às favelas. Que ficaram numa posição estratégica para atacar a cidade.
Todo brasileiro que um dia passou pela Costa Amalfitana, na Itália, terá tido uma estranha sensação de déjà-vu. Amalfi, Positano, Maiori, Minori, Ravello, nos remetem imediatamente aos morros cariocas. Com pelo menos duas diferenças. Para começar, quem os ocupa não é uma massa de miseráveis, mas uma elite endinheirada. Continuando, são cidades de lazer e trabalho, e não bantustões onde impera o tráfico de drogas.
O Rio nasceu errado. Não bastasse nascer errada, a cidade continuou torta existência afora. Lá surgiu, mais do que em nenhuma outra cidade do Brasil, uma convivência amistosa entre o lícito e o ilícito, entre a vida honesta e a criminalidade. O bicheiro é um personagem folclórico, que merece um tapinha nas costas, e os barões do bicho são personagens beneméritos que patrocinam desfiles de carnaval. Os traficantes assumiram brechas deixadas pelo Estado ou pela sociedade organizada e assumiram até mesmo a distribuição de luz ou gás nas favelas.Tudo isso contribui para um exótico modus vivendi, onde uma tênue fímbria separa o mundo do trabalho do mundo do crime. Para encanto dos europeus. Para um francês ou italiano, vir ao Brasil e não visitar a favela é como ir a Roma e não ver o papa. A bandidagem sabe disso e criou corredores especiais para uso de turistas. Quem organiza o turismo no morro não é o Estado, mas o tráfico. A polícia, particularmente durante o governo Brizola, participou de um afável acordo não de cavaleiros, mas de bandoleiros. Eu finjo que reprimo o tráfico, você finge que não vende drogas. Por favor, seja discreto na hora de entregar a muamba. No Rio, até o Cristo faz que não vê o que acontece sob seu olhar complacente.
Os grandes conflitos no Rio, de modo geral, não ocorrem entre polícia e bandidos, como seria a ordem natural das coisas, mas entre bandidos e bandidos, pela conquista de territórios. Em um país em que o desarmamento é imposição legal, os soldados do tráfico desfilam com a nonchalance dos justos, armados de fuzis que nem a polícia possui. Vai daí que um dia o Estado inventa de retomar o poder que deveria exercer e nunca exerceu. Tarde demais. A bandidagem reivindica usucapião. Durante muito tempo se discutiu se o poder paralelo das favelas deveria ser combatido pelas Forças Armadas. E durante muito tempo a resposta foi não. Não é função das Forças Armadas. A função das Forças Armadas é combater o inimigo externo. No Haiti, sim. Lá o Exército Nacional colabora voluntariamente na repressão ao crime. No Brasil, não é sua função. Talvez tenha sido esta intervenção no Haiti o que levou, finalmente, nossas autoridades militares a olhar para o descalabro dos morros.
Outro argumento é que soldados não estão preparados para combater o tráfico e podem ser contaminados pelo mesmo. Se assim se pensava ano passado, hoje assim não se pensa mais. Se estão ou não preparados, se serão ou não contaminados, só o futuro dirá. O que está acontecendo hoje no Rio é mais ou menos o que aconteceu na casbá de Argel, no final dos 50. Por razões diferentes, é claro. Estamos em plena guerrilha urbana e, cá com meus botões, me pergunto se guerrilha urbana se combate com tanques. O que as Forças Armadas têm feito por enquanto é expulsar a bandidagem de uma favela para outra. Segundo os jornais, há hoje seiscentos traficantes encurralados no morro do Alemão. Serão presos esses seiscentos? Me permito duvidar.
Outra peculiaridade nossa é que os generais do tráfico comandam a guerrilha de dentro... dos presídios. As ordens para ataques criminosos partiram dos traficantes Márcio Santos Nepomuceno, o Marcinho VP, e Elias Pereira da Silva, o Elias Maluco, de dentro do presídio federal de segurança máxima de Catanduvas (PR), afirma a Justiça do Rio. Os generais do tráfico sequer correm o risco de seus soldados. O estado maior esta protegido em presídios de segurança máxima. Os soldados estão sujeitos a chuvas (de bala) e trovoadas.Seus ordenanças são advogados, normalmente inscritos na Ordem dos Advogados do Brasil. Que esperança de vitória pode alimentar o Estado quando advogados são estafetas do alto comando da droga?Jornais e televisão estão saudando a investida das Forças Armadas como o dia D da guerra contra o tráfico, numa alusão ao desembarque das tropas aliadas na Normandia. Santa ilusão. Um batalhão de bandidos foi expulso de um morro para o outro e há centenas de morros no Rio, todos dominados pelo tráfico. Ficarão os militares permanentemente nos morros que estão ocupando? Claro que não ficarão. Quando saírem, a turma volta.
