PONTO FINAL
Paulo Wainberg
Twitter.com/paulowainberg
“Eles se encontram no cais do porto pelas calçadas,
Fazem biscates pelos mercados, pelas esquinas,
Carregam lixo vendem revistas, juntam baganas,
E são pingentes nas avenidas da capital.
.....
Sopram ventos desgarrados, carregados de saudade,
Viram copos,
viram mundos.
Mas o que foi,
nunca mais será.
Mas o que foi , nunca mais será. “
Você acabou de ler parte de um poema, pura poesia, instigante, bela, evocadora e profunda.
É, também, a letra da música Desgarrados, feita por Sergio Napp e composta por Mario Barbará, um dos maiores sucessos brasileiros.
Não são todos que, como eu, têm a sorte de possuir um Sergio Napp na vida.
Como amigo!
Além de escritor e letrista, e acima de tudo poeta, ele é uma pessoa doce, afável, leal, disponível e que jamais recusa sua presença.
Quando ouvi Desgarrados pela primeira vez, não o conhecia, isto foi na geração passada.
Decorei o poema.
Quando nos conhecemos, iniciou-se uma discussão secular, porque eu disse:
– Sérgio, tu és um poeta.
E ele me respondeu que não, que letra de música não é poesia.
Há mais de trinta anos ele me irrita com essa mania de negar o que é, insistindo com essa absurda tese: letra de música não é poesia.
Poesia não se podia, durante a ditadura. Foi, então, na música, que nossos poetas floreceram, ou Chico Buarque não é poeta? Vinicius? Tom Jobim? Carlinhos Lira? Geraldo Vandré?
Poesia engajada, poesia da alma, poesia da beleza, do sonho, da saudade, da paixão, da alegria e da tristeza.
Nas letras de músicas podia-se dizer, então, que o que foi, nunca mais será, que amanhã será outro dia, que amar é bom, chega de tristeza ou que fazer samba não é contar piada.
O Serginho Napp é um desses, com a sensibilidade de quem é poeta e, portanto, faz poesia.
Um de nossos poetas malditos, já falecido, Paulo Hecker Filho, costumava dizer que um grande poeta faz, no máximo, vinte poemas na vida. O resto é tentativa.
Talvez. Desconheço a estatística.
Fazer um único grande poema é, na minha opinião, a missão do grande poeta. Escrever mil poemas sem um que seja imenso, dolorosamente definitivo, de revolver as entranhas, sufocar o cérebro e martirizar o coração? Que perda de tempo, então, que triste vocação perdida, sem o talento a suportar-lhe o desejo.
Sergio Napp pode dizer o que quizer, pode afirmar que letra de música é um gênero literário a parte, pode negar-se a condição de poeta, pode tudo, até votar em... arghhhhh, senador.
Continuarei amigo dele com toda a força, perto ou longe, sempre ou às vezes.
Em Desgarrados, Sergio escreveu o grande poema que torna grande o poeta.
E como sei que ele vai continuar me irritando, deixo a discussão em aberto, para quem quiser pensar a respeito, opinar ou não.
Para mim, Sergio Napp é poeta. E ponto final.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Um comentário:
"Sergio Napp pode dizer o que quizer..."
Não seria "quiser"?
Um ligeiro typo...
Postar um comentário