Leitor me pergunta como pode um ateu acreditar em intervenção divina na criação do universo. Não pode. Ocorre que vivemos em época de convicções sem fundamento algum. Os católicos que conheço de catolicismo nada entendem. Desconhecem os dogmas, que constituem o fundamento da Igreja Católica. Mais ainda: sequer sabem o que seja dogma. São católicos como alguém é corintiano ou gremista. Tanto que vemos por todos os lados católicos freqüentando cultos de umbanda ou sessões espíritas. Sempre é bom apostar uma fichinha em cada crença. Nunca se sabe...A irresponsabilidade no que tange a crenças não é apenas católica.
Conheço marxistas que jamais leram Marx, Lênin ou Stalin. Têm todos os reflexos de um comunista, pensam, agem, se comportam e votam como comunistas. Mas nunca ouviram falar em materialismo dialético ou ditadura do proletariado.
Conheço universitários que se pretendem cientistas e acreditam nas potocas do Além. Há doutores que acreditam em Deus. Como pode orientar uma tese um homem que acredita no que não existe?
Sempre depositei certa confiança nos ateus. Um homem, para descrer de superstições milenares, necessita de certa erudição. Não basta apenas dizer que não crê em Deus porque jamais o viu. É preciso entender como a idéia de Deus serve a quem quer exercitar poder sobre seus semelhantes. Como esta idéia é útil aos Estados e tiranos. Como serve para conquistar “mentes e corações”, como dizia Richard Nixon.
Se na culta França existem católicos que não acreditam em Deus, nada espanta que neste país incrível encontremos ateus que nele acreditem. Incultura não é apanágio de crentes. Analfabetos existem inclusive entre ateus. É no entanto lastimável constatar que este analfabetismo esteja contaminando pessoas que, por obrigação intelectual, deveriam ser cultas. Coisas nossas.
Essa gente que se declara atéia e crê numa intervenção divina na evolução das espécies é tão atéia quando o católico que se julga católico e acha que o vinho da comunhão é apenas um símbolo do sangue de Cristo. Pessoas que nada entenderam de nada. Não são ateus. São bobalhões que vêm algum charme em se professarem ateus. São ateus de araque.
O crente não precisa conhecer nada do que crê. Crê e basta. Já o ateu, este precisa entender o que nega. Em minha biblioteca, que já terá uns cinco mil volumes, tenho pelo menos quinhentos sobre cristianismo, história do cristianismo e catolicismo. Mais uns cem sobre judaísmo. E mais uma meia centena sobre islamismo e crenças outras. Não que pretenda usar estes instrumentos para justificar meu ateísmo. Ocorre que acho divertido ler sobre superstições. Duvido que algum católico tenha tal bibliografia sobre sua fé. Algum bispo, talvez. Mas os padres de hoje já nem conhecem latim.
Um outro leitor acha que não estou dando ao livro de Darwin o crédito que ele merece. Em verdade, o livro está em minhas estantes. Mas não o li. Muito árido e além do alcance de minha compreensão. Não preciso de Darwin para ser ateu. A Bíblia já me basta. Continua o leitor: “Hume, na verdade, não foi o primeiro a ficar em cima do muro. Você conhece algum pensador que se declarou ateu antes de Darwin? Desde a antiguidade, em todas as escolas de filosofia, o máximo que os pensadores conseguiam fazer, para tentar negar as teorias criacionistas, era afirmar que os deuses não intervinham na sua criação. Foi o caso de Epicuro, Confúcio e uma escola indiana cujo nome não me vem a mente. Acontece que as pessoas tinham medo de não haver resposta para as perguntas como quem criou o universo, para onde vamos?"Não é que tivessem medo. É que para tais perguntas não há resposta que satisfaça mortais contaminados por este vírus medíocre, o desejo de eternidade. Quem criou o universo? Quem disse que o universo teve de ser criado por alguém? Para onde vamos? Vamos para a morte, oras. Não há outro horizonte à frente. Antes de chegar lá, vamos para onde quisermos.
Quanto a conhecer alguém que se tenha declarado ateu antes de Darwin, a antigüidade está cheia deles. O fato é que o conceito de ateu entre os antigos é um tanto distinto do conceito contemporâneo. Se o ateu de hoje diz não crer em deus, o ateu de então descria não de deus, mas dos deuses.Se os primeiros indivíduos a se identificarem como ateus surgem no século XVIII, a idéia em muito antecede a Era Cristã. Segundo o Dictionnaire de théologie catholique, de Vacant e Mangenot, “é pela Índia que deve se abrir a história do ateísmo”. Segundo Finngeir Hiorth, historiador norueguês, “há documentos que mostram a existência de ateus na Índia dois mil anos antes que na Grécia”, isto é, dois mil e quinhentos anos antes de Cristo.
Isso sem falar que nós todos somos ateus. Se não em relação ao deus cristão, pelo menos em relação a outros. Quem hoje crê em Zeus, Netuno, Urano, Afrodite, Gaia, Titãs ou Cíclopes? Ateus existem desde o nascimento dos deuses. Isto é, desde sempre.
SÓ VOLTAREMOS NA PRÓXIMA SEGUNDA FEIRA
Até lá
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