Mal o Estado marca um mísero pontinho na luta contra o tráfego, os incondicionais defensores dos tais de direitos humanos saem de suas confortáveis tocas. A Anistia Internacional criticou ontem em nota a atuação da polícia no Rio. Disse que a reação aos ataques do tráfico está colocando comunidades em risco e pode acabar em carnificina. Sob o título "violência no Rio de Janeiro condenada", a nota clama para que "as autoridades brasileiras ajam dentro da lei na resposta à onda de violência".
O guerrilheiro nada como um peixe no mar do povo, dizia Mao. Parafraseando o Grande Timoneiro: o traficante nada como um peixe no mar da favela. Há solução para o problema no tráfico no Rio? Eu diria que há, e são duas. A primeira é elementar. Legaliza-se de vez a droga e, no dia seguinte, sem um tiro sequer, não existe tráfico algum no país. A outra é um pouco mais polêmica: napalm.
Mas aí a Anistia Internacional vai chiar.
sexta-feira, 26 de novembro de 2010
CRÔNICAS CIBERNÉTICAS
EU TENHO BLOG!!
PAULO WAINBERG
http://paulowainberg.wordpress.com
Twitter.com/paulowainberg
Já posso me equiparar à uma criança de dez anos.
Nem imaginam como estou feliz.
Não, não estou me exibindo nem me gabando, jamais serei capaz de fazer o que ela faz, está além das minhas capacidades mentais, das físicas nem se fala.
Você deve ter percebido acima que, além de twitter, agora eu tenho um blog.
Isto mesmo, rapaz, eu tenho um blog!
Eu sei que você caiu de quatro, deve estar abismado e se perguntando:
– Como, ele fez um blog? O gênio cibernético que, quando lhe falaram em vírus de computador pela primeira vez, ficou com medo de entrar na sala para não ser infectado, fez um blog?
Respondo: Estou dizendo que tenho um blog, não que fiz um.
Sou um cara de sorte e possuo duas fadas madrinhas e um poltergeist do bem cuidando da minha vida literária.
A Tainã Bispo e o Gabriel Martins, da Editora Leya, me adotaram, cuidam de mim como seu eu fosse uma salada de berinjela ou um prato de azeitonas recheadas. E a Luciana Thomé, codinome Lu Thomé, que me assumiu como agente, divulgadora, organizadora e tudo o mais que se refira à minha carreira literária. Por ser uma agente é que ela tem um codinome. Há quem a chame de Lurdes, mas isso é questão de gosto.
Bom, essas três pessoas me introduziram no encantado mundo dos twitter e dos blogues sendo que neste último universo, apesar da boa vontade do Gabriel, que me passou um explicadíssimo negócio repleto de botões para eu fazer isto, aquilo e muito mais no meu blog, não ousei clicar em nenhum, com medo de que algo terrível aconteça do qual eu jamais me recupere.
No twitter, embora não entenda o funcionamento, faço as coisas sozinho, venço meus receios. O blog, a Lu Thomé (uso o codinome para não revelar sua identidade), tomou conta, tudo o que você encontrar lá é responsabilidade dela.
O facebook é por minha conta.
Sendo assim, doravante você lerá minhas crônicas no meu blog que, para quem não leu lá em cima, repito: HTTP://PAULOWAINBERG.WORDPRESS.COM, só que tudo em letra minúscula! Não vá se enganar.
Esta nova tecnologia, que passo a utilizar, traz a você a grande vantagem de não precisar ler nada meu, sobretudo as crônicas que fico enviando, toda a semana. Basta não entrar no meu blog, entendeu?
Infelizmente, e isto não posso evitar ainda, talvez quando eu alcançar a idade mental de 15 anos eu consiga, você vai receber a informação, no seu email, sobre novas postagens (no meu tempo postagem era enviar carta pelo correio), novas crônicas, textos, comentários e outras cositas más que se colocam, dizem, nos blogues.
Ah, a Lu me informou que vai postar também crônicas antigas, assim, não entrando no meu blog você poderá não ler várias coisas minhas, atuais e antigas.
O mais espetacular é que, caso você entre, poderá deixar mensagens, já pensou? Eu acho isso o máximo, deixar mensagens em blogues. Agora que tenho um, vou começar a fazer isto no dos outros.
Bem, é isto. Tenha respeito comigo, doravante. Afinal, eu uso essas coisas e poderia ser teu filho.
PAULO WAINBERG
http://paulowainberg.wordpress.com
Twitter.com/paulowainberg
Já posso me equiparar à uma criança de dez anos.
Nem imaginam como estou feliz.
Não, não estou me exibindo nem me gabando, jamais serei capaz de fazer o que ela faz, está além das minhas capacidades mentais, das físicas nem se fala.
Você deve ter percebido acima que, além de twitter, agora eu tenho um blog.
Isto mesmo, rapaz, eu tenho um blog!
Eu sei que você caiu de quatro, deve estar abismado e se perguntando:
– Como, ele fez um blog? O gênio cibernético que, quando lhe falaram em vírus de computador pela primeira vez, ficou com medo de entrar na sala para não ser infectado, fez um blog?
Respondo: Estou dizendo que tenho um blog, não que fiz um.
Sou um cara de sorte e possuo duas fadas madrinhas e um poltergeist do bem cuidando da minha vida literária.
A Tainã Bispo e o Gabriel Martins, da Editora Leya, me adotaram, cuidam de mim como seu eu fosse uma salada de berinjela ou um prato de azeitonas recheadas. E a Luciana Thomé, codinome Lu Thomé, que me assumiu como agente, divulgadora, organizadora e tudo o mais que se refira à minha carreira literária. Por ser uma agente é que ela tem um codinome. Há quem a chame de Lurdes, mas isso é questão de gosto.
Bom, essas três pessoas me introduziram no encantado mundo dos twitter e dos blogues sendo que neste último universo, apesar da boa vontade do Gabriel, que me passou um explicadíssimo negócio repleto de botões para eu fazer isto, aquilo e muito mais no meu blog, não ousei clicar em nenhum, com medo de que algo terrível aconteça do qual eu jamais me recupere.
No twitter, embora não entenda o funcionamento, faço as coisas sozinho, venço meus receios. O blog, a Lu Thomé (uso o codinome para não revelar sua identidade), tomou conta, tudo o que você encontrar lá é responsabilidade dela.
O facebook é por minha conta.
Sendo assim, doravante você lerá minhas crônicas no meu blog que, para quem não leu lá em cima, repito: HTTP://PAULOWAINBERG.WORDPRESS.COM, só que tudo em letra minúscula! Não vá se enganar.
Esta nova tecnologia, que passo a utilizar, traz a você a grande vantagem de não precisar ler nada meu, sobretudo as crônicas que fico enviando, toda a semana. Basta não entrar no meu blog, entendeu?
Infelizmente, e isto não posso evitar ainda, talvez quando eu alcançar a idade mental de 15 anos eu consiga, você vai receber a informação, no seu email, sobre novas postagens (no meu tempo postagem era enviar carta pelo correio), novas crônicas, textos, comentários e outras cositas más que se colocam, dizem, nos blogues.
Ah, a Lu me informou que vai postar também crônicas antigas, assim, não entrando no meu blog você poderá não ler várias coisas minhas, atuais e antigas.
O mais espetacular é que, caso você entre, poderá deixar mensagens, já pensou? Eu acho isso o máximo, deixar mensagens em blogues. Agora que tenho um, vou começar a fazer isto no dos outros.
Bem, é isto. Tenha respeito comigo, doravante. Afinal, eu uso essas coisas e poderia ser teu filho.
quinta-feira, 25 de novembro de 2010
O CRAVO NÃO BRIGOU COM A ROSA
Luiz Antonio Simas,
mestre em História Social pela UFRJ
e professor de História do ensino médio.
Desenvolve pesquisas sobre a cultura popular carioca.
Chegamos ao limite da insanidade da onda do politicamente correto. Soube dia desses que as crianças, nas creches e escolas, não cantam mais O cravo brigou com a rosa. A explicação da professora do filho de um camarada foi comovente: a briga entre o cravo - o homem - e a rosa - a mulher - estimula a violência entre os casais. Na nova letra "o cravo encontrou a rosa/ debaixo de uma sacada/o cravo ficou feliz /e a rosa ficou encantada".
Que diabos é isso? O próximo passo é enquadrar o cravo na Lei Maria da Penha. Será que esses doidos sabem que O cravo brigou com a rosa faz parte de uma suíte de 16 peças que Villa Lobos criou a partir de temas recolhidos no folclore brasileiro?É Villa Lobos, cacete!Outra música infantil que mudou de letra foi Samba Lelê. Na versão da minha infância o negócio era o seguinte: Samba Lelê tá doente/ Tá com a cabeça quebrada/ Samba Lelê precisava/ É de umas boas palmadas. A palmada na bunda está proibida. Incita a violência contra a menina Lelê. A tia do maternal agora ensina assim: Samba Lelê tá doente/ Com uma febre malvada/ Assim que a febre passar/ A Lelê vai estudar.Se eu fosse a Lelê, com uma versão dessas, torcia pra febre não passar nunca. Os amigos sabem de quem é Samba Lelê? Villa Lobos de novo. Podiam até registrar a parceria. Ficaria assim: Samba Lelê, de Heitor Villa Lobos e Tia Nilda do Jardim Escola Criança Feliz.
Comunico também que não se pode mais atirar o pau no gato, já que a música desperta nas crianças o desejo de maltratar os bichinhos. Quem entra na roda dança, nos dias atuais, não pode mais ter sete namorados para se casar com um. Sete namorados é coisa de menina fácil. Ninguém mais é pobre ou rico de marré-de-si, para não despertar na garotada o sentido da desigualdade social entre os homens.
Dia desses alguém [não me lembro exatamente quem se saiu com essa e não procurei a referência no meu babalorixá virtual, Pai Google da Aruanda] foi espinafrado porque disse que ecologia era, nos anos setenta, coisa de viado. Qual é o problema da frase? Ecologia, de fato, era vista como coisa de viado. Eu imagino se meu avô, com a alma de cangaceiro que possuía, soubesse, em mil novecentos e setenta e poucos, que algum filho estava militando na causa da preservação do mico leão dourado, em defesa das bromélias ou coisa que o valha. Bicha louca, diria o velho.Vivemos tempos de não me toques que eu magôo. Quer dizer que ninguém mais pode usar a expressão coisa de viado ? Que me desculpem os paladinos da cartilha da correção, mas isso é uma tremenda babaquice. O politicamente correto é a sepultura do bom humor, da criatividade, da boa sacanagem. A expressão coisa de viado não é, nem a pau (sem duplo sentido), ofensa a bicha alguma.
Daqui a pouco só chamaremos o anão - o popular pintor de roda-pé ou leão de chácara de baile infantil - de deficiente vertical . O crioulo - vulgo picolé de asfalto ou bola sete (depende do peso) - só pode ser chamado de afrodescendente. O branquelo - o famoso branco azedo ou Omo total - é um cidadão caucasiano desprovido de pigmentação mais evidente. A mulher feia - aquela que nasceu pelo avesso, a soldado do quinto batalhão de artilharia pesada, também conhecida como o rascunho do mapa do inferno - é apenas a dona de um padrão divergente dos preceitos estéticos da contemporaneidade. O gordo - outrora conhecido como rolha de poço, chupeta do Vesúvio, Orca, baleia assassina e bujão - é o cidadão que está fora do peso ideal. O magricela não pode ser chamado de morto de fome, pau de virar tripa e Olívia Palito. O careca não é mais o aeroporto de mosquito, tobogã de piolho e pouca telha.
Nas aulas sobre o barroco mineiro, não poderei mais citar o Aleijadinho. Direi o seguinte: o escultor Antônio Francisco Lisboa tinha necessidades especiais... Não dá. O politicamente correto também gera a morte do apelido, essa tradição fabulosa do Brasil.
O recente Estatuto do Torcedor quer, com os olhos gordos na Copa e 2014, disciplinar as manifestações das torcidas de futebol. Ao invés de mandar o juiz pra putaqueopariu e o centroavante pereba tomar no olho do cu, cantaremos nas arquibancadas o allegro da Nona Sinfonia de Beethoven, entremeado pelo coro de Jesus, alegria dos homens, do velho Bach.
Falei em velho Bach e me lembrei de outra. A velhice não existe mais. O sujeito cheio de pelancas, doente, acabado, o famoso pé na cova, aquele que dobrou o Cabo da Boa Esperança, o cliente do seguro funeral, o popular tá mais pra lá do que pra cá, já tem motivos para sorrir na beira da sepultura. A velhice agora é simplesmente a "melhor idade".Se Deus quiser morreremos, todos, gozando da mais perfeita saúde.
Defuntos? Não. Seremos os inquilinos do condomínio Cidade do pé junto.
mestre em História Social pela UFRJ
e professor de História do ensino médio.
Desenvolve pesquisas sobre a cultura popular carioca.
Chegamos ao limite da insanidade da onda do politicamente correto. Soube dia desses que as crianças, nas creches e escolas, não cantam mais O cravo brigou com a rosa. A explicação da professora do filho de um camarada foi comovente: a briga entre o cravo - o homem - e a rosa - a mulher - estimula a violência entre os casais. Na nova letra "o cravo encontrou a rosa/ debaixo de uma sacada/o cravo ficou feliz /e a rosa ficou encantada".
Que diabos é isso? O próximo passo é enquadrar o cravo na Lei Maria da Penha. Será que esses doidos sabem que O cravo brigou com a rosa faz parte de uma suíte de 16 peças que Villa Lobos criou a partir de temas recolhidos no folclore brasileiro?É Villa Lobos, cacete!Outra música infantil que mudou de letra foi Samba Lelê. Na versão da minha infância o negócio era o seguinte: Samba Lelê tá doente/ Tá com a cabeça quebrada/ Samba Lelê precisava/ É de umas boas palmadas. A palmada na bunda está proibida. Incita a violência contra a menina Lelê. A tia do maternal agora ensina assim: Samba Lelê tá doente/ Com uma febre malvada/ Assim que a febre passar/ A Lelê vai estudar.Se eu fosse a Lelê, com uma versão dessas, torcia pra febre não passar nunca. Os amigos sabem de quem é Samba Lelê? Villa Lobos de novo. Podiam até registrar a parceria. Ficaria assim: Samba Lelê, de Heitor Villa Lobos e Tia Nilda do Jardim Escola Criança Feliz.
Comunico também que não se pode mais atirar o pau no gato, já que a música desperta nas crianças o desejo de maltratar os bichinhos. Quem entra na roda dança, nos dias atuais, não pode mais ter sete namorados para se casar com um. Sete namorados é coisa de menina fácil. Ninguém mais é pobre ou rico de marré-de-si, para não despertar na garotada o sentido da desigualdade social entre os homens.
Dia desses alguém [não me lembro exatamente quem se saiu com essa e não procurei a referência no meu babalorixá virtual, Pai Google da Aruanda] foi espinafrado porque disse que ecologia era, nos anos setenta, coisa de viado. Qual é o problema da frase? Ecologia, de fato, era vista como coisa de viado. Eu imagino se meu avô, com a alma de cangaceiro que possuía, soubesse, em mil novecentos e setenta e poucos, que algum filho estava militando na causa da preservação do mico leão dourado, em defesa das bromélias ou coisa que o valha. Bicha louca, diria o velho.Vivemos tempos de não me toques que eu magôo. Quer dizer que ninguém mais pode usar a expressão coisa de viado ? Que me desculpem os paladinos da cartilha da correção, mas isso é uma tremenda babaquice. O politicamente correto é a sepultura do bom humor, da criatividade, da boa sacanagem. A expressão coisa de viado não é, nem a pau (sem duplo sentido), ofensa a bicha alguma.
Daqui a pouco só chamaremos o anão - o popular pintor de roda-pé ou leão de chácara de baile infantil - de deficiente vertical . O crioulo - vulgo picolé de asfalto ou bola sete (depende do peso) - só pode ser chamado de afrodescendente. O branquelo - o famoso branco azedo ou Omo total - é um cidadão caucasiano desprovido de pigmentação mais evidente. A mulher feia - aquela que nasceu pelo avesso, a soldado do quinto batalhão de artilharia pesada, também conhecida como o rascunho do mapa do inferno - é apenas a dona de um padrão divergente dos preceitos estéticos da contemporaneidade. O gordo - outrora conhecido como rolha de poço, chupeta do Vesúvio, Orca, baleia assassina e bujão - é o cidadão que está fora do peso ideal. O magricela não pode ser chamado de morto de fome, pau de virar tripa e Olívia Palito. O careca não é mais o aeroporto de mosquito, tobogã de piolho e pouca telha.
Nas aulas sobre o barroco mineiro, não poderei mais citar o Aleijadinho. Direi o seguinte: o escultor Antônio Francisco Lisboa tinha necessidades especiais... Não dá. O politicamente correto também gera a morte do apelido, essa tradição fabulosa do Brasil.
O recente Estatuto do Torcedor quer, com os olhos gordos na Copa e 2014, disciplinar as manifestações das torcidas de futebol. Ao invés de mandar o juiz pra putaqueopariu e o centroavante pereba tomar no olho do cu, cantaremos nas arquibancadas o allegro da Nona Sinfonia de Beethoven, entremeado pelo coro de Jesus, alegria dos homens, do velho Bach.
Falei em velho Bach e me lembrei de outra. A velhice não existe mais. O sujeito cheio de pelancas, doente, acabado, o famoso pé na cova, aquele que dobrou o Cabo da Boa Esperança, o cliente do seguro funeral, o popular tá mais pra lá do que pra cá, já tem motivos para sorrir na beira da sepultura. A velhice agora é simplesmente a "melhor idade".Se Deus quiser morreremos, todos, gozando da mais perfeita saúde.
Defuntos? Não. Seremos os inquilinos do condomínio Cidade do pé junto.
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